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DERMATOLOGIA Talita B. Valente ATM 2023A 1 DOENÇAS BOLHOSAS DA PELE • Vesículas e bolhas ocorrem em afecções cutâneas e podem constituir um sintoma excepcional ou acidental que aparece no transcurso de um processo de causa específica, como queimadura química/física, ação de toxina, infecção bacteriana ou viral. Há também dermatoses em que as vesículas e bolhas constituem a manifestação cutânea primária e fundamental. • A patogenia das enfermidades bolhosas ocorre por mecanismos múltiplos: o Genodermatoses bolhosas - Caráter genético (dominante ou recessivo), mutação genética de um dos componentes moleculares da epiderme ou da união dermoepidérmica. o Doenças bolhosas causadas por infecções - bacterianas (Impetigo bolhoso e Síndrome da pele escaldada), virais (herpes simples e zoster, doença de mãos-pés-boca pelo vírus coxsackie). o Reações de hipersensibilidade a medicamentos - (Eritema pigmentar fixo, eritema polimorfo bolhoso, síndrome de Stevens-Johnson e Necrólise epidérmica tóxica). o Decorrente de alterações metabólicas - Diabetes e porfirias. o Dermatoses vesiculobolhosas autoimunes (intraepidérmicas e subepidérmicas) - Pacientes com enfermidades bolhosas sensibilizam-se a certos antígenos presentes na epiderme ou da união dermoepidérmica. Nessas situações a enfermidade é adquirida e os pacientes produzem autoaticorpos contra esses antígenos. § Intraepidérmicas: pênfigo foliáceo clássico; pênfigo foliáceo endêmico; pênfigo vulgar; pênfigo vegetante; pênfigo por IgA; pênfigo paraneoplásico; pênfigo induzido por medicamentos. § Subepidérmicas: penfigoide bolhoso; penfigoide das membranas mucosas; herpes gestacional; dermatose por IgA linear; dermatite herpetiforme; epidermólise bolhosa adquirida; e lúpus eritematoso bolhoso. A formação de bolhas se dá por um descolamento entre as camadas da pele. Geralmente esse descolamento ocorre dentro da epiderme ou na junção entre a derme e epiderme. Esse descolamento chama-se acantólise (perda de adesão entre as células epiteliais da camada de Malpighi/Espinhosa contida na epiderme e composta por queratinócitos modificados após migração da camada basal e cél. de Langerhans). BOLHA INTRAEPIDÉRMICA (desmossomos) Alta - Pênfigo foliáceo Suprabasal - Pênfigo vulgar, D. de Darier, D. de Haley-Haley SUBEPIDÉRMICA (hemidesmossomos) Rica em céulas (inflamatórias) - Dermatite Herpetiforme, Microabcessos de Pierar Rica ou pobre em células - Pênfigo bolhoso Pobre em células - EBA, PCT (vasos proeminentes) DERMATOLOGIA Talita B. Valente ATM 2023A 2 PÊNFIGOS • É um grupo de doenças com comprometimento cutâneo e, algumas vezes, mucoso que tem em comum a presença de bolhas intraepidérmicas. • Ocorre a produção de autoanticorpos dirigidos contra antígenos (desmogleínas) do desmossomo, estrutura celular responsável pela adesão celular epitelial. • A etiologia é desconhecida embora, em certos casos, o agente possa ser suspeitado ou imputado. Fatores genéticos provavelmente também estão implicados na predisposição para desenvolver a doença. • Em todos os pênfigos está presente o sinal de Nikolsky, que se caracteriza pelo deslizamento da pele aparentemente normal próxima da área comprometida quando se faz uma fricção. Esse sinal indica a presença de acantólise, um excelente recurso diagnóstico embora não seja patognomônico. • A imunoflorescência direta permite observa os anticorpos presente nos pênfigos. o Pênfigo vulgar - Autoanticorpos IgG marcados entre todas as junções entre os queratinócitos. PÊNFIGO FOLIÁCEO • Tem duas formas: o Não endêmico (pênfigo de Cazenave) § Ocorrência universal. § Pacientes dos 40-60 anos. § Não existem casos familiares. o Endêmico (fogo selvagem). § Ocorrência familiar. § Incidência predominante em adultos jovens e crianças que vivem próximos a córregos e rios, em áreas rurais e em algumas tribos indígenas. § Encontrado na América do Sul, principalmente no Brasil (Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal). § Aspectos epidemiológicos sugestivos de doença desencadeada por um fator ambiental. • Manifestações clínicas: o Bolhas superficiais que se rompem com facilidade, deixando áreas erosadas. Com a ruptura das bolhas formam-se erosões que confluem, na maioria das vezes, formando áreas eritematosas recobertas por crostas e escamas. o Sem acometimento mucoso. o Lesões iniciais ocorrem geralmente na face, pescoço e parte superior do tronco, permanecendo nesses locais por meses ou anos. Disseminação das lesões no sentido crânio-caudal. § Forma localizada - Pênfigo eritematoso (Sener-Usher), erosões na região malar, é uma forma inicial ou frusta de pênfigo foliáceo e, eventualmente, de pênfigo vulgar, com lesões que simulam LE e dermatite seborreica. § Forma generalizada - Pênfigo bolho-invasivo. § Forma eritrodérmica - Bolhas tornam-se menos evidentes, distribuídas de forma universal predominando o eritema e a descamação crônica. Odor característico e cama do doente recoberta de escamas. § Forma queratósica - Doentes, durante a evolução, apresentam lesões pigmentares de aspecto verrucoso, muitas vezes com distrofias ungueais e queratodermias palmoplantares. É a forma queratósica, que pode evoluir para lesões pigmentadas residuais, a chamada forma pigmentar, a qual indica remissão da enfermidade. o Sensação de ardor/queimação. o Sensibilidade aumentada ao frio e piora com exposição solar. PÊNFIGO VULGAR • Forma mais grave de pênfigo • Inicia-se, em mais de 50% dos casos, com lesões exulceradas na mucosa oral, que lembram aftas, podendo permanecer nessa área por vários meses, antes do aparecimento de lesões na pele. • Pode surgir em qualquer idade, mas ocorre mais frequentemente entre 40-60 anos. DERMATOLOGIA Talita B. Valente ATM 2023A 3 • Distribuição universal, porém, são descritos mais casos entre os judeus. • Manifestações clínicas: o Manifestações iniciais da doença são a presença de lesões nas mucosas orais em 50-70% dos doentes, alcançando 90% durante a evolução. o As lesões nas mucosas são representadas por bolhas flácidas que, rompidas, foram erosões dolorosas que sangram facilmente. As lesões orais dificultam a alimentação, com comprometimento nutricional e do estado geral. o O pênfigo vulgar pode se restringir ao acometimento mucoso (tipo mucoso) ou evoluir para acometimento cutâneo (tipo mucocutâneo), com bolhas flácidas sobre áreas de pele normal ou eritematosa. Evultualmente é possível observar uma bolha, há uma acantólise em localização um pouco mais que o pênfigo foliáceo, fazendo com que o teto da bolha seja um pouco maior. o As bolhas são frágeis e formam-se em áreas erodidas, úmidas, sangrentas, algumas recobertas por crostas hemáticas, confluentes, dolorosas e sem tendência a cicatrização. o A fricção ou pressão exercida na pele aparentemente normal, próxima a lesão, induz ao descolamento epidérmico (sinal de Nikolsky). -> Ocorre em todos os pênfigos o As lesões podem ser localizadas ou generalizadas, sendo comuns aquelas no couro cabeludo, na face, nas axilas e na virilha (predileção por dobras). o As lesões evoluem com discromia (hipercromia ou hipocromia), sem cicatriz. o É uma doença grave, crônica e com períodos de remissão e exacerbação, podendo evoluir para óbito se não for tratado. • Complicações: infecções bacterianas secundárias, choque séptico, desnutrição e caquexia, desidratação, desequilíbrio hidroeletrolítico. • A gestação pode precipitarou agravar o pênfigo vulgar. No feto, podem ocorrer retardo de crescimento, prematuridade e morte intrauterina. Gestantes com pênfigo vulgar podem transmitir seus autoanticorpos para o feto, com o desenvolvimento de pênfigo neonatal. O pênfigo neonatal tende a desaparecer espontaneamente em três semanas, pois resulta, exclusivamente, da transferência de anticorpos que são progressivamente eliminados. • PÊNFIGO VEGETANTE: o Variante benigna do pênfigo vulgar. o Costuma ocorrer em doentes mais jovens. o As lesões costumam se iniciar na mucosa oral. Evoluem, acometendo grandes dobras flexurais e intertriginosas. As bolhas são flácidas e, ao se romperem, dão lugar a áreas exulceradas envolvidas por vegetações que formam placas de aspecto verrucoso e hiperpigmentado. o Placas vegetantes purulentas que se ampliam centrifugamente. DIAGNÓSTICO • Diagnose é confirmada por exame citológico, exame histopatológico, imunofluorescência e, eventualmente, por immunoblotting, imunoprecipitação e ELISA. • Suspeita clínica, sinal de Nicolsky -> Anatomopatológico + Exame mostrando anticorpos (imunoflurescência). • Desmogleina 1: foliáceo. • Desmogleína 3: vulgar. • A imunoflorescência direta permite observa os anticorpos presente nos pênfigos. o Pênfigo vulgar - Autoanticorpos IgG marcados entre todas as junções entre os queratinócitos. o Penfigoide bolhoso - Autoanticorpos na junção dermoepidérmica. • Pênfigo foliáceo (imagem rosa) - Clivagem acontolítica alta -> Camadas córnea e granulomatosa • Pênfigo vulgar (imagem roxa) - Acacantólise suprabasa. DERMATOLOGIA Talita B. Valente ATM 2023A 4 • Diagnóstico diferencial: Dermatite seborreica, Lupus subagudo (não faz bolha, só placas). o Pênfigo vulgar -> Avaliar outras doenças bolhosas, ver localização, presença de lesões em mucosas e tipo de bolha. TRATAMENTO • Manejar: o Perda de barreira cutânea - Pacientes mais suscetíveis a distúrbios hidroeletrolíticos e perda de fluídos, assim como infecções cutâneas secundárias. o Lesões de mucosa - São dolorosas e dificultam a alimentação. • Rápido controle inicial da doença (Glicocorticóides sistêmicos): Prednisona 1-1,5 mg/Kg/dia • Terapia de manutenção (Poupadores de corticoide): Azatioprina (primeira escolha) é imunossupressor. o Alternativas: micofenolato de monfetil e ciclofosfamida • Após semanas com lesões cicatrizadas, ausência de lesões novas e Nikolski negativo, inicia-se gradualmente a retirada das medicações. PENFIGOIDE BOLHOSO • Doença bolhosa autoimune subepidérmica. • Acomete indivíduos idosos, comum acima dos 60 anos. • Não há predileção por cor de pele ou sexo. • Anticorpos contra os hemidesmossomos. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS • Geralmente inicia com as lesões urticariformes. • Bolhas grandes e tensas, de conteúdo claro ou hemorrágico, que aparecem sobre a pele normal ou eritematosa urticariforme e intensamente pruriginosas. • As lesões têm predileção pelas áreas flexurais, particularmente face interna das coxas, virilha, axilas e parte inferior do abdome, podendo acometer todo o corpo, embora alguns doentes apresentam doença de forma localizada. • Acometimento mucoso ocorre em cerca de 10-30%. DIAGNÓSTICO • Suspeita clínica -> Confirmação laboratorial via exame histopatológica e imunofluorescência. • Bolha subepidérmica, não acantolítica e infiltrado inflamatório com numerosos eosinófilos, monócitos e alguns neutrófilos. • Pênfigo bolhoso - Imunofluorescência com autoanticorpos na junção dermoepidérmica. • Diagnóstico diferencial: Herpes gestacional, penfigoide cicatricial, epidermólise bolhosa adquirada, lúpus eritematoso sistêmico bolhoso, dermatite herpetiforme e dermatose por IgA linear. TRATAMENTO • Glicocorticoide sistêmico (Prednisona) até controle das lesões e redução gradual + Azatiprina / Micofenolato de mofetil / Metotrexato / Tetraciclinas / Dapsona • Pacientes refratários -. Imunobiológico Rituximab DERMATITE HERPETIFORME • Dermatose bolhosa crônica associada a enteropatia sensível ao glúten (doença celíaca), clínica ou subclínica, em todos os casos. • Componente genético acentuado. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS • Lesões papulovesiculosas, pruriginosas, que evoluem para bolhas tensas, simétricas, de tamanhos variados, com tendência a agrupar- se, adquirindo aspecto herpetiforme. As lesões apresentam-se escoriadas pela coçagem. • 25% de incidência de dermatite herpetiforme nos doentes com doença celíaca. DERMATOLOGIA Talita B. Valente ATM 2023A 5 • Predileção pelas superfícies externas de cotovelos e joelhos, linha de implantação de cabelos na fronte, dorso superior, região sacral e nádegas, regiões escapulares, podendo ocorrer em quaisquer áreas do corpo. • Geralmente não há acometimento mucoso. • Mais frequente em adultos de 30-40 anos, evolui por surtos e não compromete o estado geral. • Rara em negros e asiáticos. • Poucos pacientes apresentam sinais e sintomas clínicos gastrointestinais, porém 75% apresentam atrofia subtotal ou total da mucosa do intestino delgado, e o restante dos doentes apresentam alterações histopatológicas mínimas com infiltrado inflamatório linfocitário intraepitelial na mucosa intestinal. • Anemia, osteopenia, osteoporose, alterações dentárias, infertilidade e aborto podem ser encontrados, decorrentes da má absorção. • É descrita associação da dermatite herpetiforme com outras doenças autoimunes, particularmente doenças da tireoide, diabetes insulino-dependente, lúpus eritematoso, síndrome de Sjögren, sarcoidose, vitiligo, alopecia areata, anemia perniciosa, artrite reumatoide, nefropatia por IgA, cirrose biliar primária, hepatite crônica ativa, doença de Addison e colite ulcerativa. DIAGNÓSTICO • Clínico, histopatológico e imunológico, podendo ser complementado com investigação jejunal, até mesmo biópsia. • Exame histológico revela vesicobolha não acantolítica subepidérmica com infiltrado inflamatório neutrofílico na derme papilar. • Diagnóstico diferencial: considerar o eritema polimorfo, a escabiose, as escoriações neuróticas, a dermatite acantolítica transitória, o penfigoide, o herpes gestacional e a dermatite por IgA linear. TRATAMENTO • Restrição rigorosa de glúten na dieta e uso de Dapsona 100 mg/dia. • Risco de malignidades associado à dermatite herpetiforme, especialmente para linfomas, dos quais, 78% ocorrem no trato gastrintestinal. Dieta isenta de glúten parece ter papel protetor conta o desenvolvimento de linfomas.
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