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2 
ESTUDOS EM ECLESIASTES ���� tlhq 
 
 
1. SABEDORIA E LITERATURA SAPIENCIAL NO ISRAEL DO A NTIGO TESTAMENTO. 
 
 A literatura bíblica sapiencial é composta dos livros de Jó, Provérbios, Eclesiastes, além dos 
livros deuterocanônicos de Sabedoria e Eclesiástico, e do acréscimo tido por alguns como impróprio 
(BÍBLIA DE JERUSALÉM, 1995, p. 875) dos Salmos e Cântico dos Cânticos. Para entendermos a 
literatura sapiencial será necessário compreendermos que ela se instala dentro do contexto do 
Antigo Oriente, ou seja, tanto na Mesopotâmia, quanto na Palestina e até no Egito, existiam textos 
bastante parecidos com os que encontramos na literatura sapiencial bíblica. Essas obras não se 
preocupavam tanto com a religião, mas com a vida profana, cujo alvo era a busca da capacidade de 
viver bem através do acúmulo da experiência. Ao ser humano cabia o conformar-se à ordem 
universal, buscando a felicidade e a prosperidade. Sabedoria era a arte do bem viver e nunca a 
capacidade de alcançar o conhecimento supremo dos deuses, a filosofia. Sabedoria aqui tem 
relação estreita com a experiência que a própria vida traz. Observe que o sábio não fala como o 
profeta: “Assim diz o Senhor...”, mas contenta-se com um “Filho meu, ouve a instrução de teu pai...”. 
O ser humano não carece aqui da busca da vontade divina em fonte direta, mas do conhecimento 
que o próprio Deus lhe permite através da experiência do pai e da mãe, do exemplo dos animais (a 
formiga), da fugacidade dos anos. A localização de Salomão como o compositor de muitos 
provérbios (não só ele, mas também por discípulos, conf. Provérbios 25:11), como um pai que lega 
a seu filho a sabedoria, contém elementos semelhantes à sabedoria egípcia, onde o Faraó deixa 
ensinamentos escritos a seu filho. Não à toa, Salomão é considerado o maior dos sábios e sua 
sabedoria superava mesmo a dos egípcios, conforme a Bíblia (I Rs.4:29-34). Mas apesar de 
semelhanças entre os textos bíblicos e os extrabíblicos percebe-se na literatura sapiencial bíblica 
tinha como fator diferencial que o alvo de toda a sabedoria é o temor do Senhor. Assim, a literatura 
sapiencial bíblica tem uma grande preocupação com a vida da pessoa em toda a sua dimensão 
física e espiritual. Não existem departamentos separados na vida de uma pessoa no Antigo 
Testamento, a saber, a separação entre o sagrado e o profano. 
 
 A literatura sapiencial não se preocupa, como os livros históricos, em mostrar os atos 
misericordiosos e salvíficos de Deus no decorrer da história em favor de seu povo Israel. A 
preocupação dos autores é mostrar às pessoas a forma em que deviam viver aqui no mundo diante 
de Deus (HEIDT, 1970, p.60). Os Salmos nos revelam a forma de orar; O livro de Jó, a maneira 
como nos portarmos diante do sofrimento. A forma de viver a vida diária é abordada em Provérbios 
e em Eclesiastes. Parece estranho afirmar que a literatura sapiencial teve implicações morais se 
bem antes desses textos existia o Código da Aliança com os Dez Mandamentos, um tratado ético 
com fortes implicações para o dia-a-dia dos antigos judeus. Acontece que, com o passar dos 
séculos e, principalmente a partir do exílio babilônico, a experiência do encontro com outras nações, 
a elaboração de novas teologias e o surgimento de problemas cujas antigas formas de reflexão não 
 3 
mais serviam para explicar, novas zonas de reflexão foram surgindo e com elas a necessidade de 
complementos morais. Entretanto, os escritores sapienciais nunca abandonaram a Torah. Antes 
encontraram uma nova forma de falar sobre ela, abandonando o jeito proibitivo e enfático das leis 
apodíticas e buscando uma maneira que apelasse mais à reflexão e ao confronto entre a pessoa e 
si mesma. Por exemplo, o “não adulterarás” é repetido em Provérbios 6:27-29 da seguinte forma: 
“Pode alguém carregar fogo consigo sem queimar a própria roupa? Pode alguém andar sobre 
brasas sem queimar os próprios pés? Assim acontece com aquele que procura a mulher do 
próximo, quem a toca não ficará impune”. 
 
 Deve-se compreender que a Sabedoria não começou em Israel como um movimento 
organizado a partir de uma elite que vivia em torno do Rei Salomão no Século X antes de Cristo. 
Expressões de sabedoria popular eram comuns no meio da família, do clã e da tribo, como em todo 
o Oriente antigo. Uma prova disto é a fábula de Jotão, em Juízes 9:8-15), uma história que põe 
árvores conversando entre si, uma sutil e forte crítica contra a possibilidade de instalação de uma 
monarquia em Israel. Com a formação do estado israelita, o interesse escriturístico amplia-se e 
Salomão torna-se modelo para aqueles que aprendem dele a arte de refletir em torno da vida. É 
justamente aqui, no período de Salomão que ocorre o auge da sabedoria em Israel, de acordo com 
José Luiz Sicre (1995, p. 275), graças a dois fatores: o contato com a cultura egípcia e a habilidade 
pessoal do rei, concedida por Deus. 
 
Com o tempo (Sec.V a C) a sabedoria israelita parte do simples para entrar numa espécie 
de “crise” cujo termo serve, não para caracterizar o desinteresse pela sabedoria em si mesma, mas 
para identificar um novo momento na sabedoria israelita quandos os sábios colocaram em xeque os 
resultados obtidos pelas antigas reflexões, distanciando-se assim do otimismo dos antepassados. É 
aquele tipo de pensamento que diz que o que foi bom no passado pode não ser bom no presente. 
Essa crise que se manifestou através de duas faces: a crise da idéia de Deus, refletida em no livro 
de Jó e a crise da própria Sabedoria, refletida no livro de Eclesiastes. Em Jó está em jogo a justiça 
divina por causa do sofrimento do justo. Se, de fato, a riqueza e a prosperidade são frutos da 
fidelidade a Deus, a pobreza, a miséria e a doença seriam conseqüências da infidelidade a Deus? É 
justamente aqui que surge o personagem Jó, um homem íntegro e reto, que, logo de início, 
confunde os leitores acostumados com o ensino tradicional do individualismo ético de Ezequiel: “A 
alma que pecar, essa morrerá” (Ez.18). A crise da idéia de Deus em Jó é resolvida quando Jó 
abandona a antiga imagem de Deus (ouvir falar) e a troca por uma nova (meus olhos te vêem), a de 
uma experiência viva através da cortina do sofrimento e da dor. No dizer de José Luiz Sicre, “a 
Sabedoria, que tinha entrado em crise, é salva por uma sabedoria superior, através da luta com o 
mistério e a blasfêmia” (1995, p. 278). 
 
 Noutra crise, a da Sabedoria em relação a si mesma, aparece o livro de Eclesiastes, o 
qual nos abre uma nova pista de reflexão, não a partir da dor, mas a partir do desencanto e do fastio 
com as coisas da vida, como o trabalho constante, o prazer, a juventude, o amor, a política, o 
conhecimento humano (ciência). Tudo é questionado e visto como fugaz. Entretanto, o autor do livro 
 4 
vê uma saída para esta crise, não como Jó, a partir de uma nova visão de Deus, mas a partir da 
própria vida “profana”: as riquezas são fruto do trabalho e podem ser “buscadas”. Viver o momento 
presente sem se “economizar” pois a morte é uma realidade da qual não há escape. Uma leitura 
superficial do texto pode deixar transparecer que o autor de Eclesiastes era materialista e hedonista. 
Mas, com o desenvolvimento do estudo do texto, veremos que não era assim, pois o autor de 
Eclesiastes sabe que teremos que prestar contas a Deus de todos os nossos atos. 
 
 No final do Antigo Testamento a sabedoria israelita foi representada em duas obras que só 
os católicos consideram canônicas: Eclesiástico e Sabedoria. Nessas obras percebe-se uma reação 
ao modelo de sabedoria imposto pelos gregos (Eclo.2:12, 3:20 e 41:8) e a afirmação que a 
verdadeira sabedoria vem de Deus e que a raiz da sabedoria é temer ao Senhor 
(Eclo.1:1,14,18,20). Outra coisa digna de nota é o grande interesse pela história do povo de Israel 
demonstrada pelos sábios desse tempo, coisa não muito comum na literatura sapiencial dos outrospovos. Esse interesse aparece em Eclesiástico 44-50, quando os personagens da história de Israel 
são exaltados, e também em Sabedoria 11-19, com uma reflexão sobre o a escravidão no Egito. 
Permanece aqui aquela antiga tradição israelita (Sl.136) de louvar a Deus pelos seus feitos no 
passado. 
 
 
 
2. ECLESIASTES – QUESTÕES SOBRE O LIVRO 
 
2.1 – ECLESIASTES OU tlhq - ”QOHELET” ? 
 
O termo “Eclesiastes” foi emprestado ao livro pela Septuaginta e pela Vulgata e vem do 
grego ekklesia que quer dizer “congregação”. No original hebraico o termo é tl,h,qo (qohelet, 
particípio feminino), que vem de lh;q; (qahal) que, por sua vez, quer dizer “assembléia, 
congregação”. O termo tem sido traduzido de forma não literal em algumas bíblias como “pregador”, 
adotado por Martinho Lutero e oriundo da tradição greco-latina. Talvez essa tradução venha da 
alusão (KIDNER, 1989, p.1) à uma possibilidade de que o termo referia-se a um “status” 
eclesiástico, como o convocador da assembléia ou aquele que a essa mesma assembléia falava. 
Russel Champlin (2000, p.2.701) complementa esse pensamento com a idéia de que Salomão teria 
convocado a grande assembléia para entregar discursos de grande sabedoria. A palavra aparece 
logo no início do texto (1:1) como designação da pessoa que fala ou que escreve. A rigor, a palavra 
traz mais a idéia de alguém que reúne, congrega, ao pé da letra, “reunidor”. Um dos problemas 
apresentados aqui por essa designação reside no fato que o termo “qahal” aparece sempre no 
Antigo Testamento designando a congregação religiosa que se reúne em torno do culto e da leitura 
da Palavra de Deus (como em Neemias 8). De acordo com Étienne Glasser (1975, p.17) Qohelet 
não pretende assumir a liderança da assembléia religiosa, a qual pertence por natureza ao sumo-
 5 
sacerdote. Mas, o termo seria utilizado aqui de forma figurada, apontando para uma assembléia de 
sábios, sendo Qohelet o sábio-mor? Talvez, diferente dos sábios das nações, Qohelet compreende-
se como pertencente à congregação de Israel, sem se preocupar necessariamente com o culto, mas 
em inserir sua sabedoria dentro do temor de Deus. No capítulo 12:9-10 (...”ele ponderou, examinou 
e corrigiu muitos provérbios...”), encontramos uma pista etmológica que nos levará à idéia de que 
Qohelet congrega sabedoria ou ensinamentos sábios e os repassa. Nesse sentido pensa José 
Líndez (1999, p. 17) quando aponta a atividade de Qohelet com dupla face: sábio-mestre e 
investigador. Líndez chega mesmo a apontar para o fato que ele era mestre numa academia de 
sabedoria em Jerusalém, a serviço das necessidades educacionais da juventude da classe alta. 
Assim, faremos uma opção em tratar o livro pelo seu título no original hebraico. Qohelet é alguém 
com personalidade e, por isso, evitaremos chamá-lo de Eclesiastes, que parece mais impessoal. 
 
 
2.2 – AUTORIA 
 
A leitura de 1:1,12 parece responder a questão logo de início: o autor do livro é Salomão, filho de 
Davi. Mas, a questão não é tão simples assim. 
• Primeiro , porque a obra alterna a apresentação dos ensinamentos na primeira e na terceira 
pessoas. Ora o autor fala de si mesmo como sendo Qohelet (1:12) , ora aponta para Salomão 
como terceira pessoa (1:1; 12:9-10). 
• Segundo , a tradição em torno de Salomão, utiliza o argumento das fortes experiências 
narradas na primeira pessoa (1:16, 2:1, 2:15, “eu vi...”, “pensei comigo mesmo...”, “eu 
entendi...”) como sendo prova da autoria salomônica. Constitui-se, na verdade, aquilo que 
Werner Schmidt (1994, p.311) chama de “ficção real”, uma fala que reproduz situações de uma 
terceira pessoa imaginária (O rei) como experiência vivencial da pessoa que escreve. 
• Terceiro , ao afirmar na primeira pessoa: “Eu, Qohelet, fui rei de Israel, em Jerusalém...”, o autor 
estaria falando que no momento da escritura do livro já não era mais rei. Seria possível isso 
num contexto onde a monarquia era vitalícia? Estaria Salomão no final de sua vida, cansado de 
suas experiências como rei e homem rico, refletindo sobre a fugacidade da vida? Ou estaria o 
autor falando como se fosse Salomão “morto”, um sábio davídico pós-salomônico, inspirado e 
fundado nele? Alude-se mais uma vez aqui ao pensamento de Werner Schmidt sobre “ ficção 
real”. 
• Quarto , Lutero foi um dos primeiros a negar a autoria do livro para Salomão, apontando para 
Jesus Ben Sirac (Sec. II a C). Mas foi a partir do início do Século Vinte que se afirmou 
categoricamente a não autoria de Salomão, em virtude do tipo de hebraico que o livro utiliza, 
cheio de aramaísmos não comuns no período salomônico, mais próximos do período do pós-
exílio quando os judeus retomaram o aramaico como língua corrente. Alguns exemplos de 
aramaísmos no livro aparecem em 1:10 (kevar), 2:8 e 5:7(medina), 4:2 (shabeach), 3:18, 7:14 e 
8:12 (‘al-divrat), 8:1 (Pesher), 10:17 (ben-chorim), entre outros. Uma lista com outros 
aramaísmos nos é apresentada por Michael Eaton e G. Lloyd Carr (1989, p. 22). 
 6 
• Quinto , não há muito consenso entre os teólogos sobre a autoria do livro. Contudo, se por um 
lado, não se pode atribuir a obra na sua inteireza a Salomão, por outro, não se pode negar a 
inspiração nele fundamentada. É sempre bom lembrar que nos tempos bíblicos, atribuir uma 
obra literária a um autor famoso era o mesmo que prestar-lhe honra, visto que suas idéias 
estaria sendo perpetuadas. Pelo menos identificam-se duas mãos no texto. Uma delas é a do 
autor principal, chamado de Qohelet; a outra é a da moldura, a da redação final, que cria as 
bordas e comentários sobre Qohelet, na terceira pessoa do singular. 
 
2.3 – DATA, LUGAR E CONTEXTO 
 
 A pergunta em torno da data da autoria do livro de Qohelet depende do posicionamento que 
o acadêmico tem em relação à autoria do mesmo. Se considerarmos que a teoria que aponta a 
autoria salomônica para o texto então teremos que remetê-lo para o período de 990 a C, quando 
Salomão reinava em Israel. Senão, teremos que considerar o contexto do Sec.III a C, momento 
posterior à morte de Alexandre Magno, quando a Palestina estava sendo governada pelos faraós 
egípcios da família dos ptolomeus, herdeiros de parte do império do grande conquistador 
macedônio. A mentalidade que dominava o Egito da época era formada pela mistura da religião com 
a filosofia, ou seja, o rei era considerado um ser divino, encarnação do deus Amon-Rá, sendo, por 
isso, dono de tudo que existia: terras, produtos e até mesmo as pessoas. Isso fazia com que o Egito 
funcionasse através de um sistema tributário interno que lembrava muito a época do Rei Salomão, 
onde todo o esforço produtivo era canalizado para a capital do império (Alexandria). A política 
externa dos faraós ptolomeus não era diferente da interna. No caso da Palestina, o poder que o rei 
egípcio desempenhava era apoiado não só pelos sacerdotes, mas por elites a este ligadas que 
tinham fortes ligações com o Egito, encarregadas de fazer a cobrança dos impostos. Sacerdotes e 
elites, além de cobradores eram também vigilantes da ideologia imposta, verdadeiros agentes do 
estado a serviço de uma máquina repressora que punia tantos quantos não obedecessem às regras 
impostas. O esquema tributário começa nas aldeias, passando pelas cidades menores, indo até à 
grande cidade Jerusalém e, por fim, à capital do império, Alexandria. Quanto ao lugar da 
composição de Qohelet é cada vez mais comum a escolha de Jerusalém, em função das evidências 
internas (1:1, 12; 5:1). 
 
 Existem alguns textos de Qohelet que pressupõem o contexto acima exposto. Proponho 
aqui um exercício de análise dos mesmos em sala de aula: 4:1; 5:1; 5:8; 5:9; 8:4. 
 
2.4 – CÂNONICIDADE 
 
 Qohelet não teve uma inclusão tranqüila no Cânon do Antigo Testamento. De acordo com 
Russel Champlin (2000, p. 2.703) houve protestos no primeiro concílio realizado em Jâmnia por 
volta do ano 90 d C que se estenderam até à época de Jerônimo,cerca de 389 d C. Ainda existe 
muita discussão sobre esse concílio. Muitos teólogos acreditam que o Cânon do Antigo Testamento 
já se achava fixado antes de 90 d C, e que em Jâmnia a discussão estava em torno da 
 7 
canonicidade dos livros que já faziam parte do Cânon. Portanto, a discussão não seria se Qohelet 
deveria ser incluso mas se deveria ser excluído. O antigo costume dos rabinos de lavarem as mãos 
após a leitura de um livro santo nem sempre se aplicou ao Qohelet. Alguns rabinos consideravam o 
texto como útil, do ponto de vista filosófico e oriundo da sabedoria humana, mas não sagrado, ou 
seja, inspirado por Deus. Assim também pensou Teodoro de Mopsuéstia, um dos principais 
teólogos da escola antioquena, entre 350 e 428 d C. 
 
Existem duas razões para a inclusão do livro no Cânon do Antigo Testamento. Apesar de 
ser contestada por grande parte dos teólogos da atualidade, a crença antiga de que Salomão teria 
escrito o livro contribuiu bastante para sua canonização. Um outro fator foi a leitura pública do livro 
no terceiro dia da Festa dos Tabernáculos como uma forma de lembrar a natureza transitória da 
vida humana, o perigo das riquezas e a necessidade de obediência a Deus, explícitas no texto do 
livro. Essa leitura era feita na Sinagoga e, a partir do Sec.VI d C, os massoretas o classificaram 
dentro de uma subdivisão do cânon judaico-palestinense conhecida por “Hamesh Megillot” (Os 
cinco rolos festivos), que continha livros a serem lidos por ocasião das principais festas judaicas. 
Além de Qohelet, compunham o grupo Cântico dos Cânticos, Rute, Ester e Lamentações de 
Jeremias. 
 
2.5 – INTEGRIDADE E INSPIRAÇÃO 
 
 Um dos grandes problemas em torno de alguns livros da Bíblia é o dilema existente entre a 
integridade e a inspiração do texto. Urge que expliquemos esses termos. Ao usar o termo 
“integridade” refiro-me aqui à capacidade que o livro tem em relação ao seu ambiente de produção. 
Seria “íntegro” um livro que não tivesse qualquer influência de qualquer literatura extra-bíblica, um 
livro onde não houvesse menção de qualquer idéia ou texto que não fosse na “íntegra” judaico. 
Portanto, integridade aqui não diz respeito à capacidade do livro de conter um ensinamento 
consistente, correto e moralmente capaz. O outro termo é “inspiração”. Num primeiro momento 
utilizaremos o termo em relação ao seu conceito mais tradicional, o da inspiração “mecânica”, onde 
Deus atua na mente do autor do livro de forma direta, quer seja pela forma do ditado verbal, quer 
seja pelo método de insuflar idéias santas, as idéias de Deus no livro, ainda que não “palavra por 
palavra”, mas aquilo que Deus queria que o autor escrevesse, recebidas por este de forma 
misteriosa. 
 
 Uma vez definidos os termos, devemos refletir em torno daquilo que pode se constituir 
numa ameaça à integridade do livro. Temos aqui alguns fatores: 
 
• Primeiro, a possibilidade já mencionada anteriormente de uma autoria do livro por duas mãos. 
Alguns chegam mesmo a colocar 3 autores para a obra, o que inclui a participação de um 
compilador. 
• Segundo, a existência de pensamentos e doutrinas que seriam estranhas ao resto do Antigo 
Testamento, consideradas até mesmo como heresias. Por exemplo, o “pessimismo” existente 
 8 
no livro (“...tudo é vaidade...”, 1:2); uma espécie de hedonismo que não combina com a ética 
vetero-testamentária (2:24-26, 11:9 a 12:8); uma negação da teologia deuteronomista com seu 
individualismo ético, conforme reproduzido na Lei (Deuteronômio), nos Livros Históricos (Josué, 
Juízes, I e II Samuel e I e II Reis) e nos livros proféticos (Jeremias e Ezequiel). Vemos isso 
estampado no pensamento de Qohelet que uma mesma sorte atinge o sábio e o insensato 
(2:12-17). O justo e o ímpio (9:2). 
• Terceiro, na existência de textos extra-bíblicos no livro, direta ou indiretamente citados. Para 
efeito de comparação utilizaremos dois exemplos, conforme abaixo expostos, citando a fonte 
paralela e os textos de Qohelet. O Primeiro exemplo é o poema egípcio datado de 2.100 a C, 
conhecido como “O Cântico do Harpista”, que trata da transitoriedade da vida humana, uma 
espécie de cântico para funerais. Compará-lo com Ecl.1:4; 9:7-10; 11:9; O segundo exemplo é 
uma parte do poema acádico da Epopéia de Gilgamesh, datado entre 2400 e 2000 a C. 
Entristecido pela morte do amigo Enkidu, o herói Gilgamesh parte em busca da imortalidade. Ao 
chegar ao jardim dos deuses, a jovem deusa Siduri, fabricante de vinhos, lhe pondera o 
fracasso de seu empreendimento e a fugacidade da vida, recomendando-lhe a vida prazeirosa 
neste mundo. Possui alguns traços com o “Cântico do Harpista” e com Ecl.9:7-9. 
 
O Cântico do Harpista (MICHAEL EATON; LLOYD CARR, 1989, p. 39). 
 
Deixa florescer teu desejo, a fim de que teu coração se esqueça do embelezamento 
Que te sobrevirá (isto é, preparações funerárias) 
Segue teus desejos, enquanto puderes viver 
Põe mirra sobre tua cabeça, e veste-te de linho fino, 
Unge-te das maravilhas genuínas da propriedade divina. 
Estabelece um aumento para tuas boas coisas; Não deixes teu coração abater-se. 
Segue teu desejo e teu bem. 
Satisfaze as tuas necessidades na terra segundo as determinações de teu coração, 
Até que sobrevenha aquele dia, o da tristeza. 
A morte é irrevogável e lança uma sombra escura sobre a vida. 
Ao homem não lhe é dado levar consigo sua propriedade. 
Atenta bem, não existe quem parta e consiga voltar outra vez. 
 
 
A Epopéia de Gilgamesh, Tabuinha X ( JOSÉ V. LÍNDEZ, 1999, p.359) 
 
Gilgamesh, para onde corres? A vida que buscas não a encontrarás. 
Quando os deuses criaram a humanidade, guardaram a vida em suas mãos. 
Tu, portanto, Gilgamesh, (deixa) que teu ventre se encha, dia e noite diverte-te; 
Cada dia faze uma festa jubilosa, dia e noite dança e toca (música). 
Que estejam limpas tuas vestes, tua cabeça lavada, estejas bem banhado. 
Presta atenção ao jovem que toma tua mão. Que tua esposa se delete em teu seio. 
Esta é a tarefa da humanidade. 
 
 9 
 
Como ponto de partida para reflexão em torno da integridade e da inspiração de Qohelet proponho 
algumas pistas a seguir com o objetivo de discutirmos em sala de aula sobre alguns antigos 
paradigmas de interpretação bíblica. 
 
• Primeiro , deve-se repensar o conceito de inspiração. Há muito tempo, já não tem sido mais 
possível sustentar o fato que os escritores bíblicos (ou todos os escritores bíblicos) 
encontravam-se sob uma espécie de estado de transe, ou recebiam diretamente através de 
ditado divino ou estavam insuflados de influência espiritual, ao escreverem os textos sagrados. 
Há textos onde se afirma que Deus falou ao personagem para que ele escrevesse exatamente 
aquelas palavras, mas esses são a minoria. Nem sempre o escritor imaginava-se debaixo de 
uma moção especial. Por isso, escrevia coisas que não possuíam necessariamente caráter 
pedagógico ou espiritual, do tipo “Quando vieres traze a capa que deixei em Trôade, em casa 
de Carpo, e os livros, especialmente os pergaminhos” (II Tm.4:13). É justamente nisso que 
reside o caráter misterioso da inspiração bíblica: o escritor escreve em toda a sua plenitude de 
ser humano, utilizando as formas e estilos humanos próprios, a partir de um projeto que, 
originalmente, não é seu, é do Criador. Sem planejar, sem arquitetar, ele participa do plano 
divino de tornar conhecido o nome de Deus, a sua vontade, de forma escrita. De fato, Pedro 
estava certo quando disse que nenhum escritor do Antigo Testamento escreveu ou falou a partir 
de “criações” suas, mas de Deus (II Pd.1:20-21). Deixa-se, portanto, o conceito tradicional da 
inspiração “mecânica” para assumir um outro conceito, o da inspiração “dinâmica”. Aqui temos a 
verdade sempre nova de que a Bíblia é de fato o encontro da Palavra de Deus com a palavra do 
homem. 
 
• Segundo , a partir do conceito da inspiração dinâmica, percebe-se então que a existência demais de uma mão no processo de escritura-redação-compilação do texto não significa uma 
ameaça à integridade espiritual do texto. A pesquisa aqui serve para explicar os caminhos por 
que passou o texto até ganhar sua forma final. 
 
• Terceiro , o pensamento que o pessimismo existente no livro afetaria a verdade de Deus não é 
mais uma idéia consistente. José V. Líndez, citando M. Hengel e Joh Pedersen (1999, p. 25), 
lembra que o tipo de ceticismo existente em Qohelet o faz duvidar somente das possibilidades 
humanas, não da realidade de Deus. Conclui que: 
 
[...] Qohelet jamais põe em dúvida a existência de Deus; o de que duvida (e até 
nega) é poder chegar a conhecer como Deus está presente e age no mundo e na 
história. Duvida também de qualquer sistema que assegure ao homem poder chegar 
a conhecê-lo com toda segurança ou aos enigmas da natureza e da vida humana, 
“de tudo aquilo que acontece sob o sol”. 
 
 10 
Não estaria aqui uma base para repensarmos a tradicional doutrina da soberania de Deus, a 
sempre e atual verdade da Graça divina e a dependência dos seres humanos desta mesma 
Graça ? 
 
• Quarto , conforme já asseveramos no primeiro capítulo deste texto, uma leitura superficial do 
livro de Eclesiastes pode deixar transparecer que Qohelet era materialista e hedonista. Qohelet 
sabe que teremos que prestar contas a Deus de todos os nossos atos. Ainda que textos como 
Ecl.5:18-20 possam sugerir um tipo de hedonismo grego, apontam mais para um tipo de prazer 
próprio do ser humano conectado com a vontade de Deus, portanto o prazer simples e cotidiano 
que agrada a Deus e não o prazer pelo prazer, como alvo único e fundamental da vida, um 
prazer maior que substitua um prazer menor até que outro prazer ainda maior venha suplantá-
lo, ainda que isso signifique a dor, mas cujo sofrimento dê prazer (Epicuro). É também dever do 
ser humano gozar do fruto de seu trabalho. O prazer não é o máximo em Qohelet, mas o 
mínimo que o ser humano pode desfrutar nessa vida tão curta: satisfazer suas necessidades 
básicas do corpo (comer e beber), desfrutar o lazer (“alegra-te”, “vestes alvas”, ou seja, vestes 
de festa), cuidar da aparência (“nunca falte óleo sobre tua cabeça“, um bom perfume – 
preservando a auto-estima), amar (inclui o amor em toda a sua dimensão física e espiritual 
(“goza a vida com a mulher que amas...”, padrão monogâmico; viver plenamente a vida em 
família). Qohelet vê que também isso vem de Deus. Agora leia 7:1 e compare com 9:8 e veja 
que um bom perfume não é o alvo máximo de Qohelet; Leia também 7:11-12, comparando com 
2:24 e veja que na mente de Qohelet dinheiro não é tudo; mesmo naquela época, muita gente 
esperta já se valia de um tipo de sabedoria para fazer dinheiro. Veja em 2:4-11 que nem mesmo 
o Rei Salomão sentiu-se feliz com todas as suas riquezas. 
 
• Quinto , quanto à crítica geralmente feita a Qohelet por ele destruir doutrinas caras ao Antigo 
Testamento como é o caso da Teologia do individualismo ético comum na historiografia 
deuteronomista e nos profetas Jeremias e Ezequiel; convém aqui analisar que Qohelet está 
separado desses escritos cerca de 300 a 400 anos. É nesse particular aspecto que Qohelet se 
parece com o ensino de Jó. O que foi bom no passado não é obrigatoriamente bom no presente 
e isso deve conter necessariamente aquilo que costumo chamar de “popularização do 
individualismo ético”. Eu diria que o ensinamento de Ezequiel de que os atos rebeldes e 
pecaminosos contra Deus geram morte é um genuíno pensamento dentro do contexto de vida 
dos exilados do quinto século na Babilônia e da grande cidade de Jerusalém prestes a ser 
invadida pelo exército de Nabucodonozor. Tanto Ezequiel quanto Jeremias fizeram uma leitura 
fatalista graças a uma história de pecaminosidade contumaz do seu povo. Será que tamanha 
irresponsabilidade ficaria sem conseqüências? Agora, a popularização da doutrina ocorre com 
aquilo que se aprende da primeira experiência. Doravante, será comum pensar que todo 
sofrimento (conseqüência) advém de um pecado (causa). Qohelet descobre que isso não serve 
mais para explicar a vida pois ele é um grande observador (1:13,14; 3:10; 4:1,4). Podemos dizer 
que ele é um grande crítico da realidade e “diz em voz alta o que a maioria silenciosa pensa” 
(JOSÉ VÍLCHEZ LÍNDEZ, 1999, p. 20). Talvez seja por isso que Qohelet incomode tanto. 
 11 
 
• Sexto , a existência de textos extra-bíblicos citados direta ou indiretamente em Qohelet deve 
provocar no leitor mais afeito à leitura devocional da Bíblia dois impactos. O primeiro, uma 
primeira impressão de que a falta de originalidade do autor poderia comprometer a inspiração 
do texto. Esse assunto já foi discutido acima. Refeito desse primeiro impacto o leitor da Bíblia 
conhecerá um outro aspecto da sabedoria de Qohelet. Ele era uma pessoa aberta ao diálogo 
com outras fontes da sabedoria humana dos povos ao seu redor. Podemos afirmar que ele 
estava “conectado” com essas fontes, interagindo com elas e a partir delas passando toda a 
verdade de Deus. Veja que ele soube ensinar o temor de Deus ao mesmo tempo em que 
refletiu sobre valores considerados “profanos”. Se, por um lado, não podemos negar que 
Qohelet estava vivo em seu mundo, por outro, ele também estava aplicando aquilo que já se 
conhecia como Palavra de Deus. Veja Ecl.3:20 com Gn.3:19; Ecl.7:7 com Ex.23:8; Ecl.5:2-6 
com Lv.5:4 e Dt.23:21-23; Um passeio pelas referências marginais do livro de Qohelet mostrará 
ainda sua grande afinidade com a Teologia expressa em Jó, Provérbios e no profeta Isaías. No 
dizer de A. Bonora, citado por José Vílchez Líndez (1999, p. 75), Qohelet estava aberto a todas 
as correntes, sem perder sua identidade israelita. 
 
2.7 – PROPÓSITO DO TEXTO DE QOHELET 
 
 Diante da proposta de reflexão lançada nestes capítulos introdutórios ao livro de 
Eclesiastes, percebe-se que Qohelet buscava um sentido para a vida, não na particularidade das 
experiências por ele vividas, mas a vida em sua totalidade, no dizer de Werner Schmidt (1994, p. 
314). Essa totalidade passa do tédio ao prazer do viver o momento presente e das grandes alegrias 
que Deus concede como fruto do trabalho dos homens até a realidade sempre presente da morte. 
Entretanto, não é possível compreendermos o propósito de Qohelet dissociado de seu contexto 
original. A questão aqui deverá buscar suas respostas no contexto vivido pela Palestina do Sec. III a 
C, já estudado em capítulo apropriado. Logo no início de seu comentário sobre o livro de 
Eclesiastes, Ivo Storniolo e Euclides Martins Balancin (1990, p. 7) fazem uma afirmação curta sobre 
o propósito de Qohelet que pode deixar o leitor desavisado perplexo: “fazer uma crítica severa, 
relembrando o tempo de Salomão, quando houve abundância para a classe governante à custa do 
trabalho e miséria do povo. A situação repetia-se no tempo do autor”. Acrescento à essa reflexão a 
introdução ao livro de Eclesiastes, anotada na Bíblia Pastoral por Ivo Storniolo e Euclides Martins 
Balancin (1997, p. 859): 
Quais os caminhos para realizar a vida e a felicidade? O autor desmonta as ilusões que 
um determinado sistema de sociedade apresente como ideal (riqueza, poder, ciência, 
prazeres, status social, trabalho para enriquecer, etc) e coloca uma pergunta 
fundamental: “Que proveito tira o homem de todo o trabalho com que se afadiga debaixo 
do sol?”(1,3). Em vez de cair no desespero, o autor descobre duas grandes perspectivas: 
Primeiro, descobre Deus como Senhor absoluto do mundo e da história, devolvendo a 
Deus a realidade de ser Deus. Depois descobre o Deus sempre presente, fazendo o dom 
concreto da vida para o homem a cada instante e continuamente. Isso leva o homem a 
descobrir que a própria realização é viver intensamente o momento presente, 
percebendo-o como lugar de relação com o Deus que dá a vida [...] Todavia, para que se 
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possa de fato viver o presente é precisousufruir o fruto do próprio trabalho (2,10; 
2,24; 3,13.22; 5,18-20; 9,9) 
 
Assim, Qohelet denuncia as conseqüências de uma estrutura social injusta que impede a pessoa de 
usufruir do fruto do próprio trabalho, situação em que fica sem vida, vida essa roubada por um 
sistema que não mais traz sentido à existência. 
 
2.8 – RELEVÂNCIA DO LIVRO 
 
 Não é preciso muito esforço para verificarmos a relevância de Qohelet. A partir da reflexão 
feita até aqui em torno do contexto, integridade e propósito de Qohelet, podemos observar linhas 
que nos orientam em torno da atualidade do livro separado de nossa época cerca de 2.300 anos. 
Meu objetivo aqui é mais fomentar a discussão em torno da atualidade de Qohelet do que responder 
perguntas. 
 
• Há uma frase de Marcian Strange (1970, p.70) que nos chama para uma reflexão sobre a 
relevância de Qohelet: “É um livro que se mostra cansado de livros”, talvez aplicando aqui o 
texto de 12:12. Strange nos remete assim para o duplo aspecto da reflexão do livro que, no 
mundo atual, está bastante estratificado: Qohelet nos convida a refletir e agir, sem ser apenas 
contemplativo ou apenas pragmático por natureza. Abre-se aqui uma ponte para outro destaque 
dessa relevância: 
• “O Eclesiastes é convite para destruir e construir” – faço alusão mais uma vez à Bíblia Pastoral 
(1997, p. 859). O pensamento crítico tem lugar na Teologia. Será que a história pode ser 
explicada a partir de uma única postura do ser humano em relação a Deus? Parece-nos que 
cada geração do povo de Israel no Antigo Testamento de fato encontrava-se sempre na tarefa 
de definir-se como povo de Deus e assim ouvir a sua voz. Que voz de Deus escutamos hoje? 
Nesse sentido Qohelet nos desafia a quebrar o gesso de concepções teológicas que em vão 
explicam Deus e nos convida a repensar uma teologia da vida, que é dom de Deus. 
• Advinda desta linha de reflexão, podemos construir outra: Qual o sentido da vida para nós? Que 
valor possuem os bens do mundo, numa sociedade de consumo que cada vez mais coloca 
dentro de nossas mentes a necessidade da busca de fama, dinheiro, sucesso, poder, prazer? É 
possível viver a vida plenamente sem necessariamente ser materialista ou hedonista? 
• Qohelet abre portas para refazermos nossos métodos hermenêuticos: Como ler Eclesiastes? 
Apenas em seu contexto? Em seu contexto, filtrado pelo Novo Testamento? Em seu contexto, 
sem filtrar pelo Novo Testamento, aplicando diretamente para os nossos dias? E aqui, o “preço” 
de se procurar sempre construir a teologia. Se não podemos ignorar a voz sempre nova de 
Deus em Qohelet quebrando o gesso dos teólogos de seu tempo, não devemos ignorar que a 
reflexão em torno de Deus continuou avançando. Jesus nos apresenta uma concepção de Deus 
e da vida muito simples e desarraigada da teologia fossilizada. Paulo nos apresenta as coisas 
da vida como sendo realizadas, quer no beber, quer no comer, para a Glória de Deus. 
 
 
 13 
 
3. ESBOÇOS DE ECLESIASTES 
 
 
 Proponho a seguir a observação de alguns esboços do livro de Eclesiastes para nortear o 
estudo do texto do livro. O esboço de um livro nunca deve ser tomado como verdade última, mas 
como um guia que orienta a nossa leitura. 
 
 
3.1 – BÍBLIA PASTORAL 
 
 
1. INTRODUÇÃO (1:1-11) 
 
1.1 A vida é passageira – 1:1-3 
1.2 Repetição produz tédio – 1:4-11 
 
2. ONDE ESTÁ A FELICIDADE (1:12 A 6:12) ? 
 
2.1 O conhecimento não resolve – 1:12-18 
2.2 O sucesso resolve ? – 2:1-16 
2.3 Trabalhar para quem não trabalha? – 2:17-23 
2.4 Felicidade é usufruir do fruto do próprio trabalho – 2:24-26 
2.5 Saber discernir os momentos – 3:1-8 
2.6 Viver o momento presente - 3:9-15 
2.7 A realização em meio a incertezas – 3:16-22 
2.8 A opressão nega a vida – 4:1-3 
2.9 A competição é desumana – 4:4-6 
2.10 A união faz a força – 4:7-12 
2.11 O vaivém da política – 4:13-16 
2.12 Com Deus não se brinca – 4:17 a 5:6 
2.13 A pirâmide da injustiça – 5:7-8 
2.14 O acúmulo traz desgraça – 5:9-16 
2.15 Eternidade é intensidade de vida – 5:17-19 
2.16 Pior que um aborto - 6:1-9 
2.17 Conclusão : O homem diante do mistério – 6:10-12 
 
 
3. EM BUSCA DO EQUILÍBRIO (7:1 A 12:14) 
 
3.1 Discernir e resistir – 7:1-7 
3.2 O futuro pertence a Deus – 7:8-14 
3.3 Só Deus é íntegro e justo – 7:15-24 
3.4 Deus fez o homem correto – 7:25-29 
3.5 Sabedoria é discernimento – 8:1 
3.6 O limite da autoridade – 8:2-9 
3.7 Vale à pena ser justo? – 8:10-15 
3.8 O limite da sabedoria humana – 8:16-17 
3.9 Apesar de tudo, vale à pena viver – 9:1-6 
3.10 Viver o presente e amar – 9:7-12 
3.11 A sabedoria derrota as armas – 9:13-18 
3.12 A influência do insensato – 10:1-3 
3.13 Calma e discernimento – 10:4-7 
3.14 Sabedoria e prudência – 10:8-11 
3.15 O sábio fala pouco – 10:12-15 
3.16 Tentação dos governantes – 10:16-20 
3.17 Prudência e risco – 11:1-6 
3.18 Viver enquanto é tempo – 11:7 a 12:8 
3.19 Conclusão: temer a Deus – 12:9-14 
 
 
 
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3.2 – BÍBLIA DE JERUSALÉM 
 
 
 1 PRIMEIRA PARTE 
 1.1 – Prólogo (Tédio) – 1:1-11 
 1.2 – A vida de Salomão – 1:12 a 2:26 
 1.3 – A morte – 3:1-22 
 1.4 – A vida em sociedade – 4:1 a 5:8 
 1.5 – O dinheiro – 5:9 a 6:12 
 
 2 SEGUNDA PARTE 
 2.1 – Prólogo (Riso) – 7:1-7 
 2.2 – A sanção – 7:8 a 8:17 
 2.3 – O destino – 9:1 a 11:6 
 2.4 – A idade – 11:7 a 12:8 
 2.5 – Epílogo – 12:9-14 
 
 
 
3.3 – JOÃO FERREIRA DE ALMEIDA (De acordo com os melhores textos hebraico/grego) 
 
 
1. A VAIDADE DE TODAS AS COISAS TERRESTRES (1:1-18) 
 
2. OS PRAZERES E AS RIQUEZAS NÃO PROPORCIONAM A FELICIDADE (2:1-26) 
 
3. HÁ, PARA TODAS AS COISAS, UM TEMPO DETERMINADO POR DEUS (3:1-22) 
 
4. OS MALES E AS TRIBULAÇÕES DA VIDA (4:1-16) 
 
5. VÁRIOS CONSELHOS PRÁTICOS (5:1-20) 
 
6. É LÍCITO GOZAR OS BENS QUE DEUS DEU, MAS ESTES NÃO PODEM SATISFAZER A 
ALMA (6:1-12) 
 
7. AS VANTAGENS DO SOFRIMENTO, DA PACIÊNCIA E DA MODERAÇÃO (7:1-29) 
 
8. A OBEDIÊNCIA DEVIDA AO REI (8:1-8) 
 
9. AS DESIGUALDADES DA VIDA (8:9-15) 
 
10. MISTÉRIO DOS ATOS DE DEUS (8:16 a 9:10) 
 
11. A SABEDORIA É MUITAS VEZES MAIS ÚTIL AOS OUTROS DO QUE ÀQUELE QUE A 
POSSUI (9:11-18) 
 
12. A EXCELÊNCIA DA SABEDORIA (10:1-20) 
 
13. FAÇAMOS O QUE É BOM NO TEMPO OPORTUNO (11:1-8) 
 
14. A MOCIDADE DEVE PREPARAR-SE PARA A VELHICE E PARA A MORTE (11:9 A 12:10) 
 
RESUMO: O DEVER DO HOMEM (12:11-14)

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