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A doença arterial coronária é caracterizada pela presença de placas ateroscleróticas ou ateromas nos vasos da circulação arterial do coração. A aterosclerose coronária pode ser assintomática quando o grau de obstrução causado pelo ateroma é insuficiente para prejudicar o fluxo de sangue ao miocárdio. No entanto, a placa pode ter caráter obstrutivo, desencadeando o aparecimento de sintomas. Há duas formas clínicas principais de manifestação da doença arterial coronária. Uma delas, estável, costuma desencadear o aparecimento de sintomas anginosos a esforços regulares. A forma instável, ao contrário, está normalmente relacionada a manifestações clínicas que surgem a mínimos esforços ou em repouso. Enquanto as formas estáveis ou crônicas da doença aterosclerótica coronária têm caráter benigno, a doença instável é sempre uma condição de alto risco, associada a elevadas morbidade e mortalidade. As formas instáveis ou agudas da doença arterial coronária, conhecidas como síndromes coronárias agudas (SCA), ocupam a segunda posição na mortalidade global em nosso país e são a principal causa de óbito entre as doenças do coração. As SCA distribuem-se ao longo de um espectro contínuo de alterações patológicas e manifestações clínicas. Elas são o resultado de um processo agudo de instabilização da placa aterosclerótica com a formação de um trombo intracoronário que promove agravamento súbito da obstrução vascular. Dependendo do grau de obstrução coronária e da severidade da isquemia miocárdica resultante, podem surgir diferentes síndromes clínicas. A presença de um trombo parcialmente oclusivo com fluxo sangüíneo residual ou de uma oclusão transitória da luz vascular está associada a formas mais brandas da doença aguda, como a angina instável (AI) e o infarto sem supradesnível do segmento ST (IMSST). Em condições extremas de oclusão total da luz arterial e privação completa do fluxo miocárdico, normalmente se desenvolve um infarto com supradesnível do segmento ST (IMST). Assim, a intensidade da isquemia miocárdica produzida pelo grau de obstrução do lúmen vascular determina o tipo de SCA e a gravidade do quadro clínico. Etiologia. As síndromes coronárias agudas são desencadeadas a partir da instabilização de uma placa aterosclerótica com trombose oclusiva em cerca de 90% dos casos. Outras vezes, elas podem resultar de processos patológicos de natureza diferente que também promovem um desequilíbrio entre a oferta de O2 ao miocárdio e o seu consumo. Entre as causas mais comuns de insuficiência coronária aguda não-aterosclerótica está o espasmo coronário. Normalmente produzido em áreas de aterosclerose incipiente, o vasoespasmo primário resulta de uma alteração da função vasodilatadora do endotélio (disfunção endotelial) com aumento do tônus vascular. Ele costuma acometer pacientes jovens do sexo feminino, provocando quadros de angina instável. O espasmo coronário também pode ser secundário ao uso de agentes simpatomiméticos, como a cocaína. Nesse caso, o caráter mais prolongado do espasmo com aumento do consumo de O2 pelo miocárdio pode causar quadros mais graves, como IM ou morte súbita. A embolização coronária a partir de trombos valvares também é uma etiologia a ser considerada em portadores de próteses mecânicas ou endocardite bacteriana. Fisiopatologia. Teoria inflamatória: De forma simplificada, a placa aterosclerótica estável apresenta um núcleo lipídico contendo macrófagos ricos em gordura citoplasmática, conhecidos como células espumosas, além de debris celulares e gorduras livres. O núcleo lipídico permanece isolado do compartimento sangüíneo por uma capa fibrosa de colágeno bem estruturada. A partir de estímulos não inteiramente esclarecidos, como processos infecciosos agudos ou fatores que estimulam uma resposta oxidativa sistêmica, desenvolve-se um processo inflamatório que envolve a circulação e o próprio ateroma. No interior do ateroma, essa inflamação se caracteriza pela ativação de células da resposta imune celular, principalmente os linfócitos T, concentrados nas bordas das placas. Assim, linfócitos T ativados sintetizam quantidades aumentadas de interferon-gama, citocina capaz de bloquear a síntese de colágeno pelas células musculares lisas que migraram para a região subendotelial a partir da camada média vascular. Ao interferir com a formação do colágeno que compõe o arcabouço da placa aterosclerótica, as células T promovem o adelgaçamento da capa fibrosa do ateroma, reduzindo sua resistência e predispondo-o à rotura. Simultaneamente à ação do interferon, as metaloproteinases, colagenases presentes no interstício da placa aterosclerótica, passam a ser produzidas e liberadas em concentrações elevadas a partir de macrófagos teciduais, acelerando o processo de decomposição do colágeno fibrilar que compõe o ateroma. Dessa forma, surge a placa suscetível que pode se romper ou erodir em condições de sobrecarga hemodinâmica, principalmente em suas margens, onde a capa fibrosa é mais fina e a tensão circunferencial mecânica mais intensa. Por esse motivo, as SCA podem ser desencadeadas por vigorosa atividade física ou estresse emocional. A hiperatividade simpática desencadeada nessas circunstâncias provoca elevação da pressão arterial, frequência cardíaca e força contrátil do coração, impondo intensa sobrecarga mecânica sobre a placa aterosclerótica. A despeito disso, normalmente não existe fator desencadeante identificável para as SCA. Além da inflamação da placa aterosclerótica, sabe-se que, nas SCA, há uma resposta inflamatória sistêmica aguda com elevação de diversos marcadores, como proteína C-reativa, interleucina-6 e fator de necrose tumoral beta. Os níveis desses mediadores inflamatórios mantêm correlação com o prognóstico da doença aterosclerótica aguda e ajudam a estratificar o seu risco. Aparentemente, essa inflamação sistêmica parece resultar do processo inflamatório que se desenvolve no interior da placa aterosclerótica, embora ainda haja muita especulação a respeito. Aterotrombose A rotura ou erosão da placa aterosclerótica permite o contato direto de substâncias trombogênicas em seu interior com plaquetas circulantes e proteínas da coagulação. Essa interação desencadeia o processo de trombose sangüínea por duas vias distintas. Inicialmente, a lesão vascular da placa instável com exposição da matriz subendotelial promove a adesão de plaquetas circulantes ao colágeno intersticial . Essa adesão pode acontecer por via direta pelas glicoproteínas de superfície ou indiretamente por meio do fator de Von Willebrand, que atua como uma ponte para a adesão plaquetária. A adesão ao colágeno subendotelial promove ativação das plaquetas, caracterizada por mudanças conformacionais com aumento de sua superfície de contato e liberação de substâncias retidas nos seus grânulos citoplasmáticos. As plaquetas ativadas também passam a expressar receptores específicos de superfície, principalmente a glicoproteína IIb/IIIa que, juntamente com moléculas de fibrinogênio, permitem agregação intercelular. Parte dos mediadores secretados pelas plaquetas ativadas, como a adenosina difosfato (ADP) e o fibrinogênio, induzem agregação plaquetária e estabilização do trombo, enquanto outros estimulam o sistema de coagulação (fator V, XI e XIII) ou promovem vasoconstrição arterial (tromboxano A2). A fase plaquetária da trombose é responsável pela formação de um coágulo hemostático que visa interromper o sangramento. Esse processo é conhecido por hemostasia primária e é a forma mais comumente encontrada na AI e IMSST. Simultaneamente à formação do trombo branco ou plaquetário, verifica-se ampla ativação da cascata de coagulação, cujo principal objetivo é permitir a formação de altas concentrações de trombina. A exposição do fator tecidual à circulação sangüínea inicia o processo de coagulação ao permitir sua combinação com o fator VII. Essa associação catalisa a conversão do fator X à sua forma ativada Xa. Os fatores Xa, Va e II (protrombina) se combinam para formar o complexo protrombinase, responsável pela formaçãocatalítica de trombina. A trombina, por sua vez, é responsável pela síntese de uma rede de fibrina que confere estabilidade ao trombo. Esse processo, conhecido por hemostasia secundária, determina a captura de hemácias circulantes com formação de um trombo vermelho. Esse é o principal achado do IMST. A interação entre as substâncias pró-trombóticas geradas durante o evento de instabilização da placa e antitrombóticas, naturalmente presentes nos vasos sanguíneos, determina a intensidade de ativação do sistema de coagulação e progressão do trombo e, portanto, o grau de obstrução vascular e a forma clínica de apresentação da SCA. Nesse momento, a função do endotélio vascular assume extrema importância. Uma série de substâncias anticoagulantes, antiplaquetárias, fibrinolíticas e vasodilatadoras são produzidas continuamente pelo endotélio com o intuito de interromper a progressão de trombos formados na luz vascular e, assim, permitir a manutenção do fluxo sanguíneo. Em condições de disfunção endotelial provocada pelos fatores de risco cardiovascular, como diabetes, dislipidemia, hipertensão ou tabagismo, o endotélio é incapaz de sintetizar quantidades adequadas de tais substâncias, predispondo ao aparecimento das formas mais graves de SCA. Por esse motivo, a abordagem da disfunção endotelial tornou-se um alvo terapêutico das SCA nos últimos anos. Os principais agentes anticoagulantes formados pelo endotélio são: a antitrombina III, que se liga irreversivelmente à trombina para inativá-la e facilitar sua depuração plasmática; a trombomodulina; as proteínas C e S, que atuam sinergicamente para acelerar a degradação dos fatores de coagulação Va e VIIIa; e o inibidor da via do fator tecidual, que se combina ao fator Xa para bloquear o complexo formado pelo fator tecidual e fator VII. O endotélio também é capaz de secretar o ativador do plasminogênio tecidual, gerando plasmina que promove clivagem das cadeias de fibrina formadoras do trombo. Por fim, prostaciclina (PGI2) e, principalmente, óxido nítrico (NO) são potentes agentes vasodilatadores e antiplaquetários sintetizados pelo endotélio. Quadro clínico. As manifestações clínicas associadas à coronariopatia aguda são produzidas pela isquemia do miocárdio e hiperatividade adrenérgica secundária ao intenso desconforto torácico. Por isso, as SCA tendem a compartilhar os mesmos tipos de sintomas. A gravidade do quadro clínico, no entanto, costuma progredir ao longo do espectro das SCA à medida que a isquemia é mais intensa e prolongada. Assim, o quadro clínico na AI tende a ser mais frustro, enquanto o IMST normalmente apresenta manifestações mais exuberantes. A dor clássica da isquemia miocárdica é de caráter opressivo ou em peso localizada no centro do tórax e de limites imprecisos. A dor irradia-se mais comumente para o ombro e o braço esquerdo (face ulnar) ou a mandíbula e o pescoço. Sua instalação é normalmente insidiosa, atingindo um pico de intensidade depois de alguns minutos de seu início. Dores fugazes ou duradouras por alguns dias raramente estão associadas à isquemia miocárdica. A piora ao esforço físico com alívio ao repouso é típica da angina de peito o que determina um perfil de inatividade nos portadores de SCA. Ao contrário, a sua intensidade não costuma se alterar com a mudança de posição ou inspiração. Os sintomas anginosos são normalmente acompanhados de diaforese, náuseas e vômitos, mais comuns no IMST. Apesar da sintomatologia clássica descrita, boa parte dos portadores de SCA podem ter manifestações atípicas (equivalentes isquêmicos) que dificultam seu diagnóstico ou podem mesmo não apresentar quaisquer sintomas durante o evento agudo. A avaliação dos sintomas é fundamental para o diagnóstico de AI. Frequentemente, os exames subsidiários encontram-se inalterados nessa condição, e o único instrumento diagnóstico disponível é a queixa dos pacientes. Seu reconhecimento, no entanto, pode não ser simples. Como o grau de isquemia miocárdica na AI tende a ser mais leve, os sintomas são, muitas vezes, atípicos e fugazes. As manifestações clínicas dessa condição intermediária entre a forma estável da doença coronária e o IM traduzem um fenômeno de instabilização incipiente da placa aterosclerótica com trombose limitada e oclusão vascular incompleta. A instabilização aguda da placa na AI pode se manifestar de três formas principais: ■ angina de início recente, caracterizada pelo aparecimento de sintomas anginosos em pacientes previamente assintomáticos. Normalmente, a angina é considerada instável dentro do 1o mês de aparecimento até que a placa volte a se estabilizar; ■ angina progressiva ou em crescendo, que se manifesta pela exacerbação de sintomas anginosos prévios, como aumento da intensidade e duração da dor ou surgimento a esforços menores; ■ angina em repouso ou a mínimos esforços, forma mais grave da doença. Nesse caso, a dor intensa é entremeada por períodos assintomáticos. Na AI, diferente da coronariopatia crônica, a dor torácica não tem evento desencadeante evidente como esforço físico ou estresse emocional e pode surgir ao repouso. Em relação ao IM, a AI costuma provocar dor menos intensa, com duração de até 20 minutos e sem manifestações simpáticas exuberantes, como palidez, sudorese ou náuseas. Angina de Prinzmetal A angina variante ou de Prinzmetal caracteriza-se por dor precordial isquêmica desencadeada por espasmo coronário associada a supradesnível temporário do segmento ST. Na angina variante não há um fator precipitante evidente que leve a um aumento do consumo de O2 como na angina estável. Ao revés, os episódios ocorrem normalmente ao repouso durante o período noturno ou manhã. Portadores dessa condição mantêm-se assintomáticos no restante do dia, mesmo a grandes esforços, a não ser que haja coronariopatia obstrutiva associada. Vasoespasmo coronário aparece nas áreas adjacentes a placas ateroscleróticas, embora também possa ocorrer em trechos normais das artérias coronárias. Habitualmente, os portadores de angina vasoespástica são mais jovens, principalmente mulheres, e sem fatores de risco para coronariopatia, a não ser o tabagismo que pode precipitar as crises. Apesar de esses doentes poderem cursar com arritmias malignas e IM, levando à morte súbita, o prognóstico costuma ser bastante favorável com índices de sobrevida bastante elevados. O tratamento baseia-se na utilização de nitratos e bloqueadores de canal de cálcio tanto na fase aguda quanto crônica. Infarto do miocárdio (IM) O IM corresponde à forma mais grave de SCA. Nessa condição, a oclusão coronária é completa, ainda que de forma temporária no IMSST. O acúmulo de vultosas quantidades de produtos de decomposição do metabolismo energético, como a adenosina e o lactato, se traduz por profundo desconforto torácico com ampla irradição e resposta simpática exacerbada. Assim, além da forte dor que tende a se estender por mais de 30 minutos, costumam aparecer sudorese, náuseas e extremidades frias e úmidas. A manifestação é máxima no IMST e classicamente acompanhada por uma sensação de morte iminente. Repouso e uso de nitrato costumam aliviar o quadro clínico no IMSST, mas pouco afetam os sintomas no IMST. Exame físico O exame físico em portadores de SCA costuma ser de auxílio bastante limitado para o diagnóstico, principalmente na AI. Os sinais observados são inespecíficos e podem variar bastante, a depender da parede ventricular acometida e da extensão da isquemia. Portadores de IM podem apresentar sinais característicos da descarga adrenérgica, como diaforese, palidez cutânea e taquicardia. No entanto, se o IM envolver a parede inferior, significativa bradicardia com sinais de baixo débito cardíaco podem aparecer. A pressão arterial também pode variar amplamente, tendendo à elevação no IM anterior não-complicado e hipotensão no IM inferior. A temperatura corpórea se eleva sutilmente nos portadores de IM em resposta à necrose miocárdica entre o 1o e o 4o dias. Similarmente, a ausculta cardíaca em portadores de IM costuma estar inalterada. A presença de quartabulha (B4), indicando contração atrial na presença de redução da complacência ventricular, pode ser observada em alguns casos. A terceira bulha (B3) pode aparecer em casos de falência ventricular. Em circunstâncias em que o IM se acompanha de complicações mecânicas, o exame cardiológico pode ser extremamente útil. A presença de sopro sistólico apical suave pode representar um acometimento isquêmico do músculo papilar da válvula mitral, enquanto sopro paraesternal rude pode sugerir rotura do septo interventricular. A detecção de sopros na fase aguda do IM indica grave condição subjacente que exige cuidados imediatos. A presença de atrito pericárdico também pode indicar IM com acometimento de toda a espessura da parede do coração. Assim, apesar de muitas vezes estar normal, o exame físico é prática indispensável para detectar condições mais raras, porém potencialmente graves. Diagnóstico diferencial. O diagnóstico diferencial de angina de peito é parte essencial da abordagem do doente com dor torácica. O sintoma de dor torácica é bastante freqüente, correspondendo à segunda principal causa de consulta aos serviços de emergência e pode resultar de patologias benignas ou de alto risco. É importante atenção ao diagnóstico diferencial da dor torácica para que sejam admitidos os doentes sob risco, evitando-se internações desnecessárias. A Tabela II inclui os principais diagnósticos relacionados à dor torácica. Exames diagnósticos. O reconhecimento da insuficiência coronária aguda e o diagnóstico diferencial entre as suas formas clínicas de apresentação é feito pela avaliação dos sintomas à admissão hospitalar, alterações no ECG e detecção de marcadores de necrose miocárdica. Na AI, como descrito, a inspeção minuciosa das queixas do paciente é essencial para o diagnóstico, uma vez que o ECG encontra-se normalmente inalterado à admissão e os marcadores de necrose não sofrem elevação. No IMSST, as alterações ECG costumam ser mais pronunciadas e a necrose miocárdica é obrigatória. O IMST cursa com elevação do segmento ST e lesão do tecido cardíaco. Eletrocardiograma O ECG de 12 derivações é muito importante em pacientes com suspeita de SCA. Ele fornece informações diagnósticas e prognósticas essenciais, recomendando-se realização em até 10 minutos após a admissão hospitalar. A detecção de supradesnível persistente do segmento ST indica a presença de IMST (Figura 6A). O supradesnível é a expressão de sofrimento muscular transmural, portanto indica oclusão coronária completa ou subtotal. Derivações ECG com elevação do segmento ST apontam para a parede em sofrimento, permitindo o reconhecimento da artéria envolvida no evento. Na presença de supradesnível de ST irreversível com uso de nitratos, a indicação terapêutica é reperfusão miocárdica imediata. Na ausência de elevação do segmento ST, o diagnóstico inicial é de SCA sem elevação do segmento ST (SCASST), isto é, AI ou IMSST, se o quadro clínico for suspeito de insuficiência coronária aguda. As alterações ECG mais freqüentes nas SCASST são a inversão da onda T e o infradesnível de ST (Figura 6B), que caracterizam isquemia subendocárdica. Apesar de a distinção entre AI e IMSST ser definida pela alteração dos marcadores de necrose miocárdica, algumas diferenças no ECG podem ajudar a identificá-las. No IMSST, o infradesnível costuma ser mais pronunciado (0,1 mV) e duradouro. Na AI, seu aparecimento é fugaz e menos intenso. As inversões da onda T são menos específicas para o diagnóstico de isquemia miocárdica aguda em comparação às alterações do segmento ST. Na presença de suspeita diagnóstica, no entanto, a presença de ondas T profundas (2 mm) e simétricas são bastante sugestivas de isquemia miocárdica. Algumas vezes, o ECG pode mostrar alterações mistas com presença de supra e infradesnível de ST simultaneamente. Em pacientes com suspeita de SCA, porém com ECG persistentemente inalterado, a monitoração contínua pode auxiliar o diagnóstico. Os testes provocadores de isquemia antes da alta hospitalar podem ser especialmente úteis quando há dúvida diagnóstica, mas devem ser evitados na presença de sintomas. Marcadores de necrose cardíaca A morte dos cardiomiócitos com perda da integridadedo plasmalema permite que macromoléculas contidas no espaço intracelular sejam liberadas para o tecido intersticial e atinjam os vasos linfáticos, espalhando-se pela circulação. A detecção dessas moléculas no sangue periférico caracteriza a necrose miocárdica e, portanto, o IM. A necrose miocárdica resulta, na maioria das vezes, de agressão isquêmica por obstrução das artérias coronárias epicárdicas ou da microcirculação. Algumas vezes, no entanto, o miocárdio pode estar submetido a condições de “sobrecarga” que induzem a elevação desses biomarcadores na ausência de necrose miocárdica isquêmica. Nesse caso, a lesão miocárdica aparece como epifenômeno secundário a outras patologias, como embolia pulmonar ou insuficiência cardíaca aguda. Assim, é fundamental que a elevação dos marcadores cardíacos seja interpretada à luz do quadro clínico. Além de seu papel diagnóstico no IM, os marcadores de necrose miocárdica são importantes na estratificação de risco de portadores de SCA, orientando a terapêutica. Na prática clínica, destacam-se dois marcadores biológicos de necrose do miocárdio: isoenzima MB da creatinoquinase (CKMB) e troponinas (Tn). CKMB Apesar de estar presente em concentração maior nos cardiomiócitos, a CKMB também aparece em outros tecidos, como músculo esquelético, intestino ou próstata. Assim, embora tenha sido utilizada como padrão de referência para o diagnóstico de IM por muitos anos, a CKMB é apenas parcialmente específica para o músculo cardíaco.Apesar dos sensíveis avanços devidos à utilização dos novos ensaios imunológicos para a sua detecção (CKMB massa), elevações da CKMB podem resultar de lesões teciduais a distância. Nesse caso, a utilização da relação entre a fração CKMB (massa) e a CK total pode auxiliar o diagnóstico. A relação acima de 3% é um forte indício de que a necrose envolva o tecido miocárdico. A concentração sérica de CKMB começa a se elevar entre 3 e 4 horas depois do aparecimento dos sintomas isquêmicos, atinge um pico entre 24 e 48 horas a depender da reperfusão miocárdica e retorna ao normal em 72 horas. O diagnóstico ainda na primeira hora seria interessante para a instalação da terapêutica precoce apropriada. Troponinas Tn são proteínas estruturais da fibra muscular que modulam a interação entre a actina e a miosina no músculo esquelético e cardíaco. Há três subunidades: TnC, TnT e TnI. Apesar de serem expressas no músculo esquelético, algumas isoformas da TnT e TnI são específicas do músculo estriado cardíaco, por isso chamam-se cTnT e cTnI. Assim, elevações das cTnT ou cTnI não devem ser interpretadas como falso-positivo, mas sempre como lesão miocárdica irreversível, mesmo na ausência de isquemia detectável. Além de altamente específicas, as Tn são mais sensíveis para detecção de micronecroses cardíacas. Níveis insignificantes de Tn no sangue periférico de pessoas saudáveis permitem detectar elevações mínimas de concentração sérica.Assim, a Tn também demonstra perfil de alta sensibilidade,superior à CKMB, aperfeiçoando o diagnóstico e a estratificação do risco em portadores de SCASST. As Tn começam a se elevar entre 3 e 4 horas após a instalação do IM, atingem o pico entre 18 e 36 horas e depois declinam lentamente, até desaparecerem do plasma em 10 a 14 dias). Apesar de sua elevação tardia, as Tn são os melhores marcadores cardíacos disponíveis Tratamento. MEDIDAS INICIAIS E TRATAMENTO PRECOCE: O tratamento inicial da síndrome coronariana aguda inclui repouso com monitoramento via ECG e pronta terapia antitrombótica. A dor anginosa deve ser tratada com morfina, salvo nos casos de hipotensão, sendo que administração de nitroglicerina sublingual é indicada inicialmente para o alívio do desconforto isquêmico, por meio da dilatação arterial coronariana, podendo ser seguido por terapia intravenosa para o desconforto isquêmicoem curso, insuficiência cardíaca congestiva ou hipertensão não controlada. A abordagem com betabloqueadores é controversa, mas de modo geral é favorável, com início do tratamento nas primeiras 24 horas após a admissão. A administração via oral costuma ser segura, sendo a terapia intravenosa preconizada para os casos não controlados de hipertensão. O uso dessa classe de fármacos deve ser evitado em casos de risco de choque cardiogênico, evidenciados por hipotensão e déficits do ventrículo direito, associados principalmente com queda do retorno venoso, o que diminui a pré-carga do ventrículo direito. O início ou a continuação de terapia com estatinas leva a efeitos pleiotrópicos, bem como à redução dos níveis séricos de colesterol, resultando em melhorias nos desfechos cardiovasculares a longo prazo. Essas devem ser iniciadas em até 24 horas do início do quadro, devendo ser tomadas pelo paciente continuamente, em dose máxima. O uso de IECA e de BRA possuem um papel relevante no tratamento da síndrome coronariana aguda, especialmente nos casos em que o paciente possui IAM prévio, disfunção ventricular ou insuficiência cardíaca. Na ausência de contraindicações, a terapia deve ter início dentro de 24 horas após a admissão. Uma vez realizada essas medidas gerais, deve-se ter em mente os principais passos a serem seguidos diante de um paciente com dor torácica com clínica sugestiva de Síndrome Coronariana, os quais são resumidos por meio do quadro abaixo: Infarto do miocárdio com supradesnível de ST O ponto-chave no tratamento do IMST é a reperfusão coronária precoce por meio de tratamento fibrinolítico ou intervenção coronária percutânea (ICP). A oclusão completa da artéria coronária normalmente coloca sob risco uma extensão apreciável do miocárdio. A perda definitiva do músculo cardíaco pode promover falência mecânica do coração a curto ou longo prazo. A recanalização coronária é capaz de interromper a necrose do tecido cardíaco e melhorar, significativamente, a sobrevida dos portadores de IMST. Os critérios diagnósticos utilizados para a indicação da terapia de reperfusão estão bem caracterizados: ■ clínicos: dor ou manifestações clínicas sugestivas de isquemia miocárdica aguda com até 12 horas de evolução, não responsiva ao uso de nitrato. Não é obrigatória a presença da dor no momento da avaliação; ■ eletrocardiográficos: supradesnível do segmento ST em pelo menos duas derivações de mesma parede (supra de ST > 2 mm de V1 a V6 e > 1 mm nas derivações frontais) ou BRE presumivelmente novo. Além da recanalização coronária, a abordagem terapêutica nos portadores de IMST inclui a administração precoce de agentes antitrombóticos e antiisquêmicos. O ácido acetilsalicílico (AAS) é um antiplaquetário essencial ao tratamento do IMST por reduzir as taxas de reinfarto e a mortalidade. Deve ser administrado imediatamente após a admissão hospitalar na dose de 200 mg (macerado) e mantido indefinidamente em baixas doses de 75 a 160 mg. Anticoagulantes também são empregados no IMST em combinação com agentes antiplaquetários, para manter a patência coronária depois de sua recanalização. Classicamente, na ausência de contra-indicações, recomenda-se o uso intravenoso inicial de betabloqueadores seguido de administração das formulações orais, sobretudo em pacientes não submetidos a recanalização ou nos recanalizados que cursam com taquicardia, hipertensão arterial ou isquemia persistente. A administração dos betabloqueadores deve ser cautelosa em portadores de infartos extensos ou com disfunção ventricular. Esses agentes foram relacionados ao desenvolvimento de choque cardiogênico nesses pacientes, devendo-se evitar sua infusão venosa. Finalmente, nitratos servem a dois propósitos no IMST. O primeiro deles é diagnóstico, servindo para excluir a hipótese de espasmo coronário à admissão hospitalar. A manutenção do supradesnível de ST após sua administração sublingual exclui a possibilidade de espasmo coronário isolado ou angina variante (angina de Prinzmetal). O segundo uso do nitrato no IMST é terapêutico. Nitrato IV é indicado no caso de isquemia persistente ou para controle de congestão pulmonar ou hipertensão arterial, podendo ser utilizado de forma rotineira nas primeiras 24 a 48 horas de evolução, desde que não haja contra-indicação. Intervenção coronária percutânea O cateterismo cardíaco seguido de ICP da artéria coronária relacionada ao IMST é o método de escolha para a reperfusão miocárdica. O método, conhecido por angioplastia primária, é muito eficiente, restabelecendo o fluxo arterial epicárdico em mais de 95% dos casos quando realizado em centros especializados. Em comparação à reperfusão farmacológica com agentes fibrinolíticos, a ICP reduz as taxas de reinfarto e sangramento, ampliando a sobrevida a curto e longo prazo. Recomenda-se que a angioplastia primária seja realizada por hemodinamicista experiente em até 90 minutos após a apresentação do paciente ao hospital. Em centros que não dispõem de serviço de hemodinâmica, a transferência para angioplastia primária é recomendada se houver contra-indicações à fibrinólise (30% dos pacientes) (Tabelas III e IV) ou choque cardiogênico. Portadores de IMST admitidos tardiamente (> 3 horas) também se beneficiam da realização de ICP. Além do AAS, a heparina não-fracionada (HNF) é também recomendada em portadores de IMST submetidos a angioplastia primária, pois ajuda a prevenir as complicações trombóticas associadas ao procedimento. A infusão dos inibidores da glicoproteína IIb/IIIa durante a ICP mostrou-se benéfica ao reduzir a ocorrência de morte, reinfarto e revascularização de urgência aos 30 dias e 6 meses pós-infarto. Por fim, a administração precoce de clopidogrel está indicada com o propósito de reduzir as complicações trombóticas associadas à angioplastia primária e, principalmente, ao implante de stent. Terapia fibrinolítica Os agentes fibrinolíticos atuam pela estimulação do sistema de fibrinólise endógeno, ou seja, catalisam a conversão do substrato inativo plasminogênio em plasmina. A plasmina, por sua vez, é responsável pela rotura das pontes entre as moléculas de fibrina que dão estrutura ao trombo, dissolvendo-o. A reperfusão farmacológica por agentes fibrinolíticos deve ser implementada nos centros que não dispõem de hemodinâmica, principalmente nos infartos com até 3 horas de evolução, ou se houver expectativa de demora superior a 90 minutos para início da ICP primária. Apesar de suas desvantagens em relação à ICP, os fibrinolíticos restabelecem o fluxo coronário em 70 a 80% dos casos quando administrado precocemente. Assim, a infusão dentro das primeiras horas de sintomas é essencial para o sucesso terapêutico.A recanalização coronária pós-fibrinólise se caracteriza pelo alívio da dor torácica, queda do supradesnível de ST (> 50%) e pico precoce (< 18 horas) dos marcadores cardíacos (CKMB). O AAS é uma das principais medicações adjuvantes à fibrinólise. A sua combinação com agentes fibrinolíticos reduz a mortalidade do IMST quase à metade em relação à fibrinólise isolada.As heparinas também fazem parte do tratamento fibrinolítico no IMST. Elas participam do processo de recanalização ao contribuir para a lise do trombo e ajudam a prevenir a reoclusão coronária. O uso da HNF é obrigatório com agentes fibrino-específicos por 48 horas, porém, a sua associação com a estreptoquinase é questionável. Síndromes coronárias agudas sem supradesnível de ST As SCASST incluem a AI e o IMSST, como já descrito. Apesar de compartilharem a mesma fisiopatologia, o risco intra-hospitalar e as complicações após a alta divergem nessas duas entidades clínicas. A AI costuma ser mais benigna em suas formas leves, enquanto o prognóstico dos portadores de IMSST ou AI de alto risco é mais grave. Assim, a estratégia terapêutica nas SCASST é mais complexa e depende da estratificação do risco dos seus portadores. Os pacientes de risco cardiovascular mais elevado se beneficiam de uma terapêutica antitrombótica agressiva, enquanto nos doentes de baixo risco recomenda-seum tratamento mais leve. Ao longo dos últimos anos, foram desenvolvidos alguns critérios para se estratificar o risco de óbito, reinfarto ou reintervenção coronária nos portadores de SCASST. Os critérios da Sociedade Brasileira de Cardiologia são os mais utilizados em nosso meio(Tabela VI). A estratificação de risco deve ser realizada assim que os dados clínicos, eletrocardiográficos e laboratoriais estiverem disponíveis após a admissão hospitalar. Por esse motivo, esses dados devem ser coletados rapidamente. Apesar da estratificação inicial, a avaliação do risco cardíaco deve ser dinâmica, ou seja, portadores de SCASST de risco intermediário à admissão hospitalar podem ser reclassificados ao longo de sua internação se as condições clínicas sofrerem mudanças. A partir da estratificação do risco cardiovascular dos portadores de SCASST, a estratégia terapêutica em relação ao uso de agentes anticoagulantes e antiplaquetários é bastante distinta. Risco cardiovascular baixo Os pacientes de baixo risco normalmente não merecem internação hospitalar. Após um período de observação no serviço de emergência, esses pacientes podem se submeter a um teste para detecção de isquemia miocárdica, como a cintilografia miocárdica ou o ecocardiograma de estresse. Não se recomenda a realização do teste ergométrico no portadores de SCA. Na ausência de isquemia, o paciente pode receber alta hospitalar, mantendo acompanhamento ambulatorial. Caso contrário, se o exame vier alterado, deve-se seguir as recomendações para pacientes de risco intermediário/alto. Risco cardiovascular intermediário ou alto Os pacientes com angina instável de risco intermediário e alto, bem como os portadores de IMSST, devem ser admitidos em Unidade Coronária. As condutas descritas a seguir devem ser iniciadas após a estratificação do risco. Antiagregação plaquetária Na SCASST de risco intermediário ou alto, a terapêutica antiplaquetária suplementar ao AAS é importante já na fase precoce de admissão. O benefício dessa terapêutica está associado à atenuação do processo aterotrombótico na placa instável e redução de embolização microvascular. Em pacientes submetidos ao implante de stent, a terapêutica antiplaquetária ampla também ajuda na profilaxia da trombose aguda. Diversos estudos demonstraram que o benefício clínico da antiagregação com AAS é ampliado por uma inibição plaquetária complementar com agentes tienopiridínicos ou inibidores da glipoproteína IIb/IIIa (iGPIIb/IIIa). Quanto maior o risco do paciente, maior o benefício com a utilização destes medicamentos. Tienopiridínicos A ticlopidina e o clopidogrel são os dois agentes tienopiridínicos atualmente disponíveis. Eles atuam por meio da inibição irreversível do receptor de ADP na superfície plaquetária. A via do ADP é uma das mais importantes na estimulação das plaquetas. Ambas as medicações estão aprovadas para uso na AI/IMSST. Apesar disso, o clopidogrel é o agente de escolha nesses pacientes, pois há mais evidências que comprovam seu benefício, além de provocar menos efeitos colaterais, como epigastralgia, neutropenia e plaquetopenia. A dose recomendada é de 300 mg de ataque, seguida de 75 mg/dia. Clopidogrel também deve ser utilizado rotineiramente em todo paciente com contra-indicação ao uso da aspirina e naqueles submetidos a ICP.Nos pacientes de indicação cirúrgica após a estratificação invasiva, o clopidogrel deve ser suspenso por, pelo menos, 5 dias antes do procedimento ATENÇÃO!Para a confecção desse material foram usados livros ,artigos científicos,conteúdos de aulas e palestra da faculdade UNIME de medicina e conteúdos de aulas, material didático de outras plataformas de ensino e material confeccionados por outros colegas, portanto não é um conteúdo autoral. Ou seja, o conteúdo contido no resumo não é de criação minha, eu apenas compilei o material da melhor forma para estudo.
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