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UFC/FEAAC/DTE Microeconomia I Prof. Henrique Félix Aula 14 O EXCEDENTE DO CONSUMIDOR E OUTRAS MEDIDAS DE BEM-ESTAR 1. EXCEDENTE DO CONSUMIDOR (EC) O excedente do consumidor corresponde ao ganho do consumidor medido pela diferença entre o seu preço de reserva1 e preço que ele efetivamente paga pela quantidade do bem demandado. Graficamente, o EC é definido como a área sob a curva de demanda marshalliana (ordinária) e acima da linha de preço pago pelo consumidor. Esta área fornece a utilidade do consumo do bem em questão. Observe que no caso de uma função demanda linear (como no gráfico abaixo), é fácil determinar o EC calculando a área do triângulo ApB. Cálculo do Excedente do Consumidor (EC) Suponha uma função demanda inversa contínua e diferenciável 𝒑(𝒙) . O excedente do consumidor é dado por: 𝑬𝑪 = ∫ [𝒑(𝒙) − 𝒑] �̅� 𝟎 𝒅𝒙 = ∫ 𝒑(𝒙)𝒅𝒙 − 𝒑 ∫ 𝒅𝒙 = �̅� 𝟎 �̅� 𝟎 ∫ 𝒑(𝒙)𝒅𝒙 − 𝒑�̅� �̅� 𝟎 onde: 𝑝(𝑥) é a função demanda inversa; 𝑝 é o preço pago 1 A expressão “preço de reserva” tem origem no mercado de leilões. Num leilão, cada item tem um preço mínimo pelo qual o leiloeiro está disposto a vendê-lo. Se o preço oferecido por um comprador for abaixo deste preço mínimo, o leiloeiro se reserva o direito de comprar este item ele mesmo. Este preço ficou conhecido como preço de reserva do vendedor e passou a descrever o preço pelo qual alguém está exatamente disposto a comprar ou vender alguma coisa. (VARIAN, 2012) �̅� é a quantidade consumida Exemplo Numérico Considere o mercado de um bem hipotético, cujas funções demanda e oferta são, respectivamente, 𝑝(𝑄) = 400 − 10𝑄 e 𝑝(𝑄) = 25 + 𝑄2. O ponto de equilíbrio deste mercado é (𝑄∗, 𝑝∗) = (15, 250). O EC neste caso é: 𝐸𝐶 = ∫ [𝑝(𝑄) − 𝑝∗] �̅� 0 𝑑𝑄 = ∫ [400 − 10𝑄 − 250]𝑑𝑄 = 15 0 ∫ [150 − 10𝑄]𝑑𝑄 15 0 = 150 ∫ 𝑑𝑄 − 10 ∫ [𝑄]𝑑𝑄 15 0 15 0 = [150𝑄 − 5𝑄2]|0 15 = 150𝑄|0 15 − 5𝑄2|0 15 = 150(15) − 150(0) − 5(152) + 5(02) = 1125 2. VARIAÇÃO DO EXCEDENTE DO CONSUMIDOR (𝑽𝑬𝑪) A Variação do Excedente do Consumidor (𝑽𝑬𝑪) revela as variações do nível de bem-estar do consumidor em termos de perdas ou ganhos após alguma mudança nos preços, de uma incidência de impostos ou de outras políticas que impactam sobre o preço de um bem no mercado. Por exemplo, a incidência de um imposto sobre o consumo do bem x, que eleva o preço de p0 para p1: Observe que no caso de uma cobrança de imposto sobre a venda do bem, seu preço aumenta e a VEC será negativa (𝑉𝐸𝐶 < 0), indicando que houve perda de bem-estar. Por outro lado, no Cecilia Realce caso da aplicação de um subsídio, o preço se reduz e a VEC será positiva (𝑉𝐸𝐶 > 0), indicando que a política beneficiou o consumidor. No gráfico abaixo, a VEC pode ser decomposta em duas subáreas: (1) área A, que representa a perda gerada relativa às quantidades do bem consumidas; e, (2) área B, que representa a perda gerada relativa às quantidades do bem que deixam de ser consumidas. A Variação do Excedente do Consumidor, VEC é dada por: 𝑽𝑬𝑪 = 𝑬𝑪(𝒑𝟏) − 𝑬𝑪(𝒑𝟎) = ∫ [𝒑(𝒙) − 𝒑𝟏] 𝒙𝟏 𝟎 𝒅𝒙 − ∫ [𝒑(𝒙) − 𝒑𝟎] 𝒙𝟎 𝟎 𝒅𝒙 Expandindo-se esta expressão, têm-se, = ∫ 𝑝(𝑥) 𝑥1 0 𝑑𝑥 − 𝑝1 ∫ 𝑑𝑥 x1 0 − ∫ 𝑝(𝑥) 𝑥0 0 𝑑𝑥 + 𝑝0 ∫ 𝑑𝑥 x0 0 (1) Note que o terceiro termo em (1) pode ser reescrito como ∫ 𝑝(𝑥) 𝑥0 0 𝑑𝑥 = ∫ 𝑝(𝑥) 𝑥1 0 𝑑𝑥 + ∫ 𝑝(𝑥) 𝑥0 𝑥1 𝑑𝑥, (2) Substituindo-se em (1), tem-se, 𝑉𝐸𝐶 = ∫ 𝑝(𝑥) 𝑥1 0 𝑑𝑥 − 𝑝1 ∫ 𝑑𝑥 x1 0 − (∫ 𝑝(𝑥) 𝑥1 0 𝑑𝑥 + ∫ 𝑝(𝑥) 𝑥0 𝑥1 𝑑𝑥) + 𝑝0 ∫ 𝑑𝑥 x0 0 (3) Que resulta em, 𝑉𝐸𝐶 = − [∫ [𝑝(𝑥)] 𝑥0 𝑥1 𝑑𝑥 + 𝑝1𝑥1 − 𝑝0𝑥0] (4) Exemplo Numérico: Dados: 𝑝(𝑥) = 10 − 𝑥 2 𝑝0 = 2 → 𝑥0 = 16 𝑝1 = 3 → 𝑥1 = 14 𝑉𝐸𝐶 = − [∫ [𝑝(𝑥)] 𝑥0 𝑥1 𝑑𝑥 + 𝑝1𝑥1 − 𝑝0𝑥0] 𝑉𝐸𝐶 = − [∫ (10 − 𝑥 2 ) 16 14 𝑑𝑥 + (3.14 − 2.16)] = − [10 ∫ 𝑑𝑥 16 14 − 1 2 ∫ 𝑥𝑑𝑥 + 10 16 14 ] = − [10𝑥|14 16 − 1 2 𝑥2 2 |14 16 + 10] = − [10(16 − 14) − 1 4 (162 − 142) + 10] = − [20 − 60 4 + 10] = −[20 − 15 + 10] = −15 Observação: Usando-se a função demanda ordinária, 𝑥(𝑝) = 20 − 2𝑝 , a VEC é calculada com a integral no preço, 𝑉𝐸𝐶 = ∫ 𝑥(𝑝)𝑑𝑝 = ∫ [20 − 2𝑝]𝑑𝑝 = [20(3 − 2) − (32 − 22)] = 15 > 0 3 2 𝑝1 𝑝0 Mas o exemplo é de um aumento do preço, logo a VEC deveria ser negativa. Para resolver isto, deve-se inverter os limites de integração, 𝑉𝐸𝐶 = ∫ 𝑥(𝑝)𝑑𝑝 = ∫ [20 − 2𝑝]𝑑𝑝 = [20(2 − 3) − (22 − 32)] = −15 2 3 𝑝0 𝑝1 < 0 Assim, chega-se ao mesmo resultado anterior com a função demanda inversa. Pode-se concluir que a medida da VEC é a mesma tanto com a demanda ordinária (usando-se os preços como limites da integração) quanto com a demanda inversa (usando-se as quantidades como limites da integração), ou seja, 𝑉𝐸𝐶[𝑝(𝑥)] = 𝑉𝐸𝐶[𝑥(𝑝)]. 3. VARIAÇÃO COMPENSATÓRIA (VC) A Variação Compensatória (VC) é uma medida monetária que representa a variação de renda que seria necessária para deixar o consumidor tão bem quanto antes de uma variação de preço, ou seja, para levá-lo à curva de indiferença original, ou ainda, para compensá-lo pela variação do preço. É dada pelo negativo da Compensação Hicksiana na renda. Cecilia Realce No caso de uma elevação do preço do bem, há redução do nível de bem-estar do consumidor e, portanto, a VC é negativa. Caso contrário, o nível de bem-estar aumenta e a VC é positiva. Observação: Usando-se as funções utilidade indireta e dispêndio mínimo, pode-se definir a VC como abaixo. No mesmo nível de bem-estar anterior, têm-se, 𝑣(𝑝1, 𝑀 − 𝑉𝐶) = 𝑣(𝑝0, 𝑀) 𝑒(𝑝1, 𝑣(𝑝1, 𝑀 − 𝑉𝐶)) = 𝑒(𝑝1, 𝑣(𝑝0, 𝑀)). 𝑒(𝑝1, 𝑣(𝑝1, 𝑀 − 𝑉𝐶)) = 𝑀 − 𝑉𝐶 𝑽𝑪 = 𝑀 − 𝒆(𝒑𝟏, 𝒗(𝒑𝟎, 𝑀)) Exemplo Numérico de Cálculo da VC Um consumidor encara uma função utilidade 𝑈(𝑥1, 𝑥2) = 𝑥1 1/2 𝑥2 1/2 , paga, originalmente, os preços ($1,$1) e tem uma renda de $100. Suponha uma incidência de impostos indiretos que eleva o preço do bem 1 para $2. Calcule a variação compensatória. A solução do PMU neste caso resulta em: (1) Antes da incidência do imposto, 𝑥1 ∗ = 𝑀 2𝑝1 = 100 2(1) = 50 e 𝑥2 ∗ = 𝑀 2𝑝2 = 100 2(1) = 50 (2) Após a incidência do imposto, 𝑥1 ∗∗ = 𝑀 2𝑝1 = 100 2(2) = 25 e 𝑥2 ∗∗ = 𝑀 2𝑝2 = 100 2(1) = 50 Cecilia Realce Para manter o nível de utilidade anterior à variação de preço, iguala-se as utilidades máximas antes e após a variação do preço do bem 𝑈(𝑥1 ∗, 𝑥2 ∗) = 𝑈(𝑥1 ∗∗, 𝑥2 ∗∗) 𝑈(50, 50) = 𝑈 ( 𝑀 2𝑝1 , 𝑀 2𝑝2 ) 50 1 250 1 2 = ( 𝑀 2(2) ) 1 2 ( 𝑀 2(1) ) 1 2 50 = 𝑀 √4√2 → 𝑀 = 100√2 → 𝑀 = 141,42 𝑉𝐶 = (100 − 141,42) = −41,42 Conclusão: se, após o imposto, a renda do consumidor fosse de $141,42, ele estaria tão bem quanto com a renda inicial de $100 pagando os preços originais (antes do imposto) e manteria o mesmo nível de bem-estar anterior (na mesma curva de indiferença original). 4. VARIAÇÃO EQUIVALENTE (VE) A Variação Equivalente (VE) é uma medida monetária que representa a variação de renda que o consumidor estaria disposto a abrir mão para evitar a variação de preço, ou seja, para que sua escolha na curva de indiferença posterior possa deixa-lo com o mesmo nível de bem-estar de antes da variação no preço, ou ainda, para compensá-lo pela variação do preço. No caso de uma elevação do preço, uma vez que prejudica o consumidor, a VE é negativa. Caso contrário será positiva. Cecilia Realce Observação: Usando-se as funções utilidade indireta e dispêndio mínimo, pode-se definir a VC como abaixo. No mesmo nível de bem-estar anterior, têm-se, 𝑣(𝑝1, 𝑀) = 𝑣(𝑝0, 𝑀 + 𝑉𝐸) 𝑒(𝑝1, 𝑣(𝑝1, 𝑀)) = 𝑒(𝑝0, 𝑣(𝑝0, 𝑀 + 𝑉𝐸)) 𝑒(𝑝0, 𝑣(𝑝0, 𝑀 + 𝑉𝐸)) = 𝑀 + 𝑉𝐸 𝑽𝑬 = 𝒆(𝒑𝟎, 𝒗(𝒑𝟎, 𝑴 + 𝑽𝑬))− 𝑴 Exemplo Numérico de Cálculo da VE No mesmo exemplo da Cobb-Douglas acima, 𝑈(𝑥1, 𝑥2) = 𝑥1 1/2 𝑥2 1/2 , tem-se: Para manter o nível de utilidade posterior à variação de preço, 𝑈(𝑥1 ∗, 𝑥2 ∗) = 𝑈(𝑥1 ∗∗, 𝑥2 ∗∗) 𝑀 2 1/2 𝑀 2 1/2 = 251/2501/2 → 𝑀 ≅ 70 𝑉𝐸 = (70 − 100) = −30 Conclusão: o consumidor estaria disposto a pagar (reduzir sua renda) em $30 para não encarar a elevação do preço do bem 1 via imposto. De outra maneira, se o consumidor tivesse uma renda de $70 aos preços originais, estaria tão bem quanto com uma renda de $100 aos novos preços, ou seja, estaria com o mesmo nível de bem-estar posterior ao da variação de preço. Observação: Se a mudança de preço melhora a situação de bem-estar do indivíduo, então: 𝑉𝐶 > 0 𝑒 𝑉𝐸 > 0. Caso contrário, isto é, se piora, então, 𝑉𝐶 < 0 𝑒 𝑉𝐸 < 0. Note que o sinal de VC e VE é igual ao sinal de VEC. Assim, • Se o bem-estar melhora ⟹ 𝑉𝐶 > 0, 𝑉𝐸 > 0 𝑒 𝑉𝐸𝐶 > 0 • Se o bem-estar piora ⟹ 𝑉𝐶 < 0, 𝑉𝐸 < 0 𝑒 𝑉𝐸𝐶 < 0 5. PREFERÊNCIAS QUASE-LINEARES No caso de funções utilidade quase-lineares, onde a demanda por um dos bens não depende da renda, as medidas VC e VE são iguais, V𝐶 = 𝑉𝐸 Cecilia Realce Cecilia Realce 6. O EXCEDENTE DO PRODUTOR O excedente do produtor pode ser medido pela área acima da função oferta e abaixo do nível de preço efetivamente praticado. 𝐸𝑃 = 𝑝𝑠 ∗𝑥∗ − ∫ 𝑝𝑠(𝑥) 𝑥∗ 0 𝑑𝑥 A Variação do Excedente do Produtor (VEP) 𝑉𝐸𝑃 = 𝐸𝑃1 − 𝐸𝑃2 = [𝑝 ′′𝑥′′ − ∫ 𝑝𝑠(𝑥)𝑑𝑥 𝑥′′ 0 ] − [𝑝′𝑥′ − ∫ 𝑝𝑠(𝑥)𝑑𝑥 𝑥′ 0 ] = = [𝑝′′𝑥′′ − 𝑝′𝑥′] − {∫ 𝑝𝑠(𝑥)𝑑𝑥 𝑥′ 0 + ∫ 𝑝𝑠(𝑥)𝑑𝑥 𝑥′′ 𝑥′ } + ∫ 𝑝𝑠(𝑥)𝑑𝑥 𝑥′ 0 𝑽𝑬𝑷 = [𝒑′′𝒙′′ − 𝒑′𝒙′] − ∫ 𝒑𝒔(𝒙)𝒅𝒙 𝒙′′ 𝒙′ Cecilia Realce Cecilia Realce Literatura: VARIAN, Hal R. (2012) Cap. 14 RESENDE, José G. de L. (Notas de Aula 10 e 11) JEHLE & RENY (2001) EXERCÍCIOS PROPOSTOS 1. Considere o mercado competitivo para um bem qualquer com as seguintes funções de demanda e oferta de mercado: Demanda: P = 400 – 10Q Oferta: P = 25 + Q² Onde P é o preço do bem e Q é a quantidade demandada do bem. Responda as questões abaixo: (a) Qual o preço e a quantidade de equilíbrio desse mercado? (b) Calcule o excedente do consumidor nesse mercado. (c) Calcule o excedente do consumidor após o governo fixar o máximo de unidades vendidas em apenas 10. 2. Considere o mercado competitivo para um bem qualquer com as seguintes funções demanda e oferta: Demanda: P = a – Q² Oferta: P = 3Q² Onde “a” é uma função qualquer da renda agregada dos consumidores nesse mercado. Responda as questões abaixo: (a) Qual o preço e a quantidade de equilíbrio? (b) Calcule o excedente do consumidor. (c) Suponha a = R/3, onde “a” é a renda agregada dos consumidores nesse mercado. Suponha que R=4. Qual a variação no excedente do consumidor quando a renda agregada dos consumidores aumenta? 3. Suponha que certo modelo de mercado possui as funções de demanda e oferta dadas, respectivamente, por: P = 14 – Q²d e P = 2 + Q0. Nessas condições, calcule o excedente do consumidor. 4. Suponha que uma mercadoria Q tenha uma função demanda inversa p = 3⋅q-1/2 e que atualmente são vendidas 100 unidades. Qual é o excedente do consumidor desta mercadoria? 5. Suponha um consumidor com uma função utilidade U(x1, x2) = x1 1/2 x2 1/2 . Originalmente, ele se defronta com os preços ($1,$1) e tem uma renda de $100. No momento seguinte o preço do bem 1 aumenta para $2. Determine as variações compensatória e equivalente. 6. A função utilidade quase-linear de um consumidor é dada por 𝑼(𝒙𝟏, 𝒙𝟐) = √𝒙𝟏 + 𝒙𝟐 . Suponha que o preço do bem 1 varie de p1 0 para p1 1. Pede-se: (a) Encontre a expressão da Variação Compensatória (VC); (b) Encontre a expressão da Variação Equivalente (VE); (c) O que há em comum entre os resultados dos itens anteriores?
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