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Direito do Consumidor - 2-2018 - Notas de Aula - Caio

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Direito do Consumidor
Prof. Ricardo Rocha Leite
Bibliografia
Básica:
· GRINOVER, Ada Pellegrini; et al. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. [v.1 e 2]. Editora: Forense Universitária. Ano: 2011.
· BENJAMIN, Antonio Herman de Vasconcellos. Manual de direito do consumidor. Editora: Revista dos Tribunais. Ano: 2008.
· MIRAGEM, Bruno. Curso de direito do consumidor. Editora: Revista dos Tribunais. Ano: 2013.
Complementar:
· GAMA, Hélio Zaghetto. Curso de Direito do Consumidor. Editora: Forense. Ano: 2006.
· NUNES, Luiz Antônio Rizzato. Curso de Direito do Consumidor. Editora: Saraiva. Ano: 2013.
· BITTAR, Carlos Alberto. Direitos do consumidor. Editora: Forense Universitária. Ano: 2011.
· CARVALHO, Andre. A cidade morria devagar: o romance de uma cooperativa. Editora: Armazém de Ideias. Ano: 2004.
· MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. Editora: Revista dos Tribunais. Ano: 2012.
Sugerida:
· BESSA, Leonardo; MARQUES, Cláudia Lima e BENJAMIN, Herman. Manual de Direito do Consumidor, 2018.
· MIRANDA, Bruno. Manual de Direito do Consumidor, 2018.
· TARTUCE, Flávio e AMORIM, Daniel. Manual de Direito do Consumidor, 2018.
· NUNES, Rizzato. Manual de Direito do Consumidor, 2018.
· GRINOVER, Ada Pelegrini. Código de Defesa do Consumidor Comentado, 2018.
· LIMA, Cláudia e MIRAGEM, Bruno. Código de Defesa do Consumidor Comentado, 2018.
· GARCIA, Leonardo de Medeiros. Código de Defesa do Consumidor Comentado, 2017.
Avaliação
· A primeira avaliação será escrita, individual, contendo, em média, 4 questões objetivas e subjetivas. A avaliação compreenderá, aproximadamente, 8 (oito) questões, sendo 4 (quatro) objetivas e 4 (quatro) discursivas. As questões objetivas corresponderão a 40% (quarenta por cento) do valor da avaliação e as subjetivas ao percentual de 60%.
· A segunda avaliação, denominada de Avaliação Multidisciplinar Cumulativa (AMC), abrangerá o conteúdo previsto pela Instituição. A elaboração e agendamento de data serão de responsabilidade da Instituição de Ensino. Conforme edital divulgado, o uso da menção obtida somente é permitido para beneficiar o estudante, exceto no caso de não comparecimento injustificado à avaliação, situação que ocasionará o lançamento da menção "SR" (sem rendimento) e composição da menção final. Conforme faculta o item 5.2 do edital da AMC, a composição do resultado da AMC será utilizada para cálculo da segunda menção e somente para as disciplinas constantes da avaliação, ou seja, caso o aluno realize a AMC, porém não seja avaliado em Direito do Consumidor, a menção obtida não será utilizada para composição do resultado da segunda avaliação realizada pelo docente. A forma de utilização é de que a nota da AMC poderá substituir a menção da terceira avaliação, caso seja maior.
· A terceira avaliação abrangerá, como já colocado anteriormente, matéria cumulativa. A avaliação compreenderá, aproximadamente, 8 (oito) questões, sendo 4 (quatro) objetivas e 4 (quatro) discursivas. As questões objetivas corresponderão a 40% (quarenta por cento) do valor da avaliação e as subjetivas ao percentual de 60%.
· O professor poderá disponibilizar trabalhos para serem realizados extraclasse ou em sala de aula, que terão o objetivo de complementar as horas-aula necessárias e, eventualmente, a menção final.
· Durante a realização das provas, é permitida a consulta à legislação impressa (Código de Defesa do Consumidor e Vade Mecum), sem comentários ou anotações. Não é permita a consulta a livros de doutrina, apostilas ou a equipamentos eletrônicos (celulares, computadores, tablets etc). Os equipamentos eletrônicos deverão ser desligados e guardados em mochilas e bolsas durante a realização da prova. A realização de consulta indevida durante a prova implicará menção II ao aluno.
· Datas previstas:
· Primeira Prova: 24/09/2018
· AMC: 30/10/2018
· Segunda Prova: 20/11/2018
Sumário
1. Introdução ao Direito do Consumidor	5
1.1. Histórico do Direito do Consumidor	5
1.2. Finalidade do Direito do Consumidor	6
1.3. Proteção constitucional e previsão legal	6
2. Introdução ao Código de Defesa do Consumidor	8
2.1. Relação jurídica de consumo	9
2.1.1. Elementos subjetivos da relação jurídica de consumo	9
2.1.2. Elementos objetivos da relação jurídica de consumo	18
2.2. Tutela do Consumidor	23
3. Direitos básicos do consumidor	24
3.1. Direito à informação	26
3.1.1. Aspectos significativos do direito à informação	26
3.1.2. Conceituação de informação	27
3.1.3. Categorias da informação	28
3.2. Tutela contratual	30
3.3. Tutela da prevenção e reparação de danos	31
3.4. Tutela processual do consumidor	33
3.4.1. Domicílio do consumidor	33
3.4.2. Inversão do ônus da prova	33
4. Responsabilidade civil e defesa do consumidor	39
4.1. Responsabilidade civil tradicional	39
4.2. Responsabilidade civil no CDC	40
4.2.1. Modalidades da responsabilidade civil quanto à violação à saúde e à segurança do consumidor (acidentes de consumo)	42
4.2.2. Modalidades da responsabilidade civil quanto à inadequação do objeto (vícios de consumo)	52
5. Prescrição e decadência no CDC	61
5.1. Prazo decadencial no CDC: discussão de vícios de consumo	62
5.1.1. Critérios para definição do prazo decadencial quando o vício é aparente	62
5.1.2. Critérios para definição do prazo decadencial quando o vício é oculto	63
5.1.3. Obstáculos à decadência	65
5.2. Prazo prescricional no CDC: discussão de acidentes de consumo	67
6. Desconsideração da personalidade jurídica no CDC	69
6.1. Conceito de desconsideração da personalidade jurídica	69
6.2. Hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica no CDC	69
7. Proteção contratual no CDC	72
7.1. Fase pré-contratual	72
7.1.1. Oferta	72
7.1.2. Publicidade	75
7.1.3. Práticas abusivas	80
7.2. Fase de execução contratual	93
7.2.1. Inadimplemento voluntário do consumidor	94
7.2.2. Arquivos de consumo	99
7.2.3. Proteção contratual	106
7.2.4. Cláusulas abusivas	109
7.2.5. Contratos de adesão	112
7.3. Fase pós-contratual	113
Aulas 1 e 2 – 30/07/2018 e 31/07/2018
Programa – Aulas 1 e 2
1. Introdução ao Direito do Consumidor
1.1. Histórico do Direito do Consumidor
1.2. Finalidade do Direito do Consumidor
1.3. Proteção constitucional e previsão legal
Introdução ao Direito do Consumidor
Histórico do Direito do Consumidor
· Entendimento:
· Anteriormente ao século XVIII, as relações econômicas, na Europa, se baseavam em transações simples, muitas vezes próximas do escambo, com uma produção de bens feita, predominantemente, de maneira individual.
· Com a Revolução industrial, surgiu a produção massificada, em série, que permitiu grande impulsionamento do consumo, em razão da queda no preço de produção, que funcionou significativamente bem com o aumento populacional que o mundo ocidental experimentou nesta época. Esta produção em série, no entanto, trazia um aumento dos riscos, associados a um único erro de projeto, que poderiam afetar grande quantidade de pessoas ao mesmo tempo.
· Com a Revolução Francesa (1789), os Estados passaram a ter tendências mais liberais, dando origem aos princípios clássicos dos contratos, que são a “Autonomia da vontade” e o “Pacta sunt servanda” (o qual postula que os contratos fazem lei entre as partes), frente aos quais o Estado não intervinha nas relações entre os particulares.
· No entanto, com o passar do tempo, as teorias de bem-estar social, desenvolvidas, em especial, a partir dos anos 1960, nos EUA, passaram a influenciar as relações econômicas, de modo que a intervenção estatal nas relações privadas passou a ser melhor aceita.
· No Brasil, a Constituição Federal de 1988, de caráter predominantemente liberal, trouxe, também, algumas previsões próximas ao bem-estar social, como os direitos sociais do art. 6º, CF (educação, saúde, entre outros). As leis brasileiras, como o Código Civil, influenciadas pela CF/88, não dexaram de lado os princípios clássicos dos contratos, mas apresentam uma série de situações em que o Estado pode intervir nasrelações entre os particulares, para regulá-las, a exemplo da anulação de cláusulas de contratos que geram onerosidade excessiva. A ideia destas possibilidades de intervenção, previstas em lei, é garantir a chamada “igualdade formal”.
· Contudo, com o passar do tempo, percebeu-se que, quando a própria relação jurídica é originada em situação de desigualdade, apenas a previsão legal geral das leis que regulam as relações entre particulares (Código Civil) não seria suficiente para gerar “igualdade material” (ou seja, fática, real, substancial), em razão das vulnerabilidades apresentadas por algumas das partes envolvidas. Passou-se, então, a entender que “se deve tratar os desiguais na medida de suas desigualdades”.
· Alguns diplomas legais, então, passaram a trazer elementos discriminatórios, no sentido de que reconhecem as diferenças entre as partes em algumas relações jurídicas específicas, desde que essas diferenciações sejam justificadas, em busca do chamado “reequilíbrio da relação jurídica”. Bons exemplos de diplomas legais como esses são o Estatuto do Idoso, a Lei Maria da Penha e o Código de Defesa do Consumidor.
Finalidade do Direito do Consumidor
· Entendimento: o consumidor é entendido como vulnerável no mercado de consumo, pois, neste mercado, na maioria das vezes, é o fornecedor quem dita as regras da relação jurídica. A finalidade do Direito do Consumidor, portanto, nada mais é do que promover a igualdade material, em face da vulnerabilidade de uma das partes da relação jurídica, em relação à outra.
Proteção constitucional e previsão legal
· Entendimento: a Defesa do Consumidor está prevista, constitucionalmente, no art. 5º, XXXII, CF, e no art. 170, V, CF. De maneira a trazer a ideia de defesa ao consumidor para a prática, a própria Constituição, dentro de suas disposições transitórias, prevê a elaboração de um “Código de Defesa do Consumidor” (art. 48, ADCT, CF). No art. 1º, CDC, inclusive, a própria lei já faz referência a tais previsões constitucionais.
[CF/88] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;
[CF/88] Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
(...)
V - defesa do consumidor;
[ADCT – CF/88] Art. 48. O Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborará código de defesa do consumidor.
[CDC] Art. 1° O presente código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos arts. 5°, inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias.
Observação: Superendividamento. O “superendividado” é aquele consumidor que tem mais passivo financeiro do que ativo financeiro, ou seja, que tem mais dívidas do que patrimônio. Trata-se da mesma definição de “insolvência” do Código Civil, mas aplicada à relação de consumo. De maneira mais simples, o “superendividado” poderia ser um “insolvente vulnerável”. Atualmente, o Direito Brasileiro já reconhece – e protege – a figura do “superendividado”. Entretanto, não há que se confundir o “superendividamento” com o endividamento comum (o qual se trata da existência de dívidas, mas também, paralelemente, da existência de capacidade de pagamento, como no caso do consumidor que compra algo parcelado, mas em quantidades que pode pagar ao longo de certo tempo pré-determinado).
Aulas 3 e 4 – 06/08/2018 e 07/08/2018
Programa – Aulas 3 e 4
2. Introdução ao Código de Defesa do Consumidor
2.1. Relação jurídica de consumo
2.1.1. Elementos subjetivos da relação jurídica de consumo
2.1.1.1. O consumidor
2.1.1.1.1. Primeiro conceito de “consumidor”: o consumidor padrão (art. 2º, caput, CDC)
2.1.1.1.2. Segundo conceito de consumidor (art. 2º, parágrafo único, CDC)
2.1.1.1.3. Terceiro conceito de consumidor (art. 29, CDC)
2.1.1.1.4. Quarto conceito de consumidor (art. 17, CDC)
Introdução ao Código de Defesa do Consumidor
· Entendimento geral: um Código sempre traz uma sistematização e estruturação de um conjunto de regras acerca de determinada disciplina do Direito. A Lei nº 8.078/90 institui o Código de Defesa do Consumidor (CDC), portanto, traz uma sistematização de regras. De maneira geral, o CDC traz um conjunto de:
· (i) Regras que serão abordadas nessa disciplina:
· (a) Regras de direito material civil (como as regras de responsabilidade civil);
· (b) Regras de direito processual civil (como os critérios de ônus da prova e as possibilidades de ações específicas).
· (ii) Regras que não serão abordadas nessa disciplina:
· (a) Regras administrativas (como a previsão do PROCON);
· (b) Regras penais (como os crimes contra o consumidor);
· (c) Regras de tutela coletiva (direitos individuais homogêneos e direitos difusos e coletivos).
· Normas básicas: de acordo com o art. 1º, CDC, o Código de Defesa do Consumidor traz um texto que abrange dois conceitos normatizadores básicos, que nortearão a aplicação de todos os outros artigos do diploma. Eles são:
[CDC] Art. 1° O presente código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos arts. 5°, inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias.
· (i) Normas de ordem pública: tendo em vista que as matérias do CDC são de ordem pública, as normas nele presentes são cogentes (obrigatórias) e inderrogáveis por interesse das partes (ou seja, as partes não podem delas desistir). Em termos processuais, as previsões processuais do CDC podem, então, ser reconhecidas a qualquer tempo, em qualquer grau de jurisdição, e o juiz poderá reconhecê-las de ofício (ou seja, sem provocação das partes).
· (ii) Normas de interesse social: tendo em vista que as matérias do CDC são de interesse social, as normas nele presentes são menos ligadas aos interesses dos particulares e mais aos interesses da Sociedade, tendo em vista o alto potencial de impacto das relações de consumo em um significativo número de pessoas, em razão da ideia de produção massificada.
Relação jurídica de consumo
· Entendimento: a aplicação do Código de Defesa do Consumidor leva em conta o aspecto subjetivo da relação jurídica, ou seja, é necessário que o indivíduo seja considerado um “consumidor” para que o CDC possa ser aplicável. É importante ressaltar que pode haver “consumo”, sem que a pessoa que consumiu seja considerada “consumidora”. Assim, tanto uma pessoa física, quanto uma pessoa jurídica que “consomem”, podem não ser “consumidoras”.
· Exemplo: na situação de uma empresa que compra um carro, trata-se de um “ato de consumo”, mas a empresa, por não se enquadrar nos elementos da relação jurídica de consumo, não será considerada “consumidora”.
· Elementos da relação jurídica de consumo: os elementos da relação jurídica de consumo podem ser divididos em três tipos. Os elementos subjetivos e objetivos, por sua complexidade, serão detalhados nas subseções seguintes. Eles são:
· (i) Elementos subjetivos: na relação jurídica de consumo, sempre haverá dois sujeitos, (a) o consumidor e (b) o fornecedor.
· (ii) Elementos objetivos (ou “prestação”): trata-se de ideia de se entregar um (a) produto ou um (b) serviço, ou seja, entregar uma prestação.
· (iii) Vínculo jurídico: trata-se do liame, ou ligação jurídica, presente entre os sujeitos da relação, em razão da prestação.
Elementos subjetivos da relação jurídica de consumo
· Entendimento: serão trabalhados, nesta seção, separadamente, (i) o consumidor e (ii) o fornecedor, os quais compõem os elementos subjetivos da relação jurídica de consumo.
O consumidor
· Entendimento: o CDC traz quatro diferentesconceitos de “consumidor”, que serão abordados nas subseções a seguir. Eles são:
· (i) Conceito do art. 2º, caput, CDC (consumidor padrão);
· (ii) Conceito do art. 2º, parágrafo único, CDC (consumidor equiparado);
· (iii) Conceito do art. 29, CDC (consumidor equiparado);
· (iv) Conceito do art. 17, CDC (consumidor equiparado).
Primeiro conceito de “consumidor”: o consumidor padrão (art. 2º, caput, CDC)
· Conceito de “consumidor”: o primeiro conceito de “consumidor” trazido pelo Código de Defesa do Consumidor é o do art. 2º, CDC. Ele traz três elementos principais:
· (i) Pessoa física ou jurídica: o consumidor pode ser tanto pessoa física, quanto pessoa jurídica.
[CDC] Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
· (ii) Aquele que adquire ou utiliza: via de regra, aquele que adquire um produto ou serviço será, também, aquele que o utiliza. Contudo, o consumidor pode ser tanto aquele que adquire, quanto aquele utiliza o produto, de maneira alternativa. No caso de um presente, por exemplo, alguém o “adquire” e um beneficiário vai “utilizá-lo”, mas ambos podem ser considerados “consumidores”.
· Desse elemento decorre a conclusão de que a relação jurídica de consumo, portanto, não implica, necessariamente, em relação contratual, como no caso daquele que recebe o presente.
[CDC] Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
· (iii) Destinatário final: há controvérsias na doutrina a respeito de qual seria o conceito de “destinatário final”. As duas principais teorias que tentam explicar o sentido do termo são:
[CDC] Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
· (a) Teoria maximalista (ou “teoria objetiva”): para esta teoria, o destinatário final é o chamado “destinatário fático”, que é aquele que tira o produto ou serviço do mercado de consumo.
· Assim sendo, por exemplo, se uma sociedade de advogados, pessoa jurídica, com mais de 150 advogados, compra um livro para consulta de todos os seus profissionais, ela o estaria retirando do mercado de consumo, assim, poderá ser considerada consumidora tanto quanto aquele que compra o livro individualmente, como pessoa física.
· A teoria maximalista, portanto, não cumpre os objetivos do próprio CDC, que seriam de apoiar a parte vulnerável.
· (b) Teoria finalista (ou “teoria subjetiva”): para esta teoria, além de ter que ser o “destinatário fático”, a pessoa também deve ser considerada “destinatário econômico”, o que significa que, além de retirar o produto do mercado de consumo, deve-se, também, pôr fim à cadeia de produção (ou seja, não é possível se utilizar o produto adquirido para continuar gerando renda em uma atividade econômica), para que possa ser considerado “destinatário final” e, portanto, consumidor.
· Diz-se que aquele que não coloca a fim à cadeia de produção, é o “consumidor intermediário”, que é aquele que (i) “consome” um insumo ou (ii) faz um incremento na atividade.
· Dentro desta teoria, a sociedade de advogados que compra o livro será “destinatário fático”, mas não será “destinatário econômico”, pois utilizará o livro para continuar a cadeia produtiva, por meio da confecção de peças jurídicas.
· O problema, no entanto, é que esta teoria ainda não é capaz de tutelar situações como a do pequeno produtor, que faz um financiamento em um Banco por meio de um contrato de adesão, para comprar uma máquina de colheita e melhorar sua produção. Neste caso, ele não seria o “destinatário econômico”, pois não colocaria fim à cadeia produtiva, mas, por certo, a relação não é igualitária, já que o Banco possui poder econômico significativamente maior que o produtor, o qual é, comparativamente, vulnerável.
Observação: A “teoria finalista mitigada”. No REsp 476428/SC, que discutia a aplicação do CDC ao caso de um hotel, que comprava gás de um fornecedor para poder desenvolver sua atividade econômica, o STJ assumiu um posicionamento de mitigação, ou relativização, da aplicação da teoria finalista. Para esta corrente da teoria, o “destinatário final” (e, portanto, o consumidor), seria aquele que (i) é destinatário fático (pois tira o produto do mercado de consumo) e (ii), não necessariamente é “destinatário econômico” (ou seja, não necessariamente põe fim à cadeia produtiva”), mas comprova sua vulnerabilidade econômica no caso concreto. Para o STJ, portanto, vale a “teoria finalista mitigada” (ou “teoria finalista aprofundada”, ou “teoria finalista temperada), que implica que o reconhecimento de uma pessoa como um “consumidor” depende do caso concreto.
Observação: O “consumidor intermediário” e a aplicabilidade da “teoria finalista mitigada”. O “consumidor intermediário” é justamente aquele que não põe fim à cadeia produtiva, pois (i) “consome” um insumo ou (ii) faz um incremento na atividade. Frente a este conceito, deve-se aplicar o entendimento de “Teoria finalista mitigada”, do STJ, questionando, no caso concreto, a vulnerabilidade da pessoa em questão. Na situação de uma grande empresa de telefonia, que compra produtos para melhorar sua prestação de serviços (incrementando, portanto, sua atividade), ela é o “destinatário fático”, mas não é “destinatário econômico”, pois não põe fim à cadeia produtiva e não é vulnerável. Diferentemente, o pequeno produtor, que faz um financiamento em um Banco para comprar sementes (insumos), não seria o “destinatário econômico”, pois não colocaria fim à cadeia produtiva, mas, por certo, não se encontra em uma relação igualitária, já que o Banco possui poder econômico significativamente maior que o produtor, o qual é, comparativamente, vulnerável.
· Tipos de vulnerabilidade: de maneira geral, há quatro tipos de vulnerabilidade, aplicáveis ao conceito de consumidor padrão, do art. 2º, caput, CDC. Eles são:
· (i) Vulnerabilidade fática: é a vulnerabilidade na qual fica evidenciado que há um desequilíbrio no poder econômico, ou seja, quando o fornecedor impõe seu poder econômico ao consumidor. É por isso que, em uma relação de compra e venda entre duas grandes empresas, não se caracteriza, a princípio, a relação de consumo, visto que não há desequilíbrio de poder econômico.
· (ii) Vulnerabilidade jurídica: é a vulnerabilidade na qual fica evidenciado que não há orientação jurídica, pela parte consumidora, com relação ao entendimento das consequências jurídicas da obrigação contraída, de modo a se desvencilhar das abusividades do mercado.
· (iii) Vulnerabilidade técnica: é a vulnerabilidade na qual fica evidenciado que não há domínio técnico, pela parte consumidora, com relação ao produto ou serviço prestado pelo fornecedor (por exemplo, alguém que contrata um serviço de mecânica para conserto de carro, sem entender tecnicamente de mecânica).
· (iv) Vulnerabilidade informacional: é a vulnerabilidade que ocorre quando, na apresentação do produto ou serviço, falta alguma informação crucial que poderia afetar a decisão do consumidor em consumi-lo ou não (por exemplo, um smartphone que não traz, no anúncio pela internet, a capacidade de memória). As famosas “letrinhas miúdas” são um bom exemplo de vulnerabilidade informacional. Modernamente, inclusive, até o excesso de informação pode ser considerado como vulnerabilidade informacional, pois dificulta a compreensão dos pontos realmente importantes, que de fato afetariam a decisão de compra do produto.
Observação: Diferença entre vulnerabilidade e hipossuficiência. A vulnerabilidade é um pressuposto para o conceito de consumidor, enquanto a hipossuficiência é a dificuldade, demonstrada no caso concreto, de realizar prova. Dentro do Direito do Consumidor, portanto, entende-se que o termo “hipossuficiência” se relaciona a uma situação processual, na qual o consumidor tem impossibilidade ou significativa dificuldade em produzir uma prova a respeito de algum aspecto da relação jurídica, como constante do art. 6º, VIII, CDC (não se confunde o conceitode “hipossuficiência” do CDC com o conceito geral, que costuma ser associado a fragilidade da situação econômica).
Assim sendo, todo consumidor é vulnerável (visto que a vulnerabilidade, como já se viu, é um pressuposto para o conceito de consumidor), mas nem todo consumidor será hipossuficiente.
É importante observar que a regra, mesmo no processo que lida com a relação de consumo, é de que o ônus da prova é de quem alega (art. 373, I e II, CPC), assim, mesmo no âmbito do CDC, é necessário que o advogado peça a inversão do ônus da prova, na forma do art. 373, §1º, CPC, com esteio no art. 6º, VIII, CDC.
[CDC] Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
[CPC] Art. 373. O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
§1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.
Observação: Hipervulnerabilidade. Trata-se da situação em que determinada pessoa já está em uma ou mais situações de vulnerabilidade (como em um idoso, um turista, ou um analfabeto) e, ainda, se encontra em relação de consumo, caracterizada por outra instância de vulnerabilidade. É como uma “vulnerabilidade ao quadrado”, no caso, por exemplo, do consumidor turista, ou do consumidor idoso.
O tratamento processual dado a situações de hipervulnerabilidade costuma ser de maior rigor (por exemplo, com um valor de indenização por danos morais mais elevada). O “superendividado”, que é aquele consumidor que tem mais passivo financeiro do que ativo financeiro, ou seja, que tem mais dívidas do que patrimônio, também pode ser entendido como um hipervulnerável.
Observação: Inexistência de relação de consumo no condomínio. Entende-se que, no caso do condomínio, não há relação de consumo entre o condômino e o condomínio, visto seu disciplinamento específico por regras do Código Civil. Se, no entanto, o condomínio contrata um serviço de outra empresa, poderá haver caracterização de relação de consumo entre o condomínio (pessoa jurídica) e a empresa fornecedora do serviço. O mesmo ocorre quanto aos próprios condôminos, que também podem ser considerados consumidores da empresa de serviços. Por exemplo, no caso de um elevador que deixa de funcionar, tanto a totalidade dos condôminos, quanto apenas um deles, poderá buscar tutela jurisdicional com base no CDC.
Segundo conceito de consumidor (art. 2º, parágrafo único, CDC)
· Entendimento: o segundo conceito de “consumidor” trazido pelo Código de Defesa do Consumidor é o do art. 2º, parágrafo único, CDC. Ele é utilizado em situações de direito coletivos, difusos e individuais homogêneos, e traz dois elementos principais:
[CDC] Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
· (i) Coletividade: este conceito de consumidor, em verdade, se trata de uma equiparação de determinada coletividade de pessoas, mesmo não sendo possível identificar, na individualidade, quais seriam os consumidores afetados (visto o termo “ainda que indetermináveis”), a uma condição de consumidor, para que se possa aplicar o CDC.
· (ii) Consumidor potencial: dentro deste conceito de consumidor, não é necessário que todas as pessoas em questão tenham efetivamente adquirido ou utilizado o produto ou serviço, mas sim que poderiam adquiri-lo ou utiliza-lo, ou seja, importa serem “consumidores em potencial”.
Terceiro conceito de consumidor (art. 29, CDC)
· Entendimento: o terceiro conceito de “consumidor” trazido pelo Código de Defesa do Consumidor é o do art. 29, CDC. Ele é significativamente semelhante ao conceito do art. 2º, parágrafo único, CDC, visto que também tutela (i) a coletividade e (ii) o consumidor potencial (visto o termo “todas as pessoas determináveis ou não”), e, da mesma forma, pode ser utilizado em situações de direito coletivos, difusos e individuais homogêneos.
· A maior diferença deste conceito de consumidor equiparado para os outros é que ele se aplica, de maneira mais específica, às práticas comerciais, dentre as quais estão as situações que envolvem (a) oferta, (b) publicidade, (c) cláusulas abusivas, (d) bancos de dados de cadastros de consumidores inadimplentes (os famosos cadastro de “nome sujo”), entre outras situações abordadas nos capítulos V e VI do CDC.
CAPÍTULO V
Das Práticas Comerciais
SEÇÃO I
Das Disposições Gerais
[CDC] Art. 29. Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas.
(...)
CAPÍTULO VI
Da Proteção Contratual
(...)
Quarto conceito de consumidor (art. 17, CDC)
· Entendimento: o quarto conceito de “consumidor” trazido pelo Código de Defesa do Consumidor é o do art. 17, CDC. Ele é utilizado em situações nas quais ocorre um “acidente de consumo” (seja ele fato do produto ou fato do serviço, como constante da seção 4.2.1), o qual se dá quando há violação à saúde ou segurança de um consumidor. Seu efeito é de que, em termos de responsabilidade civil, se equiparam ao consumidor aqueles que também foram vítimas do acidente.
[CDC] Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.
· Exemplo: um avião cai em cima de diversas casas por falha mecânica. Os passageiros do avião são consumidores no conceito padrão e as outras pessoas lesionadas (que sofreram danos à saúde, portanto) são consumidoras pelo conceito equiparado do art. 17, CDC. É importante observar que os donos das casas que não estavam em suas residências naquele momento (ou seja, que sofreram dano patrimonial, mas não danos à saúde), via de regra, não seriam consumidores, tendo que buscar reparação pelas regras gerais do Código Civil.
· Outro exemplo: segurança armado terceirizado que está em uma agência bancária. Em caso concreto de assalto dentro da agência em que há roubo do dinheiro do banco e do celular do segurança. O segurança entra na Justiça, contra o Banco, pedindo indenização pelo celular roubado e aplicação do CDC, com base no art. 17, CDC, por ter sido vítima de um evento (acidente de consumo).
· Como argumentos de defesa, o Banco argumentou que o art. 3º, §2º, CDC, aponta que, (i) nas relações trabalhistas, não há consumo, e (ii) que o segurança é que teria o dever de garantir a segurança do estabelecimento. Neste caso (que é concreto) o juiz do caso aplicou o CDC, em benefício do segurança.
[CDC] Art. 3º. (...)
(...)
§2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
Aulas 5 e 6 – 13/08/2018 e 14/08/2018
Programa – Aulas 5 e 6
2.1.1.2. O fornecedor
2.1.2. Elementos objetivos da relação jurídica de consumo
2.1.2.1. Produto
2.1.2.2. Serviço
2.1.2.2.1. Serviços públicos
2.2. Tutela do Consumidor
O fornecedor
· Entendimento: para o Sistema de Defesa do Consumidor, “fornecedor” é um gênero, do qual o art. 3º, CDC, traz as espécies. Os elementos mais importantes do conceito são:
[CDC] Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvematividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
· (i) Amplitude da atividade: o fornecedor, para o CDC, é desde aquele que fabrica, dando início à cadeia produtiva, passando por aquele que transforma e monta, até o distribuidor, responsável pela venda ao consumidor final. O Código, portanto, tenta ser o mais amplo possível em sua delimitação, de modo a abranger todos os passos da cadeia produtiva.
· (ii) Pessoa: o fornecedor pode ser tanto pessoa física, quanto jurídica. Exemplos de pessoa física são artesãos ou vendedores de rua que não estejam formalizados (mas que cumpram os outros requisitos). Entes despersonalizados também podem ser enquadrados como sujeitos da relação de consumo, dependendo do caso. Um exemplo de ente despersonalizado que frequentemente é entendida como fornecedor é a sociedade de fato (ou sociedade irregular), que é a sociedade que funciona como empresária, mas que não tem registro constituído na Junta Comercial.
· (iii) Desempenho de atividade: a atividade de fornecimento deve ter algumas características básicas. Elas são:
· (a) Atividade habitual: a atividade de fornecimento deve ser desempenhada de maneira habitual. Uma Universidade particular, portanto, pode ser considerada fornecedora quando o objeto for a prestação de serviços de educação, que é sua atividade habitual. Contudo, se a Universidade vende um carro para um de seus alunos, a relação não será de consumo porque a venda de carros não é uma atividade habitual.
· (b) Atividade profissional: a atividade de fornecimento deve ser desempenhada de maneira profissional, ou seja, como atividade de trabalho do fornecedor, com algum nível de organização e controle.
· (c) Atividade de natureza econômica: a atividade de fornecimento deve ter natureza econômica, ou seja, deve ter como objetivo a troca de valores monetários.
· (d) Disponibilização no mercado de consumo: a atividade de fornecimento deve disponibilizar o produto ou serviço no mercado de consumo, ou seja, deve disponibilizá-lo para consumidores.
Observação: O caso da Sociedade de Advogados. Não se discute que a atividade advocatícia tenha habitualidade, que seja profissional e que seja de natureza econômica, contudo, parte da doutrina e da jurisprudência entende que, por ele não ser disponibilizado no mercado de consumo (visto que o Estatuto da Advocacia proíbe a veiculação de propaganda e tem uma série de restrições quanto à mercantilização da atividade), a sociedade de advogados não estaria concorrendo em pé de igualdade com outras sociedades empresárias no mercado e, portanto, na relação entre cliente e advogado, não se poderia aplicar o CDC. Outra parte da doutrina e da jurisprudência entende que o CDC seria aplicável, pois os serviços estariam disponíveis para quem quisesse, ou seja, o simples fato de se poder ter acesso ao serviço já caracterizaria a disponibilização no mercado de consumo. No TJDFT, há divergência entre os magistrados e ambos os entendimentos são aplicados.
Elementos objetivos da relação jurídica de consumo
· Entendimento: serão trabalhados, nesta seção, separadamente, (i) o produto e (ii) o serviço, os quais compõem os elementos objetivos da relação jurídica de consumo.
Produto
· Entendimento: de acordo com o art. 3º, §1º, CDC, produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material (envolvendo todos os bens corpóreos, nos quais se pode tocar) ou imaterial (envolvendo softwares, produções musicais, ente outros bens nos quais não se pode tocar).
[CDC] Art. 3°. (...)
§1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
Observação: Associações sem fins lucrativos como fornecedoras. Quanto à Associações, cuja característica principal é a ausência de fins lucrativos, o STJ entende que também é possível que sejam consideradas fornecedoras quando os requisitos se verificam (como no caso do Projeto Tamar, na Bahia, que vende, habitualmente, de maneira profissional e com natureza econômica, camisetas que vão para o mercado de consumo, é possível aplicar o CDC em caso de vícios nas camisetas). Isso vale tanto para produtos, quanto para serviços (como no caso de uma Associação que, anualmente, cobra ingressos para uma tradicional festa junina).
Serviço
· Entendimento: de acordo com o art. 3º, §2º, CDC, serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
Observação: Remuneração como requisito para o reconhecimento de um serviço. Quanto à característica de remuneração, é importante observar que há dois tipos de remuneração, (i) a direta e (ii) a indireta. Nos casos de serviços gratuitos de estacionamento, por exemplo, nos quais a empresa alega não ser fornecedora quando há um vício no estacionamento, entende-se que a empresa pode, sim, ser fornecedora, visto que tem remuneração indireta ao utilizar a estratégia do estacionamento gratuito como um chamariz de vendas. O mesmo ocorre para o uso de transportes ou outros serviços por idosos em usufruto de gratuidade, onde se entende que a remuneração é indireta porque o preço das gratuidades é repassado aos consumidores pagantes.
[CDC] Art. 3°. (...)
(...)
§2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
Serviços públicos
· Entendimento: é possível, em alguns casos, a aplicação do CDC em relações envolvendo pessoas jurídicas de direito público e privado, com base no art. 4º, VII, CDC, cominado com o art. 6º, X, CDC, e com o art. 22, CDC. De maneira mais detalhada, tem-se, quanto à diferenciação entre pessoas jurídicas de Direito Público e pessoa jurídicas de Direito Privado:
[CDC] Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)
(...)
VII - racionalização e melhoria dos serviços públicos;
[CDC] Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.
[CDC] Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.
Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.
· (i) Pessoas jurídicas de direito público: nos casos de pessoas jurídicas de direito público (que são aquelas descritas no art. 41, CC, como a União, Estados, Municípios, DF, autarquias, fundações de direito público, entre outras), é possível que sejam fornecedoras quando se verificam todos os requisitos, em especial o (a) da remuneração específica e (b) do mercado de consumo, assim, é aplicável o CDC.
· Exemplo: fundações de direito público que são responsáveis pela administração de um espaço público no qual promovem shows com entrada cobrada (remuneração específica para a prestação do serviço do show e colocação do serviço no mercado de consumo, além de estarem presentes as características da natureza econômica, da habitualidade e do profissionalismo), poderão ser consideradas fornecedoras. Contrariamente, se falta vacina em um hospital público, não é possível a aplicação do CDC, visto que os recursos que financiam tal vacina advêm de impostos, ou seja, não há remuneração específica, nem natureza econômica.
· Outro exemplo: um Município queadministra a venda de jazigos, em um cemitério municipal, para famílias. Neste caso, o pagamento dos jazigos se trata de remuneração específica, disponibilizado a todos os interessados (ou seja, colocado no mercado de consumo), com natureza econômica, prestado de maneira habitual e profissional, assim, o Município será um fornecedor.
[CC] Art. 41. São pessoas jurídicas de direito público interno:
I - a União
II - os Estados, o Distrito Federal e os Territórios;
III - os Municípios;
IV - as autarquias, inclusive as associações públicas; (Redação dada pela Lei nº 11.107, de 2005)
V - as demais entidades de caráter público criadas por lei.
Parágrafo único. Salvo disposição em contrário, as pessoas jurídicas de direito público, a que se tenha dado estrutura de direito privado, regem-se, no que couber, quanto ao seu funcionamento, pelas normas deste Código.
· (ii) Pessoas jurídicas de direito privado: nos casos de pessoas jurídicas de direito privado que sejam prestadoras de serviços públicos, em razão de concessões (art. 175, CF), também há possibilidade de aplicação do CDC, desde que se verifiquem, da mesma forma, todos os requisitos, em especial o (a) da remuneração específica e (b) do mercado de consumo.
· Exemplo: a CAESB ou a CEB, que cobram remuneração específica por aquilo que é efetivamente consumido (excetuando a porcentagem destas contas que são atribuídas às taxas públicas, pois estas não são individualizadas), e que colocam os serviços diretamente no mercado de consumo, além de estarem presentes as características da natureza econômica, da habitualidade e do profissionalismo.
[CF/88] Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.
· Classificação dos serviços quanto à utilidade e sua relação com a aplicabilidade ou não do CDC: quanto à utilidade, os serviços podem ser de dois tipos. Eles são:
· (i) Serviços “uti universi”: são aqueles prestados a toda a coletividade, que são financiados por meio de impostos, os quais, por definição, não podem ser atrelados, especificamente, a uma atividade. Assim, nos casos de serviços “uti universi”, não há o requisito da remuneração específica, e, portanto, não podem ser tutelados pelo CDC, por não se verificar relação de consumo.
· Exemplo: se falta vacina em um hospital público, não é possível a aplicação do CDC, visto que os recursos que financiam tal vacina advêm de impostos, ou seja, não há remuneração específica, nem natureza econômica.
· (ii) Serviços “uti singuli”: são aqueles prestados, de maneira individualmente discriminada, para cada indivíduo. Assim, nos casos de serviços “uti singuli”, é possível a aplicação do CDC por estar verificada a relação de consumo.
· Exemplo: o fornecimento de energia elétrica feito pela CEB, que cobra remuneração específica pela energia elétrica que é efetivamente consumida. Na discussão desses valores, portanto, é possível se aplicar o CDC. Nas contas de luz, no entanto, há também uma parte do valor que é atribuída à taxa de iluminação pública, que não é individualizada e, portanto, para a qual não se aplica o CDC.
· Princípio da continuidade do serviço público essencial: de acordo com o art. 22, CDC, no caso de serviços públicos considerados indispensáveis para a comunidade, atua o Princípio da continuidade do serviço público essencial. A listagem dos serviços públicos considerados essenciais está nos arts. 10 e 11, Lei nº 7.783/89 (Lei de Greve).
· É importante ressaltar que, no entanto, não é por se tratar de serviço essencial que não é possível cortar o fornecimento por inadimplemento. Dizer que um serviço público é essencial significa que o Poder Público não pode parar de prestar o serviço, mas o consumidor ainda está obrigado à contraprestação, podendo ser suspenso em caso de inadimplemento, desde que após notificação prévia e desde que não ofenda ao interesse público, nos termos do art. 6º, §3º, II, Lei nº 8.987/95 (Lei de Concessões).
· Nos casos de hospital públicos ou privados, portanto, como o serviço prestado é de interesse público, mesmo que o pagamento de energia elétrica não se verifique (tanto se o dono for empresa privada, quanto se for um Município ou outro ente público), não há possibilidade de retirada da prestação.
[CDC] Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.
Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.
[Lei nº 7.783/89 - Lei de Greve] Art. 10 São considerados serviços ou atividades essenciais:
I - tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;
II - assistência médica e hospitalar;
III - distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;
IV - funerários;
V - transporte coletivo;
VI - captação e tratamento de esgoto e lixo;
VII - telecomunicações;
VIII - guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares;
IX - processamento de dados ligados a serviços essenciais;
X - controle de tráfego aéreo;
XI - compensação bancária.
[Lei nº 7.783/89 - Lei de Greve] Art. 11. Nos serviços ou atividades essenciais, os sindicatos, os empregadores e os trabalhadores ficam obrigados, de comum acordo, a garantir, durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.
Parágrafo único. São necessidades inadiáveis, da comunidade aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população.
[Lei nº 8.987/95 - Lei de Concessões] Art. 6º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.
(...)
§3º Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando:
I - motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações; e,
II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade.
Tutela do Consumidor
· Entendimento: a tutela do consumidor, dentro do Código de Defesa do Consumidor e do Sistema de Defesa do Consumidor, é feita de duas formas, que são a (i) a proteção aos direitos básicos do consumidor e (ii) proteções específicas.
· (i) Direitos básicos: os direitos básicos são aqueles que visam tutelar o consumidor de forma básica. São extraídos de princípios gerais do CDC. Alguns destes direitos estão listados em rol exemplificativo, no art. 6º, CDC. Por sua importância, alguns destes direitos serão trabalhados separadamente, nas seções seguintes. Eles serão:
· (a) Direito à informação;
· (b) Tutela contratual;
· (c) Tutela da prevenção e reparação de danos;
· (d) Tutela processual do consumidor:
· (I) Domicílio do consumidor;
· (II) Inversão do ônus da prova.
· (ii) Direitos específicos: tratam-se de outros direitos do consumidor, extraídos de princípios específicos do CDC, como o princípio da precaução, o princípio da dimensão coletiva e o princípio da boa-fé objetiva, que serão trabalhados mais adiante.
Aula 7 – 20/08/2018
Programa – Aula 7
3. Direitos básicos do consumidor
3.1. Direito à informação
3.1.1. Aspectos significativos do direito à informação
3.1.2. Conceituação de informação
3.1.3. Categorias da informação
Direitos básicos do consumidor
· Proteção aos direitos básicos do consumidor: os direitos básicos são aqueles que visam tutelar o consumidor de forma básica. Alguns destes direitos estão listados em rol exemplificativo, no art. 6º, CDC. Alguns exemplos são o direito à informação, as regras de publicidade, a inversão do ônus da prova, dentre outros. Os principaisdireitos básicos serão apresentados detalhadamente nas seções seguintes.
[CDC] Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (Redação dada pela Lei nº 12.741, de 2012) Vigência
IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;
V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
IX - (Vetado);
X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.
Parágrafo único. A informação de que trata o inciso III do caput deste artigo deve ser acessível à pessoa com deficiência, observado o disposto em regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
· Deveres básicos do fornecedor: da própria proteção aos direitos básicos do consumidor, decorrem os deveres básicos do fornecedor, que nada mais são do que obrigações legais, também listadas, de maneira exemplificativa ao longo do CDC. Esses deveres podem ser de dois tipos:
· (i) Dever de prevenção: trata-se do dever que o fornecedor tem de, ao colocar no mercado um produto ou serviço que sabe (ou deveria saber) ser nocivo, informar sobre tal periculosidade (art. 9º, CDC).
[CDC] Art. 9° O fornecedor de produtos e serviços potencialmente nocivos ou perigosos à saúde ou segurança deverá informar, de maneira ostensiva e adequada, a respeito da sua nocividade ou periculosidade, sem prejuízo da adoção de outras medidas cabíveis em cada caso concreto.
· (ii) Dever de segurança: trata-se do dever que o fornecedor tem de assegurar que os produtos ou serviços, ao serem ofertados no mercado de consumo, sejam seguros e não causem danos, de qualquer espécie, aos consumidores (art. 8º, CDC).
[CDC] Art. 8° Os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu respeito.
Observação: O caso do recall (ou “rechamada”). O recall (ou, no português, “rechamada”) é a prática de solicitar a devolução de um lote ou de uma linha de produtos feita pelo próprio fabricante, que ocorre pela descoberta superveniente de problemas relativos à segurança do produto. Há previsão desta prática no art. 10, §1º, CDC.
[CDC] Art. 10. (...)
§1º O fornecedor de produtos e serviços que, posteriormente à sua introdução no mercado de consumo, tiver conhecimento da periculosidade que apresentem, deverá comunicar o fato imediatamente às autoridades competentes e aos consumidores, mediante anúncios publicitários.
Direito à informação
· Entendimento: o direito à informação, previsto no art. 6º, III, CDC, é um direito básico do consumidor, que consiste na necessidade de apresentação informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, de modo a estimular (a) o consumo consciente e (b) a liberdade de escolher. Para que estes elementos sejam adequadamente verificados, no entanto, a informação deve ser dada seguindo dois requisitos. Eles são:
· (i) Relevância: a informação deve ser relevante, ou seja, deve ser significativa para que o consumidor possa mudar de ideia a respeito de consumir ou não, caso conheça a informação.
· (ii) Disponibilidade: a informação deve ser disponível, o que significa que deve estar disponível ao fornecedor (ou seja, o fornecedor deveria ter acesso à tal informação antes da prestação do serviço ou da venda do produto).
[CDC] Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (Redação dada pela Lei nº 12.741, de 2012) Vigência
Aspectos significativos do direito à informação
· Termo de consentimento informado: o termo de consentimento informado é uma ferramenta, utilizada pelo fornecedor, para garantir o direito à informação do consumidor, em respeito às regras do CDC. Trata-se de um documento em que todos os riscos do produto ou serviço são apresentados, para que o consumidor possa exercer sua decisão de maneira informada. A assinatura do consumidor atesta que o termo foi lido e que a informação foi passada.
· Exemplo: é muito comum o uso de termos de consentimento informado nos procedimentos médicos-cirúrgicos.
· Extensão da proteção ao direito à informação às fases pré e pós-contratual: antes de qualquer contrato, há uma fase pré-contratual, chamada de fase de oferta, na qual pode haver uma oferta (que é aquela feita sem um indivíduo específico como alvo) ou uma proposta (que é feita para um indivíduo específico). Após a formalização do acordo de vontades, há a fase de execução, enquanto as prestações estão sendo realizadas. Depois da finalização do contrato, há a fase pós-contratual, na qual se discutem aspectos como a garantia e o fornecimento de peças de reposição. O direito à informação está presente em todas estas fases e sua negativa, em qualquer delas, pode ensejar aplicação do CDC.
Conceituação de informação
· Entendimento: o conceito moderno de informação tem dois aspectos. Eles são:
· (i) Aspecto formal: é o aspecto da informação que indica que ela deve estar presente, ou seja, deve existir.
· (ii) Aspecto material: é o aspecto da informação que indica que ela, além de estar presente, a informação deve ser suficiente para efetivamente cumprir os requisitos de relevância e disponibilidade. A ideia do reconhecimento do aspecto material do conceito é, justamente, de que o fornecedor não se desincumbe do direito de informar em duas hipóteses (as quais devem ser analisadas frente a cada caso concreto):
· (a) Quando a informação é insuficiente, ou
· (b) Quando a informação é dada em excesso, mas de forma pouco clara, com informações irrelevantes entremeadas às informações relevantes.
Observação: Exemplo de aplicação do direito à informação em um caso concreto. O REsp nº 1.562.700/SP tratou da condenação de uma empresa de turismo pela falta de informações acerca da necessidade de visto de trânsito para cumprir determinados trechos de um trajeto de viagem, constituindo excelente exemplo de aplicação do direito à informação em um caso concreto.
RECURSO ESPECIAL. TRANSPORTE AÉREO. CONSUMIDOR. DEVER DE INFORMAÇÃO. NECESSIDADE DE VISTO DE CONEXÃO EM VOO INTERNACIONAL. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. INOCORRÊNCIA DE CULPA EXCLUSIVA OU CONCORRENTE DA VÍTIMA. INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL.
1. Polêmica em torno da responsabilidade civil de empresa de viagens credenciada por companhia aérea ao emitir bilhetes de viagem internacional (Estados Unidos), através do programa de milhagem,sem informar aos consumidores adquirentes acerca da necessidade obtenção de visto também do país onde o voo de retorno faria breve conexão (Canadá).
2. Necessidade de prestação de informações completas aos consumidores, inclusive acerca da exigência de obtenção de visto de trânsito para hipótese de conexão internacional por parte de empresa que emite as passagens aéreas.
3. Informações adequadas e claras acerca do serviço a ser restado constituem direito básico do consumidor (art. 6º, III, do CDC).
4. Informações insuficientes ou inadequadas tornam o serviço defeituoso, ensejando responsabilidade pelo fato do serviço (art. 14, caput, do CDC) e a obrigação de reparar os danos causados aos consumidores.
5. Não caracterização da culpa exclusiva ou concorrente dos consumidores demandantes por não terem obtido visto do país em que ocorreria conexão do voo de retorno (Canadá).
6. Procedência da demanda, restabelecendo-se as parcelas indenizatórias concedidas pelo acórdão que julgou a apelação.
7. Precedente jurisprudencial específico desta Terceira Turma.
8. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
(REsp nº 1562700 / SP, relator Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, STJ, DJe de 15/12/2016)
Categorias da informação
· Entendimento: a doutrina e a jurisprudência (em especial o REsp nº 586.316/MG) definem quatro categorias de informação. Elas são:
· (i) Informação-conteúdo: trata-se do fornecimento de informações a respeito das características do produto ou serviço, como a informação a respeito da cor de um carro.
· (ii) Informação-utilização: trata-se do fornecimento de informações a respeito do uso do produto ou serviço, como os manuais de um carro.
· (iii) Informação-preço: trata-se do fornecimento de informações a respeito do custo e formas de pagamento, como a impossibilidade de pagamento parcelado ou sobre aceitação ou não de determinadas formas de pagamento.
Observação: Formas de pagamento e negativa de fornecimento. De acordo com a Lei nº 13.455/2017, o fornecedor poderá estabelecer preços diferenciados de acordo com a forma de pagamento (dinheiro, débito, crédito, etc), desde que o direito à informação seja respeitado. É possível, inclusive, que o fornecedor se negue a fornecer o produto se este for pago de qualquer forma que não seja o dinheiro. A vedação à recusa de pagamento em dinheiro está positivada no art. 39, IX, CDC.
[CDC] Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)
(...)
IX - recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais; (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)
· (iv) Informação-aderência: trata-se do fornecimento de informações a respeito dos riscos do produto ou serviço, como um aviso gráfico (caveira) que informe sobre a periculosidade de um produto tóxico.
DIREITO DO CONSUMIDOR. ADMINISTRATIVO. NORMAS DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR. ORDEM PÚBLICA E INTERESSE SOCIAL. (...)
(...)
7. Entre os direitos básicos do consumidor, previstos no CDC, inclui-se exatamente a “informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem” (art. 6°, III).
8. Informação adequada, nos termos do art. 6°, III, do CDC, é aquela que se apresenta simultaneamente completa, gratuita e útil, vedada, neste último caso, a diluição da comunicação efetivamente relevante pelo uso de informações soltas, redundantes ou destituídas de qualquer serventia para o consumidor.
9. Nas práticas comerciais, instrumento que por excelência viabiliza a circulação de bens de consumo, “a oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores” (art. 31 do CDC)
10. A informação deve ser correta (= verdadeira), clara (= de fácil entendimento), precisa (= não prolixa ou escassa), ostensiva (= de fácil constatação ou percepção) e, por óbvio, em língua portuguesa.
11. A obrigação de informação é desdobrada pelo art. 31 do CDC, em quatro categorias principais, imbricadas entre si: a) informação-conteúdo (= características intrínsecas do produto e serviço), b) informação-utilização (= como se usa o produto ou serviço), c) informação-preço (= custo, formas e condições de pagamento), e d) informação-advertência (= riscos do produto ou serviço).
12. A obrigação de informação exige comportamento positivo, pois o CDC rejeita tanto a regra do caveat emptor como a subinformação, o que transmuda o silêncio total ou parcial do fornecedor em patologia repreensível, relevante apenas em desfavor do profissional, inclusive como oferta e publicidade enganosa por omissão.
(...)
21. Existência de lacuna na Lei 10.674/2003, que tratou apenas da informação-conteúdo, o que leva à aplicação do art. 31 do CDC, em processo de integração jurídica, de forma a obrigar o fornecedor a estabelecer e divulgar, clara e inequivocamente, a conexão entre a presença de glúten e os doentes celíacos.
22. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.
(REsp nº 586316 / MG, relator Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, STJ, DJe de 19/03/2009).
Aula 8 – 21/08/2018
Programa – Aula 8
3.2. Tutela contratual
3.3. Tutela da prevenção e reparação de danos
Tutela contratual
· Entendimento: a tutela contratual, prevista no art. 6º, V, CDC, é um direito básico do consumidor, que consiste na possibilidade de o Estado intervir na relação entre os particulares, por meio da modificação de cláusulas contratuais que impliquem em onerosidade excessiva.
[CDC] Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;
· Teoria da base do rompimento do negócio versus teoria da imprevisão:
· (i) Teoria do rompimento da base objetiva do negócio (ou “teoria do rompimento da base do negócio”): prevista no art. 6º, V, CDC, a teoria do rompimento da base objetiva do negócio permite que o Estado intervenha na relação entre os particulares, por meio da modificação de cláusulas contratuais que impliquem em onerosidade excessiva, mesmo que por situações já previstas em contrato (ou seja, não há necessidade de fato imprevisível).
· Esta teoria não pode ser aplicada quando a desvantagem é para o fornecedor, visto que sua aplicação visa a tutela do consumidor (que é a parte vulnerável), como disposto do art. 6º, caput, CDC.
· (ii) Teoria da imprevisão: prevista no art. 478, CC, a teoria da imprevisão também permite que o Estado intervenha na relação entre os particulares, por meio da modificação de cláusulas contratuais que impliquem em onerosidade excessiva, desde que haja ocorrência de fato imprevisível (além dos requisitos de onerosidade excessiva ou extrema vantagem de uma das partes).
· Esta teoria pode ser aplicada quando a desvantagem é para o fornecedor.
[CC] Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.
Tutela da prevenção e reparação de danos
· Entendimento: a tutela da prevenção e reparação de danos, prevista no art. 6º, VI, CDC, é um direito básico do consumidor, que consiste na necessidade de reparação integral, pelo fornecedor, quando da ocorrência de qualquer dano ao consumidor.
[CDC] Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
VI -a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
Observação: Abrangência da reparação integral. O texto do art. 6º, VI, CDC, tenta abranger uma “reparação integral”, de modo que envolve:
· (i) Dano moral (que ocorre quando há violação aos direitos da personalidade);
· (ii) Dano patrimonial: incluindo, este último, suas duas acepções. Elas são:
· (a) Dano emergente
· (b) Lucro cessante,
· (iii) Dano estético (que já se entende como dano autônomo, nos termos da Súmula nº 387, STJ).
Súmula nº 387, STJ
É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral.
· Tarifação e tabelamento do dano: a tarifação e tabelamento nada mais são do que a atribuição de um valor monetário fixo para determinada ocorrência de dano, de acordo com uma tabela pré-determinada. Trata-se de prática comum no mercado, contudo, a ideia de reparação integral do CDC permite que este valor seja ultrapassado, caso se prove que o dano foi em valor superior àquele tabelado.
Observação: Relação entre CDC e tratados internacionais. Quando o tabelamento, no entanto, é feito com base em tratado internacional, pode haver mitigação da aplicação da ideia de reparação integral. No RE 636331, o Min. Gilmar Mendes decidiu que, em face do tabelamento previsto na Convenção de Montreal e da previsão do art. 178, CF, quando (i) o passageiro não declara o valor do que está transportando e (ii) o voo é internacional, será possível limitar o dano material de acordo com tabela pré-determinada. Não há limitações, no entanto, ao valor de dano moral pedido. Esta mitigação também não é possível em voos domésticos.
[CF/88] Art. 178. A lei disporá sobre a ordenação dos transportes aéreo, aquático e terrestre, devendo, quanto à ordenação do transporte internacional, observar os acordos firmados pela União, atendido o princípio da reciprocidade. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 7, de 1995)
Parágrafo único. Na ordenação do transporte aquático, a lei estabelecerá as condições em que o transporte de mercadorias na cabotagem e a navegação interior poderão ser feitos por embarcações estrangeiras. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 7, de 1995)
· Limitação da reparação integral para a pessoa jurídica: de acordo com o art. 51, I, segunda parte, CDC, nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis.
[CDC] Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis;
Observação: Dano moral coletivo. O dano moral individual é aquele que ocorre quando há violação aos direitos da personalidade. No entanto, apesar de já se entender que a pessoa jurídica tem alguns direitos da personalidade (como a honra objetiva, associada a seu nome social), não há vinculação destes direitos de personalidade ao dano moral coletivo. Assim, quanto ao dano moral coletivo, já se entende que é possível sua fixação, independentemente de prova de dano à direitos de personalidade, com o objetivo de prevenir a prática de novos atos e punir o infrator. O dinheiro destas indenizações vai para um fundo específico. No DF, há um Fundo de Proteção ao Consumidor (FDPC). Casos célebres de dano moral coletivo são o da empresa que fez remédios contraceptivos placebo, que fez com que diversas mulheres engravidassem, e da TIM, que prometia ligações ilimitadas a 25 centavos, mas cortava propositalmente ligações que ultrapassavam certo tempo. Com base na ideia de reparação integral, o reconhecimento de dano moral coletivo também não impede o reconhecimento de reparação (moral e/ou patrimonial) em ação individual.
Observação: Teoria do dano moral pelo desvio produtivo do consumidor. Modernamente, entende-se que o tempo é um bem jurídico que deve ser protegido, assim, com base na ideia de reparação integral, será possível fixar dano moral com base na perda de tempo útil (de acordo com a ideia da teoria do “dano moral pelo desvio produtivo do consumidor”). Já há julgados em diversos tribunais reconhecendo tal teoria, mas ainda não há formação de teoria majoritária nesse sentido.
Aulas 9 e 10 – 27/08/2018 e 28/08/2018
Programa – Aulas 9 e 10
3.4. Tutela processual do consumidor
3.4.1. Domicílio do consumidor
3.4.2. Inversão do ônus da prova
3.4.2.1. Disposições básicas sobre Teoria Geral da Prova
3.4.2.2. Regra geral do ônus da prova
3.4.2.3. Regra do CDC: a inversão do ônus da prova
Tutela processual do consumidor
· Entendimento: como direitos básicos do consumidor, o CDC traz, além das proteções materiais (como o direito à informação, o a tutela contratual e a tutela da prevenção e reparação de danos), também determinadas proteções processuais, igualmente destinadas a equilibrar a relação de vulnerabilidade, mas sob uma perspectiva processual.
Domicílio do consumidor
· Entendimento: em uma ação de responsabilidade civil, o consumidor tem a prerrogativa de ajuizamento em seu domicílio (art. 101, I, CDC). Trata-se de uma faculdade do consumidor, que passa a poder ajuizar a ação tanto em seu domicílio, quanto no domicílio do réu, de acordo com sua conveniência. É, portanto, uma forma processual de proteção ao consumidor, que contraria a regra geral do Processo Civil, na qual o ajuizamento deve ser feito no domicílio do réu (art. 46, caput, CPC).
[CDC] Art. 101. Na ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos e serviços, sem prejuízo do disposto nos Capítulos I e II deste título, serão observadas as seguintes normas:
I - a ação pode ser proposta no domicílio do autor;
[CPC] Art. 46. A ação fundada em direito pessoal ou em direito real sobre bens móveis será proposta, em regra, no foro de domicílio do réu.
Inversão do ônus da prova
· Entendimento: o CDC apresenta uma regra específica para a distribuição do ônus da prova, disposta no art. 6º, VIII, CDC. Trata-se de outra forma processual de proteção ao consumidor.
[CDC] Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
Disposições básicas sobre Teoria Geral da Prova
· Entendimento: provar significa demonstrar a veracidade dos fatos alegados, de modo a convencer o juiz a respeito desta veracidade.
· Objetivos da prova: a prova busca convencer, persuadir, o juiz a respeito da veracidade de determinado fato.
· O objetivo da prova se relaciona ao convencimento, ou seja, à produção de uma verdade formal, que tenta, ao máximo que puder, se aproximar de uma verdade material.
· Objeto da prova: a prova, via de regra, deve ser feita contra fatos (ou direitos, em certos casos) que sejam (i) relevantes para a lide e (ii) controversos (ou seja, sobre os quais há dúvida).
· Questões meramente de direito, apesar de não terem fatos, no entanto, também podem requerer, em alguns casos, provas acerca de sua existência e vigência. Isto pode acontecer, por exemplo, em situações que envolvem: (i) o direito estrangeiro (devidamente traduzido por tradutor juramentado); (ii) o direito local (estadual e municipal) e (iii) o direito consuetudinário (art. 376, CPC).
[CPC] Art. 376. A parte que alegar direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário provar­lhe­á o teor e a vigência, se assim o juiz determinar.
Regra geral do ônus da prova
· Entendimento: o ônus da prova nada mais é do que o encargo de provar o fato. A regra geral do ônus da prova é aquela do art. 373, CPC, chamada de “critério estático”. Ele aponta que, em se tratando de fato constitutivodo direito do autor, aplica-se o art. 373, I, CPC, e o ônus é do autor, enquanto que, em se tratando de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, aplica-se o art. 373, II, CPC, e o ônus é do réu.
· Se nenhuma prova é produzida pelo autor, nem pelo réu, trata-se de improcedência do pedido (que é diferente de improcedência liminar do pedido), porque não restou provado nenhum dos fatos.
[CPC] Art. 373. O ônus da prova incumbe:
I ­ ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito;
II ­ ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
Observação: Diferenciação entre obrigação e ônus e sua repercussão sobre a diferenciação entre dever e encargo. Obrigação não é sinônimo de ônus, pois obrigação é concepção de direito material e ônus é concepção de direito processual. Por uma tutela jurisdicional, é possível forçar alguém a cumprir uma obrigação, mas o ônus é sempre uma faculdade da parte.
Enquanto isso, quanto à diferença entre dever e encargo, se diz que “o dever é meu para com outrem e encargo é meu para comigo mesmo”. O dever, portanto, se relaciona à obrigação (por isso se fala em credor e devedor de uma obrigação), enquanto o encargo se relaciona ao ônus.
O dever (e a obrigação) se relaciona ao direito material, enquanto o encargo (e o ônus), se relaciona ao direito processual. Aquele que tem um dever em relação a uma obrigação deve fazer aquilo que se obrigou, ou seja, pode ser compelido judicialmente a cumprir seu dever. Por outro lado, quando uma lei processual gera um ônus, a pessoa tem um encargo de realizar aquele ato, mas ninguém irá obriga-la a praticar tal ato, contudo, caso não pratique, haverá consequências.
Regra do CDC: a inversão do ônus da prova
· Entendimento: o CDC apresenta uma regra específica (diversa, portanto, da regra geral) para a distribuição do ônus da prova, disposta no art. 6º, VIII, CDC.
· Trata-se de outra forma processual de proteção ao consumidor, na qual se aplica um critério judicial (também chamado de “ope judicis”), ou seja, cuja aplicação não é indiscriminada, dependendo de certos requisitos que serão avaliados pelo juiz, quando da análise do caso concreto.
· Assim, a inversão do ônus da prova não ocorrerá sempre, podendo ou não ser aplicada no caso concreto dependendo da presença ou não dos requisitos que a autorizem.
· Adicionalmente, é importante observar que, mesmo que a inversão do ônus da prova ocorra, isso não significa que a pretensão do consumidor será, necessariamente, atendida.
· Requisitos para inversão do ônus da prova: são dois os requisitos que, quando verificados, mesmo que não cumulativamente, autorizam a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, CDC). Eles são:
[CDC] Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
· (i) Verossimilhança: trata-se da “aparência de verdade” da alegação. Ela se verifica quando há indícios suficientes de que a alegação é verdadeira.
· Exemplo: em uma situação na qual o consumidor busca reparação por demora em um atendimento telefônico para manutenção de um serviço de televisão a cabo, a apresentação de um número de protocolo torna a alegação do consumidor verossímil, mesmo que ele não apresente a gravação da conversa. Nestes casos, é mais fácil para a empresa produzir a prova, pois esta, em tese, armazena as gravações.
Observação: Definição de “indício”. Fato conhecido que leva à presunção de que aquilo que foi alegado é verdadeiro.
Observação: Regra de experiência. A regra de experiência (ou “regras ordinárias de experiência”, nos termos do art. 6º, VIII, CDC) é a utilização de conhecimento acerca de fatos coletivos que acontecem ordinariamente com as pessoas da localidade em que se vive. Não se trata, portanto, de nenhum conhecimento técnico privado que o juiz possa ter (por exemplo, não se trata de regra de experiência quando um juiz, que também é engenheiro mecânico, julga uma sentença com base em seu conhecimento técnico). A regra de experiência é uma boa forma de verificação se determinada alegação é ou não verossímil.
· (ii) Hipossuficiência: a vulnerabilidade é um pressuposto para o conceito de consumidor, enquanto a hipossuficiência é a dificuldade, demonstrada no caso concreto, de realizar prova. Dentro do Direito do Consumidor, portanto, entende-se que o termo “hipossuficiência” se relaciona a uma situação processual, na qual o consumidor tem impossibilidade ou significativa dificuldade em produzir uma prova a respeito de algum aspecto da relação jurídica, como constante do art. 6º, VIII, CDC (não se confunde o conceito de “hipossuficiência” do CDC com o conceito geral, que costuma ser associado a fragilidade da situação econômica).
· Assim sendo, todo consumidor é vulnerável (visto que a vulnerabilidade, como já se viu) é um pressuposto para o conceito de consumidor, mas nem todo consumidor será hipossuficiente.
· É importante observar que a regra, mesmo no processo que lida com a relação de consumo, é de que o ônus da prova é de quem alega (art. 373, I e II, CPC), assim, mesmo no âmbito do CDC, é necessário que o advogado peça a inversão do ônus da prova, na forma do art. 373, §1º, CPC, com esteio no art. 6º, VIII, CDC.
[CPC] Art. 373. (...)
(...)
§1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.
· Requisitos adicionais do critério judicial (“ope judicis”): além dos requisitos previstos no art. 6º, VIII, CDC, para a verificação da possibilidade de inversão do ônus da prova (verossimilhança e hipossuficiência), a avaliação do juiz, no entanto, também deve observar dois outros elementos. Eles são:
· (i) Quanto ao consumidor, se a prova é impossível ou extremamente difícil de produzir;
· (ii) Quanto ao fornecedor, se ele tem condições de produzir a prova.
Observação: Tipos de prova negativa. Há dois tipos de prova negativa, (i) a prova de fato negativo relativo e (ii) a prova de fato negativo absoluto. A prova de fato negativo relativo é aquela que admite prova em contrário. A prova de fato negativo absoluto, por sua vez, é aquela que não admite prova em contrário, estando, em geral, associada à chamada “prova diabólica”.
Outra diferença é que a prova de fato negativo relativo, em geral, é associada a algum período temporal específico, enquanto a prova de fato negativo absoluto não tem associação a qualquer período temporal. Exemplo de situação envolvendo prova de fato negativo relativo é a alegação de que determinada pessoa cometeu infração de trânsito em uma cidade, em dia e hora específicos, pois o acusado poderá demonstrar que, naquele momento, estava em outro local.
Observação: “Prova diabólica”. A chamada “prova diabólica” é aquela prova impossível ou excessivamente difícil de ser produzida, cujo exemplo mais comum é o da prova de fato negativo absoluto. A “prova diabólica” é bastante comum na prática e mostra que a doutrina do ônus da prova do CDC, apesar de significativa, não resolve todos os possíveis problemas. Bons exemplos de casos concretos que envolvem “provas diabólicas” são:
· Situação-problema 1: casal que compra preservativo, mas que engravida e culpa o fornecedor do preservativo de que havia vício no produto, pedindo inversão do ônus da prova para que a empresa prove que não havia vício.
· Neste caso, a solução do juiz foi de não inverter o ônus da prova se baseou em um juízo de probabilidade, advindo de uma pesquisa que dizia que 70% das vezes o preservativo é eficiente,

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