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Arte Volume 5 Sumário 09 10 A arte renasce ........................................... 4 Movimento humanista: o homem no centro do mundo ................................. 6 Renascimento: o adeus definitivo à Idade Média ........................................... 8 Recriar é criar. ............................................. 21 Teatro elisabetano: o mundo todo é um palco! .............................................. 22 Um teatro para ver e ser visto ........................................................................ 23 “Há mais coisas entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia” ........... 24 Ser ou não ser original: eis a questão ............................................................. 25 A música renasce cheia de dissonâncias ......................................................... 27 Música instrumental ...................................................................................... 28 Pavanas e galhardas: dança e música ............................................................ 31 Acesse o livro digital e conheça os objetos digitais e slides deste volume. A arte renasce 09 Ponto de partida Com os colegas, observe as obras de Ghirlandaio e Botticelli e responda às questões propostas. 1. Em que período as obras foram produzidas? 2. Quais são os temas retratados pelos artistas? 3. Essas obras apresentam temas similares? Por quê? BOTTICELLI, Sandro. O nascimento de Vênus. [ca. 1480]. 1 têmpera sobre tela, 172,5 cm x 278,5 cm. Galleria degli Uffizi, Florença. GHIRLANDAIO, Domênico. São Jerônimo em seus estudos. 1480. 1 afresco, 184 cm x 119 cm. Igreja do Espírito Santo, Florença. Igreja do Espírito Santo, Florença. Galleria degli Uffizi, Florença. 4 Objetivos da unidade: obter uma visão geral sobre as artes visuais durante o Renascimento; entender a arte como uma parte integrante dos conhecimentos humanistas; compreender como a função da arte está relacionada à valorização dos seres humanos e de suas produções; reconhecer o aspecto simbólico da arte no movimento renascentista europeu; estabelecer relações entre os conteúdos históricos e a contemporaneidade; situar historicamente as manifestações artísticas do Período Renascentista; aplicar conhecimentos técnicos em produções artísticas. isuais durante o Renascimento; Na Europa Ocidental, o período da Idade Média foi considerado, durante muitos séculos, como a “Idade das Tre- vas”, em razão da soberania da Igreja Católica, que insistia em valorizar apenas o plano espiritual, deixando de lado as necessidades materiais da humanidade. A existência do Tribunal da Santa Inquisição e as perseguições mantidas pelos seus membros aos considerados hereges também contribuíram para que essa época histórica fosse considerada um período de atraso e retrocesso em relação à Antiguidade Clássica. Entretanto, é importante salientar que foi durante os últimos séculos da Ida- de Média que ocorreram mudanças responsáveis pelo estabelecimento de uma nova sociedade, voltada para os seres humanos e suas realizações. Foi nesse período também que surgiu a burguesia – termo utilizado inicial- mente para denominar os habitantes dos burgos, os quais passaram a promo- ver um comércio rico e variado e, por meio dessa atividade, a obter lucros. burgos: vocábulo de origem latina utilizado para denominar vilas e cidades medievais. Geralmente cercados por muralhas, os burgos surgiram nos entroncamentos das estradas e muitos deles desenvolveram-se das feiras. Em virtude do espaço restrito para a realização de atividades agropastoris, os burgueses se dedicaram às atividades ma- nufatureiras e comerciais. Na obra de Quentin Massys, há a representação de um casal cuja ocupação era o empréstimo a juros O comércio com o Oriente, espe- cialmente o realizado pelos mercado- res de Gênova e Veneza, proporcionou, na Europa Ocidental, o consumo de produtos raros – possibilitando gran- des lucros aos comerciantes – e trocas culturais que acabaram, aos poucos, por alterar as sociedades europeias. Foi por meio desses viajantes que novos costumes e conhecimentos chegaram à Europa. Museu do Louvre MASSYS, Quentin. O prestamista e sua esposa. 1514. 1 óleo sobre tela, color., 71 cm x 68 cm. Museu do Louvre, Paris. 5 antropocentrismo: a valorização do homem pro- moveu o estímulo à racionalidade e aos prazeres oriundos dos sentidos. Dessa forma, a apreciação de uma produção artística visual passou a ser incenti- vada e valorizada. Na Grécia Antiga, a valorização do prazer oriundo da estimulação dos sentidos era denominada hedonismo. Movimento humanista: o homem no centro do mundo O movimento humanista, central para o Renascimento, pode ser relacionado com o comércio e com os conflitos entre o Oriente e o Ocidente durante a Baixa Idade Média. Trata-se de um movimento que se caracterizou pelo retorno ao estudo da cultura clássica e foi fortemente marcado pelo antropocentrismo, ou seja, pela valoriza- ção do ser humano e de todas as suas realizações. Os humanistas contestaram a cultura medieval e se voltaram à cultura da Antiguidade Clássica em busca da valorização do homem. ConexõesConexões Leia o fragmento a seguir e, depois, responda às questões propostas. O movimento intelectual mais característico do Renascimento foi o Humanismo, um programa educacional baseado no estudo da antiga literatura grega e romana. A atitude humanista para com a Antiguidade diferia dos eruditos da Idade Média. Enquanto estes buscavam adaptar o conhecimento clássico a uma concepção cristã do mundo, os humanistas do Renascimento valorizavam a literatura antiga por ela própria – por seu estilo claro e elegante e por sua percepção da natureza humana. Com os clássicos da Antiguidade, os humanistas esperavam apreender o muito que não lhes ensinaram os escritos medievais – esperavam, por exemplo, aprender a viver bem neste mundo. [...] Usavam o co- nhecimento clássico para alimentar o seu novo interesse pela vida terrena. PERRY, Marvin. Civilização ocidental: uma história concisa. São Paulo: Martins Fontes, [19--?]. p. 271. 1. Explique a diferença entre os estudos da cultura clássica promovidos pelos humanistas e os da cultura clássica pro- movidos pelos eruditos da Idade Média. 2. O Humanismo pode ser considerado apenas um movimento de retorno à cultura clássica? Justifique sua resposta. 6 Volume 5 Aprecie Observe, a seguir, um estudo de corpo humano produzido por Michelangelo. 1. Observando o estudo de Michelangelo, cite os conhecimentos que o artista deveria ter, em sua opinião, para produzir a figura de David. 2. Como são feitas as sombras do desenho? Que técnica foi utilizada? MICHELANGELO. Homem nu, em pé. [ca. 1505]. 1 desenho a bico de pena, 37,5 cm x 19,5 cm. Sala de Exposições, Museu do Louvre, Paris. M us eu d o Lo uv re Arte 7 GIOTTO. Anunciação de Santa Ana. [ca. 1304]. 1 afresco, color., 200 cm × 185 cm. Cappella Degli Scrovegni, Pádua, Itália. GIOTTO. Última ceia. [ca. 1304]. 1 afresco, color., 200 cm × 185 cm. Cappella Degli Scrovegni, Pádua, Itália. Renascimento: o adeus definitivo à Idade Média O Renascimento foi um movimento de renovação cultural que ocorreu na Europa entre os séculos XIV e XVI e teve manifestações em todas as áreas do conhecimento. Esse movimento promoveu uma grande mudança na maneira de se observar o mundo, uma vez que os seres humanos passaram a buscar explicações não somente para a vida espiritual como também para a vida terrena. Ao colocar a figura humana como o centro de todos os estudos, interesses e produções, o Humanismo lançou as bases para o Renascimento. O processo de valorização da vida terrena permitiu o rompimento com as doutrinas impos- tas pela Igreja Católica, durante a Idade Média, que consideravam Deus como o centro do mundo. O Renascimento teve início na Península Itálica, alastrando-se por várias outras regiões da Europa. Como são várias as divisões propostas para esse período,optamos por adotar as divisões frequentemente encontradas na História da Arte: Trecento (século XIV), Quattrocento (século XV) e Cinquecento (século XVI). Trecento A primeira fase do Renascimento foi denominada Trecento por tratar-se do século XIV (1301-1400), no qual todos os anos, com exceção do último, iniciam-se com mil e trezentos – por isso trecento. No século XIV, a sociedade europeia era fortemente influenciada pela Igreja Católica e, portanto, pela religiosida- de. Os artistas não fugiam disso, reproduzindo temas religiosos, os quais acabaram por marcar a arte renascentista, especialmente durante esse período. Entretanto, mesmo mantendo a religiosidade como eixo temático, os artistas do Renascimento passaram a retratar temas bíblicos cada vez mais ambientados em cenários terrenos. Nesse sentido, podemos dizer que o naturalismo foi uma das características marcantes do movimento renascentista. Um dos grandes nomes da pintura durante o Trecento foi Giotto. Observe, a seguir, algumas de suas obras. Imagens: Cappella Degli Scrovegni 8 Volumelume 5 Obra em foco Ceni Piero Giovanni, mais conhecido como Cimabue, foi um dos precursores do movimento renascentista. Ele realizou diversas pinturas em madeira para a Igreja de Santa Maria Novella, em Florença. Nessa cidade, teria começado sua carreira sob a influência de pintores gregos contratados, por Florença, para a realização de trabalhos e para ensinar jovens artistas. De acordo com Giorgio Vasari, Cimabue teria sido um desses jovens. Observe, a seguir, uma das obras de Cimabue. CIMABUE. A Virgem e a Criança em majestade rodeadas de seis anjos. [ca. 1270]. 1 têmpera sobre madeira, 427 cm x 280 cm. Museu do Louvre, Paris. As dimensões da obra indicam que ela foi produzida para ser um elemento de devoção, fato que é comprovado pelo lugar em que ainda se encontra atualmente (interior de uma igreja). Na obra, é possível observar a forte influência da arte bizantina por conta da representação das figuras e dos elementos dourados O uso de expressões austeras e solenes era marca registrada dos artistas desse período. O azul intenso da veste da santa, em contraste com as folhas de ouro do fundo, leva o observador a focar sua atenção na figura de Maria. M us eu d o Lo uv re Arte 9 Fazer artístico Muito bem temperado Observe a referência da obra de Cimabue. Nela, aparece a informação de que o artista utilizou a têmpera, técnica adotada pelos pintores italianos que consistia em usar uma mistura de pigmentos (extraídos da terra, da argila, de musgos, de pedras moídas, etc.) com ovos. Portanto, eram os ovos que davam a liga entre os diversos elementos da natureza. A tinta assim produzida secava muito rapidamente, fato que impedia os artistas de acrescentar detalhes às partes já produzidas. A técnica de pintura com tinta a óleo, segundo algumas fontes, foi criada em 1410, na Holanda, por Jan van Eyck. Entretanto, há relatos do emprego de tipos diferentes de óleos em produções artísticas desde antes de Cristo. Diferen- temente do que ocorre com a tinta obtida pela têmpera, os pigmentos misturados com óleo demoram mais para secar, possibilitando ao artista mais tempo para a execução de seus trabalhos. Eram os próprios artistas que produziam as tintas que utilizavam. Embora possuíssem o status de artesãos, muitos deles viveram em extremas dificuldades, o que os levava a buscar um mecenas para protegê-los e patrociná-los. En- tretanto, se os artistas podiam desfrutar de algumas vantagens e confortos, também estavam sujeitos às exigências de seus senhores. Pesquise uma obra do período Trecento que tenha características semelhantes a que estudou e explique por que você a escolheu. Que elementos presentes nela podem ser comparados com os da obra de Cimabue? Sala do artista Têmpera Nesta atividade, você vai produzir suas próprias tintas e aplicá-las utilizando a técnica da têmpera. Materiais Elementos da natureza para produção das cores Ovos Recipientes para triturar, misturar e preparar as tintas Tela ou um pedaço de madeira liso Lápis grafite Pincéis Algodão ou papel-toalha Organize as ideias 10 Volume 5 MICHELANGELO. Criação de Adão. 1510. 1 afresco, color., 280 cm x 570 cm. Capela Sistina, Vaticano. Uma das mais importantes obras das artes visuais é um afresco pintado por Michelangelo no teto da Capela Sistina, representando o momento em que Deus criou o primeiro homem O afresco também foi uma técnica muito utilizada no Renascimento para adornar as paredes internas de igrejas, conventos, palácios e das casas dos ricos burgueses. Conhecida desde a Antiguidade, essa técnica foi aprimorada pelos italianos, que se especializaram na produção de murais (nome atribuído às pinturas de grandes extensões). Para executar o afresco, cabia ao pintor, enquanto a argamassa ainda estivesse molhada, aplicar as tintas. Quando o reboco da parede secava, a pintura estava pronta. Leia, a seguir, as observações feitas sobre a técnica do afresco. Trabalha-se sobre a argamassa fresca e não se abandona o trabalho enquanto não estiver acabado aquilo que naquele dia se queria fazer. Porque quando se demora a pintar, a argamassa cria uma cros- tazinha, seja em decorrência do calor, do frio, do vento ou do gelo, o que embolora e mancha todo o trabalho. Por isso a parede que se está pintando precisa ser continuamente molhada, e as tintas usadas devem ser todas de terra, e não de minerais, e o branco deve ser de travertino cozido. VASARI, Giorgio. Vidas dos artistas. São Paulo: Martins Fontes, 2011. p. 48-49. Essa técnica foi aprimorada durante o Quattrocento e o Cinquecento, culminando na genialidade da obra de Michelangelo. Como fazer 1. Forme uma dupla com um colega e, juntos, criem um projeto de pintura. Em seguida, elaborem um plano do que será retratado, destacando as cores das tintas necessárias para o trabalho. 2. Selecionem os elementos da natureza para a produção das tintas. 3. Misturem os pigmentos produzidos com ovo para formar a tinta. 4. Ao iniciar o trabalho de pintura, lembrem-se de que esse tipo de técnica permite a secagem das tintas em um curto espaço de tempo. 5. Apresentem à sua turma a obra criada por vocês. Ca pe la S ist in a Arte 11 Quattrocento A segunda fase do Renascimento é denominada Quattrocento e corresponde ao período do século XV (1401- -1500). Foi marcada pelo despontar de Florença como o grande centro cultural e artístico do Renascimento. A Família Médici foi importante incentivadora da arte do período e, graças a esses mecenas, a cidade de Florença abriga, na atualidade, significativa diversidade da produção artística do Ocidente. São expoentes desse período o arquiteto Filippo Brunelleschi, o escultor Donatello e os pintores Fra Angelico e Sandro Botticelli. Foto da cidade de Florença. À esquerda, o Palazzo Vecchio, centro do poder político da Florença renascentista; no centro, a cúpula do Batistério; e, à direita, o Duomo (Catedral de Santa Maria del Fiore) © Sh ut te rs to ck /S or in C ol ac 12 Curiosidades A arquitetura renascentista encontra-se representada com todo o seu esplendor na cúpula da Catedral de Santa Maria del Fiore. A catedral começou a ser erguida em 1296 e sua construção foi interrompida algumas vezes por causa de pestes, de guerras e de disputas pelo poder político. Desde o início, um dos grandes desafios para a construção da catedral foi a edificação da cúpula, pois o projeto previa uma estrutura muito alta e muito pesada (45 metros de largura e 100 metros de altura). Após vários projetos malsucedidos, Filippo Brunelleschi foi contratado e iniciou seu trabalho em 1420. O projeto do arquiteto, por não uti- lizar andaimes, que furavam as paredes do templo e enfraqueceriam a construção, foi considerado bastante inovador para o seu tempo. Arte 13 Para muitos estudiosos da pintura, uma das maiores contribuições do Renascimento foi a invenção da perspectiva linear,ou científica, com um único ponto de fuga. Trata-se da criação de um plano geométrico disposto sobre uma superfície bidimensional com o objetivo de que o observador tenha uma visão tridimensional da cena retratada. Para compreender melhor, observe a obra de Carlo Crivelli. Sala do artista CRIVELLI, Carlo. Anunciação com São Emidius. 1486. 1 óleo sobre madeira, transferido para tela, 207 cm x 147 cm. National Gallery, Londres. O esquema com as linhas apresenta a maneira como Carlo Crivelli planejou sua obra. O ponto de fuga, marcado pelo ponto de interseção entre as linhas, foi disposto no lado esquerdo da imagem. Para ele, convergem todas as linhas, o que fornece a impressão de que a janela está em um plano mais distante do observador, embora, na verdade, toda a cena tenha sido retratada em um plano bidimensional. O traço horizontal representa a linha do horizonte e se encontra no mesmo nível que os olhos do observador WIRTZ, Rolf C. Florença: arte e arquitetura. Alemanha: Könemann, 2001. p. 50. Planta da cúpula da Catedral de Santa Maria del Fiore Brunelleschi projetou travamentos horizontais em intersecção com travamentos verticais, os quais foram recobertos por duas paredes: uma interna e outra ex- terna. A base da cúpula foi produzida com vários anéis separados, erguidos um a um. A função desses anéis, também denominados tambores, era reduzir o peso da estrutura da cúpula sobre as paredes, que foram estruturadas no estilo espinha de peixe (tipo de amar- ração dos elementos que compõem a estrutura). A cúpula da Catedral de Santa Maria del Fiore é a quarta maior cúpula de um templo católico. Leonel Battista Alberti, em 1434, ficou tão admirado com a construção que afirmou que a sombra da cúpula seria capaz de “cobrir todas as gentes da Toscana”. © iS to ck ph ot o. co m /G io rg io M ag in i Ra ro d e O liv ei ra . 2 01 5. M ist a. Ga le ria N ac io na l d e Lo nd re s 14 Volume 5 Qual das obras abaixo pode enganar o olho humano? Por quê? Em duplas, escolham uma delas e apontem quais aspectos são importantes para a imitação ter sucesso. Que semelhança é possível identificar entre a obra de Richard Estes e a de Carlo Cravelli? Imitar não é fácil Mesmo que a obra de um determinado artista possa parecer mais “rea- lista” do que a de outro, toda imagem figurativa é uma imitação. O que se modifica é a fidelidade da imagem em relação àquilo que pretende imitar. arte figurativa: aquela que, em diferentes momentos da história da arte, procura re- produzir formas que podem ser encontradas na natureza. Troca de ideias CLOSE, Chuck. Mark. [1978 ou 1979]. 1 acrílico sobre tela. Metropolitan Museum of Art, Nova Iorque. RAPHAEL [Raffaello Sanzio]. Cristo benedicente. 1506. 1 óleo sobre madeira, 31,6 cm x 25,4 cm. Brescia Civici Musei d’Arte e Storia, Brescia. Ri ch ar d Le vy G al le ry Br es ci a Ci vi ci M us ei d ’A rte e S to ria M et ro po lit an M us eu m o f A rt ESTES, Richard. Hotel Holland. 1984. 1 serigrafia colorida sobre papel canson, 113,3 cm x 181,3 cm. Richard Levy Gallery, Novo México, EUA. Arte 15 A imitação é tão importante para a sociedade que antigas histórias sobre artistas habilidosos na arte da imitação são contadas até os dias de hoje. Uma delas trata de Zeuxis, famoso pintor da Grécia Antiga. Conta-se que Zeuxis par- ticipou de uma disputa com outro artista igualmente habilidoso, chamado Parraso. Os dois competiam para descobrir qual era o mais talentoso na arte da pintura. A pintura apresentada por Zeuxis foi a de um cacho de uvas. Quando exibiu o quadro, dois pássaros, imediatamen- te, vieram bicar as frutas. Feliz com a façanha, Zeuxis pediu ao concorrente que desembrulhasse seu quadro. Nesse mo- mento, Parraso revelou que sua pintura, na verdade, imitava um quadro embrulhado. Zeuxis, que tinha sido enganado pela ilusão criada, reconheceu, então, a superioridade de Parraso na arte da imitação. Os artistas do Renascimento retomaram a ideia de imitação da Antiguidade Clássica, mas não se restringiram a ape- nas copiar as imagens da natureza. Determinados a superar qualquer imitação já concebida, eles corrigiam a natureza, a fim de produzir uma imagem idealizada das coisas. Cinquecento Essa fase, que compreende o século XVI (1501-1600), marcou o esplendor do Renascimento na Península Itálica. A ideia do uomo universale, ou seja, do homem universal, atingiu todas as áreas do conhecimento e passou a ser obser- vada em várias outras partes do continente europeu. Uma percepção acurada dos seres humanos, que incluía diversos prismas (parte física, espiritualidade, intelecto, etc.), estava presente em toda a sociedade europeia. A Igreja Católica, inicialmente contrária ao movimento humanista, soube repensar sua postura e assumiu um papel importante de mecenato e centro de estudos humanísticos. As artes plásticas adquiriam outro status, passando de artesanato para artes liberais. Esse período foi caracterizado pelas obras de Donato Bramante, Leonardo da Vinci, Michelangelo, Ticiano, Tintoretto e Rafael. O chiaroscuro (claro-escuro) foi outra técnica aperfeiçoada pelos artistas do Re- nascimento. Produzindo contraste entre cores claras e escuras, os pintores, em suas obras, destacavam os elementos principais e obscureciam os secundários. A perspecti- va científica e o chiaroscuro foram técnicas utilizadas com o objetivo de retratar os cor- pos humanos e as cenas representadas de forma intensa e realista. Por isso a grande expressividade das obras produzidas nesse período. TINTORETTO. Cristo diante de Pilatos. [1566 ou 1567]. 1 óleo sobre tela, 515 cm x 380 cm. Scuola Grande di San Rocco, Veneza. Sc uo la G ra nd e di S an R oc co 16 Volume 5 Compare a escultura de Praxíteles, escultor da Grécia Antiga, com a obra David, de Michelangelo. Que semelhanças é possível identificar entre elas? Uma das características do estatuário renascentista era o conceito de contraposto, que consistia na representação da figura humana em uma posição em que uma das pernas sustentava totalmente a escultura, enquanto a outra ficava livre, conferindo dinamismo à obra. Escultura Os avanços das técnicas e os resultados obtidos na pintura e na arquitetura renascentista também podem ser observados na escul- tura desse período. As esculturas gregas e romanas da Antiguida- de serviram de inspiração para a criação de obras que representa- vam toda a beleza física dos seres humanos. Apesar dos tamanhos monumentais de muitas dessas produções, a beleza contemplada também envolvia imperfeições e expressões de sentimentos. PRAXÍTELES. Hermes carregando o infante Dionísio. [entre 330 e 320 a.C.]. 1 escultura em mármore, 2,15 m de altura. Museu Arqueológico de Olímpia, Olímpia. Ao observar a obra inacabada do escravo a acordar, temos a sensação de que o homem está saindo da pedra como se estivesse a se libertar © Sh ut te rs to ck /P an os K ar as Interseção vre, conferindo dinamismo à obra. PRAX márm©S hu tte rs to ck /P an os K ar as © Sh ut te rs to ck / A postura resultante – chamada contrapposto (contraposto) – produz todas as espécies de curvaturas sutis: o arqueamento do joelho “livre” re- sulta em um leve movimento giratório da pélvis, um arqueamento com- pensatório da coluna vertebral e uma inclinação de ajustamento dos om- bros. Como os requintados detalhes do Partenon, essas variações nada têm a ver com a capacidade da estátua de manter-se ereta, mas acentuam intensamente a sua impressão de organismo vivo [...]. JANSON, H. W.; JANSON, Anthony F. Iniciação à história da Arte. São Paulo: Martins Fontes, 2009. p. 60. La tin St oc k/ Al bu m /a kg -im ag es /R ab at ti - D om in gi e © Sh ut te rs to ck /m ur at ar t M IC H E LA N G E LO . E sc ra vo a a co rd ar . [ ca . 1 53 0] . 1 e sc ul tu ra e m m ár m or e, 27 5 cm d e al tura . G al le ri a de ll´ A cc ad em ia , F lo re nç a. M IC H E LA N G E LO . D av id . 1 50 4. 1 e sc ul tu ra e m m ár m or e, 4 34 c m d e al tu ra . G al le ri a de ll´ A cc ad em ia , F lo re nç a. Ao observar David, percebemos a grandeza de um trabalho que transforma o mármore em uma representação tão bela e detalhada do corpo humano. A escultura representa David, herói bíblico, momentos antes de enfrentar o gigante Golias Arte 17 Retratos e cenas É importante lembrar que, comumente, muitas das carac- terísticas das obras artísticas são reflexo das sociedades nas quais foram produzidas. Por esse motivo, ao observarmos as diferentes artes, podemos analisar os valores de determinado grupo, suas organizações sociais e econômicas, credos, ves- tuários, costumes, tradições, etc. No Renascimento, a pintura e a escultura foram utilizadas para enaltecer ou simplesmente eternizar momentos impor- tantes na vida das pessoas retratadas. Era ainda uma forma de demonstrar o prestígio, a prosperidade e o poder que tinham diante de seus pares e da sociedade na qual estavam inseridas. Se é certo afirmar que as artes visuais fornecem características sobre determinados períodos históricos, também é correto dizer que as obras de arte estão repletas de críticas a essas mesmas sociedades. Vários foram os artistas que, por vingança ao mecenas exigente e sovina, ou como forma de registrar seu descontentamento, inseriram em suas obras elementos que simbolizavam posições pessoais contrárias à ordem vigente. Na tio na l G al le ry VAN EYCK, Jan. Retrato de Giovanni Arnolfini e sua esposa. 1434. 1 óleo sobre carvalho, 82 cm x 60 cm. National Gallery, Londres. DA VINCI, Leonardo. A última ceia. 1498. Técnicas mistas, 460 cm x 880 cm. Convento de Santa Maria delle Grazie, Milão. Uma das obras mais conhecidas de Leonardo da Vinci retrata a última ceia de Jesus Cristo com seus apóstolos y, O comerciante Arnolfini encomendou essa obra para registrar seu casamento. Ao analisarmos a riqueza com a qual os noivos se apresentam e o luxo do quarto que serve de cenário, podemos concluir que a pretensão era salientar sua posição de poder e seu status social Co nv en to d e Sa nt a M ar ia d el le G ra zie 18 Volume 5 Analise o autorretrato de Albrecht Dürer. Obra em foco DÜRER, Albrecht. Autorretrato aos 22 anos. 1493. 1 óleo sobre linha, transferido para pergaminho, 57 cm x 45 cm. Museu do Louvre, Paris. No autorretrato de Albrecht Dürer, é possível observar o uso da técnica do chiaroscuro, pois há um destaque em seu rosto e em suas mãos, as quais são apresentadas com detalhes expressivos da anatomia humana. Fazer artístico Autorretrato Em uma época em que ainda não havia a fotografia, a pintura foi a forma mais comum de produzir retratos. Além de deixar registrados seus contratadores, muitos artistas se autorretrataram em cenas encomendadas ou produziram, por iniciativa própria, seus autorretratos. Nesta atividade, você vai produzir um autorretrato que apresente elementos que possam comprovar seus hábitos, preferências e cenas do seu cotidiano. Em outras palavras, ao analisar seu retrato, o observador deverá ter condições de saber um pouco mais a seu respeito. Materiais Máquina fotográfica ou celular com câmera Vestuário Objetos que fazem parte de sua rotina Cenário Como fazer 1. Liste suas principais caraterísticas e os elementos do seu cotidiano que você deseja que façam parte do autorretrato. 2. Escolha o cenário. Ele deve fazer parte das suas atividades habituais. 3. Fotografe a cena a ser retratada. 4. Produza um desenho com base na foto. 5. Apresente-o na próxima aula. A obra foi produzida quando Dürer viajava entre as cidades de Basileia e Estrasburgo. Ele havia sido chamado pela família de volta à casa paterna, em Nuremberg, para oficializar o noivado com a jovem Agnes Frey, com a qual se casaria um ano depois. O retrato seria um presente para a noiva. A flor de cardo que o artista tem em suas mãos pode ser interpretada como sorte no amor e fidelidade ao ser amado, uma mensagem muito direta para sua futura esposa. A inscrição no alto do retrato afirma “Tudo ocorrerá de acordo com a vontade do alto”. Portanto, a religiosidade do artista e a confiança nos desígnios de Deus são evidentes. M us eu d o Lo uv re Arte 19 Hora de estudo 1. Sobre o movimento humanista, assinale a(s) afirmativa(s) correta(s). I. Ocorreu na Europa durante o século XIX e teve como inspiração o Renascimento. II. O estudo da cultura clássica foi essencial para que houvesse a valorização dos seres humanos e de suas realizações. III. O teocentrismo medieval deu lugar ao antropocen- trismo. a) Todas as afirmativas estão corretas. b) Todas as afirmativas estão erradas. c) As afirmativas I e II estão corretas. d) As afirmativas I e III estão corretas. e) As afirmativas II e III estão corretas. 2. Sobre a arte renascentista, analise as afirmativas a seguir. I. Movimento de renovação cultural que teve início na Península Itálica durante o século XIV. II. A burguesia, que desejava firmar sua posição na so- ciedade europeia no início da Idade Moderna, contri- buiu para o desenvolvimento da arte renascentista. III. Os artistas renascentistas promoveram um retorno aos temas religiosos após estes serem proibidos pela Igreja Católica. De acordo com sua análise, assinale a(s) afirmativa(s) correta(s). a) Todas as afirmativas estão corretas. b) Todas as afirmativas estão erradas. c) As afirmativas I e II estão corretas. d) As afirmativas I e III estão corretas. e) As afirmativas II e III estão corretas. 3. Sobre as artes visuais renascentistas, assinale as afir- mativas corretas. (01) Os temas religiosos passaram a ser retratados com mais naturalismo. (02) O hedonismo, ou seja, a busca pelo prazer em apreciar belas obras, pode ser considerado uma característica do movimento. (04) A técnica do afresco foi bastante utilizada no Re- nascimento e está presente na decoração interna de muitos templos, edifícios públicos e palácios. (08) A escultura, em virtude da dificuldade de obtenção de materiais para sua produção, não apresentou grande destaque entre as artes visuais. (16) Entre os séculos XIV e XVI, ocorreram muitas ino- vações técnicas nas artes visuais, fruto do estudo, da observação e da experimentação promovidos por artistas e pensadores da época. 4. (UEL – PR) Analise a figura e leia o texto a seguir. Andreas Vesalius (1514-1564) In: De Humani Corporis Fabrica. Gravura 25, dos músculos. Basiléia: 1543. “Naturalmente, a preocupação maior estava na representação do ser humano. A arte renas- centista nunca se distanciou demasiado dessa sua vocação antropocêntrica. Nesse momento, a preocupação com a figuração da imagem huma- na se concentraria na representação do corpo, percebido em toda a extensão de sua carnalida- de, suas formas, seu peso, sua textura, sua os- satura, sua musculatura, sua anatomia, enfim.” (SEVCENKO, Nicolau. O Renascimento. São Paulo: Atual, 1994. p. 62.) Com base na imagem e no texto, considere as afirma- tivas a seguir. I. Vesalius expressa na imagem uma visão idealizada de homem. II. O artista se apoia em uma concepção religiosa de homem. III. A imagem procura reproduzir os movimentos do corpo humano. IV. O nu se torna um tema recorrente na arte ocidental da época. Estão corretas apenas as afirmativas: a) I e IV. b) II e III. c) III e IV. d) I, II e III. e) I, II e IV. 20 Volume 5 21 10 Recriar é criar Ponto de partida 1. Que costumes da sua região mereceriam ser retratados a fim de serem preservados para a posteridade? Por quê? 2. Como você recriaria a obra de Brueghel utilizando elementos da sua região ou país? 3. Que elementos da sua época (brincadeiras, jogos, moda, tecnologias, etc.) você colocaria? Explique os motivos da sua escolha. BRUEGHEL,Pieter. Jogos infantis. 1560. 1 óleo sobre painel, 118 cm × 161 cm. Kunsthistorisches Museum, Viena. (Detalhe.)BRUEGHEL, Pieter. JogJ gos inffantis. 1560. 1 óleo sobre paip nel, 118 cm × 161 cm. Kunsthistorisches Museum, Viena. (Detalhe.) Observando mais detalhadamente a obra de Brueghel, é possível identificar algumas brincadeiras que ainda fazem parte, na atualidade, da diversão e da interação infantis Kunsthistorisches Museum Os espetáculos teatrais criados na In- glaterra entre o começo do reinado de Elizabeth I (1558) e o fechamento dos teatros profissionais, em Londres, pelo Parlamento puritano (1642), fazem par- te do chamado teatro elisabetano. Foi nesse período que William Shakespeare (1564-1616), considerado o mais ilustre poeta dramático da história do teatro ocidental, produziu sua obra. Entre os séculos XV e XVII, Londres era uma das mais importantes e agitadas cidades do mundo, com uma população de 200 mil habitantes, composta de plebeus, membros da nobreza e do clero, comerciantes de toda sorte, funcionários públicos, estrangeiros e, é claro, ladrões e trapaceiros. Nesse ambiente fervilhan- te, homens do teatro criaram peças que, por sua riqueza dramática e qualidade poética, sobreviveram aos séculos. Para se ter uma ideia mais clara da efervescência cultural londrina, durante a época do teatro elisabetano foram criadas as primeiras salas de espetáculo permanentes do mundo. A cidade contava com, em média, seis salas de espetáculo em funcionamento, divididas entre públicas (com preços acessíveis a todos) e privadas (originalmente reservadas a um grupo seleto, mas acessível a quem pudesse pagar os altos preços cobrados). Foi também a época em que se formaram vários grupos de teatro. Alguns eram assegurados pelo patrocínio e proteção de membros da nobreza, o que permitiu que os coletivos de artistas se organizassem como empresas comerciais. A própria rainha Elizabeth, em 1583, decidiu dar de pre- sente a si mesma uma companhia de teatro, reunindo os melhores atores dos grupos existentes. Objetivos da unidade: BERK, Ari; McDERMOTT, Kristen (comp.). Bons conselhos para viajar à noite por Londres. In: ______. A vida e a época de William Shakespeare: um relato deste cavalheiro e poeta, em suas próprias palavras. São Paulo: Ciranda Cultural, 2008. p. 9. conhecer um panorama do teatro elisabetano; conhecer elementos teatrais renascentistas; discutir o teatro de Shakespeare; ler trechos das peças de Shakespeare; discutir questões sobre versões e recriações; desenvolver noções de leitura dramática; conhecer aspectos da música renascentista; compreender os conceitos de consonância e dissonância na música; entender o conceito de família instrumental; conhecer as danças renascentistas pavana e galharda. Teatro elisabetano: o mundo todo é um palco! KLIMT, Gustav. The Globe Theatre in London. 1888. 1 afresco. Burgtheater, Viena. Afresco representando a encenação de uma cena de Romeu e Julieta, de Shakespeare Toma cuidado com os guardas da cidade, pois eles são grosseiros e geralmente abordam à força até mesmo boas pessoas que não apresentam nenhuma suspeita. Eles são reconhecidos por seu hálito, que é horrível e cheira a cebola. Caso eles te detenham e o oficial pareça querer prender-te, finge ser um francês, holandês ou cidadão de um país que está em paz com o nosso, e talvez serás poupado; por não te entende- rem, eles não poderão interrogar-te, como é costume na cidade, e consequentemente não terão nada para dizer-te, e então dirige-te rapidamente para casa. Bu rg th ea te r 22 Volume 5 Para manter o funcionamento das salas de espetáculo e garantir a sobrevi- vência das companhias, era necessária a presença significativa de um público pa- gante, sendo fundamental, tendo em vista que cada espetáculo costumava ficar pouco tempo em cartaz, a criação de muitas peças. Esse contexto foi essencial para o desenvolvimento de uma importante dramaturgia. Os autores das peças teatrais eram geralmente contratados pelas compa- nhias. Escreviam sozinhos e, com frequência, de modo colaborativo. Essa pro- dução foi tão intensa que cerca de 600 peças dessa época chegaram até os dias atuais. Além disso, são conhecidas outras 600 peças, presentes em documentos diversos, sem contar que o número de textos teatrais completamente desapare- cidos, segundo estimativas, é ainda maior. Cerca de 250 autores dessa época foram catalogados por estudiosos, sendo os mais famosos, além de Shakespeare, Thomas Kyd (1558-1594), Christopher Marlowe (1564-1593), John Lyly (1554?- -1606) e Ben Jonson (1562-1637). Um teatro para ver e ser visto Como os autores faziam para atrair o grande público ao teatro? Que tipo de história conseguia tal feito? [...] foram buscar na tradição popular, na história e na litera- tura espanhola e italiana, a matéria para suas peças. Dessa forma, juntaram-se a tradição religiosa, o sentimento heroico e o espírito romântico e aventureiro das novelas de cavalaria, o que gerou a possibilidade de um teatro aberto, híbrido, sem preconceitos, per- meável a todas as influências, inclusive a trazida pela redescoberta dos clássicos. VASCONCELLOS, Luiz Paulo. Dicionário de Teatro. Porto Alegre: L&PM, 2009. p. 193. Inspirada em fontes variadas, essa dramaturgia não tinha medo de se reinventar em novos formatos. dramaturgia: ”arte, ciência e técnica de escrever peças de teatro. O termo refere-se também aos métodos utilizados em dife- rentes períodos, bem como aos estilos in- dividuais de composição dramática. Assim, podemos falar numa dramaturgia expres- sionista ou épica, ou numa dramaturgia ibseniana ou shakespeariana”. VASCONCELLOS, Luiz Paulo. D icionário de Teatro. Porto Alegre: L&PM, 2 009. p. 77. Selo com a ilustração do Globe Theatre, teatro de Shakespeare, em 1614 Desde 1590, apareceram formas originais de escrita dramática que testemunhavam uma total liberdade de gosto e um sereno desprezo pelas regras clássicas. [...] O essencial era contar uma história, exprimir as verdades do coração e do espírito e refletir o espetáculo do mundo. Ousava-se evocar problemas filosóficos tanto quanto fatos políticos e sociais. CORVIN, Michel. Dictionnaire encyclopédique du théâtre. Paris: Larousse, 2011. p. 566. (Tradução nossa). © Sh ut te rs to ck /G al ya m in S er ge j O teatro elisabetano era extremamente popular. As peças eram frequentadas por pessoas de diferentes classes sociais, principalmente as encenadas nos teatros públicos, que tinham ingressos mais baratos e se localizavam nos arredores de Londres. Shakespeare chegou a ser dono de um desses teatros, o Globe Theatre, uma construção com formato circular, sem teto e sem proteção, portanto, do sol e da chuva. Não à toa, os ingressos mais baratos eram desti- nados ao espaço em frente ao palco, onde o público assistia ao espetáculo em pé e sujeito à ação do tempo. Os nobres e comerciantes mais abastados viam o espetáculo dos camarotes mais caros, situados nas laterais do prédio. Arte 23 Nos teatros públicos e aber- tos (sem cobertura), como o Globe Theatre, normalmente o palco prin- cipal avançava no meio do público, que o cercava por três lados. Uma segunda área cênica ficava elevada perto desse palco, podendo ser usa- da pelos atores, em determinadas cenas, ou por músicos. O público, além de estar em pé, podia comer e beber durante a representação. Pró- ximo ao palco ficavam comerciantes que vendiam laranjas e cerveja. Para uma peça funcionar nesse ambiente, era preciso que envolvesse comple- tamente a audiência. Apresentação no Globe Theatre, que foi reconstruído e reinaugurado pela rainha Elizabeth II, em 1997 Converse com os colegas sobre as questões propostas. 1. Você já assistiu a interpretações das obras de Shakespeare? Vale apresentações ocorridas em sua escola, nos teatros de sua cidade ou em filmes. Caso tenha assistido, cite-as e descreva suas impressões sobre essa experiência. 2. Que obras de Shakespearevocê já leu? Troca de ideias "Há mais coisas entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia" Shakespeare é o grande nome do teatro elisabetano. Sobre sua vida pouco se sabe. Nascido e criado em uma família de agricultores e comer- ciantes que viviam em uma pequena cidade chamada Stratford-up-Avon, rumou para Londres com uma trupe de atores, aos 23 ou 24 anos, deixan- do, na sua cidade natal, mulher e três filhos. Em Londres, consagrou-se como dramaturgo, poeta, ator e até empresário e dono de teatro. Escreveu 37 peças consideradas um tesouro da cultura universal. As mais famosas, para citar algumas, são Hamlet, Otelo, Rei Lear, Macbeth, Romeu e Julieta, Henrique V, Ricardo III, Muito barulho por nada, Assim é se lhe parece, A Tem- pestade, Sonho de uma noite de verão, A megera domada e As alegres coma- dres de Windsor. William Shakespeare em gravura de E. Scriven, publicada em The Gallery of Portraits with Memoirs encyclopedia, Reino Unido, 1835 ©Shutterstock/Kamira Ga le ria N ac io na l d e Re tra to s d e Lo nd re s 24 Volume 5 Suas peças são tradicionalmente categorizadas em tragédias, comédias, peças históricas e tragicomédias. Embora didática, essa divisão se revela arbitrária, uma vez que nas peças shakespearianas há uma miscelânea de aspectos trági- cos, de humor, históricos e elementos de fantasia. Shakespeare, como poucos, soube tirar proveito dos recursos cênicos disponíveis, abusando da linguagem poética para atiçar a imaginação dos espectadores. Trabalhemos a força da vossa imaginação. Supondo que, entre esta cintura de mura- lhas, Estão agora confinadas duas poderosas monarquias Cujas frentes alevantadas e contíguas O perigoso e estreito oceano separa e divide. Completai as nossas imperfeições com os vossos pensamentos: Em mil partes dividi um homem E criai uma potência imaginária; Pensai, quando falamos de cavalos, que os vedes Ser ou não ser original: eis a questão No teatro elisabetano, assim como em outras épocas, para criar suas próprias obras, os artistas frequentemente se apropriavam de enredos e histórias existentes. A genialidade de Shakespeare não reside na originalidade da trama, mas na qualidade com que desenvolveu suas cenas e personagens, mesclando inteligência, profundidade, beleza e humor em falas que sobreviveram à passagem do tempo e que se tornaram máximas da sabedoria e da poética humana. Como homem de teatro, ele soube explorar as possibilidades da cena de maneira crível e encantadora, utilizando diferentes formas de monólogos e diálogos, des- cortinando com maestria confidencialidades, confissões, arranjos de conveniência, momentos de loucura, discursos públicos e fantasias. Enquanto Shakespeare estava ocupado reformulando o Hamlet original de Thomas Kyd – hoje de- saparecido – em seu próprio herói trágico, Ben Jonson se debruçava sobre uma tarefa similar. Ele estava adaptando o principal trabalho de Kyd, The Spanish Tragedie, que também envolve um tema de vingança, a aparição de um fantasma e uma peça dentro da peça. [...] O que importava no teatro elisabetano, como em outros, não era a invenção de uma trama, mas sua elaboração criativa. Frequentemente, vários autores se juntavam para uma produção conjunta. Francis Beaumont e John Fletcher escreveram juntos umas cinquenta comédias populares nos anos de 1606 a 1616, contribuindo Fletcher com seu espírito frívolo e viva fantasia, e Beaumont, com seu talento dramático. BERTHOLD, Margot. História mundial do Teatro. São Paulo: Perspectiva, 2001. p. 319. Imprimindo os seus altivos cascos na terra acolhedora; Pois os vossos pensamentos devem agora ornar os nossos réis, Levá-los ali e acolá, saltando sobre os tempos, Mudando as ações de muitos anos Numa hora de ampulheta; para tal serviço Admiti-me como Coro desta história; O qual, à laia de prólogo, pede à vossa caridosa paciência Que ouça com mansidão e julgue com bondade a nossa peça. SHAKESPEARE. Prólogo de Henrique V. In: PORTAS, Renata. Dramaturgos e demiurgos – uma linha quase invisível. Disponível em: <http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/11376.pdf>. Acesso em: 26 ago. 2015. Arte 25 Fazer artístico FUSELI, Henry. Hamlet e o fantasma de seu pai. [entre 1780 e 1785]. 1 nanquim sobre papel-cartão, 38 cm x 49,5 cm. Você percebeu que no teatro elisabetano as mesmas histórias eram recontadas por diversos autores? O im- portante era a maneira como elas eram recontadas. Pesquise trechos de peças de Shakespeare e, em seguida, reescreva, em parceria com mais dois colegas, uma cena de uma de suas histórias. Sinta-se livre para modificar a trama à sua maneira. Ela deve ser envolvente para o seu público (colegas). Contudo, é preciso que respeite as seguintes regras: escreva as falas para os personagens em forma de diálogos ou monólogos; lembre-se de incluir, quando necessário, as rubricas; seu texto deve ter no máximo duas páginas. Ao finalizar a parte escrita, o grupo deve realizar uma leitura dramática do texto produzido. Essa é uma das muitas formas cênicas de apresentar o texto dramático. As ações devem ser realizadas sobre um espaço delimi- tado pelo grupo e o uso de alguns objetos pode ser valioso para o entendimento da cena. Para interpretar o texto, não é necessário decorar as falas. A ação deve se pautar pelas falas e pelas rubricas, conforme o exemplo. rubrica: refere-se a todas as palavras es- critas em um texto de teatro que não se- jam fala de personagem, como indicações de cenários, figurinos, marcações de cena e nomes de personagens. Shakespeare reinventou o uso de elementos tradi- cionais do teatro, como o canto, a dança, a música e as máscaras, atribuindo-lhes relevância na ação, como na cena memorável do baile em que Romeu e Julieta se conhecem. Além disso, reposicionou personagens tradi- cionais, dando-lhes uma proeminência na trama, como o fantasma que orienta a vingança de Hamlet e o clown que acompanha o Rei Lear em sua desgraça. SHAKESPEARE. Hamleto. In: ______. Teatro completo: tragédias. Tradução de Carlos Alberto Nunes. Rio de Janeiro: Ediouro, [s.d.]. p. 593. HAMLET – Deixa-me vê-lo. Pobre Yorick! (Toma o crânio) Conheci-o, Horácio; um sujeito de chistes inesgotáveis e de uma fantasia soberba [...] Onde estão agora os chistes, as cabriolas, as canções, os rasgos de alegria que faziam explodir a mesa em garga- lhadas? Não sobrou uma ao menos, para rir de tua própria careta? Tudo descarnado! Vai agora aos aposentos da senhora e dize-lhe que embora se retoque com uma camada de um dedo de espessura, algum dia ficará deste jeito [...] E este cheiro? Puá! (Joga o crânio) 26 Volume 5 As músicas de Tom Jobim já inspiraram muitas versões Interseção Troca de ideias Escolha uma obra musical que você aprecie e que tenha mais de uma versão alternativa, isto é, que tenha inter- pretações diferentes da gravação original. Mostre-as aos colegas e, juntos, elaborem uma lista com as diferenças entre a gravação original e as versões. A música renasce cheia de dissonâncias Os compositores renascentistas almejavam criar sonoridades que estimulassem os sentidos, alargando as possibi- lidades do discurso musical. Essa preocupação incluía novos tratamentos para as combinações das harmonias, isto é, das sonoridades que aconteciam simultaneamente. A perspectiva renascentista compreendia que certas combinações de sons, consideradas impróprias durante a Idade Média, poderiam ser novamente utilizadas, o que deu à música renascentista um cará- ter menos austero, tornando-a mais rica e agradável para os sentidos. Assim, as dissonâncias, em constante interação com as consonâncias, passaram a ser incorporadas como um recurso expressivo na música. dissonância: combinação de sons que causa impressão “desagradável”. A dissonância está ligada às propriedades físicas das ondas geradas por esses sons, que entram em choque umas com as outras, causando uma sensação estranha quando as ouvimos. Elas geram uma tensão, dandoa impressão de que algo não parece resolvido e necessita de resolução. consonância: é o oposto e o complemento da dissonância. Trata-se da combinação de sonoridades que “resolve” uma sensação de desacordo pro-vocada pela dissonância. Novamente, ela está ligada às propriedades físicas das ondas sonoras, que, na consonância, parecem completar-se, conferin-do um sentido harmonioso à combinação. M ar ce lo B itt en co ur t. 20 15 . A cr ílic a e na nq ui m . La tin St oc k/ ak g- im ag es /J az z A rc hi v Ha m bu rgA releitura de obras não é uma característica apenas renascentista. No- vas versões de obras conhecidas são frequentes em praticamente todas as esferas artísticas desde épocas remotas. Na Roma Antiga, eram comuns as versões romanas de esculturas gregas. Obras que foram criadas para o público de um determinado contexto sociocultural podem sofrer novas interpretações, em contextos diferentes, visando atingir outros públicos. Na música brasileira, canções como “Garota de Ipanema” (1962), de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, ou “Aquarela do Brasil” (1939), de Ary Barroso, são exemplos disso. Uma contagem inicial, feita em 1997, re- velou 188 diferentes versões de “Garota de Ipanema”. Já o número de releituras da “Aquarela do Brasil” é ainda maior: a música já tem mais de 400 diferentes versões, no Brasil e no exterior. Arte 27 Aprecie Agora você vai ouvir dois exemplos musicais, um da época do Renascimento e outro do início do século XX. O primeiro é uma composição do italiano Giovanni Pierluigi da Palestrina (1525-1594). O segundo é uma obra do compositor Alban Berg (1885-1935). Ouça as duas obras com atenção e responda: 1. Qual delas utiliza mais dissonâncias no seu discurso? 2. De que obra você mais gostou? Por quê? Que sentimentos ela transmite? Música instrumental O processo de impressão de partituras contribuiu decisivamente para afetar a forma e as bases de transmissão da música. A partir da instauração desse processo, as pessoas puderam aprender a ler uma partitura e comprar livros com obras musicais para tocar e cantar nos momentos de lazer. Essa dinâmica estimulou o surgimento de pequenos conjuntos vocais e foi responsável pela formação das primei- ras formas de conjuntos da música ocidental, os consorts – que eram pequenos grupos instrumentais formados por instrumentos da mesma “família”, com timbres parecidos, mas de tamanhos diferentes. Os consorts podiam ser com- postos somente de flautas, de violas ou mesmo de instrumentos de sopro e refletiam a divisão das vozes da formação do coral, com instrumentos mais graves e mais agudos interagindo para criar uma sonoridade homogênea e cheia. Fazer artístico Os compositores renascentistas também compunham versões com base em obras musicais de outros composi- tores. A proposta desta seção é que você, em conjunto com os colegas e seguindo as orientações do professor, faça algo semelhante. Para tanto, sigam o passo a passo a seguir. 1. Selecionem um ou mais trechos de composições de que vocês gostem. 2. Recortem esses trechos e procurem reordená-los em uma sequência. Essa sequência deve ter por fim um discurso coerente, que aborde um assunto ou tema específico. 3. Transcrevam a nova composição de maneira que todos os seus executantes possam acompanhar o desenvol- vimento da música. 4. Atribuam um título à nova composição. 5. Ao final, apresentem a composição aos demais colegas. Como desafio, eles devem indicar quais são as obras em que cada nova composição se baseou. Lembrem-se de registrar o passo a passo do processo. 28 Volume 5 Partitura musical © Sh ut te rs to ck /T im ur K ul ga rin Ja ck A rt. 2 01 3. D ig ita l. Instrumentos também têm família O desenvolvimento das famílias instrumentais iniciou-se durante o Renascimento e intensificou-se cada vez mais ao longo dos séculos seguintes. Essa evolução continuou vinculada à divisão das vozes, segundo sua extensão para o grave/agudo, e cada instru- mento musical passou a ter a sua própria família, com um representante adequado para cada tessitura. Ademais, a combinação de diversos instrumentos de famílias diferentes passou a ser explorada em virtude da riqueza de timbres que se poderia obter. Com o tempo, criaram-se conjuntos mais complexos, como a orquestra, que combina timbres de diferentes famílias. Arte 29 BRUEGHEL, Jan The Elder. O sentido da audição. 1618. 1 óleo sobre tela, 65 cm x 107 cm. Museu del Prado, Madri. Observe, a seguir, a imagem que retrata uma obra do pintor renascentista Jan Brueghel. Nela, há uma sala com vários instrumentos musicais utilizados no período em que foi produzida. Agora, observe os instrumentos musicais retratados. Pesquise um desses instrumentos, descreva sua história e principais usos na música (popular ou clássica). Em seguida, usando a técnica indicada pelo professor, faça um desenho ou pintura do instrumento pesquisado. Obra em foco 30 Volume 5 Pavanas e galhardas: dança e música Dança Nessa época, a noção de família não se encontrava somente na separação dos instrumentos. Havia um “casamento” também entre os gêneros de dança, normalmente um mais calmo e outro mais agitado. Bi bl io te ca B rit ân ic a A Pavana é fácil de dançar, consistindo basicamente de dois passos simples e um passo duplo adiante, seguidos por dois passos simples e um passo duplo para trás. Ela é tocada em templo duplo, devendo-se notar que os passos adiante começam com o pé esquerdo e que os passos para trás começam com o pé direito. PAVANE. In: BROWN. The new grove dictionary of music and musicians. London: Macmillan Publishers, 2001. (Tradução nossa). As danças renascentistas mais características eram a pavana, mais lenta, e a galharda, mais rápida, que faziam parte das chamadas danças sociais. A pavana era uma dança de Corte em compasso binário, com pas- sos simples e repetitivos, que tinha um caráter calmo e respeitável e era quase sempre dançada como um tipo de introdução dos casais ao recinto do baile ou em cerimônias de casamen- to de moças de família. Nessa dança, enquanto o cavalheiro segurava o chapéu em uma mão e portava a es- pada e uma longa capa sobre o braço, oferecia solenemente a mão direita a seu par, praticamente imóvel em seu longo e pesado vestido de cauda, pleno de ouro e joias. Assim, avança- vam o lorde e a lady em cadência com pompa e luxo. Originária de Pádua, na Itália, a pa- vana se tornou bastante popular nos séculos XVI e XVII na França, na Ingla- terra e na Espanha, sendo conhecida não apenas nos teatros e na Corte, mas também muito apreciada pelas classes médias francesas. Os textos a seguir fornecem infor- mações sobre como, e sob quais cir- cunstâncias, as pavanas e as galhardas eram dançadas no Renascimento. Iluminura de uma pavana, intitulada A dança no jardim, que faz parte do Roman de la Rose, Toulouse, início do século XVI. Encontra-se na Biblioteca Britânica Arte 31 No Renascimento, a galharda formava um par muito popular com a pa- vana. Contudo, ao contrário desta, tinha compasso ternário e tempo rápido. Era uma dança de origem popular que acabou incorporada pela nobreza. Na Inglaterra, isso ocorreu por imposição da rainha Elizabeth I, que, grande amante da dança, impôs seu gosto aos cortesãos. A galharda era uma dança alegre e saltitante, que exigia dos dançarinos bastante habilidade e força física. Era dançada a dois da seguinte forma: Ela serve aos Reis, príncipes e senhores graves, para se exibirem, em alguns dias de festividade solene, com suas grandes capas e vestes de aparato. E então, rainhas, princesas e damas acompa- nham-nos, com as grandes caudas dos vestidos abaixadas e arrastando pelo chão, às vezes seguras por demoiselles. E são, as referidas pavanas, tocadas pelos oboés e sacabuxas, que eles chamam o grande baile, e fazem-no durar até que os que dançam tenham feito duas ou três voltas completas na sala. OUVRARD, J. P. A música noséculo XVI: Europa do Norte, França, Itália, Espanha. In: MASSIN, J.; MASSIN, B. História da Música Ocidental. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. p. 274-275. Primeiro, o homem selecionava a parceira, guiava-a ao fim do salão, e, depois de tirar o chapéu em uma breve reverência, acompanhava-a em volta do salão em uma basse danse [dança de Corte, normalmente a pavana], seguida de reprise. Então ele fazia uma nova reverência e se distanciava um pouco dela durante a mudança de tempo que sinalizava a galharda, na qual ela saía dançando vivamente através do salão, em três tempos. O homem a seguia mostrando saltos e floreios. [...] A dança prosseguia com uma série de separações, reuniões e declarações de amor sublimadas em passos delicados, rápidos e saltitantes. Popular em casamentos e em bailes de corte, era normal- mente finalizada com uma suíte de danças, ocasionando a troca de beijos, favores ou buquês. [...] Na sua forma elementar, a galharda consistia em quatro passos ou saltos (pieds em l’air ou grèves), um salto (saut), uma pose (posture) [...]. Esse vocabulário básico era objeto de infinitas variações [...] Os dançarinos embelezavam os passos cruzando os pés, levantando-os à frente (ruade), do- brando ou triplicando seus passos, usando o calcanhar ou a ponta dos pés, realizando cortados (entretailles) ou combinando duas rápidas mudanças com um salto e um golpe com a ponta do pé em direção ao pé oposto (fleuret). Os saltos, por sua vez, podiam ser baixos (petit saut), altos (saut majeur) ou ornamentados com uma batida dos pés no alto à maneira de um entreato. VAN ORDEN, Kate. Music, discipline, and arms in early modern France. Chicago: University of Chicago Press, 2005. p. 94. (Tradução nossa). Para se manter em forma, a própria rainha Elizabeth I (a mesma do teatro elisabeta- no), já com 65 anos, dançava seis ou sete galhardas todas as manhãs. 32 Música Com a popularização das danças renascentistas, houve a necessidade da criação de músicas especialmente com- postas para acompanhá-las, o que deu origem a tipos específicos de composição musical, as quais levaram também os nomes pavana e galharda. Vários compositores daquele período compuseram para danças nesse formato, que eram incluídas em pequenos ciclos e tocadas em ocasiões festivas. Com o tempo, essas músicas acabaram constituindo um modelo que foi retoma- do por compositores de outros períodos históricos. Contudo, esses músicos nem sempre tinham como objetivo criar obras destinadas à dança. Seu intuito era o de retomar elementos e características do Período Renascentista. Em termos de música, as pavanas e as galhardas eram de gênero instrumental, cujo aspecto rítmico era bastante enfatizado, geralmente reiterando um padrão que era acompanhado, com passos estilizados, pelos dançarinos. O ma- terial musical, especialmente as melodias, era sempre bem semelhante entre elas. Em outras palavras, cada par pavana/ galharda era composto praticamente da mesma música. As diferenças entre um e outro tipo de composição musical ficavam a cargo do ritmo e da velocidade com que eram tocadas. A pavana era sempre tocada em compasso binário, ou seja, com marcação dos passos em dois tempos. A galharda, por sua vez, era de compasso ternário e, por isso, produzia um contraste com a pavana justamente por introduzir um compasso de três tempos em andamento rápido. Dispondo as composições em pares do tipo lento/rápido, os músicos exploravam as relações matemáticas ao apontar as possibilidades das divisões binária e ternária do ritmo. Fazer artístico Faça uma pesquisa sobre a pavana e a galharda e, com base nas informações encontradas acerca dessas dan- ças, procure reproduzir os passos ao som da música indicada. M ar ce lo B itt en co ur t. 20 15 . M ist a. Arte 33 1. (FGV – SP) “Que obra prima é o homem! Como é nobre em sua razão! Como é infinito em faculdades! Em forma e movimentos, como é expressivo e maravilhoso! Nas ações, como se parece com um anjo! Na inteligência, como se parece com um deus! A maravilha do mundo! O padrão de todos os seres criados!” (SHAKESPEARE, William. Hamlet. São Paulo: Martin Claret, 2002. p. 47.) Nesse trecho do Hamlet de William Shakespeare pode- mos identificar algumas características: a) Do Catolicismo, com a afirmação da arte como um ofício religioso. b) Do Protestantismo, com a perspectiva da infalibili- dade dos textos bíblicos. c) Do Renascimento, com a valorização do homem como o centro ou a medida do Universo. d) Do Hedonismo, com a identificação da beleza como uma manifestação do espírito divino. e) Do Teocentrismo, com a negação da influência do classicismo greco-romano. 2. (UFS – SE) Quem é considerado o principal dramaturgo inglês da Renascença? a) Henrik Ibsen b) Molière c) George Harrison d) William Shakespeare e) Harold Pinter 3. (ENEM) Acompanhando a intenção da burguesia renascentista de ampliar seu domínio sobre a natureza e sobre o espaço geográfico, através da pesquisa científica e da invenção tecnoló- gica, os cientistas também iriam se atirar nessa aventura, tentando conquistar a forma, o mo- vimento, o espaço, a luz, a cor e mesmo a ex- pressão e o sentimento. SEVCENKO, N. O Renascimento. Campinas: Unicamp, 1984. O texto apresenta um espírito de época que afetou também a produção artística, marcada pela constante relação entre: a) fé e misticismo. b) ciência e arte. c) cultura e comércio. d) política e economia. e) astronomia e religião. 4. (PUC-Rio – RJ) Sobre o conjunto de ideias que marcou o Renascimento é correto afirmar que a) a Renascença contribuiu para o reforço de valores humanistas em toda a Europa. A valorização do Ho- mem como “medida para todas as coisas” se tornou uma ideia importante para os pensadores renascen- tistas. b) as ideias dos pensadores renascentistas tornaram- -se populares, influenciando movimentos revolucio- nários. Esses ideais seriam retomados no século XIX pelos socialistas. c) os pensadores do Renascimento recuperaram ideias da Antiguidade clássica, estando de acordo com as orientações religiosas da Igreja Romana. d) a Igreja Católica, como principal compradora de obras de arte, se tornou uma defensora das ideias renascentistas. e) como movimento intelectual, o Renascimento pro- vocou uma ruptura na Igreja, dividida a partir de en- tão em Igreja Ortodoxa e Igreja Romana. Hora de estudo 34 Volume 5
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