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1 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI METABOLISMO DA GLICOSE Muitos tecidos e sistemas conseguem utilizar outras formas de combustível, como os ácido graxos e cetonas; no entanto o sistema nervoso depende quase que exclusivamente da glicose como fonte de energia. Os tecidos corporais obtêm glicose por meio do sangue. Depois de uma refeição, os níveis sanguíneos de glicose aumentam e a insulina é secretada. Uma parte da glicose que é ingerida, é removida do sangue e armazenada no fígado na forma de glicogênio, ou é convertida em gordura. Quando os níveis de glicemia caem, como ocorre entre as refeições, o glicogênio é degradado, por um processo chamado glicogenólise. Além de mobilizar suas reservas de glicogênio, o fígado sintetiza glicose a partir dos aminoácidos, glicerol e ácido lático, processo chamado de gliconeogênese. Quando os níveis de insulina reduzem muito e o corpo não consegue usar a glicose como fonte de energia, os estoques de gordura são utilizados como fonte de energia, entretanto, o produto desta reação, são os corpos cetônicos, que deixam o sangue com um pH mais ácido; essa acidez é ruim para o organismo, tendo em vista que a maioria das reações químicas que ocorrem no corpo, dependem de uma faixa muito estreita de pH. O controle hormonal da glicose no sangue, depende da ação endócrina do pâncreas. (Fluxograma - Anexo 1) Pâncreas: Glândula que possui função endócrina e exócrina. as células exócrinas (ácinos) compõem cerca de 90% da massa do órgão, sendo responsáveis pela produção de enzimas que fluem para o sistema digestório, por meio de uma rede de ductos. A porção endócrina, é representada pelas Ilhotas de Langerhans, que produzem diversos hormônios. Cada ilhota é composta por: • Células alfa: secretam glucagon. • Células Beta: secretam insulina e amilina. • Células Delta: secretam somatostatina. • Células F: secretam o polipeptídeo pancreático. DIABETES 2 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI ➽ Hormônios reguladores da glicose: Insulina: hormônio importante para reduzir os níveis sanguíneos de glicose. A liberação de insulina pelas células beta do pâncreas é regulada pelos níveis de glicemia, aumentando com a elevação dos níveis sanguíneos de glicose e diminuindo quando estes níveis declinam. Glucagon: mantém a glicose sanguínea entre as refeições e durante os períodos de jejum, produz um aumento dos níveis de glicemia, por meio da glicogenólise e gliconeogênese. Sua liberação é controlada pela glicose sanguínea, a diminuição de glicose, leva a um aumento do glucagon. Os níveis de glucagon também aumentam durante o exercício vigoroso com o intuito de impedir a redução da glicose sanguínea. Amilina: seus níveis plasmáticos aumentam em resposta aos estímulos nutricionais, levando a inibição do esvaziamento gástrico e secreção de glucagon. ➽ Hormônios contrarreguladores: Epinefrina: ajuda a manter os níveis de glicemia durante os períodos de estresse, provoca a glicogenólise no fígado, provocando a liberação de grandes quantidades de glicose. Aumenta a mobilização dos ácidos graxos para uso como fonte de energia. Hormônio do crescimento: antagoniza os efeitos da insulina, diminui a captação e uso da glicose pelas células, aumentando a glicemia. Hormônios glicocorticoides: importantes para a sobrevivência em períodos de jejum e inanição, estimulam a gliconeogênese pelo fígado e diminuem o uso tecidual de glicose. Hormônio e fonte Controle da secreção Principais ações Glucagon: células alfa Nível baixo de glicose, exercícios físicos, refeições hiperproteicas, estimulam a secreção. Somatostatina e insulina inibem a secreção. Eleva o nível sanguíneo de glicose acelerando a degradação de glicogênio em glicose no fígado (glicogenólise), convertendo outros nutrientes em glicose no fígado (gliconeogênese) e liberando glicose no sangue. Insulina: células beta Nível sanguíneo elevado de glicose, acetilcolina, arginina e leucina, glucagon, GH e ACTH estimulam a secreção. Somatostatina inibe a secreção. Reduz o nível de glicose acelerando o transporte de glicose para as células, convertendo glicose em glicogênio (glicogênese) e diminuindo a glicogenólise e gliconeogênese; aumenta a lipogênese e estimula a síntese proteica. Somatostatina: células delta Peptídeo pancreático inibe a secreção. Inibe a secreção de insulina e glucagon, retarda a absorção de nutrientes no sistema digestório, aumentando o tempo de absorção. Polipeptídeo pancreático: células F Refeições contendo proteína, jejum, exercícios físicos e hipoglicemia aguda estimulam a secreção. Somatostatina e nível sanguíneo elevado de glicose inibem a secreção. Inibe a secreção de somatostatina, a contração da vesícula biliar e secreção de enzimas digestivas no pâncreas. 3 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI CONCEITO Síndrome metabólica, com etiologias diversas, caracterizada por hiperglicemia, resultante da secreção deficiente de insulina pelas células beta, resistência periférica á ação da insulina, ou ambas. CLASSIFICAÇÃO Tipo Características Tipo 1 1 A: deficiência de insulina por destruição autoimune das células beta. 1 B: deficiência de insulina de natureza idiopática. Tipo 2 Perda progressiva da secreção insulínica, combinada com a resistência á insulina. Gestacional Hiperglicemia de graus variados diagnosticada na gestação, sem critérios de DM prévio. Outros tipos Monogenicos (MODY), neonatal, secundário a endocrinopatias, doenças do pâncreas exócrino, secundário a infecções ou medicamentos. DIABETES TIPO 1 Caracteriza-se pela destruição das células beta do pâncreas, levando a deficiência absoluta de insulina. Corresponde de 5-10% dos casos de diabetes mellitus. É dividido em dois tipos: • Tipo 1 A: autoimune, mais comum em crianças e jovens. Decorrente de uma predisposição genética (antitransportador de zinco – Znt8), de fatores ambientais (infecções virais, dieta e microbiota intestinal). Tem forte relação com os genes do sistema de histocompatibilidade humano (HLA). A velocidade de destruição das células beta é variável. A forma rapidamente progressiva geralmente acomete crianças, mas também pode ocorrer em adultos. A forma lentamente progressiva ocorre geralmente em adultos, e é designada diabetes autoimune latente em adultos, com idade entre 25-65 anos (LADA). • Tipo 1 B: ou idiopático, os anticorpos não são detectáveis na circulação, sem relação com o HLA. DIABETES TIPO 2 Geralmente tem início insidioso e sintomas mais brandos. Manifesta-se em geral em adultos com história de sobrepeso e história familiar de diabetes tipo 2. Consiste em uma deficiência relativa de insulina, associado a um defeito na sua secreção. A hiperglicemia se desenvolve lentamente permanecendo assintomática por vários anos. A cetoacidose nestes casos é rara e quando presente, geralmente é decorrente de infecções ou estresse muito grave. As alterações metabólicas que levam ao diabetes tipo 2, incluem: • Resistencia á insulina. • Comprometimento na síntese de insulina pelas células beta do pâncreas. • Produção aumentada de glicose pelo fígado. Na resistência a insulina, os tecidos (principalmente fígado, tecido musculo esquelético e tecido adiposo), não respondem adequadamente a este hormônio, logo, a glicose não consegue entrar nas células com a mesma facilidade, o que leva a um acúmulo de glicose no sangue (hiperglicemia). Está fortemente associada a obesidade e ao sedentarismo; a obesidade leva o fígado á produzir mais insulina. DIABETES GESTACIONAL Estado de hiperglicemia, menos severo que o diabetes tipo 1 e 2, detectado pela primeira vezna gravidez. Geralmente se resolve no período pós-parto e pode retornara anos depois. OUTROS TIPOS • Diabetes monogênico (MODY): herança autossômica dominante, surge antes dos 25 anos, marcado por graus variáveis de disfunção nas células beta pancreáticas; não está associada a obesidade. 4 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI • Decorrente do uso de medicamentos: pentamidina, ácido nicotínico, glicocorticóides, hormônio tireoidiano, tiazídicos, agonistas beta adrenérgicos). • Devido a endocrinopatias: acromegalia, síndrome de Cushing, glucagonoma, feocromocitoma, somatostinoma, pancreatite crônica. • Defeitos genéticos na ação da insulina: Leprechaunismo (síndrome de Donohue) e a síndrome de RabsonMendenhall, defeito no receptor de insulina. • Diabetes pós-transplante: uso de imunossupressores aumenta o risco. • Diabetes neonatal: hipertrigliceridemia antes dos 6 meses de vida, causado geralmente por uma mutação no gene que codifica uma parte do canal de potássio das células beta. RASTREIO ➽ Critérios para o rastreio do DM em adultos assintomáticos: Excesso de peso (IMC >25 kg/m2) e um dos seguintes fatores de risco: • História de pai ou mãe com diabetes; • Hipertensão arterial (>140/90 mmHg ou uso de anti- hipertensivos em adultos); • História de diabetes gestacional ou de recém-nascido com mais de 4 kg; • Dislipidemia: hipertrigliceridemia (>250 mg/dL) ou HDL-C baixo (<35 mg/dL); • Exame prévio de HbA1c ≥5,7%, tolerância diminuída à glicose ou glicemia de jejum alterada; • Obesidade severa, acanthosis nigricans; • Síndrome de ovários policísticos; • História de doença cardiovascular; • Sedentarismo; OU • Idade ≥ 45 anos; OU • Risco cardiovascular moderado • Não existe um consenso na frequência com que os indivíduos assintomáticos devem ser testados, porém o recomendado é que seja a cada 3-5 anos. • Casos de tolerância diminuída á glicose, glicemia de jejum alterada ou diabetes gestacional prévio, podem ser testados anualmente. Os objetivos da consulta de rastreamento são: conhecer a história pregressa da pessoa; realizar o exame físico, incluindo a verificação de pressão arterial, de dados antropométricos (peso, altura e circunferência abdominal) e do cálculo do IMC; identificar os fatores de risco para DM; avaliar as condições de saúde e solicitar os exames laboratoriais necessários e que possam contribuir para o diagnóstico e para a decisão terapêutica ou preventiva. QUADRO CLÍNICO Os sinais e sintomas característicos de diabetes são os 4 P´s : poliúria, polidipsia, polifagia e perda de peso inexplicada. Estes sintomas podem também estar presentes no tipo 2, porém eles são muito mais agudos no tipo 1, podendo progredir para cetose, desidratação e acidose metabólica. Outros sintomas podem estar presentes, como: prurido, visão turva e fadiga. No diabetes tipo 2, o início é insidioso e muitas vezes a pessoa na apresenta sintomas; geralmente a suspeita da doença é feita pela presença de uma complicação tardia, como proteinúria, retinopatia, neuropatia periférica, doença arteriosclerótica ou por infecções de repetição. Sinais e sintomas clássicos: • Poliúria; • Polidipsia; • Perda inexplicada de peso; • Polifagia. Sintomas menos específicos: • Fadiga, fraqueza e letargia; • Visão turva (ou melhora temporária da visão para perto); • Prurido vulvar ou cutâneo, balanopostite. Complicações crônicas/ doenças intercorrentes: • Proteinuria; • Retinopatia diabética; • Catarata; • Neuropatia diabética (câimbras, parestesias e/ou dor nos membros inferiores, mononeuropatia de nervo craniano); • Doença arteriosclerótica (infarto agudo do miocárdio, acidente vascular encefálico, doença vascular periférica); • Infecções de repetição. 5 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI Quando os níveis sanguíneos de glicose estão muito elevados, a quantidade de glicose filtrada pelos glomérulos ultrapassa a quantidade que pode ser reabsorvida pelos túbulos renais, resultando em glicosúria acompanhada de perdas de água na urina. A sede decorre da desidratação intracelular, quando os níveis de glicose aumentam a água é retirada das células corporais, incluindo aquelas presentes no centro da sede no hipotálamo. A polifagia, resulta da inanição celular e da depleção das reservas celulares de carboidratos, lipídios e proteínas. A perda de peso, sem alteração no apetite; ocorre pela perda de líquidos corporais devido a diurese osmótica, e a perda de tecidos corporais, ocorre porque na ausência de insulina o organismo utiliza as reservas de gorduras e proteínas. A redução do volume plasmático leva a fadiga e fraqueza. As parestesias são decorrentes da disfunção temporária dos nervos sensitivos periféricos. A hiperglicemia e a glicemia favorecem o crescimento das leveduras. O prurido e a vulvovaginite devido a Candida, são as queixas iniciais em mulheres com diabetes; já nos homens, pode ocorrer balanite ou balanopostite (infecção da glande e do prepúcio). DIAGNÓSTICO Baseia-se na detecção da hiperglicemia. Existem quatro tipos de exames que podem ser utilizados no diagnóstico do diabetes mellitus: ➽ Glicemia de jejum: medida da glicose no sangue venoso (soro ou plasma), após jejum de 8 horas. ➽ Teste de tolerância a glicose (TTG, TOTG ou GTT): após a administração oral de glicose, ingerida em até 5 minutos, é coletado o sangue para mensuração da glicemia nos tempos zero (jejum de 8 horas) e 120 minutos após a ingestão. Importante teste de triagem, mede a capacidade do corpo armazenar glicose e remove-la do sangue. ➽ Hemoglobina glicada (A1c): reflete a média das glicemias dos últimos 3 meses. Hemoglobina que se encontra ligada á glicose; normalmente a hemoglobina não contém glicose quando é liberada na medula óssea. É recomendado que seja utilizada como um exame de acompanhamento e de estratificação do controle metabólico. Falsa redução: anemia hemolítica ou estados hemorrágicos, vitaminas C e E em altas doses, transfusão de sangue recente, gravidez ou parto, hemoglobinopatias, dapsona. Falsa elevação: hipertrigliceridemia, hiperbilirrubinemia, alcoolismo crônico, ingestão crônica de salicilatos, anemia ferropriva, fenobarbital e toxicidade por chumbo ou opiáceos. ➽ Glicemia casual: medida de glicose no sangue venoso, colhida a qualquer momento do dia, independente se o paciente tiver se alimentado ou não. Aceita como método diagnóstico apenas em assintomáticos. A glicemia casual é o primeiro exame a ser solicitado, pois fornece um resultado na própria consulta. O ponto de corte indicativo de diabetes é maior ou igual a 200 mg/dl na presença de sintomas de hiperglicemia. Se não houver urgência, é preferível solicitar uma glicemia de jejum medida no plasma, pessoas com glicemia de jejum alterada, entre 11 mg/dl e 125 mg/dl, por apresentarem alta probabilidade de ter diabetes pode requerer uma segunda avaliação por TTG-75g. Categoria Glicemia de jejum TTG: 2 hrs após 75g de glicose Glicemia casual Hemoglobina glicada Glicemia normal < 110 <140 <200 Glicemia alterada >110 e <126 Tolerância diminuída á glicose ≥140 e <200 Diabetes mellitus <126 ≥ 200 200 (com sintomas clássicos***) >6,5% ***Os sintomas clássicos de DM incluem poliúria, polidipsia e polifagia. Indivíduos com hiperglicemia intermediária (glicemia de jejum entre 110 mg/dl e 125 mg/dl, e duas horas pós-carga de 140 mg/dl a 199 mg/dl e HbA1c entre 5,7% e 6,4%), também denominadas de casos pré-diabetes, deverão ser orientadas para a prevenção do diabetes (orientações sobre alimentação saudável, atividade física e reavaliação anual de glicemia de jejum). 6 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI Diagrama de rastreamento ediagnóstico para diabetes mellitus tipo 2 7 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI A consulta médica deve abordar quatro aspectos fundamentais: história da pessoa, exame físico, avaliação laboratorial e estratificação do risco cardiovascular. Marcadores de resistência á insulina: • Teste de clamp euglicemico hiperinsulinêmico: Padrão-ouro para avaliar a ação da insulina. Há infusão contínua de insulina e soro glicosado com múltiplas coletas de sangue por 3-4 horas. • Índice HOMA IR: expressa a resistência insulínica hepática pressupondo equivalência com a periférica, baseia-se na avaliação da glicemia e insulina medidas após 8-12 hrs de jejum na mesma amostra. História clínica • Identificação: sexo, idade, raça e condição socioeconômica. • História atual: duração conhecida do DM e controle glicêmico; sintomas (polidipsia, poliúria, polifagia, emagrecimento, astenia, prurido vulvar ou balanopostite, diminuição brusca da acuidade visual, infecções frequentes), apresentação inicial e evolução dos sintomas, estado atual. • Investigação sobre diversos aparelhos e fatores de risco: dislipidemia, tabagismo, sobrepeso e obesidade, sedentarismo, perda de peso, características do sono, função sexual, dificuldades respiratórias. Queixas sobre infecções dentárias, da pele, de pés e do aparelho genito-urinário; úlcera de extremidades, parestesias, distúrbios visuais. • História pregressa: infarto agudo do miocárdio (IAM) ou acidente vascular cerebral (AVC) prévios; intercorrências metabólicas anteriores (cetoacidose, hiper ou hipoglicemia etc.); passado cirúrgico e história gestacional. • História familiar: de diabetes mellitus (pais, filhos e irmãos), doença cardiovascular e outras endocrinopatias. • Perfil psicossocial: hábitos de vida (incluindo uso de álcool e outras drogas), condições de moradia, trabalho, identificação de vulnerabilidades, como analfabetismo e déficit cognitivo, potencial para autocuidado, rede de apoio. • Avaliação de consumo alimentar: incluindo o consumo de doces e açúcar, sal, gordura saturada e cafeína. • Medicações em uso: uso de medicações que alteram a glicemia (tiazídicos, betabloqueadores, corticosteroides, contraceptivos hormonais orais, por exemplo); tratamentos prévios e resultados. • Prática de atividade física Exame físico • Medidas antropométricas: obtenção de peso e altura para cálculo do índice de massa corporal (IMC) e aferição da cintura abdominal (CA). • Exame da cavidade oral: atenção para a presença de gengivite, problemas odontológicos e candidíase. • Medida da PA e frequência cardíaca: duas medidas de PA, separadas por, pelo menos, um minuto, com paciente em posição sentada. • Pescoço: palpação de tireoide (quando DM tipo 1). • Ausculta cardíaca e pulmonar. • Exame dos pés: lesões cutâneas (infecções bacterianas ou fúngicas), estado das unhas, calos e deformidades. Avaliação dos pulsos arteriais periféricos e edema de membros inferiores; exame neurológico sumário. • Exame de fundo do olho Exames complementares • Glicemia de jejum e HbA1C. • Colesterol total (CT), HDL e triglicerídeos (TG). o A fração LDL pode ser calculada utilizando-se a fórmula de Friedewald: LDL = CT – HDL – TG/5 (para triglicerídeos abaixo de 400 mg/dL). • Creatinina sérica. • Exame de urina tipo 1 e, se necessário, microalbuminúria ou relação albumina/creatinina. • Fundoscopia. Recomenda-se que os exames de glicemia de jejum e HbA1c sejam realizado duas vezes ao ano, nos casos em que a pessoa encontra-se dentro da meta glicêmica estabelecida, e a cada três meses, se estiver acima da meta. Os demais exames podem ser solicitados uma vez ao ano. 8 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI TRATAMENTO O tratamento do diabetes mellitus tipo 2, consiste na adoção de hábitos de vida saudáveis, alimentação equilibrada, atividade física regularmente, moderação no consumo de álcool e abandono do tabagismo; acrescido ou não do tratamento farmacológico. ➽ Controle glicêmico: Essencial para o tratamento, mantem o paciente assintomático e previne as complicações agudas e crônicas. Pode ser monitorado pela glicemia de jejum, pré-prandial (antes das refeições), pós-prandial (após as refeições) e pela hemoglobina glicada (avalia o controle glicêmico a longo prazo). As glicemias ajudam no ajuste das doses das medicações. ➽ Monitorização da glicemia: Recomendada por 3 ou mais vezes no dia a todas as pessoas com diabetes mellitus em uso de insulina de doses múltiplas. A pesquisa de corpos cetonicos na urina (cetonúria), precisa ser aferida em pessoas com diabetes mellitus tipo 1 se a glicemia for maior que 300mg/dl, se houver estresse agudo ou sintomas de hiperglicemia/cetose. ➽ Metas terapêuticas: Parâmetro Metas terapêuticas Níveis toleráveis Hemoglobina glicada Ao redor de 7% em adultos. Entre 7,5 e 8,5% em idosos. As metas devem ser individualizadas de acordo com: Duração do diabetes, doença cardiovascular, idade, complicações microvasculares, comorbidades, hipoglicemia não percebida. Glicemia de jejum < 100 mg/dl < 130 mg/dl Glicemia pré- prandial < 100 mg/dl <130 mg/dl Glicemia pós- prandial < 160 mg/dl < 180 mg/dl TRATAMENTO MEDICAMENTOSO O tratamento do diabetes tipo 1, além da terapia não farmacológica, exige sempre a administração de insulina, prescrita em esquema intensivo, de três a quatro doses de insulina/dia, divididas em insulina basal e prandial, cujas doses são ajustadas de acordo com a glicemia capilar, realizada 3 vezes ao dia. O tratamento do diabetes tipo 2, exige tratamento não farmacológico e antidiabéticos orais, e eventualmente com uma ou duas doses de insulina basal. INSULINA A insulina exógena é administrada para substituir a falta de secreção de insulina no DM1 ou para suplementar a secreção insuficiente de insulina no DM2. ➽ Classificações: Podem ser rápidas ou prandiais: • Ultrarrápida: asparte, lispro e glusina. Podem ser aplicados 15 minutos antes, durante, ou até 15 minutos após a refeição. • Rápida: regular. Deve ser aplicada de 30-40 minutos antes das refeições. Basais: • Intermediária: NPH. Pode ser misturada com insulinas de ação rápida ou ultrarrápida. • Prolongada: detemir, glargina, degludeca. Detemir costuma provocar ganho de peso menor do que a glargina; porém são necessárias doses maiores para obter o mesmo efeito glicêmico. Degludeca é o análogo se ação mais prolongada, pode ser aplicada 1 vez por dia para uso como insulina basal. 9 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI HIPOGLICEMIANTES ORAIS Divididos em 5 categorias: secretagogos de insulina; sensibilizadores da insulina; inibidores da alfaglicosidase; inibidores de GLT2. SECRETAGOGOS DE INSULINA Promovem a liberação de insulina nas células beta do pâncreas. SULFONIURÉIAS Ação de longo prazo, atuam através de sua ligação a um receptor de sulfoniuréias de alta afinidade na célula beta, que está ligado a um canal de potássio sensível ao ATP. A ligação de uma sulfoniuréia fecha o canal, resultando em uma reação acoplada que determina o influxo de íons cálcio e a secreção de insulina. GLINIDAS Ação de curto prazo, início rápido, indicados para o controle de hiperglicemia pós-prandial. Se fixam em um local diferente na célula beta, fechando os canais de potássio sensíveis a ATP, resultando na liberação de insulina. Nateglinida, repaglinida. SENSIBILIZADORES DE INSULINA Fármacos antidiabéticos orais mais antigos. BIGUANIDAS O principal representante é a metformina. Ela atua inibindo a produção hepática de glicosee aumenta a sensibilidade dos tecidos periféricos ás ações da insulina. Clorpropramida, gliblenclamida, grimeprida, gliclazida. 10 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI Não produz hipoglicemia, pode contribuir para a redução do peso, melhora os perfis lipídicos. Ação protrombótica, estimula a fibrinólise, reduz a incidência de infarto e morte em obesos com DM2. Evita a progressão para DM2 com intolerância a glicose. Reduz o risco de neoplasias associadas ao diabetes, baixo custo, bom perfil de segurança. Os efeitos colaterais mais comuns são os gastrointestinais (náuseas, vômitos, cólica, diarreia, gosto metálico, flatulência), porém se iniciada com doses baixas ou substituída por uma de liberação prolongada, os sintomas desaparecem. TIAZOLIDINEDIONAS A pioglitazona, diminui a resistência insulínica nos tecidos periféricos (principalmente no musculoesquelético, mas também em menor grau, o tecido adiposo e fígado), por meio do estímulo do receptor PPAR-gama, levando a um aumento da expressão dos transportadores de membrana (GLUT4). Favorecem a diferenciação dos pré-adipócitos em adipócitos pequenos, mais sensíveis a insulina, e provocam a apoptose dos adipócitos grandes. Reduzem a glicemia, por estimular a captação de glicose pelos músculos e diminuem os níveis de ácidos graxos e triglicérides. • Efeitos adversos: sinusite, faringite e mialgia, retenção hídrica, anemia, raramente hepatotoxicidade. INIBIDORES DA ALFAGLICOSIDASE A acarbose, inibe competitivamente a ação das alfaglicosidades na “borda em escova’ do intestino delgado, retardando a quebra de oligossacarídeos e dissacarídeos nas suas formas mais simples, monossacarídeos. Isso leva a um retardo na absorção de glicose, levando a uma redução da glicemia e insluninemia no período pós-prandial. Vem caindo em desuso, pois é uma droga menos potente na redução da glicemia. INCRETINOMIMÉTICOS INIBIDORES DE DIPEPTIL PEPTIDASE IV Estimulam a ação de hormônios intestinais, chamados de incretinas. Inibem a enzima DPP-4, que é responsável pela inativação dos hormônios incretina, como o GLP-1. O aumento da atividade dos hormônios incretina aumenta a liberação de insulina em resposta a refeições e a redução na secreção imprópria de glucagon. Não causam saciedade ou plenitude e não provocam alterações no peso corporal. Contraindicados em hepatopatias agudas. Vildagliptina, sitagliptina, saxagliptina, linagliptina. AGONISTAS DE GLP-1 A liraglutida liga-se aos receptores endógenos para GLP-1 e potencializam os efeitos deste hormônio incretínico, provocando aumento da secreção de insulina dependente de glicose, potencializando a primeira fase de insulina, inibição da secreção de glucagon, retardo do esvaziamento gástrico e diminuição do apetite. Contraindicados no DM1, na cetoacidose diabética e na insuficiência hepática grave, distúrbios gastrointestinais graves. INIBIDORES DE SGLT2 Bloqueadores seletivos do cotransportador de sódio- glicose tipo 2 (SGLT2), encontrado no túbulo proximal renal. Em pacientes normais, toda a glicose filtrada pelos glomérulos acaba reabsorvida nos túbulos proximais renais, o que faz com que a urina seja livre de 11 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI glicose. No paciente em uso de inibidor de SGLT2, o bloqueio desse transportador leva ao aumento de excreção urinária de glicose, mesmo quando o indivíduo apresenta níveis de glicemia normais, levando a perda de urina e redução da glicemia. COMBINAÇÕES DO TRATAMENTO A escolha do medicamento geralmente segue uma sequência, porém nos casos de hiperglicemia severa no diagnóstico (>300 mg/dl) pode se beneficiar da insulina desde o início. O custo e as preferencias pessoais também são importantes para a escolha. 1ª linha Se o paciente não alcançar a meta glicêmica em até três meses com as medidas não farmacológicas, o tratamento preferencial é acrescentar a metformina no plano terapêutico. Inicia com doses baixas, única ou duas vezes ao dia, durante ou após as refeições. Após 5-7 dias, caso não surjam efeitos adversos, poderá ser aumentada a dose para 850 mg a 1000 mg/dia. A dose efetiva geralmente é 850 mg 2x ao dia. 2ª linha A associação com um segundo fármaco ocorre com a maioria dos casos de DM2, devido ao caráter progressivo da doença. Combinando-se dois antidiabéticos orais, com mecanismos de ação diferentes obtém-se uma queda adicional na glicemia, com melhora do quadro metabólico, confirmado pela dosagem de HbA1C. Se as metas de controle não forem alcançadas após 3- 6 meses de uso de metformina, pode se associar a uma sulfoniuréia. Elas também podem ser utilizadas como primeira escolha quando há perda de peso e teores glicêmicos mais elevados, indicando secreção insuficiente de insulina. 3ª linha Se o controle metabólico não for alcançado após o uso de metformina em associação com uma sulfonilureia por 3 a 6 meses, deve ser considerada uma terceira medicação. A insulina também é considerada quando os níveis de glicose plasmática estiverem maiores de 300 mg/dL, na primeira avaliação ou no momento do diagnóstico, principalmente se acompanhado de perda de peso, cetonúria e cetonemia. As classes de medicamentos que podem ser utilizadas são insulinas de ação intermediária ou longa, recomenda-se o uso de insulina intermediária devido à longa experiência com seu uso e ao menor custo. A via de administração usual da insulina é a via subcutânea, mas a insulina regular também pode ser aplicada por vias intravenosa e intramuscular, em situações que requerem um efeito clínico imediato. A aplicação subcutânea pode ser realizada nos braços, abdômen, coxas e nádegas. A velocidade de absorção varia conforme o local de aplicação, sendo mais rápida no abdômen, intermediária nos braços e mais lenta nas coxas e nádegas. Para correção das hiperglicemias de jejum ou pré- prandial, escolhe-se uma insulina basal (intermediária ou lenta), enquanto que, para tratamento da hiperglicemia associada à refeição, seleciona-se uma insulina de curta ação ou rápida. 12 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI Fluxograma de tratamento diabetes tipo 2 13 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI Categorias Classes Ações Indicações e contra indicações Efeitos adversos Secretagogos de insulina • Sulfoniuréias • Glinidas. Aumentam a secreção de insulina pelas células betapancreáticas. Melhores candidatos; duração da doença < 5 anos. Não recomendados nos casos de insuficiência renal e hepática. Ajuste da dose: semanal, se necessário. • Sulfoniuréias: Hipoglicemia, ganho de peso, hiperinsulinemia, hiperatividade do SNAs, hipoglicemia, aumento mortalidade cardiovascular pós-IAM, secreção elevada de ADH. Sensibilizadores da insulina •Biguanidas (metformina) •Tiazolidinedionas (pioglitazona) • Biguanidas: diminui a produção de glicose hepática. Dose 500 mg 3x dia ou 850 mg 2x ao dia. • Tiazoledinedionas: aumenta a resposta tissular á insulina (músculo e gordura). Dose 15-45 mg 1x dia. • Contra indicações biguanidas: falência renal, hepática, hipóxia (suspender se creatinina >1,5). • Tiazolidinedionas: falência hepática, gestação, historia de câncer de bexiga ou hematúria inexplicada. • Biguanidas: acidose lática (rara). Metformina: hipotensão postural, hipertensão rebote, sedação, distúrbio do sono, cefaleia, vertigem, tontura, xerostomia, anemia hemolítica, febre. • Tiazolidinedionas: edema, aumento de peso e resistência a sua ação. Inibidores da alfaglicosidase Acarbose Retardama digestão e absorção de carboidratos no intestino delgado. Não causam hipoglicemia. Contraindicada para os pacientes com doença inflamatória intestinal, obstrução intestinal, síndromes disabsortivas, doenças hepáticas, insuficiência renal, gestação, lactação, crianças menores de 12 anos. Flatulência, meteorismo, cólicas, distensão abdominal, diarreia. Incretinomiméticos Inibidores da dipeptidil peptidase IV e agonistas GLP-1. Aumentam a secreção de insulina e reduzem a secreção de glucagon em resposta as refeições (efeito incretina). • Inibidores da DPP4: Dose: Vidalglipina 50 mg 2x dia, stragliptina 100 mg/dia; saxagliptina e linagliptina 5 mg/dia. • Agonistas do GLPI1: Liraglutida: 0,6 – 1,8 mcg SC x 1 dia • Agonistas do GLPI1: perda de peso • Inibidores da DPP4: rinofaringites. • Agonistas do GLPI1: hipoglicemia Inibidores de SGLT2 Glifozinas Bloqueiam a reabsorção de glicose nos túbulos proximais renais, aumenta a glicosúria. Depende da função renal normal. Dose: Dapagliflozina 10 mg 1 x dia. Infecção urinária, aumento da excreção de Na (hipotensão). Perda de peso significativa. Insulinas Insulina e análogos da insulina (glargina, detemir, degludeca, lipro, asparte, glusina. Estimulam a captação de glicose pelos tecidos e bloqueiam a secreção de glicose pelo fígado Indicados em todos os casos de diabetes tipo 1 e em alguns casos de diabetes tipo 2. Hipoglicemia, aumento de peso, reações no local da injeção. 14 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI ACOMPANHAMENTO Estratificação de risco para diabetes mellitus tipo 2: Risco Critério Baixo Pessoa com glicemia de jejum alterada e intolerância à sobrecarga de glicose Médio Pessoa com DM diagnosticado e: Controle metabólico (HbA1c <7,5) e pressórico adequados Sem internações por complicações agudas nos últimos 12 meses Sem complicações crônicas (micro ou macroangiopatia) Alto Pessoa com DM diagnosticado e: Controle metabólico (7,5 < HbA1c <9) ou pressórico inadequado, com internações por complicações agudas nos últimos 12 meses e/ou complicações crônicas (incluindo pé diabético de risco avançado) Muito alto Pessoa com DM diagnosticado e: Controle metabólico (7,5 < HbA1c < 9) ou pressórico inadequado com internações por complicações agudas nos últimos 12 meses e/ou complicações crônicas (incluindo pé diabético de risco avançado) COMPLICAÇÕES O diabetes mellitus não controlado pode provocar, a longo prazo, disfunção e falência de vários órgãos, principalmente rins, olhos, nervos, coração e vasos sanguíneos. Está associado a um aumento da mortalidade e ao alto risco de desenvolvimento de complicações micro e macrovasculares, assim como de neuropatias. Podem ser classificadas em agudas (cetoacidose, hipoglicemia, coma hiperosmolar) e crônicas (retinopatia, nefropatia, neuropatia). AGUDAS As complicações agudas do DM incluem a descompensação hiperglicêmica aguda, com glicemia casual superior a 250 mg/dl, que pode evoluir para complicações mais graves como cetoacidose diabética e síndrome hiperosmolar hiperglicêmica não cetótica, e a hipoglicemia, com glicemia casual inferior a 60 mg/dL. Essas complicações requerem ação imediata da pessoa, da família ou dos amigos, e do serviço de Saúde. CETOACIDOSE A cetoacidose é uma emergência endocrinológica decorrente da deficiência absoluta ou relativa de insulina, potencialmente letal, com mortalidade em torno de 5%. A cetoacidose ocorre principalmente em pacientes com DM tipo 1, sendo na maioria das vezes, a primeira manifestação da doença. A pessoa com DM tipo 2, que mantém uma reserva pancreática de insulina, raramente desenvolve essa complicação. ➽ Fatores precipitantes: infecção, má aderência ao tratamento (omissão da aplicação de insulina, abuso alimentar), uso de medicações hiperglicemiantes e outras intercorrências graves (AVC, IAM ou trauma). ➽ Sintomas: polidipsia, poliúria, enurese, hálito cetônico, fadiga, visão turva, náuseas e dor abdominal, além de vômitos, desidratação, hiperventilação e alterações do estado mental. ➽ Diagnóstico: é realizado por hiperglicemia (glicemia maior de 250 mg/dl), cetonemia e acidose metabólica (pH <7,3 e bicarbonato <15 mEq/l). ➽ Complicações: choque, distúrbio hidroeletrolítico, insuficiência renal, pneumonia de aspiração, síndrome de angústia respiratória do adulto e edema cerebral em crianças. (Fluxograma - Anexo 2) SÍNDROME HIPERORSMOLAR HIPERGLICEMICA NÃO CETÓTICA Estado de hiperglicemia grave (superior a 600 mg/dl a 800 mg/dL) acompanhada de desidratação e alteração do estado mental, na ausência de cetose. Ocorre apenas no diabetes tipo 2, em que um mínimo de ação insulínica preservada pode prevenir a cetogênese. A mortalidade é mais elevada que nos casos de 15 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI cetoacidose diabética devido à idade mais elevada dos pacientes e à gravidade dos fatores precipitantes. ➽ Sintomas: fraqueza, desidratação, poliúria, sinais e sintomas neurológicos, sede excessiva. Os sintomas neurológicos incluem: hemiparesia, reflexos de Babinski, afasia, fasciculações musculares, nistagmo, alucinações visuais, convulsões e coma. ➽ Maior risco: são os idosos, cronicamente doentes, debilitados ou institucionalizados, com mecanismos de sede ou acesso à água prejudicados. ➽ Fatores precipitantes: doenças agudas como AVC, IAM ou infecções, particularmente a pneumonia, uso de glicocorticoides ou diuréticos, cirurgia, ou elevadas doses de glicose (por meio de nutrição enteral ou parenteral ou, ainda, de diálise peritoneal). Avaliação diagnóstica • História: causa da descompensação (mudança e não aderência ao esquema de insulina, doenças e medicações intercorrentes, abuso alimentar). • Exame físico: pressão arterial, frequência cardíaca e respiratória, temperatura axilar, avaliação do estado mental, hálito cetônico, boca, garganta e ouvidos, ausculta respiratória, exame abdominal, gânglios linfáticos, pele, exame neurológico. • Exames complementares: glicemia capilar, cetonúria e exame comum de urina, se sintomas de infecção urinária. Conduta • Hidratação oral e tratamento da doença intercorrente. • Pessoas com glicemia >250 mg/dL, cetonúria e hálito cetônico, desidratação ou vômitos: encaminhar para serviço de emergência prontamente • Pessoas com glicemia >250 mg/dL e cetonúria, mas sem os agravantes acima: administrar 20% da dose de insulina diária sob a forma de insulina regular e revisar em quatro horas. Repetir a dose se glicemia >250 mg/dL. Se não melhorar no próximo teste ou mostrar agravantes, encaminhar prontamente ao serviço de emergência. A pessoa deve ser hidratada com soro fisiológico 0,9% endovenoso em acesso venoso calibroso. • Pacientes com glicemia >250 mg/dL, sem cetonúria, mas com manifestações clínicas, administrar 10% da dose total de insulina e observar de 4 em 4 horas até estabilização. Havendo piora do quadro, encaminhar para serviço de emergência. A pessoa também deve ser hidratada com soro fisiológico 0,9% endovenoso em acesso venoso calibroso. HIPOGLICEMIA Diminuição dos níveis glicêmicos – com ou sem sintomas – para valores abaixo de 70 mg/dL. ➽ Sintomas: ocorrem quando a glicose plasmática é menor de 60 mg/dl a 50 mg/dl, podendo esse limiar ser mais alto, ou mais baixo. Geralmente, a queda da glicemia leva a sintomas neuroglicopênicos (fome, tontura, fraqueza, dor de cabeça, confusão, coma, convulsão) e a manifestações de liberação do sistema simpático (sudorese, taquicardia, apreensão, tremor). ➽ Fatores de risco: idade avançada, abuso de álcool, desnutrição, insuficiência renal, atraso ou omissão de refeições, exercício vigoroso, consumo excessivo de álcool e erro na administraçãode insulina ou de hipoglicemiante oral. A grande maioria das hipoglicemias é leve e facilmente tratável pelo próprio paciente. A hipoglicemia pode ser grave quando a pessoa ignora ou trata inadequadamente suas manifestações precoces, quando não reconhece ou não apresenta essas manifestações, ou quando a secreção de hormônios contrarreguladores é deficiente, o que pode ocorrer com a evolução da doença. ➽ Manejo: Paciente Ingerir 10 g a 20 g de carboidrato de absorção rápida; repetir em 10 a 15 minutos, se necessário. Amigo ou familiar Se a pessoa não conseguir engolir, não forçar. Pode-se colocar açúcar ou mel embaixo da língua ou entre a gengiva e a bochecha e levá-lo imediatamente a um serviço de Saúde. Serviços de saúde Se existirem sinais de hipoglicemia grave, administrar 25 mL de glicose a 50% via endovenosa em acesso de grande calibre, com velocidade de 3 ml/min e manter veia com glicose a 10% até recuperar plenamente a consciência ou glicemia maior de 60 mg/dL; manter então esquema oral, observando o paciente enquanto perdurar o pico da insulina; pacientes que recebem sulfonilureias devem ser observados por 48h a 72h para detectar possível recorrência. 16 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI CRONICAS Macrovasculares: • Doença cardiovascular e cerebrovascular • Doença vascular periférica Microvasculares: • Retinopatia • Nefropatia Neuropatia: • Polineuropatia • Mononeuropatia e neuropatia autonômica Pé diabético A fisiopatologia não está totalmente esclarecida, porém, sabe-se que a duração do diabetes, hipertensão arterial, tabagismo, dislipidemia, hiperglicemia crônica, resistência insulínica, contribuem para o desenvolvimento das complicações crônicas do diabetes mellitus. ➽ Doença macrovascular Os sintomas das três grandes manifestações cardiovasculares (doença coronariana, doença cerebrovascular e doença vascular periférica) são semelhantes em pacientes com e sem diabetes. Porém, alguns pontos merecem destaque: • a angina de peito e o IAM podem ocorrer de forma atípica na apresentação e na caracterização da dor (devido à presença de neuropatia autonômica cardíaca do diabetes); • as manifestações cerebrais de hipoglicemia podem mimetizar ataques isquêmicos transitórios; • a evolução pós-infarto é pior nos pacientes com diabetes. Estratificação de risco cardiovascular no diabetes: Avalia a taxa de inicdencia de doença coronoriana em 10 anos. Categorias de risco Eventos coronarianos em 10 anos Idade (anos) Condição Baixo <10 Homens <38 Mulheres <46 Sem fatores de estratificação, sem marcadores de aterosclerose subclínica, sem doença aterosclerótica clínica. Intermediário 10 a 20 Homens 38-40 Mulheres 45 a 56 Sem fatores de estratificação, sem marcadores de aterosclerose subclínica, sem doença aterosclerótica clínica Alto 20 a 30 Qualquer idade Com fatores de estratificação ou com marcadores de aterosclerose subclínica, sem doença aterosclerótica clínica. Moderado >30 Qualquer idade Com doença aterosclerótica clínica, história de eventos cardiovasculares (IAM/AVC), presença de estenose > 50% em qualquer artéria. 17 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI Taxa de doença coronariana em 10 anos: • Baixo: 10% • Intermediário 10-20% • Alto risco 20-30% • Muito alto risco >30% Estratificação de risco: • Idade > 49 anos para homens e >56 anos para mulheres. • Diabetes mellitus com duração superior a 10 anos. • História familiar prematura de doença cardiovascular. • Presença de síndrome metabólica. • Hipertensão arterial sistemica tratada ou não. • Tabagismo atual. • Taxa de filtração glomerular estimada em < 60 ml/min • Albuminúria > 30 mg/g de creatinina. • Neuropatia autonomica cardiovascular. • Retinopatia diabética. Marcadores de aterosclerose subclínica • Escore de cálcio coronário > 10 Agatston. • Placa na carótida (espessura íntima-média >1,5mm) • Angiotomografia de coronárias com presença de placa. • Índice tornozelo-braquial <0,9. • Presença de aneurisma de aorta abdominal. Doença aterosclerótica clínica • Síndrome coronariana aguda • Angina estável ou infarto do miocárdio prévio • AVC isquêmico ou ataque isquêmico transitório • Insuficiência vascular periférica (úlcera isquêmica) • Revascularização de qualquer artéria por aterosclerose: carótidas, renais e de membros inferiores. • Amputação não traumática de membros inferiores. • Doença aterosclerótica grave com obstrução > 50% em qualquer artéria. Risco cardiovascular e avaliação do perfil lipídico: Avaliação : colesterol total (CT), HDL (alta densidade ), LDL (baixa densidade ) e triglicerídeos ( TGL). A hiperglicemia crônica leva a disfunção das células endoteliais, que resulta: na diminuição da produção de Óxido Nítrico (NO); aumento da sensibilidade à Angiotensina II; aumento fluxo sanguíneo e pressão intravascular: aumento da permeabilidade vascular e perda de células microvasculares e oclusão vascular. RETINOPATIA DIABÉTICA Importante causa de cegueira, está muito relacionada com as elevações da glicemia e a hiperlipidemia (comuns em indivíduos com diabetes não contolado). Caracteriza-se por uma anormalidade da permeabilidade vascular da retina, formação de microaneurismas, neovascularização e hemorragia associada e cicatrizes de descolamento de retina. • Fatores de risco: duração da diabetes mellitus (maior que 5-7 anos), nível de controle glicêmico, hipertensão arterial, dislipidemia, doença renal/ proteinúria, baixo hematócrito; fatores genéticos (formas graves). • Sintomas: o paciente em geral, evoluem assintomáticos até a perda da visão (que pode ser abrupta, nos casos de hemorragia). Os principais sintomas: visão embaçada, perda de visão e distorção das imagens, entretanto os pacientes podem ser assintomãticos. O edema macular é uma lesão que pode apresentar a perda de visão central como primeira manifestação, na maioria dos casos é irreversível. Gestação, puberdade e melhora rápida do controle glicêmico podem acelerar sua evolução. Gravidade Achados Sem retinopatia aparente Sem alterações RD não Proliferativa Leve Microaneurisma apenas RD não Proliferativa Moderada Achados mais abundantes que na leve e menos abundantes que na grave RD não Proliferativa Grave Um destes: >20 hemorragias retinianas em cada um dos 4 quadrantes, ensalsichamento venoso em 2 quadrantes, microanormalidades vasculares intrarretinianas em 1 quadrante. RD Proliferativa Neovasos e/ou hemorragia vítrea ou pré-retiniana 18 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI • Tratamento: padrão ouro – fotocoagulação a laser. Impede a progressão para cegueira: 90% dos casos, na fase não proliferativa. 50% dos casos, fase proliferativa Casos refratários: cirurgia (Vitrectomia). NEFROPATIA DIABÉTICA A anormalidade funcional no aparelho justaglomerular levam a vasoconstrição das arteríolas, que associada a hipertensão arterial sistêmica e a hiperglicemia, levam a um aumento na pressão intraglomerular e da taxa de filtração glomerular (que posteriormente diminui). Essa hiperfiltração, aumenta a permeabilidade dos glomérulos, permitindo a excreção maior de albumina. Situações podem elevar a excreção de albumina na urina: exercício físico intenso, doença aguda febril, hematúria e/ou leucocitúria, contaminação com secreção vaginal, descompensação diabética, crise hipertensiva e insuficiência cardíaca congestiva. • Classificação: Fase 1 Hiperfiltração, incremento na taxa de filtração glomerular, fase longa e ainda passível de reversão com o controle metabólico rigoroso, microalbuminúriaé ausente. Fase 2 Presença de microalbuminúria (albuminúria entre 30 a 300 mg/dia), pode haver algum comprometimento renal. Fase 3 Proteinúria clínica ou macroalbuminúrica, presença de albuminúria superior a 300 mg; lesões mais graves. Lesão de Kimmestiel-Wilson: nódulos grosseiros, que tornam o glomérulo com aspecto lobulado. Lesões irreversíveis. • Diagnóstico: Rastreamento anual: com medida da albuminúria e estimativa da TFG. Valores de albumina utilizadas para o diagnóstico de doença renal do diabetes: Deverá ser confirmado com 2-3 amostras no intervalo de 3-6 meses. • Tratamento: Visa diminuir a excreção urinária de albumina, evitar o aumento progressivo, desacelerar o declínico da taxa de filtração glomerular, prevenir os eventos cardiovasculares. Controle glicêmico: Hb1Ac: <7% NEUROPATIA DIABÉTICA Quadro variado, com múltiplos sinais e sintomas, dependentes de sua localização em fibras nervosas sensoriais, motoras e/ou autonômicas. A neuropatia pode variar de assintomática até fisicamente incapacitante. Neuropatias sensitivo-motoras: • Polineuropatia simétrica distal: início insidioso, é a forma mais comum de neuropatia diabética periférica e apresenta três estágios: inicial, sintomático e grave. O estágio inicial é, em geral, assintomático, mas pode haver diminuição de sensibilidade. O período sintomático é caracterizado por perda de sensibilidade, dormência e, muitas vezes, parestesias e/ou dor. O estágio grave apresenta envolvimento motor com limitação funcional e com potencial para ulceração nos membros inferiores. Amostra casual de urina Valores Concentração de albumina ≥ 14 mg/l Indice de albumina ceratinina ≥ 30 mg/g Amostra de urina 24 hrs ≥ 30 mg/24 hrs 19 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI Dor neuropática: Fibras finas (Fibras C): dor em queimação, superficial, ↓ Sudorese, pele seca e pés frios (prejuízo vasomotor) Fibras grossas: alterações motoras, perda sensibilidade térmica e vibratória, perda do senso de posição, perda de reflexos. Neuropatias focais: • Mononeuropatias: formas raras de inĩcio sũbito, assimẽtrica e autolimitado. Exemplos de mononeuropatias com dẽficit motor são a paralisia facial, oculomotora e ciãtico-poplĩtea; um exemplo de mononeuropatia sensitiva ẽ a ocorrência de forte dor na região intercostal. • Miorradiculopatia: apresenta quadro clĩnico de dor e atrofia muscular intensa na cintura pẽlvica, nãdegas e coxas com início insidioso. • Neurites compressivas: podem ocorrer sĩndromes como a do tũnel carpal ou tarsal. São identificadas por dor e parestesias nas mãos, antebraços ou pẽs e por hipotrofia dos pequenos mũsculos das mãos e/ou dos pẽs. Neuropatias autonômicas: • Cardiovascular: tonturas, hipotensão postural, hipotensão pós-prandial, taquicardia em repouso, intolerância ao exercício, isquemia miocárdica ou infarto sem dor, complicações nos pés e morte súbita. • Autonômica periférica: alterações na textura da pele, edema, proeminência venosa, formação de calo, perda das unhas, anormalidade na sudorese dos pés. • Gastrintestinal: disfagia, dor retroesternal, pirose, gastroparesia, constipação, diarreia, incontinência fecal. • Genitourinária: disfunção vesical, ejaculação retrógrada, disfunção erétil, dispareunia. • Resposta pupilar anormal: visão muito diminuída em ambientes escuros. • Resposta neuroendócrina á hipoglicemia: menor secreção de glucagon e secreção retardada de adrenalina. • Tratamento: Controle glicêmico: previne, inibe intensidade e extensão das lesões. PÉ DIABÉTICO Conjunto de síndromes clínicas que afetam o sistema nervoso periférico sensitivo, motor e autonômico, de forma isolada ou difusa, nos segmentos proximal ou distal, de instalação aguda ou crônica, de caráter reversível ou irreversível. O pé isquêmico caracteriza-se por história de claudicação intermitente, isto é, dor em repouso que piora com exercício ou elevação do membro superior. À inspeção, observa-se rubor postural do pé e palidez à elevação do membro inferior. Ao exame físico, o pé apresenta-se frio, com ausência dos pulsos tibial posterior e pedioso dorsal. O pé neuropático caracteriza-se por alteração da sensibilidade dos membros inferiores. Na história, o paciente pode referir sintomas como formigamentos, sensação de queimação que melhora com exercício ou sintomas de diminuição da sensibilidade. O pé neuropata pode se apresentar com temperatura elevada por aumento do fluxo sanguíneo. Além disso, pode-se observar atrofia da musculatura interóssea, aumento do arco plantar, dedos em “garra” e calos em áreas de aumento de pressão. Fatores de risco para úlceras nos pés • Amputação prévia • Úlcera nos pés no passado • Neuropatia periférica (perda de sensibilidade tátil/dorlorosa). • Deformidade nos pés (Artropatia de Charcot) • Doença vascular periférica • Nefropatia diabética (especialmente em diálise) • Mau controle glicêmico • Tabagismo • Deficiência visual • Calosidades, anidrose, micose, fissuras. 20 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI • A pesquisa de neuropatia periférica deve ser realizada pelo menos anualmente, usando um monofilamento de 10g. O monofilamento deve ser aplicado com uma pressão suficiente para encurvar-se, e em pelo menos 4 locais da região plantar de ambos os pés (hálux, extremidades distais do 1º, 3º e 5º metatarsos), perguntando se o paciente sentiu a pressão nestes locais. • Teste com o diapasão de 128 Hz: O uso desta ferramenta é uma forma prática de avaliar a sensibilidade vibratória. O cabo do diapasão deve ser posicionado sobre a falange distal do hálux. O teste é considerado anormal quando a pessoa perde a sensação da vibração enquanto o examinador ainda percebe o diapasão vibrando • Teste para a sensação de picada: Utiliza-se um objeto pontiagudo para testar a percepção tátil dolorosa da picada como uma agulha ou palito, na superfície dorsal da pele próxima a unha do hálux. A falta de percepção diante da aplicação do objeto indica um teste alterado e aumenta o risco de • Teste para o reflexo aquileu: Com o tornozelo em posição neutra, utiliza-se um martelo apropriado para percussão do tendão de Aquiles. O teste é considerado alterado quando há ausência da flexão do pé. Fisiopatologia: Traumas (pelos calçados inapropriados, caminhar descalço), insensibilidade associada á liitação da mobilidade articular , alterações biomecanicas, hiperqueratose, calosidades, anidrose (pele serca) são alterações que precedem o surgimento das úlceras. Manejo: Categoria de risco Recomendação Acompanhamento 0 Orientações sobre calçados apropriados. Estímulo ao autocuidado. Anual, com médico ou enfermeiro da Atenção Básica. 1 Considerar o uso de calçados adaptados. Considerar correção cirúrgica caso não haja adaptação. A cada 3 a 6 meses com médico ou enfermeiro da Atenção Básica. 2 Considerar o uso de calçados adaptados. Considerar necessidade de encaminhamento ao cirurgião vascular. A cada 2 a 3 meses com médico e/ou enfermeiro da Atenção Básica. Avaliar encaminhamento ao cirurgião vascular. 3 Considerar o uso de calçados adaptados. Considerar correção cirúrgica caso não haja adaptação. Se DAP, avaliar a necessidade de encaminhamento ao cirurgião vascular. A cada 1 a 2 meses com médico e/ou enfermeiro da Atenção Básica ou médico especialista. 21 ANA CAROLINA DE MELO – XXXI Anexo 1 Anexo 2 Mecanismos da cetoacidose Está associada a níveis muito baixos de insulina e a níveis extremamente elevados de glucagon, catecolaminas e outros hormônios contrarreguladores. Os níveis aumentadosde glucagon e das catecolaminas levam à mobilização dos substratos para a gliconeogênese e a cetogênese pelo fígado. A gliconeogênese em excesso em relação à necessária para suprir a glicose do cérebro e de outros tecidos dependentes de glicose produz uma elevação nos níveis de glicemia. A mobilização dos ácidos graxos livres (AGL) a partir das reservas de triglicerídeos no tecido adiposo leva à produção acelerada de cetonas e ao desenvolvimento de cetose. SNC, sistema nervoso central. O metabolismo no estado de jejum deve manter a concentração de glicose plasmática para uso do encéfalo.
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