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Visão Geral: Respostas Celulares ao Estresse e aos Estímulos Nocivos A célula normal está limitada, em suas funções e estrutura, a uma faixa de variação bastante estreita devido ao seu estado de metabolismo, diferenciação e especialização; por restrições pelas células vizinhas; e pela disponibilidade de substratos metabólicos. No entanto, ela é capaz de dar conta das demandas fisiológicas, mantendo um estado de equilíbrio chamado homeostase. As adaptações são respostas estruturais e funcionais reversíveis às alterações fisiológicas (p. ex., gestação) ou a alguns estímulos patológicos, durante as quais um novo estado de equilíbrio, alterado, é alcançado, permitindo a sobrevivência e a atividade funcional da célula. A resposta adaptativa pode consistir em um aumento no tamanho das células (hipertrofia) e da sua atividade funcional, um aumento do número de células (hiperplasia), uma diminuição do tamanho e da atividade metabólica das células (atrofia) ou uma mudança do fenótipo das células (metaplasia). Quando o estímulo é eliminado, a célula pode retornar ao seu estado original sem ter sofrido qualquer consequência danosa. Se os limites das respostas adaptativas forem excedidos ou se as células forem expostas a agentes ou estímulos nocivos, privadas de nutrientes essenciais, ou ficarem comprometidas por mutações que afetem constituintes celulares essenciais, ocorre uma sequência de eventos denominada lesão celular. A lesão celular é reversível até certo ponto, mas se o estímulo persistir ou for intenso o suficiente desde o início, a célula sofre lesão irreversível e, finalmente, ocorre morte celular. Adaptação, lesão reversível e morte celular podem ser os estágios de um dano progressivo que sucede diferentes tipos de agressões. Por exemplo, em resposta a uma sobrecarga hemodinâmica, o músculo cardíaco aumenta, como uma forma de adaptação, podendo sofrer lesão. Se o suprimento sanguíneo para o miocárdio está comprometido ou é inadequado, o músculo primeiramente sofre lesão reversível, manifestada por certas alterações citoplasmáticas (ver adiante). Finalmente, as células sofrem lesão irreversível e morrem. A morte celular, o resultado final da lesão celular progressiva, é um dos mais cruciais eventos na evolução de uma doença em qualquer tecido ou órgão. Ela resulta de várias causas, incluindo isquemia (redução do fluxo sanguíneo), infecção e substâncias tóxicas. A morte celular constitui também um processo normal e essencial na embriogênese, no desenvolvimento dos órgãos e na manutenção da homeostase. Existem duas vias principais de morte celular, a necrose e a apoptose. A privação de nutrientes induz uma resposta celular adaptativa chamada autofagia, que pode culminar em morte celular. Diversos tipos de estímulos podem induzir alterações nas células e tecidos, diferentes das típicas adaptações, lesão e morte celulares. Os distúrbios metabólicos celulares e a agressão crônica subletal podem estar associados com acúmulos intracelulares de várias substâncias, incluindo proteínas, lipídios e carboidratos. O cálcio é frequentemente depositado em sítios de morte celular, resultando em calcificação patológica. E, ainda, o processo normal de envelhecimento é acompanhado por alterações morfológicas e funcionais nas células. Mecanismos da Lesão Celular A discussão da patologia celular da lesão e necrose leva a um estágio para a consideração dos mecanismos e vias bioquímicas da lesão celular. Os mecanismos responsáveis pela lesão celular são complexos. Entretanto, há diversos princípios que são relevantes à maioria das formas de lesão celular. • A resposta celular ao estímulo nocivo depende do tipo de agressão, sua duração e sua intensidade. Pequenas doses de uma substância química tóxica ou breves períodos de isquemia induzem lesão celular reversível, enquanto altas doses do mesmo tóxico ou uma isquemia mais prolongada resultam ou em morte celular instantânea ou em lesão celular irreversível arrastada, evoluindo, com o tempo, para a morte celular. • As consequências da lesão celular dependem do tipo, estado e adaptabilidade da célula agredida. O estado nutricional e hormonal celular e suas necessidades metabólicas são importantes na sua resposta à agressão. O quão vulnerável uma célula é, por exemplo, à perda de suprimento sanguíneo e hipoxia? Quando a célula do músculo estriado esquelético da perna está privada de seu suprimento sanguíneo, ela pode ser colocada em repouso e preservada; o mesmo não ocorre com o músculo estriado do coração. A exposição de dois indivíduos a concentrações idênticas de uma substância tóxica, como o tetracloreto de carbono, pode ser inofensiva em um e produzir morte celular no outro. Isto pode ser devido aos polimorfismos em genes que codificam enzimas hepáticas que metabolizam o tetracloreto de carbono (CCl4) em subprodutos tóxicos. Com o mapeamento completo do genoma humano, há um grande interesse na identificação dos polimorfismos genéticos que afetam as respostas dos diferentes indivíduos aos vários agentes agressores. • A lesão celular é resultante de diferentes mecanismos bioquímicos que agem em vários componentes celulares essenciais. Os componentes celulares que mais frequentemente são lesados por estímulos nocivos incluem as mitocôndrias, as membranas celulares, a maquinaria de síntese e empacotamento de proteínas e o DNA. Qualquer estímulo agressivo pode, simultaneamente, acionar múltiplos mecanismos interconectados que lesam as células. Essa é uma razão pela qual é difícil relacionar a lesão celular em uma situação específica a uma única ou ainda principal alteração bioquímica. Depleção de ATP A redução dos níveis de ATP é a causa fundamental da morte celular por necrose. A depleção de ATP e a redução de síntese de ATP são frequentemente associadas à lesão isquêmica e química (tóxica). O ATP é produzido de duas maneiras. A principal via nas células dos mamíferos é a fosforilação oxidativa do difosfato de adenosina, em uma reação que resulta na redução do oxigênio pelo sistema de transferência de elétrons das mitocôndrias. A segunda é a via glicolítica, que pode gerar ATP na ausência do oxigênio usando glicose derivada dos líquidos corporais ou da hidrólise do glicogênio. As principais causas de depleção de ATP são a redução do fornecimento de oxigênio e nutrientes, danos mitocondriais e a ação de algumas substâncias tóxicas (p. ex., cianeto). Fosfato de alta energia na forma de ATP é requerido virtualmente para todos os processos sintéticos e degradativos dentro da célula. Estes incluem o transporte na membrana, síntese de proteína, lipogênese e reações de desacilação- reacilação necessárias à modificação de fosfolipídios. A depleção de 5% a 10% dos níveis normais de ATP produz extensos efeitos em muitos sistemas celulares críticos: • A atividade da bomba de sódio dependente de energia da membrana plasmática (Na+, K+-ATPase ou abaínasensível) é reduzida. A falha desse sistema de transporte leva à entrada de sódio e sua acumulação dentro das células e difusão do potássio para fora. O ganho final de soluto é acompanhado por um ganho isosmótico de água, causando tumefação celular e dilatação do RE. • O metabolismo energético celular é alterado. Quando o fornecimento de oxigênio para as células é reduzido, como na isquemia, a fosforilação oxidativa cessa, resultando em decréscimo do ATP celular e aumento associado de monofosfato de adenosina. Essas alterações estimulam as atividades da fosfofrutocinase e da fosforilase, levando a uma taxa aumentada de glicólise anaeróbica, com o propósito de manter as fontes de energia da célula gerando ATP através do metabolismo da glicose derivada do glicogênio. Em consequência, as reservas de glicogênio são rapidamente exauridas. A glicólise anaeróbica resulta em acúmulo de ácido lático e fosfatos inorgânicos da hidrólise de ésteres de fosfato. Isso diminui o pH intracelular,resultando na diminuição da atividade de muitas enzimas celulares. • A falência da bomba de Ca2+ leva ao influxo de Ca2+, com efeitos danosos em vários componentes celulares. • A depleção prolongada ou crescente de ATP causa o rompimento estrutural do aparelho de síntese proteica, manifestado como desprendimento dos ribossomos do retículo endoplasmático rugoso e dissociação dos polissomos, com a consequente redução da síntese proteica. • Nas células privadas de oxigênio ou glicose, as proteínas se tornam anormalmente dobradas e o acúmulo de proteínas mal dobradas no retículo endoplasmático (RE) desencadeia uma reação chamada de resposta de proteína não dobrada que pode culminar em lesão e morte celular. • Finalmente, há dano irreversível às mitocôndrias e às membranas lisossômicas, e a célula sofre necrose. Danos Mitocondriais As mitocôndrias são elementos críticos na lesão e na morte celular em todas as suas formas. Isto deve ser esperado porque elas fornecem a energia que sustenta a vida através da produção de ATP. A mitocôndria pode ser danificada por aumentos de Ca2+ citosólico, espécies reativas de oxigênio (ver adiante), privação de oxigênio, e assim elas são sensíveis a praticamente todos os tipos de estímulos nocivos, incluindo hipoxia e tóxicos. Além disso, mutações de genes mitocondriais são a causa de algumas doenças hereditárias. Há três principais consequências dos danos mitocondriais: • O dano mitocondrial frequentemente resulta na formação de um canal de alta condutância na membrana mitocondrial, chamado de poro de transição de permeabilidade mitocondrial. A abertura desse canal de condutância leva à perda do potencial de membrana mitocondrial, resultando em falha na fosforilação oxidativa e na depleção progressiva do ATP, culminando na necrose da célula. Um dos componentes estruturais do poro de transição de permeabilidade mitocondrial é a proteína ciclofilina D, que é uma das várias ciclofilinas que funcionam como um alvo do fármaco imunossupressor ciclosporina (usado para impedir rejeição do enxerto). Em alguns modelos experimentais de isquemia, a ciclosporina reduz a lesão impedindo a abertura do poro de transição de permeabilidade mitocondrial — um modelo interessante de terapia alvo molecular para lesão celular. O papel da ciclosporina na redução da lesão miocárdica isquêmica em seres humanos está em investigação. • A fosforilação oxidativa anormal também conduz à formação de espécies reativas de oxigênio, as quais têm muitos efeitos deletérios, descritos mais adiante. • As mitocôndrias abrigam entre suas membranas interna e externa várias proteínas capazes de ativar as vias apoptóticas, incluindo o citocromo c e proteínas que ativam indiretamente enzimas indutoras da apoptose, chamadas caspases. O aumento da permeabilidade da membrana mitocondrial externa pode resultar na liberação dessas proteínas para o citosol e em morte por apoptose. Influxo de Cálcio e Perda da Homeostase do Cálcio Os íons cálcio são importantes mediadores da lesão celular. De acordo com isto, a diminuição do cálcio protege as células de lesões induzidas por uma variedade de estímulos nocivos. O cálcio livre no citosol é normalmente mantido em concentrações muito baixas (≈ 0,1 μmol) em comparação com os níveis extracelulares de 1,3 mmol, e a maior parte do cálcio intracelular fica sequestrada na mitocôndria e no RE. A isquemia e certas substâncias tóxicas causam um aumento da concentração do cálcio citosólico, inicialmente pela liberação do Ca2+ dos estoques intracelulares e, posteriormente, pelo aumento do influxo através da membrana plasmática. O aumento do Ca2+ intracelular causa lesão celular por vários mecanismos. . • O acúmulo de Ca2+ nas mitocôndrias leva à abertura dos poros de transição de permeabilidade mitocondrial e, como descrito, à falência na geração de ATP. • O aumento do cálcio citosólico ativa diversas enzimas, com efeitos potencialmente deletérios sobre a célula. Essas enzimas incluem as fosfolipases (que causam dano às membranas), proteases (que clivam as proteínas de membrana e do citoesqueleto), endonucleases (que são responsáveis pela fragmentação da cromatina e do DNA) e as ATPases (acelerando, assim, o esgotamento de ATP). • O aumento dos níveis de Ca2+ intracelular resultam, também, na indução da apoptose, pela ativação direta das caspases e pelo aumento da permeabilidade mitocondrial. Acúmulo de Radicais Livres Derivados do Oxigênio (Estresse Oxidativo) A lesão celular induzida por radicais livres, particularmente as espécies reativas de oxigênio, é um importante mecanismo de dano celular em muitas condições patológicas, como a lesão química e por radiação, lesão de isquemia-reperfusão (produzida pela restauração do fluxo sanguíneo em um tecido isquêmico), envelhecimento celular e morte de micorganismos pelos fagócitos. Os radicais livres são espécies químicas que têm um único elétron não emparelhado em um orbital externo. Os elétrons não emparelhados são altamente reativos e “atacam” e modificam moléculas adjacentes, tanto substâncias inorgânicas quanto orgânicas — proteínas, lipídios, carboidratos, ácidos nucleicos —, muitas delas componentes essenciais do núcleo e das membranas celulares. Algumas dessas reações são autocatalíticas, isto é, as moléculas que reagem com os radicais livres são convertidas em radicais livres, gerando, assim, uma propagação de danos em cadeia. As espécies reativas de oxigênio (ERO) são um tipo de radical livre derivado do oxigênio, cujo papel na lesão celular está bem estabelecido. Normalmente, ERO são produzidas nas células durante a respiração mitocondrial e geração de energia, mas são degradadas e removidas pelos sistemas de defesa celulares. Portanto, as células são capazes de manter um estado estável no qual os radicais livres estão presentes transitoriamente, em baixas concentrações, mas sem causar danos. O aumento da produção ou a diminuição da eliminação das ERO provoca um excesso desses radicais livres, uma condição chamada de estresse oxidativo. O estresse oxidativo tem sido implicado em uma grande variedade de processos patológicos, incluindo lesão celular, câncer, envelhecimento e algumas doenças degenerativas como doença de Alzheimer. As ERO são produzidas também em grandes quantidades por leucócitos ativados, particularmente neutrófilos e macrófagos, durante a reação inflamatória, auxiliando na destruição de micróbios, remoção de células mortas e outras substâncias indesejáveis. Geração de Radicais Livres Os radicais livres podem ser gerados dentro das células de vários modos: • As reações de redução-oxidação que ocorrem durante processos metabólicos normais. Durante a respiração normal, o oxigênio molecular é reduzido pela transferência de quatro elétrons para o H2, gerando duas moléculas de água. Essa conversão é catalisada por enzimas oxidativas no retículo endoplasmático, citosol, mitocôndrias, peroxissomos e lisossomos. Durante esse processo, são geradas pequenas quantidades de espécies intermediárias parcialmente reduzidas nas quais diferentes números de elétrons foram transferidos do O2, que incluem o ânion superóxido (O², um elétron), o peróxido de hidrogênio (H2O2, dois elétrons) e íons hidroxila (OH, três elétrons). • Absorção de energia radiante (p. ex., luz ultravioleta, raios X). A radiação ionizante, por exemplo, pode hidrolisar a água em radicais livres hidroxila (OH) e hidrogênio (H). • Surtos rápidos de ERO são produzidos em leucócitos ativados durante a inflamação. Isso ocorre por uma reação precisamente controlada em um complexo de múltiplas proteínas de membrana plasmática que usam a NADPH oxidase para a reação redox. Além disso, algumas oxidases intracelulares (p. ex., xantina oxidase) geram ânion superóxido. • O metabolismo enzimático de substâncias químicas exógenas ou fármacos pode gerar radicais livres que não são ERO,mas produzem efeitos semelhantes (p. ex., o CCl4 pode gerar). • Os metais de transição como o ferro e o cobre doam ou aceitam elétrons livres durante reações intracelulares e catalisam a formação de radicais livres como na reação de Fenton (H2O2 + Fe²+ > Fe³ + OH + OH-). Como a maior parte do ferro livre intracelular está no estado férrico (Fe3+), ele deve primeiramente ser reduzido ao estado ferroso (Fe2+) para participar da reação de Fenton. Essa redução pode ser incrementada pelo O² e, assim, fontes de ferro e ânion superóxido cooperam no dano celular oxidativo. • O óxido nítrico (NO), um mediador químico importante gerado por células endoteliais, macrófagos, neurônios e outros tipos celulares, pode atuar como radical livre e também pode ser convertido no altamente reativo ânion peroxinitrito (ONOO−), bem como em NO2 e NO3. Remoção dos Radicais Livres Os radicais livres são naturalmente instáveis e, em geral, decompõem-se espontaneamente. O ânion superóxido, por exemplo, é instável e decompõe-se (sofre dismutação) espontaneamente em O2 e H2O2 na presença de água. Além disso, as células desenvolveram múltiplos mecanismos enzimáticos e não enzimáticos para remover radicais livres e, assim, minimizar a agressão. Estes incluem os seguintes: • Antioxidantes que ou bloqueiam a formação de radicais livres, ou os inativam (p. ex., remoção). São exemplos as vitaminas lipossolúveis E e A, bem como o ácido ascórbico e a glutationa no citosol, o ferro e o cobre podem catalisar a formação de ERO. Sob circunstâncias normais, a reatividade desses metais é minimizada pela sua ligação a proteínas de armazenamento e de transporte (p. ex., transferrina, ferritina, lactoferrina e ceruloplasmina), evitando que esses metais participem em reações que gerem ERO. • Diversas enzimas atuam como sistemas de remoção radicais livres e quebram o H2O2 e o . Essas enzimas estão localizadas perto dos locais de geração dos oxidantes e incluem as seguintes: 1. Catalase, presente nos peroxissomos, que decompõe o H2O2 (2H2O2 → O2+ 2H2O). 2. Superóxido dismutases (SODs) são encontradas em muitos tipos celulares e convertem o em H2O2 (O² + 2H > H²O² + O²). Esse grupo inclui a manganês-superóxido dismutase, que se localiza nas mitocôndrias e a cobre-zinco- superóxido dismutase, que é encontrada no citosol. 3. A glutationa peroxidase também protege contra lesão catalisando a degradação de radicais livres (H2O2 + 2GSH → GSSG [homodímero de glutationa] + 2H2O, ou 2OH + 2GSH → GSSG + 2H2O). A proporção intracelular de glutationa oxidada (GSSG) para glutationa reduzida (GSH) reflete o estado oxidativo da célula e é um indicador importante da habilidade celular em destoxificar ERO. Efeitos Patológicos dos Radicais Livres Os efeitos das ERO e de outros radicais livres são bastante amplos, porém três reações são particularmente relevantes na lesão celular: • Peroxidação lipídica nas membranas. Na presença de O2, os radicais livres causam peroxidação dos lipídios dentro das membranas plasmáticas e das organelas. O dano oxidativo é iniciado quando as ligações duplas em ácidos graxos insaturados dos lipídios das membranas são atacadas por radicais livres derivados do O2, particularmente por. As interações lipídio-radical livre geram peróxidos, que são instáveis e reativos, e sobrevém uma reação em cadeia autocatalítica (chamada propagação), que pode resultar em lesão extensa das membranas. • Modificação oxidativa de proteínas. Os radicais livres promovem a oxidação das cadeias laterais de aminoácidos, formação de ligações covalentes proteína-proteína cruzadas (p. ex., pontes dissulfeto) e oxidação da estrutura da proteína. A modificação oxidativa de proteínas pode danificar os sítios ativos das enzimas, romper a conformação de proteínas estruturais e intensificar a degradação, pelos proteossomas, de proteínas não dobradas ou mal dobradas, provocando uma devastação por toda a célula. • Lesões no DNA. Os radicais livres são capazes de causar quebra das cadeias simples e duplas do DNA, ligações cruzadas das cadeias do DNA e a formação de complexos de adição. O dano oxidativo do DNA tem sido relacionado ao envelhecimento celular e à transformação neoplásica das células. O conceito tradicional sobre radicais livres era de que eles causam lesão e morte celular por necrose e, de fato, a produção de ERO é um frequente prelúdio à necrose. No entanto, está claro hoje que os radicais livres também podem desencadear a apoptose. Estudos recentes revelaram também um papel das ERO na sinalização através de uma variedade de receptores celulares e intermediários bioquímicos. Na verdade, de acordo com uma hipótese, as principais ações do derivam mais da sua capacidade de estimular a produção de enzimas de degradação do que de causar dano direto às macromoléculas. Também é possível que essas moléculas potencialmente mortais, quando produzidas sob condições fisiológicas na “dose correta“, desempenhem importantes funções fisiológicas. Defeitos na Permeabilidade da Membrana A perda precoce da permeabilidade seletiva da membrana, evoluindo no final para um dano evidente da membrana, é uma característica constante na maioria das formas de lesão celular (exceto na apoptose). O dano na membrana pode afetar as funções e a integridade de todas as membranas celulares. Mecanismos da Lesão da Membrana Nas células isquêmicas, os defeitos de membrana são o resultado da depleção de ATP e da ativação cálcio mediada de fosfolipases. A membrana plasmática pode também ser danificada diretamente por várias toxinas microbianas, proteínas virais, componentes líticos do complemento e numerosos agentes químicos e físicos. Vários mecanismos bioquímicos contribuem para os danos à membrana. • Espécies reativas de oxigênio. Os radicais livres do oxigênio causam lesão às membranas celulares através da peroxidação lipídica, discutida anteriormente. • Diminuição da síntese de fosfolipídios. Nas células, a produção de fosfolipídios está reduzida em consequência de uma função mitocondrial defeituosa ou pela hipoxia, ambas diminuindo a produção de ATP e afetando as vias biossintéticas dependentes de energia. A redução de síntese de fosfolipídios afeta todas as membranas celulares, incluindo as próprias membranas mitocondriais. • Aumento na quebra dos fosfolipídios. Lesões celulares graves estão associadas ao aumento da degradação de fosfolipídios da membrana, provavelmente devido à ativação de fosfolipases cálcio-dependentes pelos níveis elevados de Ca2+ citosólico e mitocondrial. A quebra dos fosfolípidos leva ao acúmulo de produtos de degradação dos lipídios, que incluem ácidos graxos livres não esterificados, acilcarnitina, e lisofosfolipídios, que têm um efeito detergente sobre as membranas. Eles também se inserem na bicamada lipídica da membrana ou substituem os fosfolipídios da membrana, potencialmente causando modificações na permeabilidade e alterações eletrofisiológicas. • Anormalidades citoesqueléticas. Os filamentos do citoesqueleto funcionam como âncoras que conectam a membrana plasmática ao interior da célula. A ativação de proteases pelo aumento do cálcio citosólico causa dano aos elementos do citoesqueleto. Na presença de tumefação celular, essa lesão gera, particularmente nas células miocárdicas, o desprendimento da membrana celular do citoesqueleto, tornando-a suscetível ao estiramento e ruptura. Consequências do Dano à Membrana Os locais mais importantes de danos à membrana durante a lesão celular são as membranas mitocondriais, a membrana plasmática e as membranas dos lisossomos. • Dano à membrana mitocondrial, o dano às membranas mitocondriais resultam na abertura dos poros de transição de permeabilidade mitocondrial, levando à diminuição de ATP e liberação de proteínas que disparam a morte por apoptose. • Dano à membrana plasmática. O dano à membrana plasmática leva à perda do equilíbrio osmótico e influxo de líquidos e íons, bem como àperda do conteúdo celular. As células podem, também, perder metabólitos que são vitais para a reconstituição do ATP, com subsequente esgotamento dos estoques de energia. • Lesão às membranas dos lisossomos resulta em liberação de suas enzimas para o citoplasma e ativação das hidrolases ácidas no pH ácido do interior da célula lesionada. Os lisossomos contêm RNases, DNases, proteases, fosfatases e glicosidases. A ativação dessas enzimas promove a digestão enzimática das proteínas, RNA, DNA e glicogênio, e a célula morre por necrose. Danos ao DNA e às Proteínas As células possuem mecanismos que reparam danos ao DNA, porém se o dano é muito grave para ser corrigido (p. ex., após exposição do DNA a fármacos nocivos, radiação ou estresse oxidativo), a célula inicia um programa de suicídio que resulta em morte por apoptose. Uma reação semelhante é iniciada por proteínas incorretamente dobradas, as quais podem ser resultantes de mutações hereditárias ou por causas adquiridas, como os radicais livres. Lesão Reversível vs. Irreversível. A relevância clínica dessa questão é óbvia — se pudermos respondê-la, seremos capazes de traçar estratégias para prevenir que a lesão celular tenha consequências deletérias permanentes. No entanto, os mecanismos moleculares relacionados à maioria das formas de lesão celular que culminam na morte celular se mostraram difíceis de encontrar, por várias razões. O “ponto de não retorno” no qual a lesão se torna irreversível é ainda completamente indefinido, e não há correlação bioquímica ou morfológica indiscutível de irreversibilidade. Dois fenômenos caracterizam consistentemente a irreversibilidade — a incapacidade de reverter a disfunção mitocondrial (perda de fosforilação oxidativa e de geração de ATP), mesmo após o término da agressão original, e alterações profundas na função da membrana. A lesão das membranas lisossômicas resulta na dissolução enzimática da célula lesada, que é característica da necrose. A perda de proteínas intracelulares através da membrana da célula lesada e, subsequentemente, para a circulação sanguínea, fornece um meio de detecção de lesão celular tecido-específica e necrose usando amostras de soro sanguíneo. Por exemplo, o músculo cardíaco contém uma isoforma específica da creatina-cinase e da proteína contrátil troponina; o fígado (especificamente o epitélio dos ductos biliares) contém uma isoforma da enzima fosfatase alcalina, e os hepatócitos contêm transaminases. Nesses tecidos, a lesão irreversível e a morte celular se refletem por níveis elevados dessas proteínas no sangue, e a mensuração desses biomarcadores é usada para avaliar os danos a esses tecidos. Correlações Clinicopatológicas: Exemplos Selecionados de Lesão e Necrose Celulares Lesão Isquêmica e Hipóxica A isquemia é o tipo mais comum de agressão celular em medicina clínica e que resulta da hipoxia provocada pela redução do fluxo sanguíneo, geralmente devido a uma obstrução mecânica arterial. Ela também pode ser causada por redução da drenagem venosa. Ao contrário da hipoxia, durante a qual a produção de energia através da glicólise anaeróbica continua a isquemia também compromete o fornecimento de substratos para a glicólise. Assim, nos tecidos isquêmicos, não apenas o metabolismo aeróbico é comprometido, mas a geração de energia anaeróbica também cessa depois que os substratos glicolíticos são exauridos ou quando a glicólise é inibida pelo acúmulo de metabólitos que normalmente seriam removidos pelo fluxo sanguíneo. Por essa razão, a isquemia tende a causar lesão celular e tecidual mais rápida e intensa que a hipoxia na ausência de isquemia. Mecanismos da Lesão Celular Isquêmica Quando a pressão de oxigênio dentro da célula diminui, ocorre perda da fosforilação oxidativa e diminuição da geração de ATP. A depleção de ATP resulta em falha da bomba de sódio, com perda de potássio, influxo de sódio e água e tumefação celular. Ocorre também influxo de cálcio, com seus muitos efeitos deletérios. Há uma perda progressiva de glicogênio e redução da síntese de proteínas. Nesse estágio, as consequências funcionais se tornam graves. Por exemplo, o músculo cardíaco cessa sua contratilidade dentro de 60 segundos após a oclusão da artéria coronária. Observe, entretanto, que a perda de contratilidade não significa morte celular. Se a hipoxia continua, a depleção ainda maior de ATP causará deteriorações adicionais. O citoesqueleto se dispersa, levando à perda de características ultraestruturais como as microvilosidades e formação de “bolhas” na superfície celular. “Figuras de mielina”, derivadas das membranas celulares em degeneração, são vistas dentro do citoplasma (em vacúolos autofágicos) ou no meio extracelular. Acredita-se que elas sejam o resultado da exposição de grupos fosfatídicos que promovem a captação e a inserção de água entre pilhas lamelares de membranas. Nesse momento, as mitocôndrias estão geralmente tumefeitas, como consequência da perda do controle do volume nessas organelas; o retículo endoplasmático permanece dilatado e a célula inteira está intensamente tumefeita, com altas concentrações de água, sódio e cloreto e uma concentração reduzida de potássio. Se o oxigênio for restaurado, todas essas alterações são reversíveis. Se a isquemia persiste, sobrevêm lesão irreversível e necrose. A lesão irreversível está associado morfologicamente com a intensa tumefação das mitocôndrias, extenso dano da membrana plasmática (originando as figuras de mielina) e tumefação dos lisossomos. Grandes densidades amorfas e floculentas crescem na matriz mitocondrial. No miocárdio, elas são indicação de lesão irreversível e podem já ser observadas após 30 a 40 minutos de isquemia. Ocorre então influxo maciço de cálcio para dentro da célula, particularmente se a zona isquêmica é reperfundida. A morte é principalmente por necrose, mas a apoptose também ocorre; a via apoptótica provavelmente é ativada pela liberação de moléculas pró-apoptóticas das mitocôndrias muito permeáveis. Os componentes celulares são progressivamente degradados e há uma ampla perda das enzimas celulares para o espaço extracelular e, inversamente, entrada de macromoléculas extracelulares do espaço intersticial para dentro das células que estão morrendo. Finalmente, as células mortas são substituídas por grandes massas compostas de fosfolipídios na forma de figuras de mielina. Estas são fagocitadas por leucócitos ou degradadas posteriormente a ácidos graxos. A calcificação desses ácidos graxos residuais pode ocorrer, com formação de sabões de cálcio. A saída de enzimas intracelulares e outras proteínas, através da membrana plasmática anormalmente permeável, para a corrente sanguínea, proporciona um importante indicador clínico de morte celular. Por exemplo, níveis séricos elevados da creatina-cinase MB e troponina do músculo cardíaco são sinais precoces de infarto do miocárdio, podendo ser detectados antes que o infarto seja morfologicamente detectável. As células dos mamíferos desenvolveram respostas protetoras para lidar com o estresse hipóxico. A mais bem definida dessas respostas é a indução de um fator de transcrição denominado fator-1 induzido por hipoxia, que promove a formação de novos vasos sanguíneos, estimula vias de sobrevivência celular e incrementa a glicólise anaeróbica. Ainda resta saber se o entendimento de tais mecanismos de detecção de oxigênio irá fornecer novas estratégias para a prevenção e tratamento da lesão celular isquêmica e hipóxica. Apesar das muitas investigações em modelos experimentais, não há ainda abordagens terapêuticas confiáveis para a redução das consequências lesivas da isquemia em situações clínicas. A estratégia que é, talvez, a mais útil nas lesões isquêmicas (e traumáticas) cerebrais e medulares é a indução transitória de hipotermia (reduzindo-se a temperatura corporal interna a 33,3°C). Esse tratamento reduz a demanda metabólica das células agredidas, diminui atumefação celular, suprime a formação de radicais livres e inibe a resposta inflamatória do hospedeiro. Tudo isto contribui para a redução da lesão celular e tecidual. Lesão de Isquemia-Reperfusão A restauração do fluxo sanguíneo para os tecidos isquêmicos pode promover a recuperação de células, se elas foram reversivelmente lesadas, mas também pode, paradoxalmente, exacerbar a lesão e causar morte celular. Consequentemente, os tecidos reperfundidos continuam perdendo células além daquelas já irreversivelmente lesadas no final da isquemia. Esse processo, denominado lesão de isquemia-reperfusão, é clinicamente importante porque contribui para o dano tecidual nos infartos do miocárdio e cerebral em seguida a terapias para restaurar o fluxo sanguíneo. Como ocorre a lesão de reperfusão? A resposta provável é que novos processos lesivos são desencadeados durante a reperfusão, causando a morte de células que, de outro modo, poderiam ter se recuperado. Vários mecanismos foram propostos: • Estresse oxidativo. Novo dano pode ser iniciado durante a reoxigenação por aumento da geração de espécies reativas de oxigênio e de nitrogênio. Esses radicais livres são produzidos no tecido reperfundido como resultado da redução incompleta do oxigênio pelas mitocôndrias danificadas, ou pela ação de oxidases de leucócitos, células endoteliais ou células do parênquima. Os mecanismos de defesa antioxidante celulares são comprometidos pela isquemia, favorecendo o acúmulo de radicais livres. • Sobrecarga de cálcio intracelular. A sobrecarga de cálcio intracelular e mitocondrial começa durante a isquemia aguda; ela é exacerbada durante a reperfusão devido ao influxo de cálcio resultante dos danos à membrana plasmática e da lesão mediada por ERO ao retículo sarcoplasmático. A sobrecarga de cálcio favorece a abertura do poro de transição de permeabilidade mitocondrial com consequente depleção de ATP. Isto, por sua vez, provoca mais lesão celular. • Inflamação. A lesão isquêmica está associada com a inflamação através da liberação de “sinais de alerta” provenientes de células mortas, citocinas secretadas pelas células imunes locais, tais como os macrófagos residentes, e expressão aumentada de moléculas de adesão por células endoteliais e parenquimatosas hipóxicas, tudo isso atuando para recrutar neutrófilos circulantes para o tecido reperfundido. A inflamação provoca lesão tecidual adicional. A importância da chegada dos neutrófilos na lesão de reperfusão foi demonstrada experimentalmente pela observação de efeitos benéficos do tratamento com anticorpos que bloqueiam citocinas e moléculas de adesão, com consequente redução da saída de neutrófilos dos vasos sanguíneos. • A ativação do sistema complemento contribui para a lesão de isquemia-reperfusão. Por razões desconhecidas, alguns anticorpos IgM possuem uma tendência a se depositarem em tecidos isquêmicos, e, quando o fluxo sanguíneo é restaurado, as proteínas do complemento ligam-se aos anticorpos depositados e são ativadas, provocando mais lesão celular e inflamação. Lesão Química (Tóxica) A lesão química permanece como um problema frequente na medicina clínica, e é a principal limitação à terapia com fármacos. Como muitos fármacos são metabolizados no fígado, este órgão é alvo frequente da toxicidade dos medicamentos. De fato, a lesão hepática tóxica é talvez a razão mais frequente para a interrupção do uso terapêutico ou do desenvolvimento de um fármaco. Os mecanismos pelos quais os produtos químicos, certos medicamentos e as toxinas provocam lesão, As substâncias químicas induzem lesão celular por um dos dois seguintes mecanismos gerais: • Toxicidade direta. Algumas substâncias químicas lesam células diretamente pela sua combinação com componentes moleculares críticos. Por exemplo, no envenenamento por cloreto de mercúrio, o mercúrio se liga aos grupamentos sulfidrila das proteínas da membrana celular, causando aumento da permeabilidade da membrana e inibição do transporte de íons. Nesses casos, a maior lesão ocorre nas células que usam, absorvem, excretam ou concentram as substancias químicas — no caso do cloreto mercúrico, as células do trato gastrointestinal e do rim. O cianeto envenena a citocromo-oxidase mitocondrial, inibindo, assim, a fosforilação oxidativa. Muitos agentes quimioterápicos antineoplásicos e antibióticos também provocam lesão celular por efeitos citotóxicos diretos. • Conversão em metabólitos tóxicos. A maioria das substâncias químicas não é biologicamente ativa na sua forma nativa, mas precisa ser convertida em metabólitos tóxicos reativos, que então agem sobre as moléculas-alvo. Essa modificação é normalmente realizada pelas oxidases de função mista do citocromo P-450, no retículo endoplasmático liso, no fígado e em outros órgãos. Os metabólitos tóxicos causam lesão da membrana e lesão celular principalmente pela formação de radicais livres e subsequente peroxidação lipídica; a ligação covalente direta a proteínas e lipídios da membrana também pode contribuir. Por exemplo, o tetracloreto de carbono (CCl4), que é amplamente utilizado na indústria de limpeza a seco, é convertido pelo citocromo P-450 no radical livre altamente reativo , que causa peroxidação lipídica e danos a muitas estruturas celulares. O acetoaminofeno, um medicamento analgésico, é também convertido a produto tóxico durante a detoxificação pelo fígado, produzindo lesão celular. Acúmulos Intracelulares Uma das manifestações dos transtornos metabólicos nas células é o acúmulo intracelular de quantidades anormais de várias substâncias. As substancias armazenadas enquadram-se em duas categorias: (1) um constituinte celular normal, como água, lipídios, proteínas e carboidratos, que se acumula em excesso; (2) uma substância anormal, seja exógena, como um mineral ou produtos de agentes infecciosos, ou endógena, como um produto da síntese ou metabolismo anormal. Essas substâncias podem se acumular de modo transitório ou permanente e podem ser inofensivas para as células, mas, às vezes, são intensamente tóxicas. A substância pode localizar-se no citoplasma (frequentemente dentro dos fagolisossomas) ou no núcleo. Em alguns casos, a célula produz a substância anormal, e, em outros, pode estar apenas armazenando produtos de processos patológicos que ocorrem em outra parte do corpo. Muitos processos resultam de acúmulos intracelulares anormais, mas a maioria dos acúmulos é atribuída a quatro tipos de anormalidades. 8°Edição: 1. Uma substância endógena normal é produzida a uma taxa normal ou aumentada, mas a taxa de metabolismo é inadequada para removê-la. Exemplos desse tipo de processo são a degeneração gordurosa do fígado e a reabsorção de gotículas de proteína nos túbulos renais. 2. Uma substância endógena anormal, tipicamente o produto de um gene mutado, se acumula devido a defeitos no dobramento e transporte da proteína e uma inabilidade de degradar eficientemente a proteína anormal. Os exemplos incluem o acúmulo de α-1- antitripsina nos hepatócitos e de várias proteínas mutadas em distúrbios degenerativos do sistema nervoso central. 3. Uma substância endógena normal acumula-se devido a defeitos, geralmente herdados, em enzimas que são necessárias para o metabolismo da substância. Os exemplos incluem as doenças causadas por defeitos genéticos de enzimas envolvidas no metabolismo dos lipídios e carboidratos, resultando no depósito intracelular dessas substâncias, principalmente nos lisossomas. 4. Uma substância exógena anormal é depositada e se acumula porque a célula não possui maquinaria, enzimática para degradar a substância e nem a habilidade de transportá-la para outros locais. Os acúmulos de partículas de carbono e substâncias químicas não metabolizáveis, como a sílica, são exemplos deste tipo de alteração. 10°Edição • Remoção inadequada de uma substância normal secundária a defeitos nos mecanismos de acondicionamento e transporte, como nadegeneração gordurosa (esteatose) no fígado. • Acúmulo de uma substância endógena anormal como resultado de defeitos genéticos ou adquiridos em seu dobramento, acondicionamento, transporte, ou secreção, como acontece com certas formas mutantes de α1- antitripsina. • Falha em degradar um metabólito devido a deficiências enzimáticas hereditárias. Os distúrbios resultantes são chamados de doenças de depósito (também chamadas de doenças de armazenamento). • Depósito ou acúmulo de uma substância exógena anormal quando a célula não possui maquinaria enzimática para degradar a substância ou não tem capacidade de transportá-la para outros locais. O acúmulo de partículas de carbono ou sílica é um exemplo desse tipo de alteração. Em muitos casos, se a sobrecarga for controlada ou interrompida, o acúmulo é reversível. Nas doenças de depósito genéticas, o acúmulo é progressivo e a sobrecarga causa lesão celular, levando, em alguns casos, à morte do tecido e do paciente. LIPÍDIOS Todas as classes principais de lipídios podem se acumular nas células; triglicerídeos, colesterol/ésteres de colesterol e fosfolipídios. Os fosfolipídios são componentes das figuras de mielina encontradas nas células necróticas. Além disso, complexos anormais de lipídios e carboidratos se acumulam nas doenças de depósito lisossômico. Esteatose (Degeneração Gordurosa) Os termos esteatose e degeneração gordurosa descrevem acúmulos anormais de triglicerídeos dentro das células parenquimatosas. Com frequência a degeneração gordurosa é vista no fígado porque este é o principal órgão envolvido no metabolismo lipídico, mas também ocorre no coração, músculo e rins. As causas de esteatose incluem toxinas, desnutrição proteica, diabetes melito, obesidade e anoxia. Nas nações desenvolvidas, as causas mais comuns de degeneração gordurosa hepática significativa (fígado gorduroso) são o abuso do álcool e doença hepática gordurosa não alcoólica, que frequentemente está associada com diabetes e obesidade. Mecanismos diferentes respondem pelo acúmulo de triglicerídeos no fígado. Os ácidos graxos livres do tecido adiposo ou do alimento ingerido são normalmente transportados para os hepatócitos, onde são estereficados a triglicerídeos, convertidos em colesterol ou fosfolipídios ou oxidados a corpos cetônicos. Alguns ácidos graxos são também sintetizados a partir do acetato. A liberação de triglicerídeos dos hepatócitos requer associação com apoproteínas para formar lipoproteínas, as quais podem, então, ser transportadas do sangue para os tecidos. O acúmulo excessivo de triglicerídeos dentro do fígado pode resultar de entrada excessiva ou de defeitos de metabolismo e exportação dos lipídios. Uma série de defeitos desse tipo é induzida pelo álcool, uma hepatotoxina que altera as funções mitocondriais e microssômicas, levando ao aumento de síntese e redução da degradação dos lipídios. O CCl4 e a desnutrição proteica causam degeneração gordurosa por reduzirem a síntese de apoproteínas, a hipoxia inibe a oxidação dos ácidos graxos e a inanição aumenta a mobilização dos ácidos graxos das reservas periféricas. O significado da degeneração gordurosa depende da causa e da gravidade do acúmulo. Quando leve, pode não ter efeito sobre a função celular. A alteração gordurosa mais acentuada pode comprometer a função celular e prenunciar a morte celular. Morfologia. A esteatose é observada com maior frequência no fígado e no coração. Em todos os órgãos, aparece como vacúolos claros dentro das células parenquimatosas. Acúmulos intracelulares de água ou polissacarídeos (p. ex., glicogênio), também podem produzir vacúolos claros. A identificação de lipídios requer a exclusão de solventes de gordura usados na inclusão em parafina para as colorações de hematoxilina e eosina rotineiras. Para identificar a gordura, é necessário preparar secções de tecidos frescos e congelados ou fixados em formol aquoso. As secções são então coradas com Sudan IV ou Oil Re -O, ambos os quais conferem uma cor vermelho-alaranjada aos lipídios presentes. A reação do ácido periódico de Schiff (PAS), conjugada com digestão pela enzima diastase, é usada para identificar glicogênio, embora não seja específica. Quando não se demonstra gordura nem polissacarídeo dentro de um vacúolo claro, presume-se que ele contenha água ou líquido com baixo teor de proteína. Diagrama esquemático dos possíveis mecanismos que levam ao acúmulo de triglicerídeos no fígado gorduroso. Defeitos em qualquer uma das etapas de captação, catabolismo ou secreção podem levar ao acúmulo de lipídio. Coração. O lipídio é encontrado no músculo cardíaco na forma de pequenas gotículas, que ocorrem em dois padrões. Em um, a hipoxia moderada e prolongada, como aquela produzida na anemia profunda, causa depósitos intracelulares de gordura, criando faixas grosseiramente visíveis de miocárdio amarelado que se alternam com faixas mais escuras, castanho-avermelhadas, de miocárdio não afetado (aspecto tigroide). O outro padrão de degeneração gordurosa é produzido por hipoxia mais profunda ou por algumas formas de miocardite (p. ex., infecção por difteria) e exibe miócitos afetados de maneira mais uniforme. Fígado. No fígado, uma esteatose leve pode não afetar a aparência macroscópica. Com o acúmulo progressivo, o órgão aumenta e torna-se progressivamente amarelo, até que, em casos extremos, chega a pesar de duas a quatro vezes mais que o peso normal, com aparência amarela brilhante, macia e untuosa. A degeneração gordurosa começa com o desenvolvimento de diminutas inclusões revestidas por membranas (lipossomas) intimamente aplicadas ao retículo endoplasmático. O acúmulo de gordura é visto primeiro à microscopia óptica como pequenos vacúolos no citoplasma ao redor do núcleo. À medida que o processo avança os vacúolos coalescem, criando espaços claros que deslocam o núcleo para a periferia da célula. Ocasionalmente, células contíguas se rompem e os glóbulos de gordura coalescem, formando os tão conhecidos cistos gordurosos. Colesterol e Ésteres de Colesterol O metabolismo celular do colesterol é estreitamente regulado de modo que a maioria das células usa o colesterol para a síntese das membranas celulares sem acúmulo intracelular de colesterol ou ésteres de colesterol. Os acúmulos manifestados histologicamente por vacúolos intracelulares são observados em diversos processos patológicos. Aterosclerose. Nas placas ateroscleróticas, as células musculares lisas e os macrófagos dentro da túnica íntima da aorta e das grandes artérias estão repletos de vacúolos lipídicos, a maioria dos quais compostos de colesterol e ésteres de colesterol. Tais células exibem uma aparência espumosa (células espumosas), e agregados dessas células na íntima produzem os ateromas amarelos carregados de colesterol, característicos desse distúrbio grave. Algumas dessas células cheias de gordura se rompem, liberando lipídios no espaço extracelular. Os ésteres de colesterol extracelulares podem cristalizar-se na forma de agulhas longas, produzindo fendas bastante distintas em secções teciduais. Xantomas. O acúmulo intracelular de colesterol dentro dos macrófagos também é característico dos estados hiperlipidêmicos hereditários e adquiridos. Aglomerados de células espumosas são encontrados no tecido conjuntivo subepitelial da pele e tendões, produzindo massas tumorais conhecidas como xantomas. Colesterolose. Este termo refere-se aos acúmulos focais de macrófagos cheios de colesterol na lâmina própria da vesícula biliar. O mecanismo de acúmulo é ignorado. Doença de Niemann-Pick tipo C. Esta doença de depósito lisossômico é causada por mutações que afetam uma enzima envolvida no transporte do colesterol, resultando em acúmulo de colesterol em múltiplos órgãos. PROTEÍNAS Os acúmulos intracelulares de proteína geralmente aparecem como gotículas eosinofílicas arredondadas, vacúolos, ou agregados no citoplasma.À microscopia eletrônica, podem ter aparência amorfa, fibrilar ou cristalina. Em alguns distúrbios, como em certas formas de amiloidose, proteínas anormais se depositam principalmente nos espaços extracelulares. Os excessos de proteína dentro das células, o suficiente para causar acúmulo morfologicamente visível, têm diversas causas. Gotículas de reabsorção nos túbulos renais proximais são observadas em doenças renais associadas à perda de proteína na urina (proteinúria). No rim, quantidades mínimas filtradas pelo glomérulo são normalmente reabsorvidas por pinocitose no túbulo proximal. Em distúrbios com extravasamento maciço de proteína através do filtro glomerular há um aumento da reabsorção de proteína em vesículas, e a proteína aparece como gotículas hialinas róseas dentro do citoplasma da célula tubular. O processo é reversível; se a proteinúria diminuir, as gotículas de proteína são metabolizadas e desaparecem. Agregação de proteínas anormais. As proteínas anormais ou anormalmente dobradas podem se depositar nos tecidos e interferir com as funções normais. Os depósitos podem ser intra ou extracelulares, ou ambos, e os agregados podem causar direta ou indiretamente, as alterações patológicas. Certas formas de amiloidose se enquadram nessa categoria de doenças. Esses distúrbios são algumas vezes chamados de proteinopatias ou doenças de agregação de proteína As proteínas que se acumulam podem ser proteínas normais secretadas que são produzidas em quantidade excessiva, como ocorre em certos plasmócitos envolvidos na síntese ativa de imunoglobulinas. O RE torna-se imensamente distendido, produzindo grandes inclusões eosinofílicas homogêneas chamadas de corpúsculos de Russell. Transporte intracelular e secreção defeituosos de proteínas fundamentais. Na deficiência de α-1-antitripsina, mutações da proteína tornam o dobramento significativamente lento, levando ao acúmulo de intermediários parcialmente dobrados, que se agregam no RE do fígado e não são secretados. A resultante deficiência da enzima circulante causa enfisema. Em muitas dessas doenças, a patologia resulta não apenas da perda da função da proteína, mas também do estresse do RE causado por proteínas anormalmente dobradas, culminando em morte apoptótica das células (discutida anteriormente). Acúmulo de proteínas do citoesqueleto. Existem vários tipos de proteínas do citoesqueleto, incluindo os microtúbulos (20 a 25 nm de diâmetro), filamentos finos de actina (6 a 8 nm), filamentos grossos de miosina (15 nm) e filamentos intermediários (10 nm). Os filamentos intermediários fornecem um suporte intracelular flexível que organiza o citoplasma e resiste a forças aplicadas à célula, e estão divididos em cinco classes – filamentos de queratina (característicos das células epiteliais), neurofilamentos (neurônios), filamentos de desmina (células musculares), filamentos de vimentina (células do tecido conjuntivo) e filamentos gliais (astrócitos). Os acúmulos de filamentos de queratina e neurofilamentos estão associados com certos tipos de lesão celular. Nas células hepáticas, o hialino alcoólico é uma inclusão citoplasmática eosinofílica, característica de doença hepática alcoólica e é composto, predominantemente, de filamentos intermediários de queratina. Os emaranhados neurofibrilares encontrados no cérebro na doença de Alzheimer contêm neurofilamentos e outras proteínas. As proteínas que se acumulam podem ser proteínas normais secretadas que são produzidas em quantidade excessiva, como ocorre em certos plasmócitos envolvidos na síntese ativa de imunoglobulinas. O RE torna-se imensamente distendido, produzindo grandes inclusões eosinófilas homogêneas chamadas de corpúsculos de Russell. Defeito intracelular no transporte e secreção de proteínas fundamentais. Na deficiência de α1-antitripsina, mutações em que há dobramento significativamente lento de proteínas resultam no acúmulo de intermediários parcialmente dobrados, que se agregam no RE do fígado e não são secretados. A deficiência dessa enzima na circulação causa enfisema. Em muitas dessas doenças, a alteração patológica resulta não apenas da perda da função da proteína, mas também do estresse do RE causado por proteínas mal dobradas, culminando em morte das células por apoptose. DEGENERAÇÃO HIALINA O termo hialino geralmente refere-se a uma alteração dentro das células ou no espaço extracelular que confere uma aparência rósea, vítrea e homogênea, em secções histológicas rotineiras coradas com hematoxilina e eosina. O termo é amplamente usado como um termo histológico descritivo, em vez de um marcador específico de lesão celular. Essa alteração morfológica é produzida por uma variedade de alterações e não representa um padrão específico de acúmulo. Os acúmulos intracelulares de proteína, descritos anteriormente (gotículas de reabsorção, corpúsculos de Russell, hialino alcoólico), são exemplos de depósitos hialinos intracelulares. O hialino extracelular tem sido mais difícil de analisar. O tecido fibroso colágeno em cicatrizes antigas pode aparecer hialinizado, mas a base bioquímica dessa alteração é obscura. Na hipertensão de longo tempo e no diabetes melito, as paredes das arteríolas, especialmente no rim, tornam-se hialinizadas devido à proteína plasmática extravasada e ao depósito de material da membrana basal. GLICOGÊNIO O glicogênio é uma reserva de energia prontamente disponível armazenada no citoplasma de células saudáveis. Depósitos intracelulares excessivos de glicogênio são encontrados em pacientes com uma anormalidade no metabolismo da glicose ou glicogênio. Seja qual for o contexto clínico, as massas de glicogênio aparecem como vacúolos claros dentro do citoplasma. O glicogênio se dissolve em fixadores aquosos; para a sua localização, os tecidos devem ser fixados em álcool absoluto. A coloração com carmim de Best ou a reação do PAS conferem ao glicogênio uma cor rósea a violeta, e a digestão com diastase de uma secção paralela antes da coloração serve como controle adicional pela hidrólise do glicogênio. O diabetes melito é o principal exemplo de um distúrbio do metabolismo da glicose. Nessa doença, o glicogênio é encontrado nas células epiteliais dos túbulos renais, bem como dentro das células hepáticas, células β das ilhotas de Langerhans e células miocárdicas. O glicogênio se acumula dentro de células em um grupo de distúrbios genéticos relacionados, coletivamente conhecidos como doenças de depósito de glicogênio ou glicogenoses (Cap. 5). Nessas doenças, defeitos enzimáticos na síntese ou degradação do glicogênio resultam em acúmulo maciço, causando lesão e morte celular. PIGMENTOS Pigmentos são substâncias coloridas, algumas das quais são constituintes normais das células (p. ex., melanina), enquanto outros são anormais e acumulam-se nas células somente sob circunstâncias especiais. Podem ser exógenos, provenientes de fora do corpo, ou endógenos, sintetizados dentro do próprio corpo. Pigmentos Exógenos O pigmento exógeno mais comum é o carbono (poeira de carvão), um poluente do ar ubíquo da vida urbana. Quando inalado, é assimilado pelos macrófagos dentro dos alvéolos e, então, transportado através dos canais linfáticos para linfonodos regionais na região traqueobrônquica. O acúmulo desse pigmento escurece os tecidos dos pulmões (antracose) e os linfonodos envolvidos. Nos mineiros de carvão, os agregados de poeira de carvão podem induzir uma reação fibroblástica, ou até mesmo enfisema, e, assim, causar uma doença pulmonar grave conhecida com o pneumoconiose do trabalhador de carvão. A tatuagem é uma forma de pigmentação exógena localizada da pele. Os pigmentos inoculados são fagocitados pelos macrófagos da derme, nos quais residem pelo resto da vida das pessoas adornadas (algumas vezes com consequências embaraçadoras para o portador da tatuagem!). Os pigmentos geralmente não suscitam nenhuma resposta inflamatória. PigmentosEndógenos A lipofuscina é um pigmento insolúvel, também conhecido como lipocromo ou pigmento do desgaste. A lipofuscina é composta de polímeros de lipídios e fosfolipídios formando complexos com proteínas, sugerindo que é derivada da peroxidação de lipídios poli-insaturados de membranas subcelulares. A lipofuscina não é nociva à célula ou às suas funções. Sua importância reside no fato de ser o sinal de alarme de lesão por radicais livres e peroxidação lipídica. O termo é derivado do latim (fuscus, castanho), significando lipídio castanho. Em secções teciduais, aparece como um pigmento citoplasmático, frequentemente perinuclear, finamente granular e castanho-amarelado. É observada em células sofrendo alterações regressivas lentas e é particularmente proeminente no fígado e coração de pacientes que estão envelhecendo ou naqueles com desnutrição grave e caquexia do câncer. A melanina, termo derivado do grego (melas, preto), é um pigmento endógeno pretoacastanhado, não derivado de hemoglobina, formado quando a enzima tirosinase catalisa a oxidação da tirosina em diidroxifenilalanina nos melanócitos. Para as finalidades práticas, a melanina é o único pigmento preto-acastanhado endógeno. O único outro que poderia ser considerado nessa categoria é o ácido homogentísico, um pigmento negro que ocorre em pacientes com alcaptonúria, uma doença metabólica rara. Aqui, o pigmento é depositado na pele, tecido conjuntivo e cartilagem e a pigmentação é conhecida como ocronose. A hemossiderina é um pigmento granular ou cristalino, amarelo a castanho-dourado, derivado da hemoglobina, sendo a principal forma de armazenamento do ferro. O ferro normalmente é transportado por proteínas transportadoras específicas, as transferrinas. Nas células, é armazenado em associação com uma proteína, a apoferritina, para formar micelas de ferritina. A ferritina é um componente da maioria dos tipos celulares. Quando há um excesso local ou sistêmico de ferro, a ferritina forma grânulos de hemossiderina, que são facilmente vistos à microscopia óptica. O pigmento hemossiderina representa agregados de micelas de ferritina. Sob condições normais, pequenas quantidades de hemossiderina podem ser observadas em fagócitos mononucleares da medula óssea, baço e fígado, que são ativamente dedicados à degradação dos eritrócitos. Os excessos de ferro, locais ou sistêmicos, causam acúmulo de hemossiderina dentro das células. Os excessos locais resultam de hemorragias nos tecidos. O melhor exemplo de hemossiderose localizada é a equimose comum. No local da lesão, os eritrócitos extravasados são fagocitados durante vários dias pelos macrófagos, que degradam a hemoglobina e recuperam o ferro. Após a remoção do ferro, a fração heme é convertida primeiro à biliverdina (“bile verde”) e, então, à bilirrubina (“bile vermelha”). Em paralelo, o ferro liberado da heme é incorporado na ferritina e, finalmente, na hemossiderina. Essas conversões respondem pelo jogo dramático de cores visto em uma equimose em recuperação, que tipicamente muda de azul-avermelhada para azulesverdeada e para amarelo-dourada, antes de resolver. Quando há sobrecarga sistêmica de ferro, a hemossiderina pode ser depositada em muitos órgãos e tecidos, uma condição denominada hemossiderose. As principais causas de hemossiderose são: (1) absorção aumentada de ferro alimentar; (2) anemias hemolíticas, nas quais quantidades anormais de ferro são liberadas dos eritrócitos; (3) transfusões repetidas porque os eritrócitos transfundidos constituem uma carga exógena de ferro. Morfologia. O pigmento aparece como uma substância granular, dourada e grosseira, que reside no citoplasma da célula. Pode ser visualizado nos tecidos através da reação histoquímica pelo azul da Prússia, na qual ferrocianeto de potássio incolor é convertido pelo ferro em ferrocianeto férrico preto-azulado. Quando a causa básica é a degradação localizada das hemácias, a hemossiderina é encontrada inicialmente nos fagócitos na área. Na hemossiderose sistêmica, é encontrado primeiro nos fagócitos mononucleares do fígado, medula óssea, baço e linfonodos e em macrófagos dispersos em outros órgãos, como a pele, pâncreas e rins. Com o acúmulo progressivo, as células parenquimatosas de todo o corpo (principalmente no fígado, pâncreas, coração e órgãos endócrinos) tornam-se pigmentadas. Na maioria dos casos de hemossiderose sistêmica, o pigmento não lesa as células parenquimatosas nem compromete a função do órgão. Contudo, o acúmulo mais extremo de ferro, em uma doença herdada chamada hemocromatose, está associado à lesões no fígado, coração e pâncreas, resultando em fibrose hepática, insuficiência cardíaca e diabetes melito. A bilirrubina é um pigmento normal importante encontrado na bile. É derivada da hemoglobina, mas não contém ferro. Suas formação e excreção normais são vitais para a saúde, e a icterícia é um distúrbio clínico comum causado por excessos desse pigmento dentro das células e tecidos.
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