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Tutorial: Caracterizar Dor Crônica

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Nicolle Souza
Módulo: Processo de Envelhecimento 
Problema 03: Só dói quando respiro...
· Objetivo 01: Caracterizar dor crônica
Introdução 
A dor é um mistério. Trata-­se de um dos sintomas mais estudados no mundo, em todas as faixas etárias. Ainda assim, representa um desafio para os profissionais da saúde que lidam com pessoas idosas e não compreendem a dor. Esses profissionais não recebem, em sua formação acadêmica, ensinamentos suficientes sobre o reconhecimento e a abordagem desse sintoma tão complexo. O objetivo deste capítulo é motivar um olhar diferenciado e sensível para a dor, cujo tratamento pode exigir uma intervenção multi­ e interdisciplinar. Segundo o imaginário popular, a dor faz parte do processo fisiológico do envelhecimento e, por isso, o limiar de dor da pessoa idosa é alto. Isso é um mito. A dor é um sintoma que interfere no bem­ estar de cada um, comprometendo diretamente a capacidade funcional para desempenhar, sem auxílio, as atividades de vida diária. A dor é uma experiência individual, com substrato cultural apreendido por cada um desde a infância, cuja intensidade pode variar de um leve desconforto a uma sensação excruciante e incapacitante.
Epidemiologia
Dor é a causa mais comum que leva à procura de tratamento médico. Em torno de 80% das queixas em consultório geral envolvem dor. Em amostras populacionais na Ásia, África, Europa e Américas, 21,5% dos entrevistados relataram terem sentido dor nos últimos 6 meses. Na população idosa, a prevalência de dor é bastante elevada. Dor crônica em idosos varia entre 25% e 80%. Entre idosos residentes na comunidade, a prevalência varia entre 25% e 50%. Em residentes de clínicas de longa permanência, a prevalência é assustadora, 45% a 80% de portadores de dor substancial se encontram em subtratamento. Estes idosos provenientes da comunidade e de clínicas de longa permanência apresentam comumente várias etiologias de dor, e sua alta prevalência de alteração cognitiva, sensorial e incapacidade de várias origens dificulta ainda mais a avaliação e o diagnóstico de dor no idoso. Inventário via telefone de Louis Harris demonstrou que cerca de 18% dos idosos participantes apresentavam dor crônica e que tomavam medicações analgésicas regularmente, 63% destes pacientes tinham se utilizado de prescrição fornecida há mais de 6 meses, 45% dos pacientes que tomam analgésicos tinham procurado três médicos ou mais nos últimos 5 anos, e 79% dos que foram procurados eram médicos de cuidados primários.
Definição da dor 
A dor é definida como “uma experiência sensorial e emocional desagradável, primariamente associada a um dano real ou potencial dos tecidos, ou descrita em termos de tais lesões, ou ambos” segundo a Associação Internacional para Estudo da Dor. De maneira mais simples, pode-se dizer que “dor é aquilo que o indivíduo relata como sendo dor, existindo quando ele disser que existe”. A essência das definições é que a dor é subjetiva, apresenta múltiplas dimensões, sem uma clara relação entre a intensidade da sensação e a lesão tecidual associada à dor. A experiência da dor é modulada por vários aspectos pessoais, refletindo em experiência sensorial e resposta afetiva e cognitiva individual. Assim, esse fenômeno, inicialmente, biológico pode causar um grau de dificuldade tanto para reconhecimento e diagnóstico, como para tratamento e manutenção de sua terapêutica ao longo da evolução da doença de base, crônica ou aguda subjacente. Os profissionais envolvidos com pacientes portadores de dor devem sempre considerar a interferência de fatores cognitivos e psicossociais na precipitação e manutenção da dor, e, concomitantemente, avaliar o impacto potencial da mesma em ambos os funcionamentos, físico e psicossocial. Com o intuito de conscientizar os profissionais da saúde a respeito da questão da dor, existe uma recomendação contemporânea de reconhecer a dor como o 5 o sinal vital, ou seja, uma informação essencial na avaliação de todos os pacientes. A ideia, proposta pelo presidente da IASP, Dr. James Campbell, em discurso para a American Pain Society, 4 parte do pressuposto de que, se a dor fosse avaliada com o mesmo zelo dedicado ao registro dos outros sinais vitais, haveria melhor possibilidade de promover um tratamento adequado.
Fisiologia da Dor
Uma observação importante, já relatada anteriormente, é que a relação entre dor e dano tecidual precipitador não é uniforme nem constante. Essa observação revela a importância de se diferenciar a dor de nocicepção. Nocicepção é o termo aplicado para a ativação de fibras nervosas responsáveis pela condução de estímulos potencialmente danosos ao tecido como estímulos mecânicos, térmicos ou químicos. Na prática clínica, nocicepção não pode ser medida diretamente, porém pode ser inferida pela extensão da lesão tecidual. A relação complexa entre lesão tecidual e presença ou intensidade da dor indica que dor e nocicepção devem ser vistas como fenômenos com construtos distintos. A dor pode ser considerada percepção da nocicepção. Como outras percepções, essa é determinada pela atividade em passagens neurais aferentes, causada por estímulo direto (lesão tecidual) e por vários outros fatores não nociceptivos. A dor resulta da ativação de nociceptores presentes nas terminações nervosas livres, presentes nas fibras nervosas aferentes amielínicas (fibras C) ou finamente mielinizadas (fibras Ad) do sistema nervoso periférico. Os nociceptores podem ser ativados por estímulos físicos (mecânicos ou térmicos) e químicos (íons hidrogênio, ATP, K+, entre outros). As fibras C e Ad, que conduzem a informação dolorosa, chegam ao sistema nervoso central (SNC), em que fazem interconexões no corno dorsal da medula espinal. Nesse nível ocorre a modulação da informação nociceptiva vinda da periferia, essa modulação pode ser excitatória ou inibitória. A modulação excitatória depende de diversos canais, como receptor NMDA, receptores de neurocininas, entre outros, enquanto a modulação inibitória por ação de opioides endógenos, norepinefrina, serotonina e GABA. Após a modulação que ocorre no corno dorsal, o estímulo nociceptivo é transmitido, por meio dos tratos espinotalâmicos e espinorreticulares, até a formação reticular do tronco encefálico e núcleos talâmicos sensoriais. Destas estruturas, a informação é projetada às unidades celulares hipotalâmicas, áreas corticais sensoriais ou não e estruturas do sistema límbico. Esta ampla representação cortical e subcortical da informação sensorial dolorosa é a responsável pelos aspectos sensorial-discriminativo, afetivo-motivacional e cognitivo-avaliativo da dor. 
Classificação
Para propor o tratamento correto, é essencial que o profissional estabeleça, sempre que possível, o diagnóstico preciso do tipo de dor: nociceptiva, neuropática ou mista.
· Dor nociceptiva: resulta de dano direto ao órgão ou tecido, com preservação da integridade nervosa. Exemplos desse tipo de dor são a dor articular, a dor pós­operatória e o trauma. A dor nociceptiva divide­se em somática e visceral. A somática é bem localizada e intermitente, podendo ser desencadeada ou exacerbada pelo movimento e aliviada pelo repouso. São exemplos as dores musculoesqueléticas, úlceras de pele e linfadenopatias. A dor visceral é pouco localizada, difusa, em cólica e constante. São exemplos o infarto agudo do miocárdio, a pancreatite e a cólica nefrética. (Já falado na parte superior)
· Dor neuropática: resulta do comprometimento da estrutura nervosa central ou periférica, seja por destruição, infiltração ou compressão tecidual. É uma dor pouco precisa, contínua ou intermitente, relatada como queimação, choque ou formigamento. São exemplos a neuralgia do trigêmeo, a neuralgia pós­herpética, a dor do membro fantasma e a neuropatia diabética
· Dor mista: resulta da superposição de componentes nociceptivos e neuropáticos, como no câncer metastático para osso com compressão de raiz nervosa. Por sua complexidade, costuma exigir associação de fármacos para o seu controle, bem como uma equipe multidisciplinar com formação específica.Além disso, a dor também deve classificada quanto à intensidade em leve, moderada ou grave. Por fim, o caráter temporal divide a dor em aguda ou crônica. A American Geriatrics Society sugere o uso do termo dor persistente, em lugar de dor crônica, em função do estigma negativo associado ao termo crônico. Em idosos, a dor pode se apresentar de maneira atípica, com repercussão no humor e na funcionalidade, caracterizando um quadro de depressão, falta de apetite, isolamento social, comprometimento da mobilidade ou alteração do ciclo sono-vigília.
Efeito da idade na percepção dolorosa e dores mais frequentes em idosos 
Da mesma maneira que em outros sistemas do corpo humano, o envelhecimento promove alterações no sistema nervoso, alterando o processamento, a percepção e o tratamento da dor. Alterações neurais e bioquímicas que acompanham o envelhecimento podem levar a alterações na anatomia e fisiologia do processamento nociceptivo. Tem se tornado mais claro por meio de experimentos em animais e seres humanos que um mesmo estímulo nociceptivo produz efeitos diferentes em adultos e idosos. Existem dados em seres humanos que possibilitam dizer que há um aumento no limiar de dor com a idade, entretanto, é importante que se coloque que o limiar de dor depende do tipo de estímulo doloroso estudado. Por outro lado, a tolerância ao estímulo doloroso está diminuída em pessoas mais idosas, que toleram menos estímulos dolorosos intensos, quando comparados a populações mais jovens. Podemos dizer que o idoso sente menos os estímulos dolorosos menos intensos, mas tolera poucos estímulos dolorosos mais intensos. Esses achados podem explicar as observações clínicas que distensões de vísceras em quadros obstrutivos levam mais tempo para serem relatadas em pacientes idosos que em paciente jovens, assim como a maior incidência de isquemia miocárdica silenciosa em idosos. Em situações que cursam com dores crônicas, como a fibromialgia, sintomas como cefaleia, ansiedade, estresse e piora no padrão de sono são menos comuns em idosos do que em jovens. A falta de conhecimento das situações clínicas que cursam com dor mais frequentes no envelhecimento acaba levando ao subdiagnóstico e tratamento inadequado da dor nos pacientes idosos. As dores de origem musculoesquelética estão entre as dores mais comuns nos idosos, seguidas de dores neuropáticas, como neuropatia diabética dolorosa e neuralgia pósherpética e as dores oncológicas. 
Abordagem clínica da dor 
A avaliação da dor mais detalhada e completa possível é a chave do sucesso terapêutico. Há a possibilidade de encontrar dificuldades na avaliação dos pacientes idosos por eles manifestarem comorbidades que dificultam a expressão, ou mesmo até incapacidade de comunicação pela doença de base, tal como depressão, demência ou sequela de acidente vascular cerebral. A sensibilidade dos profissionais atuantes dentro de um contexto interdisciplinar torna-se um instrumento fundamental neste item. O sucesso no tratamento da dor depende da identificação da causa de base do processo álgico e seu tratamento definitivo. Entretanto, em muitas situações de dor crônica, a dor, por si só, torna-se entidade independente e deve ser tratada de maneira específica. É importante lembrar que não há marcadores biológicos de intensidade da dor. A dor é um sintoma e o relato do paciente, a principal evidência de sua existência. Os profissionais de saúde, assim como os familiares e cuidadores devem acreditar e investigar seriamente a queixa álgica. Algumas considerações são importantes na avaliação da dor: 
· Acredite na queixa do paciente – qualquer dor crônica ou recorrente que tenha impacto significativo na função ou qualidade de vida deve ser vista como um problema 
· Obtenha uma história cuidadosa sobre a queixa dolorosa – localização, irradiação, caráter ou qualidade, intensidade, duração, evolução, relação com as funções orgânicas, fatores desencadeantes ou de piora, fatores de melhora, e manifestações concomitantes e histórico de uso prévio de analgésicos 
· Em caso de pacientes com déficit cognitivos ou de linguagem, os cuidadores devem ser entrevistados – alterações de comportamento, vocalização e linguagem não verbal devem ser avaliadas 
· Avalie o estado psicológico do paciente – principalmente humor depressivo 
· Faça exame físico geral e neurológico cuidadoso – déficits neurológicos, hiperalgesia, alodinia, parestesia, sinais flogísticos, presença de pontos-gatilho 
· Avalie a necessidade de procedimentos diagnósticos complementares – exames de imagem e laboratoriais 
· Avalie a extensão da doença, principalmente em pacientes oncológicos 
· O tratamento da dor auxilia a pesquisa diagnóstica 
· Considere métodos alternativos para controle da dor durante a avaliação inicial 
· Reavalie a queixa álgica ao longo da terapêutica prescrita – a intensidade da dor deve ser quantificada antes e durante a terapêutica. A utilização de um “diário de dor” descrevendo a intensidade, resposta ao tratamento e atividades associadas, pode auxiliar no acompanhamento 
· Individualizar a terapêutica. 
A avaliação da dor em suas diferentes dimensões é facilitada pela utilização de escalas de avaliação, aplicadas aos pacientes. Escalas unidimensionais de intensidade como escala numérica, descritiva e visual analógica ou mais complexas como o inventório breve de dor são utilizadas na prática clínica. Escalas de grande extensão, como a escala de McGill, tem sua aplicabilidade dificultada por apresentar tempo de aplicação também prolongado. Estas escalas foram muitas vezes elaboradas para finalidade de pesquisa clínica que exigem ser as mais completas possíveis para analisar uma situação de intervenção. Em um cenário de atendimento no dia a dia, sugere-se o emprego de uma escala ou inventário que tenha facilidade de aplicação com possibilidade de continuidade da aplicação pela equipe. A dor é, certamente, um dos aspectos mais importantes dentro do atendimento, mas não é o único componente que avaliamos como geriatra. Uma sistematização do atendimento aos pacientes com dor, com avaliação da sua intensidade, e se possível de outras dimensões em quantificação objetiva, é bastante útil na prática. Este tipo de medida é muito importante quando uma equipe atua em conjunto com vários profissionais, e a documentação de sua avaliação deve ter uma linguagem comum, de fácil compreensão para todos. Assim, a melhora ou piora do quadro doloroso pode ser acompanhada de maneira mais objetiva e compartilhada pelos membros da equipe. A avaliação de outros construtos, além da intensidade da dor é importante. É oportuno salientar que, para este tipo de avaliação ou aplicação de escalas, não há necessidade de se limitar a um profissional. Ao contrário, cada aspecto de avaliação pode ser abordado pelo profissional de área com melhor capacitação dentro da equipe interdisciplinar. Sugere-se avaliação da atividade de vida diária, expectativas sobre o quadro, sintomas de depressão e ansiedade, estratégia de enfrentamento, qualidade de vida e outros construtos ou itens que a equipe julgar necessário.
Avaliação da dor no paciente idoso 
Em idosos sem distúrbios cognitivos, a avaliação da dor pode ser feita de maneira semelhante àquela realizada na população adulta. As maiores dificuldades se encontram em idosos portadores de demência. A demência, em função da diminuição da capacidade de comunicação e compreensão provoca modificações na experiência dolorosa e também dificuldades na avaliação e no tratamento da dor. O não tratamento ou subtratamento da dor traz ao idoso portador de demência maior probabilidade de riscos físicos, depressão, piora das funções cognitivas, diminuição da socialização e consumo aumentado dos recursos de saúde. A avaliação da dor em idosos portadores de demência é feita de maneira semelhante às avaliações em populações neonatais e lactentes, sendo observacional e não autoavaliativa. Dados como expressões faciais, verbalização e vocalização, movimentos corpóreos, alterações nas relações interpessoais, nas rotinase do estado mental são avaliados durante a entrevista, assim como os relatos realizados por familiares ou cuidadores. Algumas escalas foram desenvolvidas para avaliação de dor em idosos com demência. PACSLAC e DOLOPLUS2 são escalas desenvolvidas para idosos com dor e limitações cognitivas. PACSLAC é uma escala mais extensa constando de 60 itens, o que torna mais difícil a sua aplicação em grande escala, já DOLOPLUS2 é uma escala menor, com dez itens, o que facilita a sua utilização na prática clínica diária.
Abordagem não farmacológica
Pacientes idosos com dor podem requerer uma abordagem que envolva profissionais capazes de perceber o tratamento como algo que transcende o mero uso de fármacos. Em casos de dor persistente, a intervenção de psicólogo, terapeuta ocupacional e fisioterapeuta é essencial. Técnicas de neuroestimulação periférica, como acupuntura, eletroacupuntura e infiltração de pontos­gatilho, também podem auxiliar no controle da dor, assim como práticas de relaxamento e meditação. Uma pequena parcela dos pacientes requer técnicas intervencionistas, como radioterapia e bloqueios anestésicos. Em caso de dor refratária, sugere­-se o envolvimento de um anestesiologista para uma intervenção específica, que pode ser feita por via epidural, inclusive com instalação de cateteres para infusão contínua de analgésicos
Abordagem farmacológica 
Dor é aquilo que o paciente diz que dói. O arsenal medicamentoso para tratamento da dor é extenso e refinado, de maneira que o médico precisa adquirir capacidade técnica para propor os fármacos apropriados. Não se deve temer o uso correto dos medicamentos para alcançar a analgesia. O princípio básico da abordagem farmacológica em idosos é iniciar os analgésicos em baixas doses e aumentá­las gradativamente, para adequação individual da posologia. Essa regra é conhecida, na literatura geriátrica internacional, como start low, go slow. Justifica­-se porque, devido às alterações fisiológicas, farmacocinéticas e farmacodinâmicas próprias de pacientes idosos, ocorre redução da janela terapêutica, ou seja, a dose terapêutica de um analgésico aproxima-­se da dose tóxica, o que exige a prescrição criteriosa. A exceção para essa regra é a dor aguda de forte intensidade (p. ex., causada por trauma ou no pós­operatório), que requer alívio imediato com analgésico para dor forte. Dentre as principais condições clínicas e doenças que interferem na farmacocinética dos analgésicos, cabe destacar: desnutrição, insuficiência cardíaca congestiva, infecções e polifarmácia. Em decorrência do processo de envelhecimento, ocorre redução da função hepática (pelo decréscimo da atividade do citocromo P450) e da função renal (com diminuição da taxa de filtração glomerular), o que altera a excreção dos fármacos – sobretudo os lipossolúveis. 12 O médico precisa conhecer bem os analgésicos que prescreve para identificar eventuais efeitos colaterais sobre o sistema nervoso central que interfiram no tratamento, sobretudo as manifestações anticolinérgicas (delirium, visão turva, xerostomia, impactação fecal, retenção urinária). Para a seleção dos fármacos apropriados, deve­se considerar a comodidade na posologia, as interações medicamentosas, o custo financeiro, a disponibilidade e outros sintomas associados à dor. O método para o tratamento da dor oncológica, desenvolvido pela Organização Mundial da Saúde, 13 até hoje norteia a abordagem de pacientes com queixa de qualquer tipo de dor. De acordo com seus princípios básicos, o tratamento deve seguir os parâmetros elencados na sequência:
· Pela boca: sempre que possível, privilegia­se a via oral, pela maior comodidade e pela liberação mais lenta e fisiológica do fármaco, com menor risco de efeitos colaterais do que pela via parenteral 
· Pelo relógio: as doses devem ser prescritas em intervalos regulares. A dose seguinte deve ser administrada enquanto o efeito da anterior ainda não se dissipou totalmente. O objetivo é o alívio contínuo da dor 
· Pela escada: existe uma hierarquia dos analgésicos. O primeiro degrau é de fármacos não opioides. Se um deles não for suficiente para alívio da dor, prescreve­-se um opioide para dor leve ou moderada. Caso o paciente ainda refira dor, recomenda-­se um opioide para dor de forte intensidade. Em todas as etapas, pode ser associado um adjuvante 
· Para o indivíduo: a subjetividade e a veracidade da dor precisam ser respeitadas, ou seja, não existe uma dose padrão para o tratamento de determinado tipo de dor. Cada um sente a sua dor e, por isso, é importante acreditar no relato do paciente 
· Atento aos detalhes: a prescrição precisa ser bem explicativa e fornecida ao paciente por escrito, contemplando, inclusive, orientações sobre os efeitos colaterais mais frequentes.
Não opioides 
São indicados para dor leve ou como adjuvantes em qualquer degrau da escada analgésica. Têm efeito teto, ou seja, o aumento da dose além de determinado nível não potencializa a ação analgésica – ao contrário, provoca reações adversas. O uso desses fármacos em associação com determinados opioides pode ser interessante pelo efeito dose­excedente (dosesparing ef ect), que possibilita a prescrição de doses menores dos opioides.
· Analgésicos simples 
1. Dipirona: pode ser usada de 4/4 h a 6/6 h, de 500 mg a 1 g por dose. Seu uso é reconhecido em vários países, a despeito da não aprovação pela Food and Drug Administration (FDA) dos EUA 
2. Paracetamol: amplamente disponível, é recomendado como terapia de primeira escolha na dose de 325 mg a 500 mg 4/4 h, ou 500 mg a 1 g 6/6 h. A dose máxima diária é de 4 g, em função do potencial de hepatotoxicidade
· Anti-inflamatórios não esteroides 
Apesar de desaconselhados em idosos, 7 os anti­inflamatórios não esteroides (AINE) são úteis no tratamento de dor de origem inflamatória em função do rápido efeito analgésico, sendo recomendado o uso pelo menor tempo possível. Deve­-se prestar especial atenção aos efeitos colaterais, como toxicidade renal e ulcerações gastrintestinais, além de interações com outros medicamentos.
Opioides 
São derivados do ópio, classificados como naturais ou sintéticos e fracos ou fortes, e antagonizados pela naloxona. Recomenda­se usar apenas um opioide por vez, escolhido por sua intensidade e tempo de ação, comodidade de via de administração e efeitos adicionais e colaterais. As doses iniciais devem ser as mais baixas, com resultados satisfatórios. Se descontinuados de maneira abrupta, podem induzir abstinência. A substituição de um opioide por outro deve respeitar a equipotência analgésica. Constipação intestinal é um efeito previsível, induzido por todos os fármacos desse grupo, e deve ser tratada recomendando­se caminhadas, quando possível, assim como dieta laxativa com farta ingestão de líquidos e uso regular de medicamentos laxativos por via oral ou retal. 
Analgésicos e anti-inamatóriostópicos 
De acordo com as diretrizes da American Geriatrics Society, 7 os adesivos de lidocaína 5% limitam­se ao tratamento da dor neuropática. AINEs para uso tópico, como diclofenaco ou salicilato, têm sido empregados para evitar os efeitos adversos relacionados com os AINEs sistêmicos. Seu uso em idosos, no entanto, é limitado pelos riscos de manuseio inadequado e reações adversas exacerbadas.
Considerações finais 
Apesar de todo o conhecimento acumulado sobre dor, da alta tecnologia e da disponibilidade dos analgésicos, pessoas idosas ainda sofrem diariamente com dor não controlada. Isso acontece porque os profissionais encontram dificuldade para valorizar as queixas de seus pacientes, sobretudo daqueles muito idosos ou frágeis, e não prescrevem os analgésicos nas doses preconizadas. Este capítulo apresentou, de maneira objetiva, algumas recomendações de cunho geral que pretendem provocar um aprofundamento nessa temática instigante e desafiadora. A dor pode e deve ser controlada.
· Objetivo 02: Relacionar fratura por fadiga com o processo de envelhecimento
As fraturas por estresse, também conhecidas como fraturas por fadiga, são resultado de forças de baixa magnitudeaplicadas de modo repetido. Qualquer aumento na magnitude ou na frequência do estímulo ósseo produz uma reação de estresse, que pode causar microlesões. O osso responde às microlesões remodelando: primeiramente, os osteoclastos reabsorvem o tecido danificado; então os osteoblastos depositam osso novo nesse local. Quando não há tempo para que o processo de reparo seja completado antes que uma microlesão adicional ocorra, essa condição pode progredir para uma fratura por estresse. 
A queixa de dor no joelho, em pacientes de idade superior a 60 anos, é freqüente e, em geral, é provocada pelo desequilíbrio muscular decorrente do envelhecimento ou mesmo do processo degenerativo tão comum nesses pacientes(1). O desequilíbrio muscular caracteriza-se pela atrofia do quadríceps associada à retração dos músculos isquiotibiais, que de maneira progressiva leva ao posicionamento em flexo da articulação do joelho.
O processo degenerativo articular ocorre nessa faixa etária junto de manifestações clínicas freqüentes no joelho. A dor decorrente desse processo é de aparecimento progressivo e evolutivo, que piora com a atividade física e que às vezes associa-se a deformidades da articulação do joelho.
Há um grupo de pacientes, nessa faixa etária, que embora não apresente processo degenerativo importante, relata dor no joelho de início súbito, sem causa traumática. Estes pacientes têm características próprias sob o ponto de vista clínico, etiológico e terapêutico.
A lesão meniscal é uma das patologias mais freqüentes do joelho, podendo ser classificada quanto à etiologia em três tipos: traumática - decorrente de um episódio traumático específico e descrito pelo paciente; degenerativa - decorrente da artrose do joelho; por fadiga - lesões de aparecimento súbito sem causa traumática evidente. A lesão meniscal por fadiga tem os sintomas que caracterizam os pacientes do presente estudo e ocorre com maior freqüência no menisco medial de pacientes do sexo feminino(2). O exame radiográfico simples, em geral, é normal. A RM demonstra o menisco medial subluxado na maioria dos casos. Esta luxação é provocada pela abertura do "rim" meniscal devido à presença de uma fenda radial entre a transição do corpo e o corno posterior (figuras 1 e 2). Esse tipo de lesão ocorre, ao nosso entendimento, por fadiga. A chamada osteonecrose idiopática do joelho é, na verdade, uma lesão por insuficiência ou fadiga. A imagem da RM é totalmente diferente da osteonecrose avascular que ocorre por uso de corticóide, alcoolismo, lúpus, hemoglobinopatias, pacientes portadores de HIV, como descrevem Lecouvet et al(8). Gil et al consideram que a etiologia é traumática, decorrente de fratura por estresse agravada pela presença de lesão meniscal instável(4).
· Referência:
FREITAS, Elizabete. Tratado de Geriatria e Gerontologia. 3 ed. 2013
FREITAS, Elizabete. Manual Prático de Geriatria. 2 ed. 2017
MARQUEZ, Jaime. A dor e os seus aspectos multidimensionais. Rev. Ciência e Cultura. 2011
CAMANHO, Gilberto. Dor Aguda No Joelho Do Paciente Idoso. Rev. Brasileira de Ortopedia. 2008

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