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DISCURSO DO MÉTODO - RENÉ DESCARTES

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DESCARTES
Considerado hoje o precursor da Filosofia Moderna, o filósofo racionalista René Descartes
nasceu em La Haye, França em 1596. Recebeu, no colégio jesuíta Royal Henry – Le Grand, a partir
dos 10 anos de idade, educação em latim, literatura clássica e matemática. Estudou Direito na
Universidade de Poitiers, formando-se aos 20 anos. Pelos cinco anos seguintes esteve no exército e
viajou pela Europa, enquanto travava conhecimento de diferentes povos e costumes e resolvia
problemas de matemática e física. A partir desse momento, Descartes passa a elaborar, não sem
muita cautela, seu sistema filosófico. Convencido de que a tradição filosófica escolástica não
possuía fundamentos seguros e entusiasmado pela exatidão dos resultados apresentados pela
matemática, busca desenvolver um novo paradigma para a investigação filosófica, de natureza
mecanicista e quantitativo, em oposição ao sistema aristotélico-tomista, de caráter finalista e
qualitativo. Morreu em 1650 de pneumonia, devido ao rigoroso inverno de Estocolmo, onde se
encontrava a pedido da rainha Cristina da Suécia.
DISCURSO DO MÉTODO
Originalmente publicado como prefácio para os ensaios Dióptrica, Meteóricos e Geometria
em 1637, o Discurso do Método pretende expor o procedimento metódico utilizado pelo autor em
suas investigações. Chama a atenção o fato da obra ter sido publicada em francês, uma língua
vulgar, num tempo em que as obras filosóficas eram todas publicadas em latim, língua conhecida
apenas pelos doutos, isto é, as “autoridades” no assunto. Descartes tinha a intenção de reformar a
filosofia de seu tempo, portanto queria que sua obra fosse lida pelo maior número de pessoas;
afirmava também que a razão ou bom senso é algo que é naturalmente igual em todos os homens
(Discurso do método, I, § 1), de modo que não houvesse ninguém incapacitado de exercer
investigações filosóficas, desde que empregasse a razão de forma adequada. 
A obra é dividida em seis partes, as quais abordaremos separadamente a partir de agora.
I – Sendo a razão algo que é compartilhado por todos os homens de forma igual, as
diferenças de opiniões decorrem de fatores externos a própria razão, isto é, das diferentes vivências,
culturas e tradições. Da mesma forma, aquele que tem o pensamento mais exato, claro e apurado,
não o tem por ser mais racional que os outros, mas porque sua razão está melhor exercitada.
Portanto, a razão “na medida em que é a única coisa que nos distingue dos animais está por inteiro
em cada um (…) há mais e menos apenas entre os acidentes(Discurso do método, I, § 2)”.
O autor afirma em seguida que, embora tenha recebido excelente educação desde a infância
a ponto de ser admitido entre os “doutos”, possuía pouco conhecimento seguro a cerca do mundo.
Dessa maneira, decidiu, assim que terminou os estudos, por buscar em si mesmo alguma coisa que
pudesse servir de base para o verdadeiro conhecimento.
II – Nesse ponto Descartes está convencido de que é capaz de descobrir alguma verdade
sozinho, apenas através de sua própria racionalidade. Através de uma analogia, pensou no
conhecimento como um edifício. Aquele que é planejado e construído apenas por um é mais
perfeito e bem organizado do que aquele que é planejado e construído por muitos, sofrendo ao
longo do tempo diversas reformas. “Assim, os núcleos das cidades, que, tendo sido no começo
apenas aldeolas, tornaram-se com o passar do tempo grandes centros, são geralmente mal
compassados, em comparação com as praças regulares que um só engenheiro traça(Discurso do
método, II, § 1)”. Do mesmo modo, pensou Descartes que os sistemas filosóficos de sua época
foram se formando a partir das opiniões de muitas pessoas, estando menos próximos da verdade que
os raciocínios que alguém de bom-senso pode fazer a partir das coisas que toma por objeto. Assim,
decidiu por colocar em suspenso todo conhecimento que havia adquirido ao longo da vida através
da tradição, pondo-o em dúvida, a fim de averiguar se esse conhecimento se fundamentava em
verdades tão evidentes a ponte de não se poder duvidar deles.
Com o objetivo de chegar a um conhecimento verdadeiro, propôs um método que deveria
consistir em quatro passos, a saber:
Primeiro: 
“não aceitar jamais alguma coisa como verdadeira que eu não conhecesse evidentemente como tal:
isto é, evitar cuidadosamente a precipitação e a prevenção, e nada incluir em meus julgamentos
senão o que se apresentasse de maneira tão clara e distinta a meu espírito que eu não tivesse
nenhuma ocasião de colocá-lo em dúvida(Discurso do método, II, § 7)”.
Esse primeiro passo diz respeito a dúvida. Examinando um objeto qualquer, deve-se
procurar nele aquilo que não poderia ser de outra forma, isto é, aquelas características que são tão
claras e distintas que a razão não pode sequer pensá-las de outra maneira.
Segundo: “dividir cada uma das dificuldades que examinasse em tantas parcelas possíveis e
que fossem necessárias para melhor resolvê-las(Discurso do método, II, § 8)”. Esse momento do
processo se refere a análise do objeto, na separação de cada uma de suas partes constitutivas, a fim
de, num próximo momento, estabelecer relações necessárias entre elas, o que leva ao terceiro passo.
“Conduzir por ordem meus pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais fáceis de se
conhecer, para subir, aos poucos, como por degraus, até o conhecimento dos mais compostos e
supondo mesmo uma ordem entre os que não se precedem naturalmente uns aos outros(Discurso do
método, II § 9)”. 
O quarto e último passo, consiste em “fazer em toda parte, enumerações tão completas, e
revisões tão gerais, que eu tivesse a certeza de nada omitir(Discurso do método, II, § 10)”. 
 Assim, temos que o método proposto por Descartes é o seguinte: primeiro duvidar daquilo
que se apresenta a nós e somente aceitar aquilo que é tão claro e distinto a ponto de não poder ser
posto em dúvida, em seguida decompor as partes do problema para em seguida organizá-las de
modo que estabeleçam entre si uma relação de necessidade. Por fim, a revisão sistemática deverá
nos assegurar de que nada fora omitido ao longo da investigação.
III – A partir do procedimento exposto acima, Descarte empreenderá a sua busca pela
verdade. Ressalta-se novamente o caráter solitário de sua busca. Homem prudente que era, sabia
que antes de estar convencido de que os resultados obtidos eram os mais verdadeiros possíveis,
melhor seria adotar a impassibilidade quanto as exigências da vida prática. Isso implica em separar
a investigação filosófica, que deve ser um ato solitário e que ocorre do interior do sujeito, das
relações que o sujeito estabelece com o mundo exterior.
Para tanto, Descartes propõe àqueles que intentam realizar investigações filosóficas uma
moral provisória, capaz de manter o espírito firme em suas reflexões enquanto o mundo a sua volta
segue seu curso. As regras dessa moral provisória são as seguintes: 1) obedecer e respeitar as leis do
país; sendo que nossas opiniões próprias estarão sob exame, melhor será seguir a opinião mais
sensata que se pode encontrar entre os homens de bom senso; 2) não vacilar em nossas resoluções,
mantendo uma postura firme em relação aos nossos posicionamentos, pois, indo até as últimas
consequências, ou se constatará que sempre estivemos certos, ou que estávamos errados, em ambos
os casos saímos ganhando, ao passo que uma postura vacilante não leva a lugar nenhum; 3) buscar
sempre transformar a nós mesmos antes do mundo exterior, pois “nada está inteiramente em nosso
poder a não ser nossos pensamentos”; 4) por fim, deve-se escolher um modo de vida. Descartes
escolheu o modo de vida do filósofo, ou seja, uma vida de contemplação.
IV – Entregue ao isolamento, após ter estabelecido seu método e sua moral provisória,
Descartes realizará profundas meditações, onde, a partir dadúvida metódica, buscará algum
conhecimento seguro. Quanto ao conteúdo dessas meditações e aquilo que delas é extraído pelo
autor, pode-se dizer que seja o cerne de toda produção filosófica cartesiana. Veremos
detalhadamente o conteúdo dessas meditações quando tratarmos da obra Meditação Metafísicas, por
hora, nos contentaremos com uma breve exposição.
Para descobrir o que é indubitável, é necessário que antes se duvide de tudo. Os costumes e
as opiniões que se consagram com a tradição devem ser todas consideradas como falsas, em seguida
se duvida dos sentidos, que pelo motivo de nos enganarem em algumas ocasiões devem ser postos
em dúvida em sua integralidade e, enfim, se duvida até mesmo dos raciocínios. Desse modo, tudo o
que pode se apresentar ao espírito é posto em dúvida. Porém, nota Descartes “Mas, logo notei que,
quando quis assim pensar que tudo era falso, era preciso necessariamente que eu, que o pensava,
fosse alguma coisa(Discurso do Método, IV, § 1)”. E é assim que Descartes chega a sua primeira
conclusão que se tornará célebre: se eu consigo duvidar de tudo que existe, a única coisa que resta é
a própria dúvida. Sendo a dúvida um ato do meu espírito, então necessariamente eu existo. Portanto
penso, logo existo. Mas esse eu cartesiano não é tomado pelo sujeito enquanto corpo material que
acidentalmente pensa, e sim como eu pensante, pensamento puro que não depende do corpo, pois a
existência do corpo, como é coisa sensível, foi provisoriamente assumida como falsa. Por ordem
lógica, Descartes percebeu que é mais fácil descobrir a alma(o pensamento) do que o corpo, assim
distinguiu corpo e alma, fazendo cada qual uma substância distinta, onde o pensamento possui
primariedade lógica em relação ao corpo. E ele continua sua investigação da seguinte forma:
“A seguir, refletindo sobre o que eu duvidava, e que portanto, meu ser não era todo perfeito, pois eu
via claramente que havia maior perfeição em conhecer do que em duvidar, ocorreu-me investigar de
onde eu aprendera a pensar em algo mais perfeito do que eu era; e compreendi com evidência que
devia ser de uma natureza que fossem de fato, mais perfeita que eu(…) e, como não é menos
repugnante admitir que o mais perfeito seja consequência e uma dependência do menos perfeito do
que admitir que do nada proceda alguma coisa, eu também não podia tirar essa ideia de mim
mesmo(Discurso do método, IV, § 3)”
O ser de natureza superior a minha e que não pode ser deduzido como consequência da
minha própria existência imperfeita é Deus. Esse é o argumento cartesiano a favor da existência de
Deus. A prova de que Deus existe se fundamenta em uma verdade evidente da razão, do mesmo
modo que as demonstrações da geometria, onde:
“eu via claramente que, ao supor um triângulo, era preciso que seus três ângulos fossem iguais a dois
retos; mas nada me assegurava que houvesse no mundo algum triângulo. Ao passo que, voltando a
examinar a ideia de um Ser perfeito, eu descobria que a existência nele está compreendida, da
mesma forma que está compreendida na de um triângulo (…) e que, portanto, é, pelo menos, tão
certo que Deus, que é Ser perfeito, é ou existe, quanto o seria qualquer demonstração de
geometria(Discurso do método, IV, § 5)”.
V – As verdades apresentadas acima são tão claras e distintas quanto qualquer demonstração
da geometria: para que eu pense e duvide é necessário que eu exista; a minha existência diz respeito
mais a cerca do que penso do que a cerca do que sou como corpo material, logo o meu pensamento
é logicamente anterior e distinto do meu corpo; se eu duvido é porque há algo que não sei, portanto
sou imperfeito, mas consigo conceber uma existência perfeita e esta não deve ter origem no meu
próprio ser imperfeito, e sim ser causa de si própria, de outro modo não seria perfeita. Esse Ser
perfeito é Deus.
Sendo Deus a condição necessária para a existência de todas as coisas, que são imperfeita,
as leis da natureza estabelecidas por Ele devem ser observadas em tudo o que existe. Descartes
parte agora para a investigação a cerca de verdades mais particulares, as coisas da natureza e sua
disposição. Entretanto, sabia que não poderia empreender tal tarefa sem se indispor com os filósofos
de seu tempo, coisa que ele não queria de modo algum. De forma muito engenhosa e a partir das
conclusões tiradas anteriormente, Descarte propõe que para descobrir as verdades da natureza, não
precisaria necessariamente investigar nosso mundo, mas um mundo imaginário que, sendo criado
por Deus, deveria corresponder ao nosso. Portanto, a física cartesiana é deduzida de sua metafísica.
VI – Na última parte do Discurso, Descartes narra o fato de ter abortado a publicação de um
tratado (O mundo ou tratado da luz, iniciado em 1629) após a condenação de Galileu pela
Inquisição. Em seguida, justifica que, se agora, apesar de seu respeito às autoridades e de sua
aversão ao “ofício de fazer livros”(Discurso do método, VI, § 1), propõe-se a dizer alguma coisa a
cerca das investigações que realizou, isso se deve não pelas especulações metafísicas que realizara
em um primeiro momento, mas pelos conhecimentos de cunho prático, isto é, físicos, que adquirira
a partir dos princípios que estabeleceu no campo especulativo. Diz o autor:
“Mas, tão logo adquiri algumas noções gerais relativas à física e, começando a testá-las em diversas
dificuldades particulares, notei até onde podem conduzir e o quanto diferem dos princípios utilizados
até o presente, acreditei que não podia mantê-las ocultas, sem pecar grandemente contra a lei que nos
obriga a procurar, quanto dependa de nós, o bem geral de todos os homens. Pois elas me fizeram ver
que é possível chegar a conhecimentos tão úteis à vida, e que, em vez da filosofia especulativa
ensinada nas escolas, pode-se encontrar uma outra, prática, pela qual, conhecendo a força e as ações
do fogo, da água, do ar, dos astros, dos céus e de todos os outros corpos que nos cercam, tão
distintamente quanto conhecemos os diversos ofícios de nossos artesãos, poderíamos empregá-la do
mesmo modo em todos os usos a que se aplicam tais ofícios, e assim nos tornarmos como que
mestres e possuidores da natureza(Discurso do método, VI, § 2)”

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