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FACULDADE DO PIAUÍ - FAPI JELCYENE ROSA VIEIRA O IDOSO E SUA INSERÇÃO EM ABRIGOS INSTITUCIONAIS: Quais as causas? TERESINA - PI 2017 JELCYENE ROSA VIEIRA O IDOSO E SUA INSERÇÃO EM ABRIGOS INSTITUCIONAIS: Quais as causas? Trabalho de conclusão de curso apresentado à FAPI- Faculdade do Piauí para obtenção do título de bacharel em Serviço Social. Orientadora: Prof.ª Luciana Evangelista F. Franco TERESINA - PI 2017 JELCYENE ROSA VIEIRA O IDOSO E SUA INSERÇÃO EM ABRIGOS INSTITUCIONAIS: Quais as causas? Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de Bacharel em Serviço Social e aprovado em sua forma final pela FAPI- Faculdade do Piauí. Aprovada em: DEZEMBRO DE 2017 BANCA EXAMINADORA Prof.ª Aline Teixeira Faculdade do Piauí – FAPI Prof.° Fabrício Barbosa Faculdade do Piauí – FAPI Prof.ª Luciana Evangelista F. Franco Faculdade do Piauí – FAPI AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus por todas as conquistas alcançadas; A minha família pela força, incentivo, por me acompanharem e apoiarem diante de todas as dificuldades e bênçãos recebidas nestes três anos e meio de muitos aprendizados. Agradecer também a todas as pessoas queridas que durante esta trajetória muito contribuíram para o meu enriquecimento profissional. E a minha querida professora Luciana Evangelista com seu profissionalismo e dedicação me orientou na construção deste trabalho, contribuindo com seus conhecimentos e experiência no desenvolvimento de minhas idéias. “Velhice não deveria ser entendida como doença, pois não é algo contrário à natureza.” (Aristóteles). https://www.pensador.com/autor/aristoteles/ RESUMO O Brasil, antes considerado um país jovem vem passando por grandes mudanças demográficas que influenciaram na transformação dessa realidade, o decréscimo da natalidade e mortalidade, tornando-se um país com grande número de pessoas idosas. Porém, esta situação não trouxe resultados positivos, ao contrário, o aumento desta população transformou-se em um problema social, pois os governantes não prepararam o Brasil para determinada circunstância resultando em um país sem políticas públicas e sociais, serviços, programas e projetos de qualidades e eficientes, capazes de atender as necessidades básicas da população em seu processo de envelhecimento. Dessa maneira, o objetivo da pesquisa realizada é identificar quais as causas da institucionalização da pessoa idosa, a partir da análise da sociedade diante do processo de envelhecimento, da relação família / idoso no novo contexto social e assim dos motivos que resultam no processo institucional. Esta apresenta abordagem qualitativa, caráter explicativo, se utiliza do método Materialista Critico Dialético e é uma análise bibliográfica. De acordo com o estudo realizado verificou-se que as medidas implantadas pelo Estado para suprir as necessidades do idoso continuam insuficientes devido a sua ineficácia, dessa forma a família passa a ser a principal base na luta pela proteção e efetivação dos seus direitos. No entanto esta, diante de tantas imposições ideológicas colocadas pelo sistema capitalista que manipula a sociedade e, por conseguinte a família encontra-se fragilizada, impossibilitada de atender de forma eficaz as suas responsabilidades, dificultando a convivência familiar entre os membros e assim resultando na institucionalização da pessoa idosa. Todavia, é preciso que o Estado enquanto provedor disponha à família o suporte necessário para atender as demandas ali existentes, além de trabalhar a sociedade com novos olhares e conceitos, fomentando estratégias que atendam as demandas existentes auxiliando-a na mudança desta realidade. Palavras-chave: Idoso. Família. Institucionalização. ABSTRACT Brazil, previously considered a young country, has undergone great demographic changes that have influenced the transformation of this reality, the decrease of the birth rate and mortality, becoming a country with a large number of elderly people. However, this situation did not produce positive results, on the contrary, the increase of this population has become a social problem, since the rulers did not prepare Brazil for a certain circumstance, resulting in a country without public and social policies, services, programs and projects of quality and efficient, capable of meeting the basic needs of the population in its aging process. In this way, the objective of the research is to identify the causes of the institutionalization of the elderly person, from the analysis of the society before the aging process, the family / elderly relationship in the new social context and thus the reasons that result in the institutional process. This one presents a qualitative approach, explanatory character, is used of the Materialistic Critical Dialectic method and is a bibliographical analysis. According to the study, it was verified that the measures implemented by the State to meet the needs of the elderly remain insufficient due to their inefficiency, so the family becomes the main basis in the struggle for the protection and realization of their rights. However, in the face of so many ideological impositions placed by the capitalist system that manipulates society and therefore the family is weakened, unable to effectively meet their responsibilities, making it difficult for family members to live together and thus resulting in institutionalization of the elderly. However, it is necessary for the State as a provider to provide the family with the necessary support to meet the existing demands, as well as to work the society with new looks and concepts, fomenting strategies that meet the existing demands, helping it to change this reality. Key-words: Elderly. Family. Institutionalization. LISTA DE TABELAS Tabela 1: Número de idosos com idade igual ou superior a 65 anos no Brasil, nos anos de 2013-2060.....................................................................................................39 Tabela 2:Número de ILPI`s e idosos residentes nos anos de 2007-2010 no Brasil ...................................................................................................................................... 40 Tabela 3: Número de ILPI´s por região nos anos de 2009-2014................................ 41 LISTA DE QUADRO Quadro1: As causas da institucionalização da pessoa idosa ..................................... 45 LISTA DE SIGLAS ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária. BPC - Beneficio de Prestação Continuada. CF - Constituição Federal. CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. ILPI’s - Instituições de Longa Permanência para Idosos. IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. LOAS - Lei Orgânica de Assistência Social. MDS - Ministério do Desenvolvimento e Combate à Fome. ONGs - Organizações Não Governamentais. PNAD- Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. PNI - Política Nacional do Idoso. RDC - Resolução da Diretoria Colegiada. SESC - Serviço Social do Comércio. SEDH -Secretaria de Estado de Direitos Humanos. SUAS - Sistema Único de Assistência Social. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 11 2. O IDOSO NO DECORRER DA HISTÓRIA E A LEGISLAÇÃO COMO SUPORTE AO PROCESSO DE ENVELHECIMENTO ................................................................ 13 2.1. Compreendendo o ser “idoso” em tempos passados ................................... 14 2.2. O Idoso na realidade contemporânea .............................................................. 16 2.3. A legislação enquanto instrumento de proteção da Pessoa Idosa .............. 18 2.3.1. O idoso na Constituição Federal de 1988 e a garantia da proteção dos seus direitos........................................................................................................................18 2.3.2. Política Nacional do Idoso- PNI: Ampliando a proteção de direitos ................. 21 2.3.3. Estatuto do Idoso: Protegendo gerações contra uma sociedade alienada ...... 23 3. A FAMÍLIA E A PESSOA IDOSA EM UM CONTEXTO COMTEMPORÂNEO .... 27 3.1. O envelhecimento como uma expressão da questão social ......................... 27 3.2. A intergeracionalidade e o lar ........................................................................... 31 4. A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA PESSOA IDOSA NO BRASIL: DE ONDE VEM ESSA IDEIA? ...................................................................................................................................... 36 4.1. ILPI’s e sua historicidade ................................................................................... 36 4.2. A regulamentação das Instituições de Longa Permanência para Idoso ..... 42 4.3. Institucionalização da pessoa idosa: Quais as suas causas? ..................... 45 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................... 49 REFERÊNCIAS ............................................................................................................ 53 11 1. INTRODUÇÃO Nas últimas décadas foi observado através de estudos realizados, que o perfil da sociedade tem se modificado devido o decréscimo da natalidade e da mortalidade, resultando no crescente número da população idosa no Brasil. Dessa forma, necessita-se que a sociedade esteja preparada para adaptar-se a essa nova realidade. Diante dessas informações, torna-se importante elencar que a sociedade contemporânea encontra-se em um estilo de vida diferente do que se esperava ser assegurado ao idoso, tornando esse convívio fragilizado e por muitas vezes impossível. E por essa razão a pesquisa buscou compreender as principais causas que influenciam na institucionalização do idoso, e assim identificou os motivos que contribuem para que a relação família/idoso encontre-se em alguns casos tão delicada. Para se chegar aos resultados optou-se por uma pesquisa com embasamento na Teoria Marxista, pautado no método Materialista Dialético onde se analisa as sociedades com suas múltiplas relações dadas e inacabadas, visando à compreensão das causas que motivam a institucionalização do idoso na atualidade. Sendo esta pesquisa bibliográfica se utilizando de acervos produzidos anteriormente, os dados foram coletados a partir de livros, artigos e meio eletrônico para uma melhor amplitude nos resultados buscados na pesquisa. É uma pesquisa explicativa, pois busca identificar fatores e explicá-los, sendo também qualitativa, pois possibilita o estímulo de uma compreensão subjetiva referente à problemática aqui pesquisada. Com base aos métodos mencionados a pesquisa tem o propósito de analisar os dados coletados para então se chegar ao objetivo geral desta pesquisa que são as causas da institucionalização da pessoa idosa, visando entender o porquê desse processo de institucionalização e assim contribuindo para um novo olhar dessa realidade. O capítulo 2, “O idoso no decorrer da história e a legislação como um suporte ao processo de envelhecimento”, traz um debate em torno da historicidade do envelhecimento e, por conseguinte do idoso no transcurso do tempo, analisando como eram e como são considerados e acolhidos pelas sociedades de cada época, e assim abordando a legislação como o principal apoio legal aos idosos, diante de toda e qualquer circunstância vivencial segundo SOUSA (2001), SCORTEGAGNA e 12 OLIVEIRA (2012), NETTO (1996), SESC (2009), CONSTITUIÇÃO FEDERAL (1988), PNI (1994), ESTATUTO DO IDOSO (2003) e outros. No capítulo 3, “A família e a pessoa idosa”, trabalhou-se o envelhecimento como uma expressão da questão social e a intergeracionalidade no lar, estudando qual a influência desta problemática social no convívio intrafamiliar a partir de IAMAMOTO (2010), SALVADOR (2010), TEIXEIRA (2015), DEBERT (2004), BERNARDO (2005) entre outros. E no capítulo 4, “A institucionalização da pessoa idosa: De onde vem essa ideia?”, foi discutida a trajetória das Instituições de Longa Permanência para Idosos, a regulamentação que normatiza o seu funcionamento e as principais causas da institucionalização do idoso citadas por NETTO (1996), TIER, FONTANA, SOARES (2004) e outros. Assim, foi detectado no decorrer da pesquisa que devido à educação repassada culturalmente entre algumas civilizações no transcorrer do tempo, e principalmente a implantação do sistema capitalista, que tem em sua essência o poder de manipulação da sociedade, a partir de falsas ideologias que de certa forma afetam a família e assim desestruturam os laços intergeracionais existente entre estes. Dessa maneira, o trabalho encontrou como uma das causas primordiais da inserção da população estudada em Instituições de Longa Permanência para Idosos – ILPI’s, a falta de tempo para cuidar, que segundo o resultado da pesquisa desenvolvida culminam em outras causas identificadas como a necessidade de inserisse no mercado de trabalho devido suas obrigações financeiras, a indisponibilidade de outros membros da família para o cuidado do idoso entre outros, que são resultado da influencia do sistema capitalista sobre a sociedade e o Estado. 13 2. O IDOSO NO DECORRER DA HISTÓRIA E A LEGISLAÇÃO COMO SUPORTE AO PROCESSO DE ENVELHECIMENTO No decorrer da pesquisa realizada observou-se que os idosos em diferentes épocas ao longo da historia eram referenciados de formas distintas, umas positivas e outras negativas, o que correspondia a características de cada cultura. Com a implantação do modelo econômico capitalista que tem como objetivo a obtenção do lucro, através de seu poder de manipulação social e eletrônica houve a disseminação de falsas ideologias que tenderam a excluir a pessoa idosa da sociedade pelo simples fato de não encontrar-se mais inserido no meio de produção capitalista, relacionando assim o significado de pessoa aposentada, a pessoa invalida. Dessa maneira, com tanta discriminação e desrespeito com relação à pessoa idosa foi necessário a criação de medidas que assegurassem a proteção destes ao longo de suas vidas. Dessa forma, para dá inicio ao capítulo primeiramente compreenderemos o significado de “idoso”, que de acordo com o Estatuto do Idoso (2003, p. 19) em seu Art. 1 “É instituído o Estatuto do Idoso, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos”. Segundo o dicionário Aurélio Júnior (2005) “idoso é quem tem bastante idade”. E o conceito de Zirmeman (2000, p. 19) é que “[...] velho é a mesma pessoa que sempre foi, se foi um trabalhador vai continuar trabalhando; se foi uma pessoa alegre vai continuar alegrando; se foi uma pessoa insatisfeita, vai continuar insatisfeita e se foi ranzinza vai continuar ranzinza”. Então, segundo o Estatuto para considerar um cidadão como idosoeste deve ter idade cronológica de 60 anos ou mais, mas não necessariamente deverá se enquadrar em um conjunto de características físicas e/ou cognitivas que são determinados pela sociedade erroneamente. O conceito aderido à pesquisa é o de que, velho não vem cheio de regras a qual cada cidadão terá que se ajustar, velho significa vivência, aprendizado, experiência e muito mais. Os significados e as características atribuídos à velhice terão aqui grande importância para que se possa compreender o processo da pesquisa. Este capítulo irá fundamentar sobre o idoso em tempos passados e na contemporaneidade, trazendo a concepção do “ser velho na sociedade”, desde os anos de 66d.C. baseado na Bíblia, até os dias de hoje a partir da visão de autores brasileiros que elaboraram 14 pesquisas sobre a temática. Além de apresentar leis que regulamentam e legitimam os direitos que fundamentam o papel da pessoa idosa nos novos tempos. 2.1. Compreendendo o ser “idoso” em tempos passados O idoso em todas as passagens do tempo obteve uma representatividade diferenciada em cada cultura e contexto social, em algumas esse significado era positivo em outras não. Essas formas distintas de compreender a velhice dizem muito sobre as características de todas as sociedades, dessa maneira torna-se de extrema importância o desenvolvimento de pesquisas sobre essas diferentes representações para que se possa conhecer o idoso ontem e hoje inserido em uma totalidade. A primeira referência cultural é o livro Bíblico de TIMÓTEO (5:1; 2.p, 1532) que diz, “não repreenda duramente um ancião, mas exorte-o como se fosse um pai. Aos rapazes, como a irmãos. Às senhoras, como a mães. Às moças, como a irmãs, com toda a pureza”. Como está na Bíblia, em uma comunidade cristã o exercício da solidariedade e do respeito independe de sua geração e por isso os idosos naquela época eram respeitados sendo considerados como um exemplo de fé e sabedoria. Assim como também eram e são vistos os idosos na civilização oriental especificamente na sociedade chinesa, onde os idosos possuem condições privilegiadas, são bem tratados, respeitados, considerados como pessoas sábias e, portanto são estimados como importantes na sociedade. SOUSA (2001) traz em seu artigo abordagens de Lao-Tsé e Confúcio, dois filósofos orientais que veem a velhice como um momento de extrema espiritualidade, onde há uma libertação da alma, e que os mais novos devem respeitar a pessoa mais velha, sendo que esta possui uma autoridade patriarcal quando alcança a idade, independente do gênero sexual, pois a mulher que foi tão submissa, quando envelhece passa a ter poderes mais elevados que os jovens masculinos, tornando-se responsável principalmente pela educação dos netos, já que esta adquiriu devido a sua vivencia capacidade de refletir sobre os prazeres da vida e assim atribuir estes ensinamentos aos mais jovens. Na civilização ocidental os gregos por outro lado viam a velhice como um momento da vida mais triste, pois o corpo já não era mais jovem e estes adoravam a juventude. Como cita SOUSA (idem. p, 92). 15 Os gregos foram amantes do corpo jovem e saudável, preocupados em cultuá-lo e preservá-lo, sendo a velhice, de modo geral, tratada com desdém, muito desconsiderada e até motivo de pavor, principalmente pela perda dos prazeres proporcionados pelos seus sentidos. Os gregos cultuavam a juventude e a forma física e por isso repudiavam a velhice, argumentavam que os idosos eram pessoas deprimidas. SOUSA (2001) cita alguns filósofos como Aristóteles, Minermo e Colofos (360 a.C.) que possuem uma visão contrária aos orientais: estes não acreditam ter um lado bom de “ser idoso”. A percepção de Aristóteles (384-322 a.C.) acerca da velhice era bem diferente da de Platão. Na verdade, sua visão de ser idoso era deprimente: ele considerava os idosos reticentes, hesitantes, lentos, de mau caráter; dizia ainda que os idosos só imaginavam o mal, eram cheios de desconfiança e que essas características eram consequências da experiência de vida que os humilhou, sendo os carentes de generosidade, vivendo mais de recordações do que de esperanças e desprezando a opinião alheia (SOUSA, id. p.94). Na Idade Média caracterizada pela época dos mais fortes e pelos poderes militares, a sociedades colocavam os idosos submissos a eles, onde eram integrados à parte da sociedade escrava e servil, pois acreditavam que estes seriam incapazes de participarem de trabalhos e lutas que exigia um corpo fisicamente resistente. Conclui-se então que ao longo dos séculos conceitos pejorativos em relação à velhice foram continuamente levados de geração para geração, já que na antiguidade havia diferentes opiniões sobre o envelhecimento. Uns acreditavam que este era o momento de aproveitar e desfrutar da sabedoria junto aos membros mais jovens, além de serem vistos pela sociedade como um ser de extrema importância para a civilização, pois estes teriam muito a contribuir a partir de suas reflexões de vida. Porém, outros os viam a partir de seus “pontos negativos”, como pessoas sem motivação e que essa fase da vida seria um momento final, pois o idoso não teria mais nada a contribuir na sociedade. 2.2. O idoso na realidade contemporânea As concepções do envelhecimento, como já falado, variam de geração para geração, de cultura para cultura e assim se transformam ao longo da história caracterizando as civilizações a partir de pontos particulares. Diante desta análise do significado do envelhecimento em tempos passados e culturas diferentes, iremos 16 agora compreender a partir do ponto de vista de autores brasileiros qual o significado do idoso e o processo de envelhecimento hoje. Segundo SCORTEGAGNA e OLIVEIRA (2012) na atualidade brasileira o modo de ver o idoso não é diferente dos ocidentais, pois é visível o descaso que a sociedade dar ao processo de envelhecimento. Continua arraigada a visão de que a pessoa idosa é uma inválida e incapaz. Esta concepção ainda é mantida por influência do sistema que coloca para a sociedade que quando envelhece o cidadão não tem mais nenhuma serventia já que não está mais contribuindo para o desenvolvimento econômico. Vale ressaltar que: [...] a sociedade moderna encontra-se hoje diante de uma situação contraditória: de um lado, defronta-se com o crescimento massivo da população idosa,fruto do aumento da expectativa média de vida da raça humana e de outro, se omite ou adota mesmo atitudes preconceituosas sobre o velho e a velhice, retardando, destarte a implementação de medidas que virão minorar o pesado fardo dos que ingressaram na velhice (NETTO, 1996, p. 9). Por mais mudanças e acontecimentos que tenham ocorrido ao longo do tempo os idosos ainda não conseguiram alcançar um reconhecimento, a sociedade brasileira continua preconceituosa, isso acontece devido aos ensinamentos e valores de cada época sendo que a representatividade de determinados conceitos são repassados de geração para geração. Portanto essa representação de velho de forma negativa está ligada a como é percebido o processo de envelhecimento na natureza humana. Visto que, por mais que a sociedade tenha consciência que envelhecer é um processo inerente a todos os seres humanos fazendo parte do curso da vida, esta suscita reações negativas, seja porque é percebida como um tempo de perda das capacidades laborais, seja porque é associada à solidão e à proximidade da finitude. (SESC, 2009, p.9) A sociedade relaciona o envelhecimento apenas a características negativas, mas esquece de que envelhecer não as define como inúteis. Cada um possui particularidades que as distingue das outras pessoas e estas serão as responsáveis por caracterizar a sua personalidade na velhice. Segundo FREIRE (apud SESC, 2009, p. 8), “as transformações da sociedade contemporânea trouxeram para a dimensão simbólica,novos arranjos que vem alterando e provocando novos hábitos, valores e modo de produção da subjetividade em relação à velhice”, ou seja, como vimos anteriormente na civilização 17 oriental a população tem o direito de envelhecer já que eles passaram toda a juventude e a vida adulta contribuindo. Porém, no ocidente a construção social de velhice era cercada de preconceito e no contexto social ao qual estamos inseridos atualmente a velhice ainda é vista de forma preconceituosa, pois mesmo que seja um direito envelhecer com dignidade, o sistema induz a sociedade a acreditar que não contribuir mais para o desenvolvimento econômico significa estar fora da reprodução social. A mídia estrategicamente midiatiza estereótipos de belezas de forma que negam e disfarçam a velhice como se esta fosse algo repugnante, impelindo o idoso ao isolamento social. Além do descaso da própria sociedade, ainda tem a mídia com suas diversas formas de publicidade e o sistema capitalista que disseminam o ato da exclusão social. Envelhecer significa na maioria das vezes estarmos excluídos de vários lugares sociais. Um desses lugares densamente valorizado é aquele relativo ao sistema produtivo, o mundo do trabalho. “O alijamento do mundo produtivo - exatamente na nossa cultura - espalha-se criando barreiras impeditivas de participação do velho nas outras tantas e diversas dimensões da vida social”. (NETTO, 1996, p. 75) Em um sistema capitalista em que todos os processos giram em torno da lucratividade, o cidadão ao envelhecer e tornar-se um aposentado que não está mais contribuindo com o sistema é colocado de lado e visto como um fardo para sociedade. Desta forma, segundo o SESC, op. cit. (2009) o não reconhecimento social da velhice se expressa pela desvalorização do aposentado, da falta de um novo papel social e do processo de desengajamento das atividades socialmente valorizadas. A aposentadoria condicionou à pessoa idosa a categoria de inativo em uma sociedade que reconhece seus cidadãos pela sua inserção no mundo economicamente produtivo. Estar inserido em uma sociedade de um país subdesenvolvido com um sistema tão excludente exige das classes excluídas a busca por reconhecimento da questão social para juntos lutarem pelo direito de cidadania. Pois o envelhecimento populacional traz para a sociedade novos desafios, sobretudo a necessidade da transferência de recursos para atender às especificidades dessa parte da população. Sendo que nessa fase da vida há o aumento da demanda e com isso a necessidade 18 de serviços, programas e políticas qualificadas que seja um suporte ao idoso nesse novo momento. (SESC, 2009) A civilização oriental com seus ensinamentos e valores em relação à representatividade do idoso junto a sua população é um exemplo a ser seguido, colocando o idoso em uma posição valorativa impossibilitando que este sofra preconceitos e seja excluído do sistema. Sendo que no Brasil vivenciamos uma representatividade negativa, pois o primeiro a excluir é o próprio sistema. Sendo assim, é preciso que a sociedade reflita sobre o processo de envelhecimento, compreendendo que esta é uma fase da vida destinada a todos independentemente, deixando de lado esse preconceito e negatividades que apenas contribuem para um sistema tão excludente. E por essa razão buscar junto ao Estado uma forma de acolher ao idoso a partir da visão que a civilização oriental tem em relação aos seus membros, acreditando no seu potencial e indo muito além do aparente, respeitando-o como um ser humano. Nesse sentido, veremos adiante as contribuições do Estado na tentativa de minorar essa exclusão que afeta a população idosa. 2.3. A legislação enquanto instrumento de proteção da pessoa idosa 2.3.1. O idoso na Constituição Federal de 1988 e a garantia da proteção dos seus direitos Diante do que vimos anteriormente, a relação do idoso com a sociedade desde muito tempo atrás é conflituosa, devido a não aceitação e a falta de respeito desta com a pessoa idosa. Por esta razão, fez-se necessário que o Estado viesse a intervir nesta realidade garantindo aos idosos direitos que lhe propusessem uma vida digna e com respeito, assegurando-lhe um envelhecimento tranquilo. Já que o idoso quase sempre não é tratado como cidadão, a realidade obrigou a constituinte a estabelecer textos que fossem bem claros quanto a isso, estabelecendo meios legais que contribuíssem para que o idoso deixe de ser discriminado e receba o tratamento que lhe é devido. Nesse sentido, foi realizado um estudo sobre os direitos assegurados por lei à pessoa idosa. Na Constituição Federal de 1988 em seu artigo 1° e inciso III tem como fundamento: “a dignidade da pessoa humana”, assegurando de forma geral a todos o direito de gozar de uma vida plena. Sendo assim, o idoso não deve ser privado de 19 nenhum direito que lhe é assegurado por lei. Também na Constituição em seu art. 3°, inciso IV dispõe: “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.” Ou seja, o Estado mostra que todos os direitos da sociedade são garantidos por ele e busca a compreensão de que qualquer forma de discriminação é crime. A CF/88 não se limitou apenas a uma acepção geral sobre o que é direito do idoso, mas também sobre as responsabilidades da família como um todo especificando em seu art. 229 o seguinte, “os pais têm o dever de assistir, criar e educar seus filhos menores, os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”. No art. 230 (CF/88) “a família, a sociedade e o estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida”. É dever do Estado a garantia de meios para viver, mas sem esquecer que é também dever da família e da sociedade contribuir para que isso aconteça. Devido as necessidade dos idosos se inserirem na comunidade é importante que estes conheçam os direitos atribuídos a eles referente à sua dignidade individual e coletiva. A CF/88 em seus artigos 127 e 129 dispõem sobre as defesas dos direitos coletivos, incluindo a sociedade como um todo inclusive o idoso. E em seu art. 134 trata dos direitos individuais onde possuem meios que os protejam e os asseguram legalmente. E aos idosos que não possuem condições e que a família não possa prover suas necessidades básicas terá assim como previsto no art. 201, inciso I, da Constituição Federal de 1988 “a cobertura dos eventos de doenças, invalidez, morte e idade avançada pela a previdência social”. Possibilitando ao contribuinte que eventualmente está fora do mercado a capacidade de manter-se economicamente. E no art. 203 e 204 aos que não integrem o seguro social a “assistência social será prestada a quem dela necessitar independente de contribuição a seguridade”. Tais direitos são relativos ao Beneficio de Prestação Continuada- BPC, estão dispostos na Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993 que estabelece a Lei Orgânica de Assistência Social- LOAS, que refere-se a Assistência Social como um direito do cidadão e dever do Estado sendo esta uma política de Seguridade Social não contributiva, sendo esta a primeira lei a surgir com caráter de proteger o idoso. Mas, além do reconhecimento do Estado sobre suas obrigações com os idosos que contribuíram para o crescimento e desenvolvimento do país, o respeito 20 aos direitos fundamentais possibilitam que haja uma igualdade social, reeducando a sociedade para que semeie o respeito e o amor ao próximo. Quando se trata do idoso, o direito à vida engloba não apenas longevidade, mas ao envelhecimento com dignidade, respeito, proteção e inserção social. No que se refere ao direito à liberdade, deve ser ele propiciado ao idoso por meio de providênciasreais por parte do Estado e da sociedade, principalmente a independência familiar e social, através de prestações previdenciárias e assistenciais eficazes. Já o direito à igualdade, deve resguardar aos idosos as mesmas condições das demais pessoas, que vivem em sociedade. Quanto ao direito à cidadania, sua importância está em possibilitar ao idoso conservar a capacidade de analisar e compreender a realidade política e social, criticá-la e atuar sobre ela (CIELO; VAZ, 2009. P, 34). Nesse sentido, como diz Cielo e Vaz (2009), ser velho hoje significa mais do que viver por muitos anos, o segredo está na qualidade de vida fornecida a cada cidadão. E a Constituição Federal estabelece os direitos que contribuem para que isso aconteça. Viver com dignidade, ter liberdade para gozar dos prazeres da vida, ter instituições que irão lhe acolher além de uma gama de possibilidades que lhe auxiliará quanto às formas de manterem-se quando estiverem fora do sistema econômico. Porém, não é apenas na Constituição Federal de 88 que possui normas e direitos que visam proteger e assegurara pessoa idosa. Mas foi a partir da sua promulgação em 1988 que surgiram leis que realmente obtivessem normas específicas para estes, que deram aos idosos os verdadeiros direitos e garantias. 2.3.2. Política Nacional do Idoso– PNI: Ampliando a garantia de direitos Após a LOAS, a próxima leia a surgir com esse fim foi a de n° 8.842 de 4 de Janeiro de 1994, estabelecendo a Política Nacional do Idoso (PNI) e sendo regulamentada pelo o Decreto Federal n° 1.948, de 3 de Julho de 1996. A PNI dispõe sobre os deveres das organizações municipais, estaduais e da União com relação à assistência, promoção social, efetivação dos direitos que asseguram o idoso e a reeducação da sociedade em relação ao processo de envelhecimento, pois esta não busca apenas promover a proteção ao idoso, mas trabalhar de forma geral para que a sociedade tenha dignidade em seu processo de envelhecimento. Diante disso tem sua base em cinco princípios estabelecidos no art. 3°, sendo eles: 21 I - a família, a sociedade e o Estado têm o dever de assegurar ao idoso todos os direitos da cidadania, garantindo sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade, bem-estar e o direito à vida; II - o processo de envelhecimento diz respeito à sociedade em geral, devendo ser objeto de conhecimento e informação para todos; III - o idoso não deve sofrer discriminação de qualquer natureza; IV - o idoso deve ser o principal agente e o destinatário das transformações a serem efetivadas através desta política; V - as diferenças econômicas, sociais, regionais e, particularmente, as contradições entre o meio rural e o urbano do Brasil deverão ser observadas pelos poderes públicos e pela sociedade em geral, na aplicação desta lei. Analisando o inciso I e II percebe-se que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar aos idosos os seus direitos e defender a sua dignidade para que este possa conviver em comunidade como um cidadão. E para que isso aconteça é importante que a sociedade compreenda a necessidade de conhecer e manter-se informada com relação ao processo de envelhecimento. Pois para que a pessoa idosa seja acolhida com respeito e dignidade é indispensável que a sociedade se sensibilize e compreenda que o envelhecimento é uma etapa da vida inerente a todos os seres humanos e por isso é importante que ocorram algumas mudanças quanto às concepções negativas ainda impregnadas no contexto atual. A Política Nacional do Idoso tem como finalidade segundo o art. 1º, “promover a sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade”. A partir da inserção da pessoa idosa na fiscalização e aperfeiçoamentos de atividades, políticas, planejamentos e projetos que são desenvolvidos especificamente para esse público. Assim como estar no art. 4° da Política Nacional do Idoso nos incisos I e II. I - viabilização de formas alternativas de participação, ocupação e convívio do idoso, que proporcionem sua integração às demais gerações; II - participação do idoso, através de suas organizações representativas, na formulação, implementação e avaliação das políticas, planos, programas e projetos a serem desenvolvidos; A PNI aponta para a implantação e execução de políticas e ações voltadas a promoção do idoso e que estas sejam eficazes e atendam as suas necessidades básicas. A implementação dessa política é competência dos órgãos e entidades públicas das áreas de promoção e assistência social, saúde, educação, trabalho e previdência social, habitação e urbanismo, justiça, cultura, esporte e lazer, além das instituições de longa permanecia que são entidades de atendimento ao idoso que possibilitam a este um acolhimento diante das suas necessidades e de sua família. Sendo que é a partir da articulação destas áreas que a o desenvolvimento de melhorias nas condições de vida da pessoa idosa. 22 Para o fortalecimento da efetividade da Política Nacional do Idoso foram criados conselhos de âmbito municipal, estadual, nacional e de Distrito Federal que são responsáveis pela fiscalização e avaliação da PNI. Como está disposto em dois de seus artigos: Art. 6º Os conselhos nacionais, estaduais, do Distrito Federal e municipais dos idosos serão órgãos permanentes, paritários e deliberativos, compostos por igual número de representantes dos órgãos e entidades públicas e de organizações representativas da sociedade civil ligadas à área. Art. 7o Compete aos Conselhos de que trata o art. 6o desta Lei a supervisão, o acompanhamento, a fiscalização e a avaliação da política nacional do idoso, no âmbito das respectivas instâncias político-administrativas. A Lei 8.842 de 1994 que estabeleceu a PNI veio para consolidar os direitos já estabelecidos na Constituição Federal de 88, colocando a disposição outras formas de efetivação de instrumentos legais capazes de reprimir a violação desses direitos e assim promover a proteção integral do idoso em uma sociedade tão contraditória. 2.3.3. Estatuto do Idoso: Protegendo gerações contra uma sociedade alienada A Política anteriormente citada tem um caráter abrangente, estando mais relacionada aos deveres da família, sociedade e Estado como provedores dos direitos da pessoa idosa. Já a lei n° 10.741, de 1° de outubro de 2003 que estabelece o Estatuto do Idoso, criada pelo Senado Federal e sancionada pelo o Presidente da República surgiu para, além disso, dispor de caracteres mais específicos atendendo as necessidades individuais e coletivas dos idosos de forma minuciosa para que haja uma proteção mais precisa dos direitos a eles atribuído. Assegurando os direitos de pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos. O Estatuto traz nas disposições preliminares os mesmos princípios estabelecidos na PNI e alguns complementos, onde está disposto no parágrafo único o atendimento preferencial ao idoso, seja em repartições públicas ou privadas, em decorrência da formulação e execução de políticas sociais públicas específicas. Além da inserção do idoso como partícipe na comunidade dispõe também sobre prioridade da proteção do idoso pela família, e sobre a necessidade de capacitação dos recursos humanos na área de gerontologia e geriatria e na prestação de serviços ao idoso. Fomentando a responsabilidade de toda a sociedade na proteção dos direitos e a punição caso haja a violação de alguma das normas previstas por lei. E em seu artigo 23 2° coloca a relevância do idoso desfrutar sobre os direitos fundamentais a ele concedidos: Art. 2o O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espirituale social, em condições de liberdade e dignidade. É a partir destes direitos essenciais à população idosa que esta exerce sua posição como cidadã. Sendo estes, o direito a vida com a possibilidade de envelhecer com qualidade e assim poder gozar do direito à liberdade, ao respeito e dignidade. Liberdade para ir e vir, para falar, para fazer suas escolhas e expressar suas vontades, sejam elas quais forem. Sendo os idosos respeitados se reconhecidos como pessoas dignas de viver e conviver em sociedade. Além dos direitos ao alimento, à saúde, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à Previdência Social, à Assistência Social, à habitação e ao transporte. Mas, não basta tê-los é imprescindível que sejam qualificados e que realmente atendam as necessidades da pessoa idosa e de toda sociedade. Siqueira (2004) afirma que estes direitos são fundamentais porque sem eles o ser humano seria incapaz de existir ou de sobreviver. E por isso tais direitos que já estão estabelecidos na Constituição Federal foram reafirmados no Estatuto para a segurança dos reflexos da lei maior. O que convém salientar é que estes são invioláveis e em nenhum momento deverão ser esquecidos, pois são eles que regem a dignidade de todos os seres humanos. O Estatuto institui medidas de proteção ao idoso de forma individual e coletiva e é responsável por resguardá-lo caso haja violação de algum dos direitos colocados em vigor nesta lei, como dispõe o art. 46: “A política de atendimento ao idoso far-se-á por meio do conjunto articulado de ações governamentais e não- governamentais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”. Esse conjunto articulado de ações refere-se à rede de atendimento ao idoso, que se constitui a partir da articulação de serviços dos órgãos governamentais como o Ministério Público, Defensoria Pública, as secretarias de Saúde, Educação, Assistência Social, Segurança, Justiça, Esporte e Lazer; e as não- governamentais como as ONGs. 24 Essa proteção concretiza-se a partir de ações sociais básicas, previstas na PNI e através de políticas e programas que tenham um caráter complementar, capazes de atender as necessidades daqueles que carecem desses serviços, protegendo os que são vítimas de negligência ou qualquer tipo de violação através de serviços especializados, além daqueles que identifiquem e localizem parentes ou responsáveis por idosos que foram abandonados em hospitais ou instituições de longa permanência. (ESTATUTO DO IDOSO, 2003) Quanto às Instituições de Longa Permanência para Pessoas Idosas- ILPI´s o estatuto dispõe em seu art.48 sobre suas características e obrigações. As entidades de âmbitos governamentais e não-governamentais, devem se responsabilizar pela a manutenção de suas unidades atendendo as normas de planejamentos e execução previstos na lei n° 8.842, de 1994. É necessário que haja a inscrição de seus programas junto aos órgãos competentes de Vigilância Sanitária e o Conselho Municipal do Idoso e na falta desses ao Conselho Estadual ou Conselho Nacional da pessoa idosa descrevendo o modo de atendimento, observando os requisitos instituídos no art. 48 nos seguintes incisos: I – oferecer instalações físicas em condições adequadas de habitabilidade, higiene, salubridade e segurança; II – apresentar objetivos estatutários e planos de trabalho compatíveis com os princípios desta Lei; III – estar regularmente constituída; IV – demonstrar a idoneidade de seus dirigentes. As ILPI´s devem atender tais requisitos para a normatização do estabelecimento, proporcionando conforto e qualidade aos idosos institucionalizados. Instituindo como princípios a manutenção dos vínculos familiares, estimulação e a inserção do idoso em atividades em grupo além de sua participação em atividades comunitárias internas e externas sempre buscando promover os direitos que lhes são garantidos. É obrigação deste tipo de instituição fornecer aos idosos ambientes agradáveis, assegurar vestimentas adequadas e de qualidade, espaços para o recebimento de visitas, cuidado a saúde, atendimento personalizado com a integração de profissionais especializados em áreas especificas para que em casos de doenças obtenham profissionais competentes, promoção de atividades interativas que estimulem os movimentos físicos e bem está psíquica dos idosos, assistência religiosa aos que desejarem. Realização de estudos sociais sobre cada indivíduo e cada caso, 25 comunicação as autoridades competentes informando sobre os idosos em situação de doenças ou violação. Encaminhamento ou solicitação ao Ministério Público para que requisite dos familiares ou outros responsáveis anteriores, os documentos necessários ao exercício de cidadania. Manutenção do registro individual do idoso atualizado, contendo as informações necessárias, possibilitando sua identificação e comunicação ao Ministério Público casos de abandono moral ou material pelos familiares, para que este tome as providencias cabível. As fiscalizações das casas-lares serão efetuadas segundo o art. 52 “pelos Conselhos do Idoso, Ministério Público, Vigilância Sanitária e outros previstos em lei. Sendo eles os responsáveis por aplicarem multas e advertências caso seja necessário”. Vimos então que o Estatuto do idoso dispõe minuciosamente sobre os direitos da pessoa idosa, as regulamentações das entidades, as sanções e penalidades que serão destinadas aos membros da administração de instituições de longa permaneciam, caso haja algum descumprimento da lei vigente. E também sobre os deveres de todos os órgãos municipais, estaduais e nacionais com a relevância de seu papel como provedores de direitos. Diante do estudo das leis acima citadas percebemos que o dever de promoção dos direitos do idoso pela família, sociedade e Estado estão previsto em todas as normas e leis que abrangem o idoso como individuo central. E que teoricamente os direitos que os idosos precisam para viver com dignidade na sociedade estão claramente estabelecidos e contemplam as necessidades destes, sendo reafirmados em cada uma das leis no intuito de fortalecer seu reconhecimento e por consequência sua efetivação. Mas, o que se percebe é que na teoria é uma coisa e na prática é outra, pois o que se presencia habitualmente é que existe total desprezo desses direitos por alguns membros da sociedade, inclusive em alguns casos pela própria família que negligencia e viola a dignidade da pessoa idosa. O que acontece atualmente é que as instâncias que são responsáveis pela proteção do idoso estão fugindo do seu papel como provedor, jogando sua responsabilidade uma para o outra, sendo que é um dever semelhante a todos. Não basta sabermos que existem leis que protegem e asseguram os idosos diante de qualquer circunstância, é imprescindível que a sociedade de forma geral conheça essas leis, reconheça os direitos nelas instituídos como necessários para se viver com dignidade e respeito e as ponha em prática. Promovendo processos 26 e ações de sensibilização da sociedade, para que haja uma emancipação desta quanto a sua postura frente aos idosos e ao processo de envelhecimento. 3. A FAMÍLIA E A PESSOA IDOSA EM UM CONTEXTO CONTEMPORÂNEO Devido ao contexto social atual e ao crescimento da população idosa, têm surgido estudos que buscam compreender como se concretiza essa expressão da questão social na realidade brasileira de maneira que este é um país em desenvolvimento, pois conforme o que foi visto anteriormente no capitulo dois, existem alguns conflitos entre as diferentes gerações sobre a questão do envelhecimento da população e por esta razão, estes podem ou não influenciar na relação entre os membros de uma família, interferindo assim em seu meio social. Nesse sentido, este capítulo irá abordar sobre como está sendo percebido o processo de envelhecimento na sociedade epor consequência no que isto reflete na relação do idoso em seu convívio intrafamiliar, a partir da interpretação da intergeracionalidade na família contemporânea. 3.1. O envelhecimento como uma expressão da questão social Para uma melhor compreensão do texto vamos primeiramente conhecer o significado de questão social segundo a concepção de Iamamoto (2010, p. 27). É o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que têm uma raiz comum: a produção social é cada vez mais colectiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos se mantém privada, monopolizada por uma parte da sociedade. Nesse sentido, a questão social é o conjunto das expressões da desigualdade social em uma sociedade e ocorre devido à apropriação do lucro nas mãos de uma minoria, havendo assim uma má distribuição de renda. Dessa forma, o envelhecimento da população brasileira tornou-se atualmente uma das expressões dessa desigualdade social, devido a insuficiência do Estado frente ao processo de envelhecimento, omitindo-se quanto a sua responsabilidade de prover políticas públicas, programas e ações que sejam eficazes e atendam a demanda atual de idosos, sendo estas quase inexistentes. Segundo uma pesquisa realizada pelo SESC (2009, p.6)“o envelhecimento populacional constitui hoje um fenômeno mundial. Estima-se que em 2050 o número de pessoas acima de 60 anos aumentará em todo o mundo, de 600 27 milhões para quase 2 bilhões de pessoas”, ou seja, de 2009 há aproximadamente 41 anos haverá um grande aumento da população idosa em todos os países. Contudo, em países desenvolvidos esse fenômeno da longevidade da população dar-se graças a avanços na medicina e a melhorias nas condições de vida da sociedade, sendo uma questão de qualidade de vida já que o desenvolvimento dos países se dá de acordo com as necessidades da população. Porém, em países em desenvolvimento como o Brasil, essa questão torna-se uma problemática, pois o desenvolvimento do país não corresponde às expectativas desse crescimento populacional de idosos tornando-se então uma expressão da questão social devido ao país não prover respostas às necessidades básicas para um envelhecimento digno. Devido à situação atual do Brasil em “crise”, o Estado que já é ausente quanto ao atendimento das expressões da questão social, ver como única resposta à estabilidade financeira do país a redução de verbas destinadas à saúde, assistência e previdência social, ou seja, a Seguridade Social que consiste em um conjunto de políticas sociais que buscam amparar o cidadão e sua família em situação de saúde, envelhecimento e desemprego, respectivamente. Objetivando mudanças quanto às suas funcionalidades estruturais como a iminência de adiar o período de aposentadoria, a redução do BPC com a desvinculação do salário mínimo mais o adiantamento do mesmo para 68 anos, assim afetando as demais políticas públicas como a cultura, o lazer, a saúde e outras que são essenciais ao envelhecimento saudável, pois com o aumento do período de contribuição previdenciária a população não terá tempo de cuidar de si e, por conseguinte gozar de sua aposentadoria (SALVADOR, p. 430, 2010). Nesse sentido, no Brasil devido à crise política, social e econômica - sendo este último uma falsa ideologia, pois sabemos que o neoliberalismo tem como o seu dilema a “falta de recursos” e que por isso não pode arcar com respostas as necessidades de população- as expressões da questão social tem tornado-se cada vez mais alarmantes. No entanto, foi devido à organização de órgãos mundiais, pessoas idosas, e a sociedade civil que o envelhecimento passou a ser visto pelo Estado como uma expressão da questão social, deixando de ser responsabilidade apenas da família como instituição principal ao auxílio ao idoso, como cita Teixeira (2015, p. 14): 28 O envelhecimento humano que, há 40 ou 50 anos atrás, era um assunto que se restringia, quase exclusivamente, à esfera privada e familiar, emergindo à cena pública, inicialmente, como objeto de políticas previdenciárias, passou sobretudo depois dos anos 60, a se transformar numa questão social e política de maior importância no mundo contemporâneo graças à organização dos idosos e de entidades da sociedade civil organizadas em prol de sua causa, principalmente de organizações multilaterais internacionais que se constituíram em grupos de pressão, fundamentais na transformação da questão do envelhecimento em agenda pública. Foi a partir da luta organizada que o Estado viu-se obrigado a intervir no processo de envelhecimento como a expectativa de dar respostas as necessidades da pessoa idosa, objetivando a integração desta no meio social como forma de transformar essa realidade. Assim como exprime Debert (2004, p. 15). No Brasil, proliferaram, nas últimas décadas, os programas voltados para os idosos, como as “escolas abertas”, as “universidades para a Terceira Idade”, e os “grupos de convivência para idosos”. Estes programas, encorajando a busca da auto-expressão e a exploração de identidade de um modo que era exclusivo da juventude, abrem espaço para que uma experiência inovadora possa ser vivida coletivamente e indicam que a sociedade brasileira é hoje mais sensível aos problemas de envelhecimento. Dessa maneira, tais iniciativas evidenciam as tentativas de uma melhoria para os cidadãos no processo de envelhecimento e buscam que estes quando idosos possam manter-se ativos na sociedade e beneficiando-se de experiências que talvez não obtiveram quando jovens. No entanto, estas não são suficientes para um envelhecimento digno, precisa-se de muito mais. É indispensável que o direito à saúde seja efetivado e que se obtenha qualidade nos seus serviços. Que o lazer seja oferecido a todos de forma equânime e que os direitos fundamentais sem exceção, sejam prioridade das gestões municipais, estaduais e federais. Há uma luta incansável da sociedade organizada na busca por melhorias nas condições de vida do idoso, pois só assim a sociedade conseguirá o mínimo de cidadania. O envelhecimento mostra-se novamente como uma expressão da questão social quando este passa a possuir uma condição de interesse da mídia em promover um envelhecimento bem-sucedido. É a mídia, que ao colocar uns e outros em um debate amplamente visível, não só desestabiliza mecanismos tradicionais de diferenciação no interior do mundo dos experts, mais também dentre pessoas de mais idade; ao mesmo tempo, abre campos para uma nova demanda política e para a formação de novos mercados de consumo (DEBERT, 2004, p. 16). O discurso da mídia é totalmente preconceituoso, quando estereotipa o envelhecimento com caricaturas rejuvenescidas, medicamentos, plásticas e mais uma 29 série de tecnologias de rejuvenescimentos que são vendidas mundialmente como se o envelhecimento fosse responsabilidade apenas da sociedade e que para se ter uma velhice com qualidade esta deve se enquadrar em biótipos que negam a sua cultura, as suas condições financeiras e principalmente a essência de se viver bem. Mas, infelizmente este estereótipo é “comprado” por uma grande parcela da sociedade e particularmente pelo sistema que se apropria desse discurso ideológico como uma estratégia para a redução de gastos, já que o próprio cidadão responsabiliza-se em prover uma melhor condição de vida. Até algum tempo atrás falar do envelhecimento em algumas civilizações era sinônimo de status, pois estes eram vistos como sujeitos de direitos, dignos de respeito. Entretanto, na contemporaneidade a velhice é vista como um peso na família, na sociedade e no Estado enfatizando assim a discriminação, desrespeito e o não reconhecimento deste como um cidadão que tem seus direitos resguardados por lei. O envelhecimento como expressão da questão social é exatamente a não aceitação dapessoa idosa como ser social1 pelo sistema capitalista, típico da postura neoliberal de maquiar a realidade impondo que somente o que é novo, é jovem, é belo. A sociedade é apenas manipulada pelo sistema a reagir a essa pressão de ideologias impostas pelo capital e por consequência contribuir para a exclusão social do idoso em todas as esferas institucionais entre elas a família. 3.2. A intergeracionalidade e o lar Segundo o dicionário de português Aurélio Júnior (2005) geração compreende-se como “o ato de gerar e ser gerado; etapa da descendência natural que deve ser seguida por outra; considera-se como período de tempo de cada geração humana cerca de 25 anos: os pais representam uma geração, os filhos representam a geração seguinte”. E a intergeracionalidade segundo o mesmo, simboliza “algo que se realiza entre duas ou mais gerações”. Dessa forma, infere-se que a intergeracionalidade se concretiza a partir da relação entre diferentes gerações. Como crianças, jovens, adultos e idosos em um meio social onde há a construção e reconstrução de uma identidade histórica. Então, ¹O homem é um ser social um ser pensante que por ser frágil não sabe viver isolado, precisa da interação com seus semelhantes afim de buscar o seu auto-conhecimento, capta e guarda informações e portanto atinge níveis de consciência, melhorando, assim, o convívio social (Ventura, 2009). 30 para que se tenha uma compreensão da materialização da intergeracionalidade no lar é preciso que estejamos atentos ao novo perfil da família contemporânea e ao contexto social brasileiro atual. Pois como cita BERNARDO (2005, p.78): A trajetória da família brasileira atual vem-se dando num contexto de mudanças sócio-culturais e políticas, fazendo surgir novos modelos familiares, ao mesmo tempo derivados e deflagradores dessas mudanças sociais (baixa taxa de fecundidade, aumento da expectativa de vida, desvalorização da instituição do casamento, aceitação social do divórcio, transformações nas relações de gênero, entre outras) que merecem ser consideradas quando queremos compreender como se dão as relações dentro desse grupo social. Isto é, o conceito estrutural de família com o passar dos anos obteve algumas modificações que influenciaram no modelo e no significado dado a relação afetiva entre seus membros. Antes as famílias em sua maioria possuíam moradias enormes onde conviviam todos em um mesmo ambiente, de crianças aos idosos, sendo que o chefe da família junto aos homens mais jovens eram os responsáveis pelo o sustento de todos. Hoje esta estrutura encontra-se em contínuas modificações, pois com a implantação do sistema capitalista e a ideologia neoliberal de um estado mínimo, todas as gerações são obrigadas a manterem-se em constante movimentação dentro do sistema. Pois este determina através de seu controle sobre a sociabilidade humana o momento de estudar, trabalhar e envelhecer. Visto que, segundo BERNARDO (2005, p.78): Diante do reflexo da omissão do Estado frente ao alto índice de desemprego e à má distribuição de renda, da quase inexistência de políticas públicas voltadas para as questões sociais em geral e para as questões do envelhecimento populacional em particular, da escassez de programas sociais e da precariedade da saúde pública, só resta à família atuar de maneira mais direta e intensa na regulação das relações e nos apoios intergeracionais, realizando uma solidariedade familiar importante e diversificada na sociedade brasileira, em que os apoios se efetuam em função da situação social de seus atores. Ou seja, essa relação de gerações em âmbito familiar tem aumentado ao longo dos anos devido ao novo contexto social, político e econômico precário do qual esta inserida a sociedade brasileira, como no caso da má distribuição de renda, que por consequência resulta na vinda dos filhos e netos para morar com o idoso aposentado ou vice-versa por falta de condições de cada um ter seu espaço e nessa perspectiva buscara redução de gasto. Além disso, há também o novo perfil da família contemporânea representado em algumas situações por mulheres que trabalham fora 31 de casa, crianças pequenas na escola, jovens que estudam e trabalham, e o idoso que em algumas situações é o provedor do sustento da família, no qual o idoso aposentado tornar-se também um auxiliar no cuidado aos demais membros familiares, influenciando dessa forma para que a família torne-se a principal fonte de apoio intergeracional. Partindo dessa idéia a intergeracionalidade em âmbito familiar pode realizar-se de duas maneiras distintas: de maneira harmônica, quando há uma boa interação entre os membros da família a partir de uma troca de conhecimento, experiência e de dedicação ao cuidar. Porém, pode realizar-se de maneira conflituosa, onde não há aceitação das diferenças entre culturas. Por exemplo, são comuns em todas as famílias as crianças e adolescentes não ligarem mais para essa relação com a natureza, brincar lá fora, viver ao ar livre com amigos da vizinhança e da escola, preferindo passar horas no mundo digital; e muitos menos para as relações afetivas, entre eles, as pessoas adultas e idosas como a maneira de cumprimento tradicional que representava o respeito ao mais velho e que hoje não é mais usado por alguns jovens. Esses novos costumes, modo de agir e pensar quando não compreendido pelo outro tornam essa relação fragilizada e conflituosa. Todavia, isso depende da educação e dos valores adquiridos por cada ser social, pois é a partir desta que será possível que haja a percepção de que sempre existiram mudanças no decorrer das gerações. No entanto, a educação quando não repassada e apreendida culturalmente pode tornar a relação intergeracional violenta, provocando uma disputa pelo poder entre os membros mais jovens e a pessoa idosa. Dessa forma este passa a ser violentado pela a própria família, BERNARDO (2005, p. 83) cita alguns casos: • Abusos físicos - tapas, empurrões, espancamento, contenção física; • Abusos psicológicos – ameaças, humilhação constante, insultos, infantilização do idoso, privação de informações, retirada do direito de participação na tomada de decisões a respeito de coisas de seu interesse; • Abusos financeiros – filhos que confiscam as aposentadorias dos pais, ou o uso inadequado do dinheiro da pensão para benefício próprio; indução do idoso a assinar documentos, dando plenos poderes para compra, venda ou troca de bens e serviços, etc. • Abusos sexuais –refere-se ao ato ou jogo sexual de caráter homo ou hetero- relacional, utilizando pessoas idosas. Esses abusos visam a obter excitação, relação sexual ou práticas eróticas por meio de aliciamento, violência física ou ameaças; • Negligências – recusa, omissão ou fracasso por parte do responsável pelo idoso em oferecer os cuidados de que ele necessita: provisão inadequada de medicamento, de alimentação e de cuidados médicos; 32 Portanto, entre os motivos que justificam tais violências no âmbito familiar podem ser citados a má educação que é uma questão cultural, às vezes os membros da família não foram educados para cuidar e respeitar ao próximo, ou seja, a formação doméstica; a questão de índole, pois há pessoas que não possuem habilidades e até mesmo não querem se responsabilizar pelo outro. No qual ocasiona a não valorização do processo de envelhecimento e por consequência a desvalorização do idoso por parte da própria família, como foi visto no capitulo anterior. A influência do sistema sob a sociedade é mais um motivo que ocasiona outras consequências, pois a população não se torna agressiva, negligente por opção, o sistema impôs à sociedade esse papel a partir da Revolução Industrial que foi um processo de grandes transformações econômico-sociais que começou na Inglaterra no século XVIII e se espalhou por grande parte do hemisfério norte durante todo oséculo XIX e início do século XX. Sendo este momento um divisor de águas na história, pois foi a transição do modo de produção artesanal para o de máquinas, influenciando dessa maneira em quase todos os aspectos da vida cotidiana da época.Diante disso, pode-se citar entre as diversas mudanças a inserção da mulher no mercado de trabalho, longas jornadas de trabalho, ambientes insalubres e outras. Tais mudanças induziram de forma positiva e negativa na sociedade, já que tal momento foi essencial para o inicio e fortalecimento do sistema capitalista, que é um sistema econômico e uma ideologia que visa o lucro, do qual se derivam todos os tipos de desigualdades existentes. Assim, consequentemente e de forma mais especifica, o preconceito sobre as pessoas idosas, impondo mudanças na sociedade contemporânea tornando- a manipulada por uma ideologia econômica que determina de forma alienante o modo de pensar, agir e viver de uma sociedade com sistema capitalista, que segundo Iamamoto (1999, p.188) “[...] o capitalismo não é uma coisa, mais uma relação social de produção que se expressa por meio de coisas e que tem, como verso da relação, o trabalho assalariado, fonte da produção do excedente [...]”. Tal ideologia age influenciando negativamente a sociedade a condicionar e estigmatizar conceitos pejorativos em relação às expressões da questão social que são alarmantes no país, entre estas situa-se o processo de envelhecimento populacional. A ideologia impregnada em nossa cultura apresenta um caráter de seleção, preconceito e discriminação, tidos no senso comum como normais. Dessa 33 forma o envelhecimento não é visto em sua totalidade, como parte de um processo multidimensional da vida humana. (POLTRONIERI; COSTA; COSTA; SOARES, 2015, p. 294). Isso acontece devido aos conceitos criados negativamente quanto a envelhecer, representados na nossa cultura, estes impostos pelo capitalismo a partir das concepções que são lançadas na sociedade que quando o cidadão não vende mais sua força de trabalho este não tem mais nenhuma serventia, colocando todo o encargo negativo ao envelhecimento como uma etapa da vida da qual o cidadão deve ser excluído, já que este não faz mais parte do sistema capitalista (pois não vende sua força de trabalho). Sendo que como citam POLTRONIERI, COSTA, COSTA e SOARES et al (2015, p. 294) “ na organização social brasileira, a fragmentação cronológica privilegia a juventude, considerando a sua capacidade funcional ao sistema, menosprezando a velhice, negando-a”. Essa valorização da juventude reflete-se a partir do interesse do sistema capitalista tendo em vista que ela produz e o idoso não mais, por essa razão há uma má distribuição de renda e o aumento da pobreza. O que nos leva a analisar que na atualidade o sentido da idade cronológica encontra-se limitado por algumas barreiras, podendo em alguns casos influenciar na relação intergeracional no âmbito familiar, ou seja, na relação que se estabelece entre duas ou mais gerações. Isso porque os conceitos estabelecidos na sociedade são reproduzidos dentro do convívio familiar. Dessa forma, é indispensável que haja a desconstrução dos paradigmas sociais ainda existentes na realidade contemporânea brasileira, e assim a ênfase da necessidade do respeito e valorização da pessoa idosa. Como observado na citação de FERRIGNO (2006, apud POLTRONIERI, et al, 2015, p. 296): A geração é historicamente construída, pois a construção social das gerações se concretiza através do estabelecimento de valores morais e expectativas de conduta para cada uma delas, em diferentes etapas da história (p. 67). As sucessões de etapas do desenvolvimento biológico do ser humano- infância, adolescência, adulta e velhice- não são apenas singularidades orgânicas, mas, acima de tudo, são reproduções culturais. E assim como cita: Com efeito, o papel da família, importante em qualquer estagio da vida torna- se particularmente relevante durante dois períodos polares: o período educativo propriamente dito, isto é, infância e adolescência e em outro pólo, na senectude. Em ambas as situações a consideração do individuo como pessoa é a única forma de desenvolver, por um lado, e de manter, por outro, o equilíbrio afetivo e físico do ser humano, propiciando seu desenvolvimento 34 harmônico e natural, valorizando todas as suas potencialidades de maneira global (NETTO, 1996, p. 92). Portanto, “essa compreensão hoje é importante, pois em alguma década, em certos setores, se prever o desaparecimento da família como estrutura válida à sociedade do futuro (NETTO, 1996, p. 92), dessa forma é necessário o convívio entre gerações para que haja a construção de novos conceitos e a desconstrução do preconceito, sendo estas relações refeitas cotidianamente com o compartilhamento de suas experiências e vivências a serem repassadas de geração para geração contribuindo para a edificação de novos comportamentos intergeracionais. No capítulo seguinte veremos como tal questão social influenciam na vida de alguns idosos e de suas famílias, que quando alienados pelo o sistema capitalista passam a reproduzir os seus ideais de forma inconsciente. 4. A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA PESSOA IDOSA: DE ONDE VEM ESSA IDÉIA? Diante do que foi visto nos capítulos anteriores percebemos que envelhecer em países em desenvolvimentos como no caso do Brasil como predomínio do capital, não tem sido fácil devido às diversas imposições estabelecidas pelo sistema capitalista à sociedade a partir de suas ideologias dominantes, pois o Estado tem a função de moldar todos os aspectos desta, de acordo com o seu interesse. Dessa forma, veremos agora no último capítulo desta pesquisa, que umas das consequências ocasionadas pela rejeição que o sistema capitalista dissemina com relação ao processo de envelhecimento na contemporaneidade, uma vez que tornou- se uma expressão da questão social, é a institucionalização da pessoa idosa que segundo o dicionário Aurélio Junior (2005) é a “ação de institucionalizar, de passar a pertencer, de fazer parte de uma instituição ou de uma organização que atende às necessidades sociais e coletivas de uma sociedade” . Dessa maneira, para uma compreensão mais aprofundada deste processo institucional serão discutidas a historicidade e regulamentação das Instituições de Longa Permanência para Idosos- ILPI’s, buscando uma análise de quando surgiram a necessidade da intervenção de abrigos no atendimento de idosos, quais as normais legais que asseguram essas instituições, e para finalizar a discussão, quais as causas que influenciam nesta institucionalização. Vejamos: 35 4.1. ILPI’s e sua historicidade Antes mesmo de iniciar a discussão sobre os relatos de quando surgiram as Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI’s) vamos primeiramente entender o seu significado segundo ARAÚJO, SOUZA e FARO (2010, p. 252). Define-se asilo (do grego ásylos, pelo latim asylu) como casa de assistência social onde são recolhidas, para sustento ou também para educação, pessoas pobres e desamparadas, como mendigos, crianças abandonadas, órfãos e velhos. Considera-se ainda asilo o lugar onde ficam isentos da execução das leis, os que a ele se recolhem. Relaciona-se assim, a idéia de guarita, abrigo, proteção ao local denominado de asilo, independentemente do seu caráter social, político ou de cuidados com dependências físicas e/ou mentais. Devido ao caráter genérico dessa definição outros termos surgiram para denominar locais de assistência a idosos como, por exemplo, abrigo, lar, casa de repouso, clínica geriátrica e ancionato. Procurando-se padronizar a nomenclatura, tem sido proposta a denominação de instituições de longa permanência para idosos (ILPI), definindo-as como estabelecimentos para atendimento integral a idosos, dependentes ou não, sem condições familiares ou domiciliares para a sua permanênciana comunidade de origem. E segundo Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 283, de 26 de setembro de 2005, o seu significado consiste em: Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI) - instituições governamentais ou não governamentais, de caráter residencial, destinadas a domicílios coletivos de pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, com ou sem suporte familiar, em condição de liberdade e dignidade e cidadania. Ou seja, as ILPI’s possuem o mesmo caráter dos asilos, casas lares e outras instituições que tem como propósito o acolhimento de idosos, porém diferenciando-se devido a diversos fatores dos quais podem ser citados entre eles as estruturas e as formas de funcionamentos que mudaram ao longo dos tempos. Como citam as autoras, estas instituições buscam atender idosos que necessitam dessa atenção sejam eles dependentes ou não, que possuam família ou encontram-se sem estas. Tais instituições visam à proteção do idoso e a promoção dos direitos que lhes estão sendo negados. ARAÚJO, SOUZA e FARO (2010, p. 252) em sua obra exprimem que: “o cristianismo foi pioneiro no amparo aos velhos: há registro de que o primeiro asilo foi fundado pelo Papa Pelágio II (520-590), que transformou a sua casa em um hospital para velhos". Observa-se, no entanto que os primeiros indícios destas instituições estavam diretamente ligados a igreja católica que durante anos obteve um papel de reconhecimento quanto aos seus atos filantrópicos, atendendo aqueles que necessitavam de auxílio de forma caritativa, ou seja, como uma ajuda. Segundo elas: 36 No Brasil, o Asilo São Luiz para a Velhice Desamparada, criado em 1890, foi à primeira instituição para idosos no Rio de Janeiro. O surgimento deste dá visibilidade à velhice. A instituição era um mundo à parte e ingressar nela significava romper laços com família e sociedade (ARAÚJO, SOUZA, FARO, 2010, p. 252). Isso porque a velhice naquela época não era vista como um problema social, só a partir do momento que a pobreza tornou-se uma expressão da questão social houve uma maior compreensão das demais expressões que estavam em torno desta. E quando a única alternativa do idoso era ser institucionalizado tornava-se claro que seriam rompidos os laços com família e a sociedade já que este não iria mais conviver fora daquele espaço. Quando chegou aos fins do século XIX“[...] a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo dava assistência a mendigos e, conforme o aumento de internações para idosos passou a definir-se como instituição gerontológica em 1964” (ARAÚJO, SOUZA, FARO, 2010, p. 253). Não há dados de quantas instituições existiam nem o número de idosos que habitavam tais ILPI’s naquela época, mas discute-se que estas estavam diretamente relacionadas ao atendimento feito em Hospitais já que os idosos necessitavam do cuidado e dos serviços disponibilizado pela equipe de saúde. De acordo com a obra de AFFELDT (2013, p. 71-72): As instituições, os asilos surgiram no Brasil por volta dos séculos XIX e XX. Sendo representadas por hospitais, sanatórios, que abrigavam as pessoas que possuíam lepra, pessoas com tuberculose, idosos, doentes mentais e toda a população carente. Eram instituições mantidas geralmente com donativos comunitários e que possuíam algumas vezes características religiosas. Atualmente, muitas instituições delonga permanência, ou asilos, como são popularmente conhecidos são mantidos por ONGs. As instituições de longa permanência para idosos atualmente não se encontram exatamente articuladas às características religiosas, porém continuam com caráter filantrópico, pois a maioria estar associada à ONGs, organizações não- governamentais e sem fins lucrativos. São instituições mantidas pela própria sociedade civil. Mas, mesmo quando a instituição está ligada a uma ONG Estado é obrigado a auxiliar quanto aos direitos sociais sendo eles: educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, transporte, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância, e assistência aos desamparados provendo a sua proteção e efetivação. Atualmente existem alguns tipos de instituições para idosos como cita Affeldt (p. 72-73, 2013): 37 As privadas pertencem ao grupo de instituições com finalidade lucrativa, e são denominadas de clínicas geriátricas, casas de repouso, colônia ou residencial. As filantrópicas são mantidas geralmente por grupos religiosos e com longo histórico assistencial. As instituições de natureza mista ofertam longa permanência para idosos, com algumas ações de caráter privado e outras públicas, como por exemplo, o oferecimento de leitos para atendimento gratuito, através de convênio com o Estado. Essa variedade de ILPI’s nos mostra claramente o distanciamento do Estado quanto à sua responsabilidade de promover a assistência aos cidadãos brasileiros, dando espaço para que a sociedade tenha como única alternativa unir-se na busca por respostas às expressões da questão social, e também para o fortalecimento do setor privado que se torna o responsável por fornecer a efetivação das políticas públicas àqueles que podem pagar. Sendo a expansão do terceiro setor uma estratégia ideológica neoliberal, onde é disseminada a concepção do que é oferecido pelo setor privado é de qualidade e o que é público não é. Dessa maneira, pode-se compreender que no momento que o Estado recua diante de sua função e obrigação de prover os direitos da sociedade civil alegando não obter fundos suficientes para subsidiar a manutenção e qualificação das políticas públicas ele cede o lugar para o setor privado einveste os recursos no mercado financeiro. Devido às diversas mudanças no processo histórico da sociedade do qual reflete na estrutura da família, além da aceleração no envelhecimento populacional houve um aumento na procura por ILPI’s, ou seja, o aumento desproporcional da população de idosos e diversos fatores externos e interno à família influenciou o aumento dessa demanda. Dessa forma, vejamos a seguir conforme dados demográficos os números de idosos de Instituições de longa permanência e, por conseguinte o número de idosos institucionalizados no Brasil. Na tabela 1,segundo dados colhidos a partir de estudos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística- IBGE identificou-se o número aproximado de idosos na população brasileira no ano de 2013 e as expectativas para os próximos 47 anos.A estimativa faz parte de uma série de projeções populacionais baseada no Censo de 2010: TABELA 1: Número de idosos com idade igual ou superior a 65 anos no Brasil, nos anos de 2013- 2060. 38 Ano Quantidade numérica Quantidade percentual 2013 14,9 milhões 7,4% 2060 58,4 milhões 26,7% Fonte: IBGE, 2013. Elaboração própria. Observa-se segundo os dados coletados que de acordo com a expectativa da pesquisa haverá um aumento de 43,5 milhões de idosos com idade igual ou superior a 65 anos o que equivale a 19,3% desta população nos próximos 47 anos.Ou seja, o número de idosos vai quadruplicar até 2060. Isso irá ocorrer devido o aumento acelerado da população idosa que é resultado da redução no número de jovens no Brasil. Diante desta estimativa identificaremos o número de instituições existentes no país e o respectivo número de idosos residentes, vejamos: TABELA 2: Número de ILPI’s nos anos de 2007-2010 no Brasil. Características Quantidades Públicas 218 6,6% Privadas 931,5 28,2% Filantrópicas 2.153,6 65,2% Fonte: IPEA, 2011. Elaboração própria. Como podemos analisar na tabela 2, de acordo com o estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada- IPEA, o número de Instituições de Longa Permanência para Idosos no Brasil no ano de 2011está dividido entre públicas com 6,6%, privadas com 28,2% e filantrópicas com 65,2%, o que equivale a um total de 3.303,1ILPI’s
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