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Ler os Clássicos hoje - Os Maias


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MARIA ALMIRA SOARES 
OSCLÁSSICOS
Ler
Hoje
os maias
EÇA DE QUEIRÓS
NOVO
PROGRAMA
Metas
Curriculares
11.º ano
MARIA ALMIRA SOARES 
OSCLÁSSICOS
Ler
Hoje
Os maias
Eça de Queirós
ÍNDICE GERAL
APRESENTAÇÃO ............................................. 5
CONTEXTUALIZAÇÃO 
HISTÓRICO-LITERÁRIA .................................. 6
 Realismo .................................................... 6
Eça de Queirós e o realismo português .......... 8
Biografia de Eça de Queirós ......................... 9
OS MAIAS ....................................................... 11
Importância e valor literário de OS MAIAS ...... 11
Características do texto narrativo ............... 12
O romance ................................................. 15
Visão global da obra e da sua estruturação ... 30
EDUCAÇÃO LITERÁRIA – TEXTOS 
ESCOLHIDOS DE OS MAIAS ............................. 32
Representação de espaços sociais
e crítica de costumes ................................... 32
Espaços e seu valor simbólico e emotivo ......... 39
Representações do sentimento e da paixão:
diversificação da intriga amorosa ................. 42
Pedro da Maia .......................................... 42
Carlos da Maia ......................................... 43
Ega ....................................................... 44
Características trágicas dos protagonistas .... 48
Afonso da Maia ........................................ 48
Carlos da Maia ......................................... 48
Maria Eduarda ......................................... 49
A descrição do real e o papel das sensações .... 54
A descrição do real e o papel das sensações. 
Linguagem, estilo e recursos expressivos ....... 59
ÍNDICE REMISSIVO
Ação 6, 13, 16, 17, 18, 19, 22, 25, 26, 57 
Ação central 15, 17, 18, 19 
Biografia 9
Características trágicas 48, 52 
Catástrofe 23, 33, 37, 52, 53 
Comédia de costumes 17 
Comparação 38, 60, 62, 63
Complexidade 14, 15, 19, 20 
Contextualização 6 
Crítica de costumes 7, 24, 32, 36, 37 
Descrição 12, 13, 14, 29, 41, 54, 59, 62
Diálogo 12, 13, 14, 38, 51 
Discurso indireto livre 14, 15, 38 
Espaço 12, 15, 19, 22, 24, 36, 40, 41, 57, 58, 62
Estilo 8, 59 
Estruturação 14, 30, 
Extensão 15, 20, 28, 29 
Intriga 12, 14, 15, 17, 24, 26, 31, 42, 45, 46, 53
Ironia 8, 13, 28, 37
Linguagem 59
Metáfora 38, 60, 62, 63
Monólogo 12, 13, 15
Narração 12, 13, 14, 18, 21, 22 
Paixão 18, 25, 26, 35, 42, 46, 47, 48, 49
Personagens 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 26, 27, 28, 29, 36, 
38, 52
Personificação 62, 63
Pluralidade 16, 19, 46 
Protagonistas 19, 24, 25, 46, 48, 51, 52, 53, 62 
Realismo 6, 7, 8, 15, 47
Reconhecimento 52
Recursos expressivos 36, 38, 41, 59, 60, 62, 63
Reprodução do discurso no discurso 14, 36 
Romance 6, 7, 8, 9, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 20, 21, 22, 23, 24, 
26, 28, 29, 30, 31, 40, 41, 45, 46, 52, 62
Sensações 14, 54, 57, 58, 59, 60 
Sentimento 7, 25, 26, 42, 46 
Sinestesia 38, 62, 63
Subtítulo 30, 31
Tempo 7, 11, 12, 13, 16, 19, 20, 21, 23, 26, 31, 40, 48, 56, 
57, 58, 61
Texto narrativo 12, 15, 17, 19, 21, 29
Título 9, 30, 31
Tragédia 25, 26, 41, 47, 51, 52, 62
Uso expressivo do adjetivo 38, 60, 62, 63
Uso expressivo do advérbio 38, 60, 61, 62, 63
Valor emotivo 39, 40, 41 
Valor simbólico 39, 40, 41 
Visão global 30
5
APRESENTAÇÃO
O Programa de Português do Ensino Secundário, 
«Educação Literária», 11.º ano, inclui Os Maias, obra 
cujo valor literário, histórico -cultural e patrimonial 
é indiscutível. Sem prejuízo da concordância com 
esta inclusão, não deverão deixar de ser pondera-
das algumas dificuldades de leitura, compreensão e 
interpretação deste romance por parte dos alunos 
do 11.º ano. A completa fruição da obra passa pela 
ultrapassagem dessas dificuldades.
É sabido que a leitura dos clássicos é essencial 
em educação literária, mas também não deixa de 
ser conhecida a dificuldade de penetração nesses 
textos, provocada por múltiplos fatores. Sendo 
assim, os alunos necessitam de instrumentos que 
os incentivem e os ajudem a encontrar o caminho 
mais proveitoso e não os deixem desistir perante os 
obstáculos à leitura. 
Este auxiliar da leitura de Os Maias, que aqui 
apresento, pretende prestar aos alunos a necessária 
ajuda capaz de os levar a ler com o melhor proveito.
Assim, para além da informação de ordem lite-
rária e contextual que enquadra a obra e ilumina a 
sua compreensão, são apresentadas, para cada um 
dos excertos selecionados, sequências de questões e 
respetivas respostas. Esta questionação incide preci-
samente nos temas do domínio da «Educação lite-
rária» presentes no Programa. A relação leitura do 
texto/questão/resposta facultará aos alunos os recur-
sos necessários ao desenvolvimento do seu percurso 
neste domínio: por um lado, a experimentação e o 
conhecimento -treino do tipo de questionação espe-
rável; por outro lado, os saberes necessários à lei-
tura de um texto literário clássico e especificamente 
deste romance.
��
6
CONTEXTUALIZAÇÃO 
HISTÓRICO-LITERÁRIA
Realismo
Na história da literatura portuguesa, a segunda 
metade do século xix é a época do Realismo. 
O romance de Eça de Queirós, Os Maias, foi publi-
cado em 1888, constituindo, assim, um marco 
importantíssimo do movimento realista. 
Durante o século xix, com o evoluir da sociedade 
e da situação política portuguesa, o Romantismo, 
que vigorara durante a primeira metade do século, 
tornou -se um movimento decadente, desligado da 
realidade. O sentimentalismo romântico perdeu 
autenticidade e cristalizou num modo de fazer litera-
tura alheado das mudanças sociais que pediam outra 
atitude, outro olhar e outros objetivos literários.
Uma nova geração de jovens escritores antirro-
mânticos – a Geração de 70, por se ter formado nos 
anos setenta do século xix – luta e clama pelo Rea-
lismo. Trata -se de uma geração muito influenciada 
pela cultura francesa que pôde conhecer, graças ao 
desenvolvimento das comunicações, sobretudo da 
ligação por via férrea entre Portugal e Paris. 
De facto, passado o período conturbado das 
lutas liberais, a «Regeneração» (situação política 
que instituiu estabilidade no país) permitiu algum 
progresso material, nomeadamente no capítulo das 
comunicações.
Todavia, como o Romantismo estava muito 
enraizado na cultura portuguesa, a ação da Geração 
de 70 – para além da própria criação literária rea-
lista – revestiu enérgica intervenção pública, em que 
sobressaem as «Conferências do Casino». Numa 
dessas conferências, intitulada «O Realismo como 
nova expressão da Arte», Eça de Queirós afirmou 
7
as linhas fundamentais da nova escola literária, o 
Realismo.
Linhas fundamentais do Realismo:
– a criação literária realista tem como ideal a 
reforma dos costumes sociais e concretiza -se 
através do romance;
– o romance realista, através da representação 
pormenorizada da vida social (hábitos, figuras, 
gostos, realizações) faz a análise crítica dos cos-
tumes, expondo com clareza os seus males para 
que possam ser corrigidos;
– a literatura realista tem, pois, objetivos da 
ordem da crítica social; não se limita a ser, 
como era o Romantismo, «a apoteose do sen-
timento»1;
– a literatura realista deve ter, como temas, a vida 
social sua contemporânea e, como recursos, 
a observação pormenorizada, a experiência, a 
análise;
– a razão, a análise racional, deve sobrepor -se à 
subjetividade sentimental romântica que sub-
metia a razão aos sentimentos.
O Realismo levou algum tempo a implantar -se 
no panorama literário português e, assim, só prati-
camente no último quartel do século xix se publica-
ram obras realistas. Eça de Queirós sobressai dentre 
os escritores realistas portugueses e Os Maias são, 
sem dúvida, a sua obra -prima, o grande romance 
realista da literatura portuguesa.
 
1 In Eça de Queirós, O Realismo como nova expressão da arte. 
8
Eça de Queirós e o realismo 
português
Ler os romances de Eça de Queirós é uma das 
melhores formas de ficar a conhecer o realismo por-
tuguês. Eles constituem o quede melhor se produ-
ziu, em termos de romance, na segunda metade do 
século xix, em Portugal. 
Eça de Queirós, durante a sua formação inte-
lectual, absorveu, pela leitura, as influências do 
realismo francês que já se desenvolvera e afirmara 
através de grandes romances. Além disso, os prin-
cípios e objetivos, que o Realismo propugnava, 
conjugavam -se muito bem com o carácter da sua 
escrita literária e mesmo com o seu modo de estar 
na vida. 
Eça era mordaz, sarcástico, dono de um espírito 
crítico lúcido e certeiro, iluminado por uma ironia 
tão fina quão eficaz. Associava, ao seu inigualável 
sentido de humor, uma grande capacidade de obser-
vação crítica do real social. Através do seu sentido 
crítico, ele era um português distanciado dos modos 
retrógrados em que a vida social portuguesa se cris-
talizara e que teimavam em persistir, atrasando a 
evolução cultural do país. 
Eça de Queirós, através de uma escrita imbuída 
de um estilo inconfundível, preciso, esteticamente 
agradável, irónico, foi o grande obreiro do ideal 
realista português. Trabalhava admiravelmente a 
língua portuguesa, ao serviço do seu fino poder de 
observação. Deste modo, deixou -nos retratos ines-
quecíveis do Portugal seu contemporâneo, em que, 
ainda hoje, fruímos, simultaneamente, a lúcida 
compreensão da realidade social e o gozo mordaz da 
sua representação irónica. 
Não é, pois, exagero, afirmar que a obra de Eça 
de Queirós é a trave -mestra do romance realista 
português e o seu máximo expoente.
9
Biografia de Eça de Queirós
José Maria de Eça de Queirós nasceu na Póvoa 
de Varzim, em 1845. 
A sua primeira educação escolar decorreu 
no Colégio da Lapa, no Porto, a partir de 1855. 
A partir de 1861, frequentou a Faculdade de Direito 
de Coimbra até 1866, ano em que, já formado em 
Direito, se instalou em Lisboa, em casa dos pais. 
Nesse mesmo ano, inscreveu -se como advogado no 
Supremo Tribunal de Justiça. 
A sua primeira obra, publicada ainda nesse ano, 
surge na Gazeta de Portugal sob a forma de folhetim 
e intitula -se Prosas Bárbaras.
Ainda em 1866, parte para Évora. Aí, funda e 
dirige um jornal da oposição, Distrito de Évora. Em 
1867, regressa a Lisboa e, no final desse ano, parti-
cipa no Cenáculo, espécie de clube intelectual de 
intuitos revolucionários.
Em 1869, faz uma viagem ao Egito, assistindo à 
inauguração do Canal do Suez. A experiência desta 
viagem é a base dos relatos que publica no Diário de 
Notícias sob o título de «Port -Said a Suez».
Em 1870, publica, em colaboração com Rama-
lho Ortigão, O Mistério da Estrada de Sintra. Neste 
mesmo ano, é nomeado administrador do concelho 
de Leiria e obtém o primeiro lugar na classificação 
das provas que presta para cônsul de 1.ª classe. 
Em 1871, publica com Ramalho Ortigão As Far-
pas e participa nas Conferências do Casino.
A partir deste ano, prossegue a sua carreira diplo-
mática, sendo cônsul em Havana e Newcastle. Viaja 
pela América. 
Em 1876, publica o romance O Crime do Padre 
Amaro e, em 1878, O Primo Basílio.
10
Em 1886, casa com Emília de Castro Pamplona, 
condessa de Resende e, em 1888, é nomeado cônsul 
em Paris e publica Os Maias. 
Nos anos seguintes, continua a publicar e a 
intervir na vida cultural portuguesa, permanecendo 
sempre como cônsul em Paris. Morre em 1900, em 
Paris. 
��
11
OS MAIAS
Importância e valor literário 
de OS MAIAS
Ler Os Maias é conhecer a Lisboa da segunda 
metade do século xix, naquele sentido, defendido 
por muitos, de que se conhece melhor a História e a 
sociologia de um dado momento de um povo atra-
vés da leitura de um romance do que de um ensaio 
de cariz histórico. De facto, Os Maias dão -nos o 
retrato do quadro histórico, dos meios sociais, dos 
espaços físicos e geográficos onde se move todo um 
conjunto de personagens representativas de uma 
época. 
O poderoso génio criativo de Eça de Queirós, 
para compor personagens representativas da vida 
social do seu tempo, faz de Os Maias um inigualável 
ponto de observação de Portugal e, sobretudo, de 
Lisboa, no último quartel do século xix. 
Com a leitura deste romance, ficamos a conhecer 
os costumes sociais, em áreas que vão dos diverti-
mentos à educação, passando pela culinária, pelo 
vestuário, pelos transportes, pelos hábitos culturais 
e amorosos, numa visão simultaneamente ampla e 
pormenorizada. 
A este valor, advindo da exímia representação da 
vida social, acrescem duas outras características lite-
rárias que tornam a leitura deste romance extrema-
mente apetecível:
– o tom da escrita: humorístico, caricatural, 
irónico;
– o brilhantismo linguístico com que Eça de 
Queirós narra, descreve, constrói os diálogos.
A construção do romance é também uma 
demonstração de bem escrever. Os Maias paten-
teiam a arte literária de construir e sequencializar 
grandes painéis coletivos, sem deixar de, neles, 
12
 inscrever, com nitidez, os acontecimentos nucleares 
da intriga em que agem as personagens principais. 
Trata -se, pois, de uma obra que é um marco da 
qualidade literária atingida pelo romance portu-
guês, no período realista.
 
Características do texto narrativo
Texto narrativo
Os Maias são um texto narrativo e, dentro deste 
género textual, um romance. 
Como texto narrativo que são, contam ao leitor 
os acontecimentos ficcionais que constituem a sua 
intriga, dispondo -os numa certa ordem sequencial. 
Tais acontecimentos são situados no tempo e no 
espaço, em estreita conexão com as personagens. 
Estas mantêm, entre si e com o meio, uma teia de 
relações. 
No caso d’Os Maias, a elaboração e o desenvol-
vimento dos referidos elementos (intriga, tempo, 
espaço, personagens) exigem uma narrativa extensa 
e complexa a que chamamos romance. 
Os Maias são, pois, um romance. Nele, o enca-
deamento dos eventos e sequências narrativas é 
urdido de modo a simular o acontecer natural. As 
personagens vão -se insinuando subtilmente, dei-
xando que o andar da narrativa revele a função e o 
lugar específicos de cada uma na história que está a 
ser contada. 
São vários os modos de expressão de que uma 
narrativa dispõe e pode utilizar segundo a sua eco-
nomia própria. Os principais são: a narração; a des-
crição; o diálogo; o monólogo. 
A arte de narrar consiste na combinação adequada 
destes vários modos de expressão. Por exemplo: 
13
– as páginas finais de Os Maias reabrem Lisboa 
ao regresso de Carlos e Ega e, numa romagem 
de memória, passados dez anos, reativam a 
intensa descrição dos lugares e das persona-
gens, que nos tinham sido já antes descritas, 
mas, agora, muito mais decadentes;
– a mensagem final do romance é expressa em 
forma de diálogo: a ironia do declarado pessi-
mismo, do «vencidismo» de Carlos e Ega, é dei-
xada no ar através das falas de um diálogo entre 
os dois amigos («– Ainda o apanhamos!»), que 
correm para o americano, a caminho de uma 
jantarada. 
Narração
N’Os Maias, como aliás na generalidade das nar-
rativas, o modo de expressão básico é a narração. 
É a narração que faz avançar os fios da história, 
a corrente verbal -base que vai derivando, segundo 
as necessidades narrativas, para a descrição, para o 
diálogo ou para o monólogo. A narração é dinâ-
mica, flui no tempo, urdindo os acontecimentos; 
a descrição é estática, constitui uma pausa no 
 andamento da ação e destina -se a «desenhar» as 
personagens retratando -as ou a dar a imagem de 
lugares. 
Descrição
Os Maias, como romance realista, usam assidua-
mente a descrição e uma descrição pormenorizada 
que constrói imagens fiéis ao real. As descrições 
deste romance queirosiano são quase fotográficas; 
lê -las é ter a sensação de caminhar pela Lisboa do 
século xix, com o Chiado, o Grémio Literário, a 
Havaneza, os teatros, os hotéis, as ruas e as praças, e 
encontrar «gente» da época como se a sua vida, a sua 
cor, a seu movimento, a sua voz fossem reais.
Eça de Queirós é um exímio estilista da des-
crição dos ambientes, compondo, com meticuloso 
cuidado, quer espaços interiores ou exteriores, quer 
14retratos de personagens. Depois da leitura destas 
descrições, o sentido queirosiano dos pormenores 
deixa -nos, na memória, tecidos, tons, texturas, 
luzes, ruídos, gestos, olhares, aromas, as mais 
fugazes ou impressivas sensações térmicas, auditi-
vas, visuais. Deste modo, mergulhamos em toda 
a complexidade e variedade da atmosfera roma- 
nesca.
A particular estruturação deste romance exige 
que a sua primeira parte seja bastante descritiva: 
nela, o leitor é inserido no ambiente social e físico e 
são -lhe apresentadas as personagens nucleares.
Diálogo
No entanto, à medida que a intriga começa a 
ganhar ritmo e velocidade narrativa, o diálogo é fre-
quente e torna -se abundante. Trata -se de diálogos 
muito bem construídos, com grande naturalidade e 
maleabilidade segundo as personagens intervenien-
tes. Os quadros sociais de conjunto, tantas vezes fic-
cionados n’Os Maias, são vivíssimos, empolgantes 
até – como no episódio do jantar do Hotel Cen-
tral – e vivem da bem conseguida combinação entre 
narração, diálogo e descrição. 
Reprodução do discurso no discurso
– Discurso indireto livre
Outro modo de expressão, de que Eça de Queirós 
é um grande criador, é o discurso indireto livre. Este 
modo discursivo mistura características da narração 
e do diálogo: 
– por um lado, mantém os aspetos formais da 
narração, ou seja, do discurso indireto (pon-
tuação; verbos no passado e na terceira pessoa; 
referência das personagens na terceira pessoa);
– por outro lado, quanto aos aspetos semânticos 
e vocabulares, introduz no discurso as carac-
terísticas próprias da personagem como se se 
tratasse de uma intervenção sua em diálogo. 
15
O uso do discurso indireto livre faz o leitor 
reconhecer os tiques, o olhar, os hábitos verbais 
da personagem, senti -la como presença viva, mas, 
simultaneamente, distanciada, mediada pela obser-
vação externa, indireta, do discurso do narrador. 
Este facto produz, muitas vezes, efeitos irónicos, 
humorísticos, caricaturais ou reflexivos, críticos. 
Monólogo
Em consequência do progressivo desenvolvi-
mento da complexidade narrativa do romance, a 
intriga atinge o seu clímax, ou seja, o momento 
da descoberta do parentesco entre Carlos e Maria 
Eduarda. A partir daí, tudo se encaminha para o 
desfecho: a separação dos dois e o seu afastamento 
de Lisboa, palco da ação central; a morte de Afonso 
da Maia. 
É neste momento do romance que a problemá-
tica mais subjetiva, em torno das reações de Carlos 
da Maia, exige, por vezes, a presença do monólogo 
interior em que ele pensa e sofre os seus dilemas. 
O romance
Dentro do género narrativo, Os Maias são um 
romance cujos traços definidores são:
– a extensão volumosa da sua narrativa; 
– a complexa atmosfera psicossocial criada; 
– o número de personagens denso, variado, plural; 
– o ritmo temporal predominantemente lento, 
aproximando -se do acontecer quotidiano. 
Sendo um romance, Os Maias são ainda um 
romance realista, pois dão corpo literário ao sentido 
social que o Realismo atribui à literatura. Os Maias 
são também um romance de espaço, a «pintura» de 
um meio histórico, de um ambiente social. 
16
Pluralidade de ações
A ação de Os Maias articula -se fundamental-
mente em dois planos: 
– o da trajetória da família Maia; 
– o da sucessão de quadros representativos da 
decadência social de Portugal no século xix. 
A trajetória da família Maia reparte -se por três 
tempos diferentes:
– o tempo de Afonso da Maia, personagem 
que se mantém ao longo do romance, desde 
a juventude até à morte, acompanhando toda 
a ação; 
– o tempo de Pedro da Maia, tempo curto de 
uma personagem que se esvai em si mesma, 
vítima do seu exacerbado sentimentalismo 
romântico; 
– o tempo de Carlos da Maia, o protagonista da 
ação principal. 
A ação principal do romance, protagonizada 
pela família Maia, não se limita aos acontecimentos 
íntimos desta família, mas torna -se mais complexa 
através do seu enquadramento em ações secundárias 
que constroem a época de cada geração:
– Afonso da Maia surge inserido no tempo das 
lutas liberais e dos exílios românticos, embora 
venha a acompanhar a ação até ao final; 
– Pedro da Maia insere -se no período dos exces-
sos sentimentais do clima ultrarromântico;
– Carlos da Maia é contemporâneo da «Regene-
ração», do tempo em que o constitucionalismo 
monárquico está já estabelecido.
Há, pois, n’Os Maias, uma pluralidade de ações 
que se entrecruzam. 
Os acontecimentos que envolvem de perto 
as personagens da família Maia, ou aquelas de 
que são íntimas, marcam a linha nuclear da ação, 
17
 constituindo o seu primeiro plano. Nele, as perso-
nagens são desenhadas em grandes planos aproxi-
mados com traços bem nítidos. A economia desta 
linha da ação é fortemente dramática.
Simultaneamente e enquadrando a ação central, 
há um vasto plano de fundo, em que se desenvolve 
a comédia de costumes. 
Este plano é constituído por uma série de qua-
dros de conjunto, em que se cruza grande quan-
tidade de personagens secundárias. Aí, a ação não 
integra uma intriga dramática nem evolui através 
de marcadas peripécias ou acontecimentos excecio-
nais, mas segue o ritmo aproximado do acontecer 
natural. 
Cada um destes quadros de conjunto fraciona -se 
em múltiplas breves ações, apontamentos, ao sabor 
dos encontros e desencontros das muitas persona-
gens e dos motivos sociais que as põem em movi-
mento. Trata -se de um tecido narrativo lenta mas 
sabiamente urdido, produzindo uma visão caleidos-
cópica. 
O cruzamento destes dois planos da ação de 
Os Maias – o central e o de fundo – faz -se pela pre-
sença das personagens principais nesses quadros de 
conjunto: 
– a pacatez provinciana dos serões de Santa Olá-
via é perturbada pelas traquinices de Carlos; 
– o brilhantismo das noites do Ramalhete evi-
dencia a vil inveja do Dâmaso; 
– os encontros clandestinos de Carlos e da Con-
dessa apimentam as maçadoras terças -feiras em 
casa dos condes de Gouvarinho; 
– a superior serenidade de Carlos acalma os 
fáceis ânimos de Ega e de Alencar, no jantar do 
Hotel Central; 
– a presença de Carlos dá um tom de entusiasmo 
e de animação às corridas de cavalos; 
18
– Carlos escapa -se da insuportável maçada do 
sarau da Trindade, manifestando, assim, o seu 
olhar crítico. 
A multiplicidade sucessiva de largos quadros 
sociais, com uma conotação sempre inferior à do 
plano restrito da família Maia, vai retardando o fio 
da ação central, através da sua plural e descansada 
corrente, entretecida de múltiplas ações secundá-
rias. 
De outro modo, o fio da ação central estrutura -se 
com maior tensão, relacionando eventos que repre-
sentam momentos de excecionalidade na trajetória 
das personagens. Eis, em síntese, o fio condutor da 
ação no plano central:
Carlos da Maia, filho de Pedro e neto de Afonso, 
é separado, em bebé, da irmã Maria Eduarda. Esta 
separação é devida a motivos passionais: a mãe, 
Maria Monforte, movida por uma paixão fugaz por 
um conde italiano, abandona a família, levando 
consigo a filha e deixando o filho, Carlos, com o pai 
e o avô. A partir daqui, os irmãos ignoram mutua-
mente a própria existência. Nessa ignorância, vão 
reencontrar -se e apaixonar -se um pelo outro: trá-
gico amor incestuoso que põe fim a todos os ideais 
de vida profissional e social de que Carlos sonhara 
ser o expoente e mensageiro, reformador da deca-
dente vida romântica do país.
Neste plano da ação central, a narração é mais 
linear e tem um ritmo mais dramático do que no 
plano de fundo em que decorre o «viver» da bur-
guesia lisboeta. 
O dramatismo presente na ação central assenta 
nas seguintes características: 
– ritmo crescente do relacionamento entre Car-
los e Maria Eduarda;
– acumulação de subtis dúvidas e ameaças de que 
uma fatalidade escondida, disfarçadamente 
19
referida aqui e ali, poderá, mais tarde, abater -se 
sobre a família Maia: a supersticiosa fatalidade 
do Ramalhete; os fatais olhos negros de Pedro 
da Maia; as parecenças fisionómicas,que ainda 
se não sabe corresponderem a parentescos; a 
falta de certeza absoluta sobre o destino final 
da filha de Maria Monforte;
– a erupção repentina e surpreendente da peripé-
cia do drama, ou seja, da trágica identificação 
de Carlos e Maria Eduarda como irmãos;
– o dilema vivido por Carlos da Maia perante a 
descoberta de que a mulher que ama é a irmã 
cuja existência desconhecia;
– a catastrófica morte de Afonso e a destruição 
de qualquer possibilidade do futuro sonhado, 
quer no plano amoroso, quer no plano social. 
A complexidade da ação de Os Maias resulta do 
entrelaçamento (sábio, coerente e coeso) entre:
– a síntese dramática da ação central; 
– a pluralidade de ações secundárias que consti-
tuem a crónica de costumes. 
 Complexidade do tempo, do espaço 
e dos protagonistas
Tempo
O discurso narrativo refere e relaciona entre si 
acontecimentos que ocorrem no tempo. Assim, no 
discurso narrativo, são claramente visíveis os regis-
tos de tempo através dos verbos, dos advérbios, das 
datas.
Exemplificando:
– «O antepassado, cujos olhos se enchiam agora... 
fora, na opinião...»
– «... partiram ontem para Londres...»
– «... no Outono de 1875...»
– «A essa hora parecia miss Sara...»
20
No romance, cada sequência de acontecimentos é 
temporalmente alongada ou abreviada, conforme a 
sua importância relativa para o seu significado global:
– se for muito importante, é narrada com mais 
demorados pormenores e maior aproximação 
ao tempo do acontecer natural; 
– se não for importante, pode ser rapidamente 
resumida ou até passar subentendida, sem qual-
quer referência. 
Por exemplo: há um certo momento em que, 
de uma viagem de Carlos a Santa Olávia, nada é 
narrado. Este evento é elidido. Sobre ele, apenas 
lemos: «Foi no sábado» e «No sábado seguinte». 
E, no entanto, sabemos que decorreu uma semana 
de que nada ficamos a saber. 
Outra forma de acelerar a passagem do tempo é o 
resumo rápido e muitíssimo genérico: «Outros anos 
tranquilos passaram sobre Santa Olávia.»
Todavia, não é este o tratamento do tempo que 
predomina n’Os Maias. Neste romance, o trata-
mento predominante do tempo tende a aproximar 
o seu ritmo do acontecer natural, do dia a dia.
Exemplificando: 
– «Carlos, nessa manhã, ia visitar...»;
– «No Ramalhete, depois do almoço...»;
– «Na manhã seguinte, às oito horas pontual-
mente...»;
– «Três semanas depois, por uma tarde quente...».
Outra forma de encarar a complexidade do 
tempo n’Os Maias é observar a extensão temporal 
da história narrada e de que modo se reparte a sua 
organização. 
O marco temporal mais recuado corresponde 
à juventude de Afonso da Maia (sensivelmente na 
segunda década do século xix) e a última referência 
de tempo é «janeiro de 1887».
21
Assim, a história narrada n’Os Maias estende -se 
por cerca de sessenta anos, a que se acrescentam os 
dez (de 1877 a 1887) correspondentes ao intervalo 
entre o afastamento de Carlos no estrangeiro e o seu 
regresso a Lisboa. 
Todavia, no discurso narrativo, a organização 
deste tempo da história não é sempre feita por 
ordem cronológica direta. 
Vejamos: 
1 – No início do romance, estamos já no outono 
de 1875 e Afonso da Maia é já um velho que pre-
para o Ramalhete para o regresso de Carlos da Maia, 
o seu neto, já adulto.
2 – Em breve, passadas oito páginas e através do 
uso do mais -que -perfeito – o tempo verbal do pas-
sado mais recuado – somos levados para o tempo mais 
recuado da história: a juventude de Afonso da Maia.
A partir deste movimento narrativo de inversão 
temporal, uma analepse, a narração vai, então, pros-
seguir contando o passado durante sensivelmente 
oitenta páginas: o casamento de Afonso; o nasci-
mento de Pedro; o exílio de Afonso; o regresso de 
Afonso; o casamento de Pedro; o nascimento dos 
filhos de Pedro, Maria Eduarda e Carlos; a fuga da 
mulher de Pedro; a educação de Carlos em Santa 
Olávia; a formação de Carlos em Medicina e a sua 
viagem pelo estrangeiro; Afonso e o restaurado 
Ramalhete aguardando a instalação de Carlos em 
Lisboa (a narração reencontra -se com o momento 
do início do romance, o outono de 1875).
3 – De novo no outono de 1875, a partir daí 
e durante cerca de dois anos, o fluir temporal vai 
decorrer segundo a ordem cronológica direta até 
janeiro de 1877.
4 – Finalmente, depois de dez anos elididos da 
narração, o tempo volta a ser tratado demorada-
mente, durante o dia em que Carlos, acompanhado 
por Ega, peregrina por Lisboa e pelas memórias que 
lhe estão associadas. 
22
Perante esta organização do ritmo temporal da 
narração, verifica -se – de acordo com a centralidade 
das ações narradas – uma oscilação entre grande 
rapidez e grande lentidão narrativas:
– os acontecimentos anteriores a 1875 são narra-
dos num ritmo genericamente rápido;
– os acontecimentos correspondentes aos dois 
anos que se iniciam no outono de 1875 são 
narrados lentamente;
– a ausência de Carlos no estrangeiro durante 10 
anos é resumida em duas páginas;
– o último dia, final, de revisita de Carlos e Ega 
aos lugares da ação, centrando -se nas memórias 
dos dois, alonga -se por 26 páginas. 
Espaço 
De um modo geral, as ações ficcionadas n’Os 
Maias ocorrem em lugares real e historicamente 
existentes. 
Neste romance, o espaço é geralmente citadino: 
«A pacata Lisboa adormecida ao sol...».
Os lugares, onde predominantemente decorre 
a ação, pertencem à Lisboa burguesa dos fins do 
século xix: 
– o Chiado, o Loreto, o Aterro, lugares onde se 
passeia em amenas cavaqueiras; 
– o S. Carlos, o Trindade, o Grémio Literário, 
cuja intenção cultural é desmentida pela reali-
dade predominantemente sentimental;
– o Hotel Central, onde à roda da mesa se discute 
alegre e levianamente a viabilidade do país; 
– o hipódromo, lugar de suposta diversão que 
acaba pífia e tristonha;
– a Vila Balzac, a «Toca» e outros lugares da rela-
ção amorosa clandestina, de adultério reinante.
23
No entanto, outros lugares estão presentes no 
romance:
– a Lisboa com a sua atmosfera citadina, 
contrapõe -se a quinta de Santa Olávia que, 
pelo seu ambiente saudável, pelos seus ares 
lavados, a água pura, a natureza, é o lugar de 
retiro da família Maia nos momentos críticos, 
o lugar da educação de Carlos; 
– Sintra é o lugar burguês dos passeios, do vera-
neio, muito conotado com vivências poéticas e 
sentimentais;
– Coimbra é o lugar tradicionalmente acadé-
mico, onde Carlos vive a boémia estudantil e 
se forma em Medicina;
– o estrangeiro (sobretudo Paris, mas também a 
Inglaterra) é um lugar mítico: padrão que evi-
dencia a inferioridade nacional, no entender de 
Afonso, adepto da vida à inglesa; representação 
do chic parolo do Dâmaso que idolatra o bou-
levarzinho parisiense.
Porém, entre todos os espaços ficcionados no 
romance, há um, o Ramalhete, que merece menção 
especial, por ser: 
– o lugar onde vive a personagem nuclear da nar-
rativa, Carlos da Maia; 
– a casa cujos interiores mais vezes e com mais 
pormenor são descritos; 
– um lugar que simboliza e reflete, através da 
evolução do seu aspeto, o grau de felicidade 
dos seus donos (perde a aparência de fachada 
tristonha e jesuítica, de aspeto austero, freirá-
tico, para receber Carlos; adorna -se luxuosa-
mente e revive festivamente, durante o tempo 
de boémia dourada de Carlos e dos seus ami-
gos; regressa, durante a catástrofe final que 
atinge a família, à imagem de casarão som-
brio, fachada tristonha, coberto de tons de 
ruína). 
24
O espaço n’Os Maias ocupa um lugar substancial 
através de extensas e pormenorizadas descrições que 
«fotografam» a Lisboa burguesa oitocentista. 
Nessas «imagens» feitas de palavras, para além da 
dimensão física, é ainda mais importante a dimen-
são social. 
Tratando -se de um romance realista de crítica de 
costumes, torna -se muito importante representar 
literariamente a atmosfera social de cada lugar. 
O retrato da decadência de uma burguesia que 
nada faz de progressivo, de útil, de eficaz para a 
transformação dopaís, deve muito à presença des-
tes espaços sociais, em que apenas se conversa, se 
joga, se ri, se come, se namora, se inveja e se intriga, 
numa indolência destrutiva das possíveis energias 
reformadoras da sociedade. 
Protagonistas
A personagem nuclear do romance, o seu verda-
deiro protagonista é uma família, a família Maia, 
que se articula em três gerações sucessivas. A relação 
geracional dos seus elementos transporta caracterís-
ticas identitárias que se refletem no comportamento 
de cada geração. 
Cada uma destas gerações organiza -se em torno 
de uma personagem masculina que, por sua vez, 
faz par com uma personagem feminina, vive numa 
roda de amigos íntimos e integra -se numa dada 
situação histórica: 
– Afonso da Maia e D. Maria Runa;
– Pedro da Maia, Maria Monforte e o seu grande 
amigo Alencar;
– Carlos da Maia, o seu íntimo amigo João da 
Ega e Maria Eduarda.
25
O retrato de cada um dos protagonistas destes 
três momentos é eximiamente traçado por Eça de 
Queirós.
Afonso da Maia é um homem culto, sereno, de 
bom gosto, equilibrado, sólido, firme, amigo afe-
tuoso e solícito; patrão justo e generoso; cidadão 
exemplar; a síntese das tradicionais e esquecidas 
virtudes portuguesas, melhorada pelo contacto com 
a admirada Inglaterra; um «bloco de granito» que, 
«esmagado pela tragédia», se torna num velho cujos 
«passos lentos e incertos, muito pesados» desembo-
cam na morte de pé.
Pedro da Maia é um homem frágil, de profundos 
olhos negros românticos, vítima de uma educação 
livresca e clerical. Carácter amolecido pelo roman-
tismo, dado a melancolias sem razão, endoidecido 
pelo amor, apaixonado febril, acaba no suicídio. 
Opõe -se à moral familiar representada por seu pai, 
Afonso; obedece à moral do sentimento; suicida -se, 
num desfecho melodramático de herói romântico.
Carlos da Maia, educado à inglesa, destinado a 
ser obreiro do progresso, da transformação do país, 
«formoso e magnífico moço, bem feito, de uma 
testa de mármore», é apresentado como um ser 
superior. No entanto, submerso pelo tédio reinante 
na burguesia lisboeta, deixa -se vencer pelos efei-
tos da paixão, dando, assim, primazia aos «genes» 
românticos que herdara dos pais. Não se empenha 
profundamente em nada, é um diletante e acaba 
falhado. É um dandy cujos «hábitos de luxo con-
denam irremediavelmente ao diletantismo». Dentre 
os protagonistas que constituem a família Maia, 
ele ocupa o lugar mais importante. Está no núcleo 
da ação e, por isso, é ele a personagem que alcança 
maior espessura psicológica. Esta sua maior densi-
dade vem -lhe das situações complexas que vive:
– os bocejos de saciedade provocados pela frustre 
experiência amorosa com a Gouvarinho;
26
– a abstração radiosa advinda da paixão por 
Maria Eduarda;
– as fraquezas, as hesitações, as resoluções falha-
das, os projetos por concretizar, a comoção 
com a morte do avô;
– a revolta, o medo, a fuga, a covardia, o choro, o 
ceticismo, o cinismo, a secura afetiva, o pessi-
mismo existencial, durante e depois da tragédia 
que o atingiu.
Maria Eduarda, que se destaca, dentre as per-
sonagens femininas, é bela, mas discreta. Alta, de 
aparência estrangeirada, move -se com um andar 
de «deusa». Não representa o feminino apenas 
enquanto sentimento e emoção, pois tem qualida-
des no plano intelectual que a colocam à altura de 
uma conversa com Carlos e Ega.
Alencar ocupa o lugar de amigo íntimo, no 
tempo da geração de Pedro e Maria Monforte, 
mas sobrevive -lhes até ao reencontro com Carlos. 
Poeta, é o melhor representante da geração român-
tica à qual sobrevive. Surge no romance como «um 
rapaz alto, macilento, de bigodes negros, vestido 
de negro», caricatura do poeta ultrarromântico, 
que solta frases ressoantes e arrasta as suas poses. 
Mais tarde, já na geração de Carlos, reaparece como 
«homem alto, todo de preto, longos bigodes român-
ticos» e funciona, então, como recordação agoni-
zante de emoções patrióticas perdidas.
João da Ega, «um certo João da Ega», íntimo 
de Carlos, o «grande» João da Ega, que «tinha nas 
veias o veneno do diletantismo», nos tempos de 
Coimbra, estudava direito e reprovava. Personagem 
que talvez seja um alter -ego de Eça, ou antes, uma 
autocaricatura dos seus próprios ímpetos de artista 
vingador, figura exagerada de literato, perseguidor 
de ambiciosos planos irrealizados, é um falhado 
como Carlos. A sua figura, pelo aspeto físico e pela 
sua função predominante na intriga (apresenta per-
sonagens, liga acontecimentos, faz avançar a ação, 
27
não escapa a ser portador da notícia fatal) tem o seu 
quê de mefistofélica. Aliás, é referido como «Esse 
Mefistófles de Celorico». Consciência irónica e crí-
tica dos acontecimentos, através de palavras sempre 
exageradas, acaba por exibir uma certa confusão 
mental. É teatral, cómico, pueril, incoerente. Não 
respeita nada, professa o desacato como condição 
de progresso, mas bajula o Cohen homenageando -o 
com um jantar e concordando -lhe com as opiniões, 
só porque quer aproximar -se da mulher, a divina 
Raquel, por quem está fascinado. Perante a desgraça 
que avassala o amigo, acaba por surgir «cheio só de 
compaixão e ternura, com uma grossa lágrima nas 
pestanas». 
Personagens secundárias
Em torno destas personagens fulcrais e, por con-
traponto, ajudando muitas vezes a fazê -las emergir, 
gravita uma série de personagens secundárias. 
N’Os Maias, as personagens secundárias, ora 
frequentes, ora episódicas, ora circunstanciais, 
multiplicam -se ao sabor da intenção realista de 
construir um painel da sociedade lisboeta, da 
segunda metade do século xix, segundo um ponto 
de vista crítico. 
Vejamos algumas dessas personagens:
Sequeira e D. Diogo Coutinho: velhos compa-
nheiros de Afonso da Maia;
Steinbroken: embaixador finlandês, olhado cari-
caturalmente; 
Vilaça (pai e filho): administradores zelosos da 
segurança material da família Maia;
Taveira: o funcionário do Tribunal de Contas;
Cruges: o pianista de cabeleira desleixada e 
amargo spleen;
Eusebiozinho: o produto mais representativo de 
toda a degenerescência física e moral da sociedade 
portuguesa da altura;
28
Craft: inglês, sereno, fleumático, espantado com 
a «enormidade» portuguesa;
Dâmaso Salcede: o filho do velho Silva, o agiota; 
figura desorbitada de pura sátira, caricatura do fran-
cesismo em calão; representante de um dos mais 
baixos degraus da sociedade lisboeta; bochechudo 
e balofo, «frisadinho como um noivo de província», 
aldrabão, vaidoso, oco, cobarde, humilhado, avil-
tado; movido pela lisonja, pela inveja, pelo rancor; 
servil, obcecado pelo chic, ridículo. 
Na multímoda personagem que é a burguesia lis-
boeta, emergem ainda: 
Cohen: o diretor do Banco Nacional, corrupto, 
indiferente aos reais interesses do país; 
Conde de Gouvarinho: par do reino, político 
bacoco, inútil, produzindo discursos ridículos; 
Condessa de Gouvarinho: exímia nos processos 
de assédio aos favores amorosos de Carlos e nos ges-
tos melodramáticos de vítima do abandono; 
Raquel Cohen: a divina despertadora de paixões; 
Melanie, Miss Sara, Teles da Gama, Palma 
Cavalão, Castro Gomes, D. Maria Cunha, enfim, 
um rio interminável de figuras que são tipos sociais, 
ou seja, têm um comportamento determinado pela 
sua origem e estatuto social.
Trata -se de personagens representativas de clas - 
ses, grupos, funções, atitudes sociais. Estas perso-
nagens -tipo são as que melhor servem a intenção 
de crítica social realista: representam de forma cari-
catural os males sociais, expondo -os, dando -os a 
conhecer, tornando -os objeto de análise crítica e de 
ironia demolidora.
Extensão
Dentre os vários subgéneros narrativos, o 
romance é a narrativa mais extensa e mais com-
plexa. Mais breves e mais lineares são, por exemplo, 
a novela e o conto.
29
Para além desta razão básica, a de serem um 
romance, outras razões fazem com que Os Maias 
sejam um romance extenso.
De facto, trata -se de um romance realista cujo 
principal objetivo é o de ficcionar o viversocial, a 
partir da observação pormenorizada, fotográfica, 
dos múltiplos aspetos da sociedade. Não é, pois, 
possível cumprir este desígnio sem desenvolver um 
extenso volume de discurso narrativo. 
Para construir literariamente a imagem realista 
dos costumes sociais, é necessária uma forte pre-
sença da descrição. Neste caso, ou seja, para ser rea-
lista, a descrição tem de ser pormenorizada, atenta 
às cores, aos sons, aos movimentos, às texturas, aos 
odores, enfim, aos dados dos sentidos capazes de 
darem ao leitor a sensação de realidade que se pre-
tende que ele tenha. 
Por outro lado, o objetivo realista, de fazer crí-
tica social através da literatura, implica a inclusão de 
um painel plural, variado, extenso, de personagens 
secundárias. N’Os Maias, Eça de Queirós monta, 
com grande mestria, longos quadros de conjunto, 
onde essas personagens que são tipos sociais se 
entrecruzam. 
Deste modo, o romance ganha extensão, volume, 
como é próprio de uma obra literária cujos objetivos 
são consentâneos com a corrente literária realista.
Mesmo que consideremos apenas a sua dimensão 
romanesca, há, n’Os Maias, processos narrativos que 
contribuem para a sua extensão. 
Do movimento realista, fazia parte uma vertente 
naturalista que pretendia analisar quase cientifica-
mente a decadência social, atribuindo -lhe, como 
causas, a educação, a hereditariedade, o meio fami-
liar e social de origem das personagens e, bem assim, 
das classes que representam. 
30
Assim, seguindo essa tendência, torna -se necessá-
rio narrar os antecedentes de Carlos da Maia, a sua 
educação, a sua ascendência. 
Carlos da Maia falha, também, porque traz em 
si a marca romântica que herdou de Pedro da Maia 
e de Maria Monforte, mais intensa do que a lúcida 
racionalidade da educação de inspiração inglesa a 
que Afonso o submete. 
Maria Eduarda, com a mesma origem, representa 
o regresso desse passado que, tragicamente, perse-
gue e vence os intuitos reformadores de Afonso e 
de Carlos. 
Ora, para dar corpo a esta vertente, de algum 
modo naturalista, do romance, Eça inclui uma 
substancial analepse que se avoluma no início do 
romance.
Assim, sendo Os Maias um romance e, apenas 
por esta razão, uma narrativa extensa, o facto de 
serem um romance realista implica processos nar-
rativos e estruturais que avolumam o seu caudal 
narrativo, à imagem e semelhança do fluir do rio 
da vida. 
Visão global da obra 
e da sua estruturação
Título e subtítulo
Para além do título Os Maias, o romance apre-
senta um subtítulo: Episódios da Vida Romântica. 
Tal facto não deve ser encarado como uma sim-
ples explicitação de conteúdo, mas como uma pista 
importante para a compreensão das linhas da sua 
estruturação.
31
É o subtítulo, com o seu carácter abrangente-
mente coletivo e com a sua referência à «vida», que 
indica uma das dimensões do romance:
– a de fresco caricatural da sociedade portuguesa 
nas últimas décadas do século xix, crónica de 
costumes, em cujas páginas a vida social pulula 
e gesticula. 
Por sua vez, o título refere a personagem central, 
a família que se desdobra por três gerações e age 
numa dimensão diferente: a dimensão das íntimas 
histórias sentimentais e das relações familiares. 
A existência de um título e de um subtítulo 
encaminha -nos para a análise do modo como o 
romance está estruturado em dois planos que se ins-
crevem um no outro: 
– a história da família, mormente de Carlos 
(título); 
– a crónica social do Portugal oitocentista, persis-
tentemente romântico (subtítulo).
Existe, entre estes dois planos, uma articulação 
coerente que inscreve os episódios da intriga fami-
liar nos momentos político -sociais que o país atra-
vessa:
– Afonso da Maia / tempo de lutas pela afirma-
ção do Liberalismo;
– Pedro da Maia / ambiente de decadência ultrar-
romântica;
– Carlos da Maia / o constitucionalismo monár-
quico: a «Regeneração».
Claramente, a trajetória da família (anunciada no 
título) inscreve -se na evolução do Portugal român-
tico (referida no subtítulo). 
��
32
EDUCAÇÃO LITERÁRIA 
– TEXTOS ESCOLHIDOS 
DE OS MAIAS 2
representação de espaços sociais 
e crítica de costumes
� Texto �
A voz do Ega sibilava... Mas, vendo assim trata-
dos de grotescos, de bestas, os homens de ordem que 
fazem prosperar os bancos, Cohen pousou a mão no 
braço do seu amigo e chamou -o ao bom senso. Evi-
dentemente, ele era o primeiro a dizê -lo, em toda 
essa gente que figurava desde 46 havia medíocres 
e patetas – mas também homens de grande valor!
– Há talento, há saber – dizia ele com um tom de 
experiência. – Você deve reconhecê -lo, Ega... Você é 
muito exagerado! Não senhor, há talento, há saber.
E, lembrando -se que algumas dessas bestas eram 
amigos do Cohen, Ega reconheceu -lhes talento e 
saber. O Alencar, porém, cofiava sombriamente o 
bigode. Ultimamente pendia para ideias radicais, 
para a democracia humanitária de 1848: por ins-
tinto, vendo o romantismo desacreditado nas letras, 
refugiava -se no romantismo político, como num 
asilo paralelo: queria uma república governada por 
génios, a fraternização dos povos, os Estados Uni-
dos da Europa... Além disso, tinha longas queixas 
desses politicotes, agora gente do Poder, outrora 
seus camaradas de redação, de café e de batota...
– Isso – disse ele – lá a respeito de talento e de 
saber, histórias... Eu conheço -os bem, meu Cohen...
O Cohen acudiu:
– Não senhor, Alencar, não senhor! Você tam-
bém é dos tais... Até lhe fica mal dizer isso... É exa-
geração. Não senhor, há talento, há saber.
2 Textos selecionados da edição de «Livros do Brasil», Lis-
boa (9.a edição).
33
E o Alencar, perante esta intimação do Cohen, 
o respeitado diretor do Banco Nacional, o marido 
da divina Raquel, o dono dessa hospitaleira casa da 
Rua do Ferregial onde se jantava tão bem, recal-
cou o despeito – admitiu que não deixava de haver 
talento e saber. Então, tendo assim, pela influência 
do seu banco, dos belos olhos da sua mulher e da 
excelência do seu cozinheiro, chamado estes espíri-
tos rebeldes ao respeito dos parlamentares e à vene-
ração da Ordem, Cohen condescendeu em dizer, no 
tom mais suave da sua voz, que o país necessitava 
reformas... 
Ega, porém, incorrigível nesse dia, soltou outra 
enormidade:
– Portugal não necessita reformas, Cohen, Portu-
gal o que precisa é a invasão espanhola.
Alencar, patriota à antiga, indignou -se. O Cohen, 
com aquele sorriso indulgente de homem superior 
que lhe mostrava os bonitos dentes, viu ali apenas 
«um dos paradoxos do nosso Ega». Mas o Ega falava 
com seriedade, cheio de razões. Evidentemente, 
dizia ele, invasão não significa perda absoluta de 
independência. Um receio tão estúpido é digno só 
de uma sociedade tão estúpida como a do Primeiro 
de Dezembro. Não havia exemplo de seis milhões 
de habitantes serem engolidos, de um só trago, por 
um país que tem apenas quinze milhões de homens. 
Depois ninguém consentiria em deixar cair nas mãos 
de Espanha, nação militar e marítima, esta bela linha 
de costa de Portugal. Sem contar as alianças que 
teríamos a troco das colónias – das colónias que só 
nos servem, como a prata de família aos morgados 
arruinados, para ir empenhando em casos de crise... 
Não havia perigo; o que nos aconteceria, dada uma 
invasão, num momento de guerra europeia, seria 
levarmos uma sova tremenda, pagarmos uma grossa 
indemnização, perdermos uma ou duas províncias, 
ver talvez a Galiza estendida até ao Douro...
– Poulet aux champignons – murmurou o criado, 
apresentando -lhe a travessa.
E enquanto ele se servia, perguntavam -lhe dos 
lados onde via ele a salvação do país nessa catástrofe 
34
que tornaria povoação espanhola Celorico de Basto, 
a nobre Celorico, berço de heróis, berço dos Egas...
– Nisto: no ressuscitar do espírito público e do 
génio português!
Sovados, humilhados, arrasados, escalavra-
dos, tínhamos de fazer um esforço desesperado 
para viver. E em que bela situação nos acháva-
mos! Sem monarquia, sem essa caterva de políti-cos, sem esse tortulho da inscrição, porque tudo 
desaparecia, estávamos novos em folha, limpos, 
escarolados, como se nunca tivéssemos servido. 
E recomeçava -se uma história nova, um outro 
Portugal, um Portugal sério e inteligente, forte e 
decente, estudando, pensando, fazendo civiliza-
ção como outrora... Meninos, nada regenera uma 
nação como uma medonha tareia... Oh! Deus de 
Ourique, manda -nos o castelhano! E você, Cohen, 
passe -me o St. Emilion.
Agora, num rumor animado, discutia -se a 
invasão. Ah, podia -se fazer uma bela resistência! 
Cohen afiançava o dinheiro. Armas, artilharia, 
iam comprar -se à América – e Craft ofereceu logo 
a sua coleção de espadas do século xvi. Mas gene-
rais? Alugavam -se. Mac -Mahon, por exemplo, devia 
estar barato...
– O Craft e eu organizamos uma guerrilha – gri-
tou o Ega.
– Às ordens, meu coronel!
– O Alencar – continuava Ega – é encarregado 
de ir despertar pela província o patriotismo, com 
cantos e com odes!
Então o poeta, pousando o cálice, teve um movi-
mento de leão que sacode a juba:
– Isto é uma velha carcaça, meu rapaz, mas não 
está só para odes! Ainda se agarra uma espingarda, 
e como a pontaria é boa, ainda vão a terra um par 
de galegos... Caramba, rapazes, só a ideia dessas 
coisas me põe o coração negro! E como vocês 
podem falar nisso, a rir, quando se trata do país, 
desta terra onde nascemos, que diabo! Talvez seja 
má, de acordo, mas, caramba, é a única que temos, 
não temos outra! É aqui que vivemos, é aqui que 
35
rebentamos... Irra! falemos de outra coisa, falemos 
de mulheres!
Dera um repelão ao prato, os olhos humedeciam-
-se -lhe de paixão patriótica... E no silêncio que se 
fez, Dâmaso, que desde as informações sobre a rapa-
riga do Ermidinha emudecera, ocupado a observar 
Carlos com religião, ergueu a voz pausadamente, 
disse, com ar de bom senso e de finura:
– Se as coisas chegassem a esse ponto, se se puses-
sem assim feias, eu cá, à cautela, ia -me raspando 
para Paris...
Ega triunfou, pulou de gosto na cadeira. Eis ali, 
no lábio sintético de Dâmaso, o grito espontâneo 
e genuíno do brio português! Raspar -se, pirar -se!... 
Era assim que de alto a baixo pensava a sociedade 
de Lisboa, a malta constitucional, desde el -rei nosso 
senhor até aos cretinos de secretaria!...
In Capítulo VI 
Contexto
Através desta conversa durante o jantar no hotel 
Central, representam -se ficcionalmente os dados do 
contexto histórico: a crítica situação socioeconó-
mica do país; a falta de competência de quem tinha 
o poder; a falta de honestidade intelectual de quem 
o criticava; a falta de consciência nacional. 
Relacionação com outros textos
Esta discussão dos problemas do país está tam-
bém presente em Viagens na Minha Terra: neste 
livro de Garrett, é, na voz do narrador, que a situa-
ção sociopolítica é criticada.
«Se excetuarmos o débil clamor da imprensa libe-
ral já meio esganada da polícia, não se ouve no vasto 
silêncio deste ermo senão a voz dos barões gritando 
contos de réis. 
Dez contos de réis por um eleitor! 
Mais duzentos contos pelo tabaco! 
36
Três mil contos para a conversão de um anfiguri3! 
Cinco mil contos para as estradas dos aeronautas! 
Seis mil contos para isto, dez mil contos para 
aquilo! Não tardam a contar por centenas de milha-
res. Contar a eles não lhes custa nada. A quem custa 
é a quem paga para todos esses balões de papel – a 
terra e a indústria...»
 
Educação literária – as questões
1. Indique o espaço social representado neste 
texto.
1.1 Identifique o setor da sociedade que cada 
uma das personagens representa.
2. Neste texto, está presente a crítica de costu-
mes.
2.1 Através de referências ao texto, justifique a 
afirmação anterior; explicite -a.
2.2 Indique os recursos expressivos que dão viva-
cidade e acutilância à crítica.
3. Refira -se à presença de reprodução do discurso 
no discurso, explicitando o modo utilizado.
Educação literária – as respostas
1. Este texto é um excerto do grande quadro do 
jantar do hotel Central. Nele, está representada a 
alta burguesia lisboeta com poder económico e 
social e outros setores com opinião acerca do estado 
do país. 
Através da conversa que vai decorrendo durante 
o jantar, fica patente a inconsistência das posições 
intervenientes na situação do país.
1.1 As personagens que animadamente conver-
sam à roda da mesa representam setores componen-
tes da sociedade:
3 Anfiguri = texto de sentido obscuro, muito difícil de com-
preender.
37
– Cohen representa a banca, a finança;
– Alencar representa as velhas posições dos escri-
tores românticos com o seu sentimentalismo e 
idealismo patriótico, ainda subsistentes e resis-
tentes na sociedade portuguesa;
– Ega representa a intelectualidade juvenil e radi-
cal, muito crítica e demolidora, mas simulta-
neamente muito diletante: muitas palavras; 
poucas ações;
– Craft representa o ponto de vista estrangeiro, 
distanciado;
– Dâmaso representa a burguesia individualista e 
cobarde, totalmente desprovida de consciência 
nacional.
2.1 A crítica de costumes presente neste texto 
atinge os seguintes alvos:
– a incompetência, a hipocrisia e a falta de ver-
dadeira consciência dos problemas nacionais 
e de coragem para os enfrentar e tentar resol-
ver, por parte daqueles a quem tal deveria 
competir;
– a primazia da diversão e da satisfação dos 
prazeres pessoais, em vez do empenhamento 
responsável na análise e estudo dos meios 
para reformar e fazer progredir o país, por 
parte de quem tem essa responsabilidade, 
quer por ocupar lugares de poder, quer por 
se dizer detentor de pensamento crítico sobre 
o assunto.
2.2 O recurso expressivo que principalmente 
contribui para a acutilância e vivacidade da crítica é 
a ironia. Ela está presente ao longo do texto. Pode-
remos fixar -nos nos seguintes momentos:
– «E enquanto ele se servia, perguntavam -lhe 
dos lados onde via ele a salvação do país nessa 
catástrofe que tornaria povoação espanhola 
Celorico de Basto, a nobre Celorico, berço de 
heróis, berço dos Egas...»;
38
– «Meninos, nada regenera uma nação como 
uma medonha tareia... Oh! Deus de Ouri-
que, manda -nos o castelhano! E você, Cohen, 
passe -me o St. Emilion.»;
– «Mas generais? Alugavam -se. Mac -Mahon, por 
exemplo, devia estar barato...»;
– «Eis ali, no lábio sintético de Dâmaso, o grito 
espontâneo e genuíno do brio português! 
Raspar -se, pirar -se!... Era assim que de alto a 
baixo pensava a sociedade de Lisboa, a malta 
constitucional, desde el -rei nosso senhor até 
aos cretinos de secretaria!...»
Alguns exemplos de outros recursos expressivos:
– comparação: «como a prata de família aos 
morgados arruinados, para ir empenhando em 
casos de crise»;
– uso expressivo do adjetivo: «levarmos uma sova 
tremenda, pagarmos uma grossa indemniza-
ção»; «Sovados, humilhados, arrasados, escala-
vrados»;
– uso expressivo do advérbio: «cofiava sombria-
mente o bigode»;
– metáfora: «sem esse tortulho da ‘inscrição’»;
– sinestesia: «me põe o coração negro».
3. Neste texto predomina o diálogo, uma vez que 
se trata de uma conversa à volta da mesa do jantar. 
Por vezes, todavia, as falas das personagens são 
introduzidas através do discurso indireto livre, ou 
seja, a introdução do registo e do tom próprios da 
personagem no decorrer do discurso narrativo sem 
apresentar marcas gráficas e morfossintáticas pró-
prias do discurso direto. 
Exemplo:
«Não havia perigo; o que nos aconteceria, dada 
uma invasão, num momento de guerra europeia, 
seria levarmos uma sova...».
��
39
espaços e seu valor simbólico e emotivo
� Textos �
A
[...] e o Ramalhete possuía apenas, ao fundo de 
um terraço de tijolo, um pobre quintal inculto, 
abandonado às ervas bravas, com um cipreste, um 
cedro, uma cascatazinha seca, um tanque entu-
lhado, e uma estátua de mármore (onde Monsenhor 
reconheceu logo Vénus Citereia) enegrecendo a um 
canto na lenta humidade das ramagens silvestres.
In Capítulo I 
B
Não era decerto o jardim de Santa Olávia: mas 
tinhao ar simpático, com os seus girassóis perfi-
lados ao pé dos degraus do terraço, o cipreste e o 
cedro envelhecendo juntos como dois amigos tris-
tes, e a Vénus Citereia parecendo agora, no seu tom 
claro de estátua de parque, ter chegado de Versa-
lhes, do fundo do Grande Século... E desde que a 
água abundava, a cascatazinha era deliciosa, dentro 
do nicho de conchas, com os seus três pedregulhos 
arranjados em despenhadeiro bucólico, melancoli-
zando aquele fundo de quintal soalheiro com um 
pranto de náiade doméstica, esfiado gota a gota na 
bacia de mármore.
In Capítulo I 
C
Em baixo o jardim, bem areado, limpo e frio 
na sua nudez de inverno, tinha a melancolia de 
um retiro esquecido, que já ninguém ama: uma 
ferrugem verde, de humidade, cobria os grossos 
membros da Vénus Citereia; o cipreste e o cedro 
envelheciam juntos, como dois amigos num ermo; 
e mais lento corria o prantozinho da cascata, esfiado 
saudosamente, gota a gota, na bacia de mármore.
In Capítulo XVIII 
40
Contexto
Casas senhoriais, como o Ramalhete que Eça 
cria literariamente para habitação da família Maia, 
durante o tempo dourado de Carlos em Lisboa, 
integram -se no contexto citadino do século xix. 
Visitar o bairro das Janelas Verdes, onde Eça o situa, 
é, ainda hoje e através de edifícios remanescentes, 
reviver essa realidade urbana oitocentista que o 
romance nos dá a conhecer.
Relacionação com outros textos
Não é raro encontrarmos na literatura, nomea-
damente em romances, descrições de casas. Lem-
bremos, por exemplo, a famosa Casa do Vale de 
Santarém, presente em Viagens na Minha Terra, de 
Almeida Garrett:
«Para mais realçar a beleza do quadro, vê -se por 
entre um claro das árvores a janela meio aberta de 
uma habitação antiga mas não dilapidada – com 
certo ar de conforto grosseiro, e carregada na cor 
pelo tempo e pelos vendavais do sul a que está 
exposta. A janela é larga e baixa; parece -me mais 
ornada e também mais antiga que o resto do edi-
fício que todavia mal se vê... Interessou -me aquela 
janela. Quem terá o bom gosto e a fortuna de morar 
ali?» 
Frequentemente, nas obras literárias, é atribuído, 
ao espaço, um valor simbólico e emotivo. Lembre-
mos, por exemplo, o espaço do segundo ato de Frei 
Luís de Sousa, a casa em que D. Madalena vivera 
com seu primeiro marido. Trata -se, de facto, de um 
espaço carregado de sinais ameaçadores do regresso 
de D. João de Portugal e que angustia extrema-
mente a personagem de Madalena.
41
Educação literária – as questões
1. Leia seguidamente os três textos acima que, 
em momentos diferentes do romance, descrevem o 
mesmo recanto do Ramalhete; atente nas palavras e 
expressões realçadas.
1.1 A partir desta leitura, escreva um texto expo-
sitivo em que desenvolva o seguinte tópico: 
Espaços e seu valor simbólico e emotivo.
Educação literária – as respostas
1.1
Há, n’Os Maias, espaços físicos cujo tratamento 
literário ultrapassa a descrição realista e lhes confere 
um valor simbólico e emotivo. 
O caso mais saliente é o do Ramalhete que, ao 
longo do romance, vai mudando a sua conotação 
emotiva, tornando -se como que um emblema do 
grau de felicidade e brilho social da família Maia. 
O recanto descrito nestes três textos é a parte do 
Ramalhete que, mais evidentemente, assume esse 
valor simbólico e emotivo de um espaço. Evolui 
em três tempos, como a família: antes de Carlos; 
durante Carlos; depois da tragédia de Carlos.
Assim, a adjetivação e outros recursos expressivos 
criam, para o mesmo espaço, três conotações sim-
bólicas e emotivas diferentes:
– abandono, secura, ruína (antes de Carlos);
– conforto, convívio, bom gosto, amenidade 
(durante Carlos);
– abandono, decadência, tristeza (depois da tra-
gédia de Carlos). 
��
42
representações do sentimento 
e da paixão: diversificação 
da intriga amorosa
Pedro da Maia
� Texto �
Não tardou de resto a falar -se em toda a Lisboa 
da paixão de Pedro da Maia pela negreira. Ele tam-
bém namorou -a publicamente, à antiga, plantado a 
uma esquina, defronte do palacete dos Vargas, com 
os olhos cravados na janela dela, imóvel e pálido de 
êxtase.
Escrevia -lhe todos os dias duas cartas em seis 
folhas de papel – poemas desordenados que ia com-
por para o Marrare: e ninguém lá ignorava o destino 
daquelas páginas de linhas encruzadas que se acu-
mulavam diante dele sobre o tabuleiro da genebra. 
Se algum amigo vinha à porta do café perguntar 
por Pedro da Maia, os criados já respondiam muito 
naturalmente:
– O sr. D. Pedro? Está a escrever à menina.
E ele mesmo, se o amigo se acercava, estendia -lhe 
a mão, exclamava radiante, com o seu belo e franco 
sorriso:
– Espera aí um bocado, rapaz, estou a escrever 
à Maria!
Os velhos amigos de Afonso da Maia que vinham 
fazer o seu whist a Benfica, sobretudo o Vilaça, o 
administrador dos Maias, muito zeloso da dignidade 
da casa, não tardaram em lhe trazer a nova daque-
les amores do Pedrinho. Afonso já os suspeitava: via 
todos os dias um criado da quinta partir com um 
grande ramo das melhores camélias do jardim; todas 
as manhãs cedo encontrava no corredor o escudeiro, 
dirigindo -se ao quarto do menino, a cheirar regalada-
mente o perfume de um envelope com sinete de lacre 
dourado; e não lhe desagradava que um sentimento 
qualquer, humano e forte, lhe fosse arrancando o 
filho à estroinice bulhenta, ao jogo, às melancolias 
sem razão em que reaparecia o negro ripanço...
In Capítulo I 
43
 Carlos da Maia
� Texto �
Maria Eduarda veio encostar -se à janela, Car-
los seguiu -a; e ficaram ali juntos, calados, profun-
damente felizes, penetrados pela doçura daquela 
solidão. Um pássaro cantou de leve no ramo da 
árvore; depois calou -se. Ela quis saber o nome de 
uma povoação que branquejava ao longe, ao Sol, 
na colina azulada. Carlos não se lembrava. Depois, 
brincando, colheu uma margarida, para a interro-
gar: Elle m’aime, un peu, beaucoup... Ela arrancou-
-lha das mãos.
– Para que precisa perguntar às flores?
– Porque ainda não mo disse claramente, absolu-
tamente, como eu quero que mo diga...
Abraçou -a pela cinta, sorriam um ao outro. 
Então Carlos, com os olhos mergulhados nos dela, 
disse -lhe baixinho, e implorando:
– Ainda não vimos a saleta de banho...
Maria Eduarda deixou -se levar assim enlaçada 
pelo salão, depois através da sala de tapeçarias, onde 
Marte e Vénus se amavam entre os bosques. Os 
banhos eram ao lado, com um pavimento de azulejo, 
avivado por um velho tapete vermelho da Caramâ-
nia. Ele, tendo -a sempre abraçada, pousou -lhe no 
pescoço um beijo longo e lento. Ela abandonou -se 
mais, os seus olhos cerraram -se, pesados e vencidos. 
Penetraram na alcova quente e cor de oiro: Carlos, 
ao passar, desprendeu as cortinas do arco de capela, 
feitas de uma seda leve que coava para dentro uma 
claridade loira: e um instante ficaram imóveis, sós 
enfim, desatado o abraço, sem se tocarem, como 
suspensos e sufocados pela abundância da sua feli-
cidade.
In Capítulo XIII 
44
Ega
� Texto �
Mas a cólera outra vez abafou -lhe a voz. E esteve 
um momento mordendo os beiços, recalcando os 
soluços, com os olhos reluzentes de lágrimas.
Quando as palavras voltaram, foi uma explosão 
selvagem:
– Quero -me bater em duelo com aquele mal-
vado, a cinco passos, meter -lhe uma bala no cora-
ção!
Outros sons estrangulados escaparam -se -lhe da 
garganta; e batendo furiosamente o pé, esmurrando 
o ar, berrava, sem cessar, como cevando -se na estri-
dência da própria voz:
– Quero matá -lo! Quero matá -lo! Quero matá-
-lo!
Depois, alucinado, sem ver Carlos, rompeu a 
passear desabridamente pelo quarto, às patadas, 
com o manto deitado para trás, a espada mal afive-
lada batendo -lhe as canelas escarlates.
– Então descobriu tudo – murmurou Carlos.
– Está claro que descobriu tudo! – exclamou o 
Ega, no seu passear arrebatado, atirando os braços 
ao ar. – Como descobriu, não sei. Sei isto, já não é 
pouco. Pôs -me fora!... Hei de lhe meter uma bala no 
corpo! Pela alma de meu pai, hei de lhe varar o cora-ção!... Quero que vás logo pela manhã com o Craft... 
E as condições são estas: à pistola, a quinze passos!
Carlos, agora outra vez sereno, acabava a sua chá-
vena de chá. Depois, disse muito simplesmente:
– Meu querido Ega, tu não podes mandar desa-
fiar o Cohen.
O outro estacou de repelão, atirando pelos olhos 
dois relâmpagos de ira – a que as medonhas sobran-
celhas de crepe, as duas penas de galo ondeando na 
gorra, davam uma ferocidade teatral e cómica.
– Não o posso mandar desafiar?
– Não.
– Então põe -me fora de casa...
– Estava no seu direito.
45
– No seu direito!... Diante de toda a gente?...
– E tu, não eras amante da mulher diante de toda 
a gente?...
In Capítulo IX 
Contexto
A leitura da representação do amor na literatura 
não se faz sem deixar na memória do leitor um rasto 
de lugares: 
– cafés onde se escrevem cartas de amor (Pedro); 
– casas onde os apaixonados recatam a sua inti-
midade (Carlos e Maria Eduarda); 
– salões de festas, em que se namora a mulher do 
amigo (Ega). 
Estes lugares são ficcionados a partir do real: 
– o Marrare, que era um requintado café de 
Lisboa fundado pelo napolitano António 
Marrare. Ficava na rua Garrett e fora, preci-
samente, o ponto de encontro da geração de 
Almeida Garrett;
– a «Toca», nos Olivais, que, no século xix, era 
um lugar campestre mas próximo da grande 
cidade e, assim, muito apetecível para os deva-
neios da fidalguia lisboeta;
– os salões da alta burguesia, onde, para além 
das festas que os animavam, como, por exem-
plo, os bailes de máscaras, muitos encontros e 
desencontros amorosos aconteciam.
Relacionação com outros textos
O par amoroso, elemento central da intriga roma-
nesca, é talvez o tópico mais frequente no romance. 
Assim, tomemo -lo como ponto de partida para 
relembrar outros pares de outros textos da literatura 
portuguesa:
– Pedro e Inês (Os Lusíadas);
– Simão e Teresa (Amor de Perdição);
– Madalena e Manuel (Frei Luís de Sousa).
46
Educação literária – as questões
1. Os Maias são um romance, ou seja, uma 
narrativa complexa em todas as suas dimensões, 
incluindo a da intriga amorosa, que, de facto, se 
diversifica em várias intrigas amorosas. 
Estas envolvem épocas e protagonistas diferentes, 
com consequências na forma de representar o senti-
mento e a paixão.
1.1 A partir da leitura dos três textos acima e 
lembrando a leitura integral do romance, escreva 
um texto expositivo em que desenvolva o seguinte 
tópico:
– A pluralidade de intrigas amorosas n’Os Maias, 
desde o destino fatal de Pedro à maneira do herói 
romântico, passando pela vivência de pendor mais 
materialista e realista do amor entre Carlos e Maria 
Eduarda e pela caricatura do adultério reinante, a 
que Ega não escapa. 
Educação literária – as respostas
1.1 Uma das linhas de desenvolvimento da com-
plexa intriga d’Os Maias diz respeito à paixão amo-
rosa. Tanto Pedro como Carlos polarizam em si o 
papel de homens apaixonados por belas mulheres. 
Todavia, os modos como os seus amores são lite-
rariamente representados não coincidem entre si. 
Este facto deve -se ao espírito e ideais diferentes que 
reinam na época de cada um deles.
Pedro vive o seu amor por Maria Monforte como 
um absoluto que dá sentido à sua vida, como era pró-
prio do Romantismo. Arrebatadamente, escreve -lhe 
cartas. O seu amor por ela muda -lhe a vida. Dá -lhe 
a força suficiente para enfrentar Afonso e desprezar 
os seus valores morais. De tal modo a paixão é para 
ele (um romântico) um ideal de vida, que, perante a 
traição, não resiste e suicida -se. 
Carlos, pelo contrário, é a aposta de Afonso con-
tra os malefícios do romantismo exacerbado que lhe 
matou o filho. Imbuído de uma visão realista e de 
47
um sentido de progresso que não quer perder a luci-
dez analítica dos problemas, no entanto, Carlos, ser 
humano, não resiste a apaixonar -se. 
Vive essa paixão como uma componente da 
felicidade e do prazer que a vida lhe deve. Tenta 
resolver de modo sereno e racional os pequenos 
obstáculos que vão surgindo – situação conjugal de 
Maria Eduarda; opinião do avô – mas acaba der-
rotado pela presença desse elo de parentesco que 
vem da vivência dramática do amor nos românticos 
tempos de Pedro. No entanto e apesar da gravidade 
trágica do desenlace, resiste com bastante frieza e 
realismo à tragédia que o atinge.
Contemporâneo de Carlos, Ega, sendo uma per-
sonagem objeto de um desenho caricatural, é, no 
amor, mais um representante do adultério reinante. 
 
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48
características trágicas 
dos protagonistas
Afonso da Maia
� Texto �
O velho cerrara os olhos, como se desfalecesse, 
estendendo a mão para se apoiar. Ega correu para 
ele:
– Não se aflija, Sr. Afonso da Maia!
– Que queres então que faça? Onde está ele? Lá 
metido, com essa mulher... Escusas de dizer, eu sei, 
mandei espreitar... Desci a isso, mas quis acabar esta 
angústia... E esteve lá ontem até de manhã, está lá 
a dormir neste instante... E foi para este horror que 
Deus me deixou viver até agora!
Teve um grande gesto de revolta e de dor. De 
novo os seus passos, mais pesados, mais lentos, se 
sumiram no corredor. Ega ficou junto da porta, um 
momento estarrecido. Depois foi -se despindo deva-
gar, decidido a dizer a Carlos, muito simplesmente, 
ao outro dia, antes de partir para Celorico, que a sua 
infâmia estava matando o avô, e o forçava a ele, seu 
melhor amigo, a fugir para a não testemunhar por 
mais tempo.
In Capítulo XVII 
 
Carlos da Maia
� Texto �
Subitamente Carlos parou diante dele, apertando 
desesperadamente as mãos:
– Estarem duas criaturas em pleno céu, passar 
um quidam, um idiota, um Guimarães, dizer duas 
palavras, entregar uns papéis e quebrar para sempre 
duas existências!... Olha que isto é horrível, Ega!
Ega arriscou uma consolação banal:
– Era pior se ela morresse...
– Pior porquê? – exclamou Carlos. – Se ela mor-
resse, ou eu, acabava o motivo desta paixão, restava 
49
a dor e a saudade, era outra coisa... Assim estamos 
vivos, mas mortos um para o outro, e viva a pai-
xão que nos unia!... Pois tu imaginas que por me 
virem provar que ela é minha irmã, eu gosto menos 
dela do que gostava ontem, ou gosto de um modo 
diferente? Está claro que não! O meu amor não se 
vai de uma hora para a outra acomodar a novas cir-
cunstâncias, e transformar -se em amizade... Nunca! 
Nem eu quero!
Era uma brutal revolta – o seu amor defendendo-
-se, não querendo morrer, só porque as revelações 
de um Guimarães e uma caixa de charutos cheia de 
papéis velhos o declaravam impossível, e lhe orde-
navam que morresse!
In Capítulo XVII 
 
Maria Eduarda
� Texto �
Duas lágrimas corriam -lhe devagar pela face. 
E diante desta dor, tão humilde e tão muda, Ega 
ficou desconcertado. Durante um instante, com 
os dedos trémulos no bigode, viu Maria chorar 
em silêncio. Por fim ergueu -se, foi à janela, voltou, 
abriu os braços diante dela numa aflição:
– Não, não é isso, minha querida senhora! Há 
outra coisa, há ainda outra coisa! Têm sido para nós 
dias terríveis! Têm sido dias de angústia...
Outra coisa!?... Ela esperava, com os olhos largos 
sobre o Ega, a alma toda suspensa.
Ega respirou fortemente:
– Vossa Excelência lembra -se de um Guimarães, 
que vive em Paris, um tio do Dâmaso?
Maria, espantada, moveu lentamente a cabeça.
– Esse Guimarães era muito conhecido da mãe 
de Vossa Excelência, não é verdade?
Ela teve o mesmo movimento breve e mudo. Mas 
o pobre Ega hesitava ainda, com a face arrepanhada 
e branca, num embaraço que o dilacerava:
50
– Eu falo em tudo isto, minha senhora, porque 
Carlos assim me pediu... Deus sabe o que me custa!... 
E é horrível, nem sei por onde hei de começar...
Ela juntou as mãos, numa súplica, numa angús-
tia:
– Pelo amor de Deus!
E nesse instante, muito sossegadamente, Rosa 
erguia uma ponta do reposteiro, com Niniche ao 
lado e a sua boneca nos braços. A mãe teve um grito 
impaciente:
– Vai lá para dentro! Deixa -me!
Assustada, a pequena não se moveu mais, com os 
lindos olhos de repentecheios de água. O reposteiro 
caiu, do fundo do corredor veio um grande choro 
magoado.
Então Ega teve um só desejo, o desesperado 
desejo de findar.
– Vossa Excelência conhece a letra de sua mãe, 
não é verdade?... Pois bem! Eu trago aqui uma 
declaração dela a seu respeito... Esse Guimarães é 
que tinha este documento, com outros papéis que 
ela lhe entregou em 71, nas vésperas da guerra... 
Ele conservou -os até agora, e queria restituir -lhos, 
mas não sabia onde Vossa Excelência vivia. Viu -a há 
dias numa carruagem, comigo e com o Carlos... Foi 
ao pé do Aterro, Vossa Excelência deve lembrar -se, 
defronte do alfaiate, quando vínhamos da Toca... 
Pois bem! O Guimarães veio imediatamente ao 
procurador dos Maias, deu -lhe esses papéis, para 
que os entregasse a Vossa Excelência... E nas pri-
meiras palavras que disse, imagine o assombro de 
todos, quando se entreviu que Vossa Excelência era 
parenta de Carlos, e parenta muito chegada.
Atabalhoara esta história de pé, quase de um 
fôlego, com bruscos gestos de nervoso. Ela mal com-
preendia, lívida, num indefinido terror. Só pôde 
murmurar muito debilmente: «Mas...» E de novo 
emudeceu, assombrada, devorando os movimentos 
do Ega, que, debruçado sobre o sofá, desembru-
lhava a tremer a caixa de charutos da Monforte. Por 
fim voltou para ela com um papel na mão, atrope-
lando as palavras numa debandada:
51
– A mãe de Vossa Excelência nunca lho disse... 
Havia um motivo muito grave... Ela tinha fugido 
de Lisboa, fugido ao marido... Digo isto assim bru-
talmente, perdoe -me Vossa Excelência, mas não é 
o momento de atenuar as coisas... Aqui está! Vossa 
Excelência conhece a letra de sua mãe. É dela esta 
letra, não é verdade?
– É! – exclamou Maria, indo arrebatar o papel.
– Perdão! – gritou Ega, retirando -lho violenta-
mente. – Eu sou um estranho! E Vossa Excelência 
não se pode inteirar de tudo isto enquanto eu não 
sair daqui.
In Capítulo XVII 
 
Relacionação com outros textos
Em plena tragédia motivada pela descoberta de 
que Maria Eduarda é sua irmã, Carlos é colocado, 
por Ega, perante a hipótese ainda mais grave da 
morte: « – Era pior se ela morresse...». Porém, Car-
los, personagem pertencente a um contexto positi-
vista e realista, sacode de si os hipotéticos desfechos 
fatalistas de Ega, tentando analisar a situação com 
alguma frieza. Esta observação leva -nos a estabe-
lecer um paralelo, em termos de desfechos, entre 
Os Maias e Amor de Perdição, verificando existir 
uma oposição total. Na novela de Camilo Castelo 
Branco, a morte é, para os protagonistas, a única 
solução.
Este diálogo em que Maria Eduarda vai, progres-
sivamente, compreendendo o sentido das palavras 
de Ega, evoca as cenas do final do segundo ato, de 
Frei Luís de Sousa, em que Madalena, a partir das 
palavras do Romeiro, descobre, aos poucos, que 
D. João de Portugal está vivo. Ambas as situações 
se desenvolvem em crescendo e acabam em clima 
trágico.
52
Educação literária – as questões
1. Os Maias são um romance, cujos protagonistas 
são atingidos pela tragédia. 
1.1 A partir da leitura dos três textos acima e 
recordando a leitura integral do romance, escreva 
um texto expositivo em que desenvolva o seguinte 
tópico:
– Características trágicas presentes nas persona-
gens de Afonso da Maia, Carlos da Maia e Maria 
Eduarda.
Educação literária – as respostas
1.1 
O carácter trágico de Afonso da Maia revela -se 
sobretudo no seu desfecho enquanto personagem.
É, nesse desfecho, que verdadeiramente se com-
preende a sua condição de vítima de um destino trá-
gico que o atinge fatalmente provocando -lhe a morte. 
Sendo o seu perfil composto de suprema digni-
dade e até alguma solenidade, como acontece com 
as grandes personagens -padrão da tragédia antiga, 
a resposta que dá à catástrofe que sobre ele se abate 
não poderia nunca ser a de adaptação ou cinismo. 
O seu alto nível moral não pode conviver com a 
grave transgressão do neto e, daí, só lhe resta morrer 
silenciosa e dignamente. Naquele mundo, não há 
lugar para ele: é este o sinal do seu carácter trágico.
Carlos da Maia é vítima de um destino que o 
leva a cometer um crime, de que, até certo ponto, se 
mantém inocente. 
Todavia, depois do reconhecimento de Maria 
Eduarda como sua irmã, continua a desafiar os dita-
mes morais. 
É uma personagem que não vive a tragédia com 
intensidade semelhante à de Afonso, mas de um modo 
relativizado pelos costumes burgueses e realistas. 
Não se pune, não se entrega a um castigo como 
muitas vezes faziam as personagens trágicas, mas 
tenta até autodesculpar -se. 
53
Torna -se cínico, cético, afetivamente indiferente. 
Não deixa, porém, antes do desfecho, de passar pelo 
chamado dilema trágico, sofrendo interiormente a 
angústia da escolha de um dos dois caminhos que se 
lhe apresentam e respetivas consequências. 
Maria Eduarda é a vítima mais frágil: inocente 
do seu destino e do seu crime até ao fim, sofre digna 
e tragicamente a catástrofe que sobre ela se abate. 
Para ela, tal catástrofe, que só em Afonso da Maia 
reveste a radicalidade da morte, concretiza -se na dor 
do afastamento e da impossibilidade do amor.
Este carácter trágico, que marca os protagonistas 
d’Os Maias, está presente desde o início da intriga, 
através de indícios que nela vão sendo subtilmente 
semeados como um destino escondido que os 
ameaça: 
– as parecenças fisionómicas; 
– a superstição fatal atribuída às paredes do 
Ramalhete; 
– a dúvida, ainda que mínima, que possa per-
sistir sobre o rumo da vida da filha de Pedro e 
Maria Monforte. 
Todavia, é de modo imprevisto que a mão do 
destino vingador (ironicamente através do senhor 
Guimarães, o tio do Dâmaso) vem fazer o gesto 
revelador e sem outra saída que não seja a da catás-
trofe concretizada na morte ou no abandono e 
esquecimento. 
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54
a descrição do real e o papel 
das sensações
� Texto �
Agora começava a divertir -se. Apenas vira de 
relance Vladimiro, e gostara da cabeça ligeira do 
potro, do seu peito largo e fundo; mas apostava 
sobre tudo para animar mais aquele recanto da tri-
buna, ver brilhar gulosamente os olhos interesseiros 
das mulheres. Teles da Gama ao lado aprovava -o, 
achava aquilo patriótico e chic.
– É «Minhoto»! – gritou de repente Taveira.
Na volta, com efeito, fizera -se uma mudança. 
Subitamente «Rabino» perdera terreno, resistindo à 
subida, com o fôlego curto. E agora era «Minhoto», 
o cavalicoque obscuro de Manuel Godinho, que se 
arremessava para a frente, vinha devorando a pista, 
num esforço contínuo, admiravelmente montado 
por um jóquei espanhol. E logo atrás vinham as 
cores escarlates e brancas de Darque: ao princípio 
ainda pareceu que era «Rabino»: mas, apanhado de 
repente num raio oblíquo de sol, o cavalo cobriu -se 
de tons lustrosos de baio claro, e foi uma surpresa 
ao reconhecer -se que era «Vladimiro»! A corrida 
travava -se entre ele e «Minhoto».
Os amigos de Godinho, precipitando -se para a 
pista, bradavam, de chapéus no ar:
– «Minhoto»! «Minhoto»!
E, em redor de Carlos, os que tinham apostado 
pelo campo contra «Vladimiro» faziam também 
votos por «Minhoto», em bicos de pés, junto do 
parapeito da tribuna, estendendo o braço para ele, 
animando -o:
 - Anda, «Minhoto»!... Isso, assim!.... Aguenta, 
rapaz!... Bravo!... «Minhoto»! «Minhoto»!
A russa, toda nervosa, na esperança de ganhar 
a poule, batia as palmas. Até a enorme Craben se 
erguera, dominando a tribuna, enchendo -a com 
os seus gorgorões azuis e brancos: – enquanto que, 
ao lado dela, o conde de Gouvarinho, também de 
pé, sorria, contente no seu peito de patriota, vendo 
55
naqueles jóqueis à desfilada, nos chapéus que se agi-
tavam, brilhar civilização...
De repente, de baixo, d’ao pé da tribuna, de 
entre os rapazes que cercavam o Darque, uma excla-
mação partiu.
– «Vladimiro»! «Vladimiro»!
Com um arranque desesperado o potro viera 
juntar -se a «Minhoto»: e agora chegavam furiosa-
mente, com brilhos vivos de cores claras, os foci-
nhos juntos, os olhos esbugalhados,

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