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Problema 3 – Intermediária Módulo XIII – DOR Introdução A dor central pós-AVC é definida como uma síndrome neuropática caracterizada por dor intermitente ou persistente e por outras alterações sensoriais em partes do corpo correspondentes à lesão cerebral; Como essa fisiopatologia ainda não é completamente conhecida, o tratamento clínico pode não ser efetivo; • O paciente é submetido a polifarmácia, mas não obtém melhora completa dos sintomas; Epidemiologia O AVC constitui, a nível global, a segunda principal causa de morte; Dos doentes com AVC, 1 a 12% apresentam dor neuropática central após o evento e cerca de 40% apresentam outras síndromes dolorosas; Os fatores de risco incluem: idade jovem (18-65 anos), sexo feminino, gravidade do evento vascular, presença de espasticidade, diabetes mellitus, alterações da sensibilidade, depressão e dor prévios ao evento vascular; • Porém, parece não haver correlação entre a área afetada, a lateralidade, a localização da lesão e os fatores de risco com a qualidade e/ou intensidade da dor; Fisiopatologia A fisiopatologia da DNC-AVC é complexa e ainda não é totalmente compreendida; • Desconhece-se a razão do desenvolvimento desta síndrome em apenas alguns doentes; A DNC-AVC pode ocorrer após lesão isquêmica ou hemorrágica em qualquer área somatossensorial do SNC, sendo mais frequente após lesões no núcleo ventral posterior do tálamo e da região opérculo-insular; • Processos de desaferenciação, neuroplasticidade e mecanismos de hiperexcitabilidade neuronal parecem ter um papel no desenvolvimento da sd; Quadro clínico A dor após AVC pode estar direta ou indiretamente relacionada com o evento vascular cerebral e apresentar-se com caraterísticas nociceptivas, neuropáticas ou mistas; Dor neuropática central: A dor central pós-AVC é rara e tem várias designações, como dor talâmica, síndrome talâmico ou retrolenticular ou síndrome de Déjerine-Roussy; • Este quadro neuropático surge em consequência de AVC envolvendo território da circulação posterior; O atingimento talâmico estará assim na base de um processamento central alterado de estímulos sensitivos, incluindo os nociceptivos; Tal como outros tipos de dor neuropática, a dor pós-AVC tem suas peculiaridades; • A maioria dos casos inicia-se imediatamente após o AVC ou nos primeiros três meses; É geralmente descrita como dor espontânea e/ou evocada, intensa, lancinante que interfere com o sono e prejudica a qualidade de vida do doente; A localização da dor é variável, podendo atingir todo o hemicorpo afetado ou apenas parte deste; Os descritores mais utilizados são queimadura, picada, facada, aperto, formigamento e espasmo; Grande parte dos doentes apresenta alterações da percepção da dor e da temperatura e frequentemente existe uma mistura de alterações sensitivas positivas e negativas; A hiperalgesia, disestesia e alodínia tátil e térmica ao frio são frequentes no exame objetivo; Problema 3 – Intermediária Módulo XIII – DOR Os fatores de agravamento podem ser estímulos internos, como o stress e emoções, ou externos, como o toque e o frio; Outras síndromes dolorosas: Muitas vezes coexistem outras síndromes dolorosas além da dor pós-AVC; Os quadros dolorosos mais frequentes são: Dor musculoesquelética: Em algumas situações, as queixas musculoesqueléticas podem ser consideradas consequências indiretas de sequelas de AVC; As alterações biomecânicas resultantes de déficits motores e /ou sensitivos podem originar sobrecarga musculo-tendinosa dos membros sãos e consequentemente lesões microtraumáticas tendinosas e aceleração de patologia degenerativa, com foco nas articulações de carga (ex: joelho); O quadro clínico não difere muito da população em geral, assim como as estratégias diagnósticas; Omalgia do hemiplégico: A omalgia, conhecida na prática clínica como o ombro doloroso do hemiplégico, é um dos paradigmas da dor após AVC; Por ser a condição dolorosa mais frequente após AVC, estima-se que afete cerca de 70-80% dos doentes hemiplégicos no primeiro ano Embora encarada como um problema da fase subaguda/crônica, curiosamente em alguns estudos 2/3 dos doentes identifica o início das queixas nas primeiras 2 semanas após AVC; Ressalta o fato de que são os doentes com défices motores mais graves do membro superior que mais vezes sofrem de omalgia Espasticidade: A espasticidade é uma sequela frequente das lesões do neurônio motor superior; Pode ser dolorosa por si mesma, muitas vezes em relação com a existência de espasmos musculares; Mas também, os padrões de posicionamento que condiciona, se não contrariados, podem estar na origem de contraturas e retrações musculo- tendinosas associadas, que só por si podem constituir uma outra causa de dor; SDRC (também é central): A incidência deste quadro após AVC é difícil de estabelecer, variando entre 10 e 50% Atinge mais frequentemente o membro superior, sendo muitas vezes descrito na literatura mais antiga como síndrome ombro-mão; A sua fisiopatologia não se encontra totalmente esclarecida, sendo a hipótese mais aceita a de que o déficit motor estaria na base de algum grau de disfunção autonômica, atuando como promotor da cascata inflamatória local (sensibilização periférica); • A imobilidade, quando há persistência de déficit motor grave, julga-se que será o fator perpetuador da resposta inflamatória que, quando prolongada, condicionará mecanismos de sensibilização central com possibilidade de cronificação da dor A dor é de facto o sintoma dominante na maioria dos casos; • O início das queixas se dá nos primeiros meses pós-AVC, sendo raro após 5 meses; A dor pode ser acompanhada por outras alterações da sensibilidade, edema e alterações vaso e/ou sudomotoras locais; Diagnóstico A distinção entre dor neuropática e dor nociceptiva representa um desafio clínico, dado que muitos doentes apresentam vários tipos de dor; O diagnóstico é basicamente clínico, de exclusão; Na tentativa de facilitar e homogeneizar o diagnóstico de DNC-AVC, foi publicada em 2009 uma proposta de critérios de diagnóstico que inclui critérios obrigatórios e critérios de suporte; • Os critérios obrigatórios incluem: dor na área corporal correspondente à lesão do SNC; história sugestiva de AVC; início de dor após AVC; confirmação de lesão vascular por exames de imagem e sinais negativos e/ou positivos correspondentes à área corporal de lesão do SNC; Problema 3 – Intermediária Módulo XIII – DOR • Os critérios de suporte incluem: inexistência de associação da dor com o movimento, com inflamação ou dano local tecidual; descritores de dor como queimadura, dor fria, choque elétrico, pressão, picadas de agulhas; presença de alodínia ou disestesia ao toque; Devem ser excluídas outras causas de dor, nomeadamente dor nociceptiva ou dor neuropática periférica; De acordo com a presença de critérios obrigatórios e de suporte, é possível classificar o diagnóstico de DNC-AVC como possível, provável ou definitivo Além dos critérios clínicos, e de acordo com os critérios de diagnóstico propostos, é importante a visualização da lesão vascular nas vias somatossensorias por TC e/ou RM ou das alterações da via espinotalâmica por RM com tratografia; Os estudos PET mostram alterações no tálamo destes doentes, tanto em repouso como na dor evocada; Tratamento A DNC-AVC é uma dor de difícil compreensão, sendo o seu tratamento um desafio; A amitriptilina, gabapentina e pregabalina sãoconsiderados fármacos de primeira linha; • Os inibidores seletivos da recaptação de serotonina-noradrenalina (duloxetina) e a lamotrigina podem ser considerados quando a terapêutica prévia for ineficaz; A prescrição de opioides deve ser criteriosa, uma vez que não há evidência de benefício terapêutico na DNC-AVC quando comparados com os fármacos anteriormente descritos; Não existe evidência que suporte o tratamento preventivo de DNC-AVC; As outras síndromes dolorosas concomitantes devem também ser identificadas e tratadas; Os tratamentos não farmacológicos podem ser considerados em doentes com DNC-AVC refratária e têm sido abordados em alguns estudos recentes; Apesar dos resultados promissores da estimulação cerebral profunda em doentes com DNC-AVC, o parecer oficial do National Institute for Health and Care Excellence em 2016 concluiu que não existe ainda evidência suficiente para aprovar esta terapêutica; • Os resultados da estimulação do cortéx motor não foram conclusivos; • A estimulação magnética transcraniana repetitiva pode diminuir a intensidade da dor; Alguns doentes beneficiam de outras abordagens, nomeadamente fisioterapia, terapia ocupacional e psicoterapia; Referência ALMEIDA, R. S. Dor neuropática central após Acidente Vascular Cerebral. Rev Dor, Lisboa, 2018, 26(1): 8-13. Disponível em: https://aped- dor.org/images/revista_dor/pdf/2018_01.pdf#page =11. Acesso em: 02 mar. 2021. GASPAR, A. T., ANTUNES, F. Dor crônica após acidentes vascular cerebral. Sinapse, Lisboa, 2010, 10(2): 38-44. Disponível em: http://www.sinapse.pt/magazine_download.php?i d=14#page=40. Acesso em: 02 mar. 2021.
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