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FMU – Faculdades Metropolitanas Unidas Giovanna Borges da Silva RA: 2413120 Turma: 003106A04 Crimes em espécie APS – Atividade Prática Supervisionada São Paulo 2020 01. No caso desta disciplina será prevista como tal atividade a leitura do livro Dos Delitos e das Penas, de Cesare Beccaria (http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/delitosB.pdf), e a entrega de um artigo no qual sejam comparados os delitos descritos pelo autor com aqueles já estudados em classe na disciplina Crimes em espécie, bem como as sugestões do autor para prevenção de crimes e sua aplicabilidade em nosso ordenamento. RESENHA: DOS DELITOS E DAS PENAS, DE CESARE BECCARIA O presente trabalho tem como objetivo analisar os delitos descritos na obra de Cesare Beccaria com os estudados na disciplina crimes em espécie, bem como as sugestões do autor para a prevenção de crimes e sua aplicabilidade em nosso ordenamento., A obra é um manifesto do autor contra o sistema criminal de sua época (século XVIII), a fim de que a sociedade através de mudanças contasse com instituições melhores e que fossem criadas novas leis. Trata-se de uma obra multifacetada que se divide em quarenta capítulos e apresenta aspectos gerais e específicos do Direito Penal, seus objetos e o Direito Processual Penal. As penas, antigamente, constituíam uma espécie de vingança coletiva. Era muito comum ocorrer a aplicação de punições com consequências muito mais severas que o delito praticado. Beccaria, em sua obra critica a severidade destas penas, remontando desde sua origem até a sua eficácia na aplicação. Através das teorias contratualistas de Jean-Jacques Rousseau e de John Locke, Beccaria inicia sua obra justificando a origem das leis e o advento do conceito de soberania estabelecido pela renúncia das liberdades individuais em prol do coletivo, visando, o bem público. De acordo com essa teoria, verifica-se a necessidade de um soberano que represente e administre as liberdades individuais de forma legítima. Para Beccaria, esse soberano é representado pelo legislador. Quanto aos aspectos gerais do Direito, trata das consequências, dos Princípios da Precedência, da interpretação e obscuridade das leis, da proporção dos crimes e das penas, do grau das penas da honra, a vantagem da penalização imediata, dos duelos, do ócio, das falsas ideias de utilidade, das Ciências, dos magistrados, das recompensas, da educação. DA INTERPRETAÇÃO DAS LEIS Beccaria defende a ideia de que os julgadores do crime não devem ter o direito de interpretar as leis, pois eles não são legisladores. Os juízes recebem as leis da sociedade ou do soberano que representa tal sociedade; isso não significa dizer que ele deva obedecer cegamente a regras arcaicas que não representem a sociedade atual, pois não é possível exigir a execução destas sem cometer injustiça; no entanto, o autor defende que o intérprete legítimo das leis é o soberano, e não o juiz. Para que tal conceito seja verdadeiro, é necessário que o juiz faça, de acordo com o autor, um silogismo perfeito, ou seja, que utilize a lei escrita da melhor forma possível para adequá-la a uma situação real. Se o juiz ultrapassa este limite e é obrigado a elaborar um raciocínio a mais, ou mesmo se o faz por vontade própria, o exercício legal torna-se obscuro. Beccaria defende que não há nada mais perigoso do que a ideia de que é preciso consultar o “espírito da lei”, ou seja, ele se mostra completamente contrário à ideia da existência do ramo chamado de hermenêutica na área jurídica. Nas palavras do próprio autor, “cada homem tem a sua maneira de ver; e o mesmo homem, em épocas distintas, vê diversamente os mesmos objetos. O espírito da lei seria, pois, o resultado da boa ou da má lógica de um juiz, de uma digestão fácil ou penosa, da debilidade do acusado, da violência das paixões do magistrado, de suas relações com o ofendido, enfim, da reunião de todas as pequenas causas que modificam as aparências e transmutam a natureza dos objetos no espírito mutável do homem”. A tendência brasileira é, ao contrário do defendido por Beccaria, aumentar a possibilidade de interpretação dos juízes. O país, por ter uma Constituição extremamente detalhista, criou um sistema que ampararia quaisquer dificuldades da parte julgadora; no entanto, o Direito brasileiro é repleto de regras que impedem sua modificação de maneira rápida, o que significa dizer que, enquanto as realidades sociais, políticas e econômicas se alteram de maneira constante, o Direito é obrigado a passar por diversos trâmites para alterar um único artigo. Com isso, há casos nos quais a lei não se encaixa perfeitamente, ou mesmo que a lei não prevê. Para esses, de acordo com a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, em seu artigo 4º: LINDB, Art. 4: Quando a lei for omissa, o juiz deverá decidir o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios de direito. Tal dispositivo abre a possibilidade de um juiz determinar, com base em processos interpretativos, qual seria a analogia correta; ou seja, um caso pode ser julgado de diversas maneiras, dependendo do entendimento de quem julga. Cada vez mais o judiciário brasileiro se encontra na necessidade de julgar além da palavra escrita da lei, pois isto se torna necessário para a realização da justiça. DOS DELITOS Em relação ao Direito Penal, destacam-se os delitos tratados no decorrer do livro, após a divisão dos crimes, dos roubos, dos crimes difíceis de provar, do suicídio, do contrabando e de um tipo especial de crime. Cesare, ao tratar dos roubos, faz distinção do emprego ou não de violência. Nesse sentido, percebe-se que a Legislação do Brasil quando trata dos crimes contra o patrimônio aborda o roubo no artigo 157 e o furto no artigo 155. O autor sugere que a pena seja de natureza pecuniária. Ocorre que, quando praticado pela miséria e desespero indica a escravidão temporária. No caso do roubo deve ser acrescida punição física. Com relação aos crimes difíceis de provar, o autor destaca o adultério, a sodomia e do homicídio de criança “bastarda”. Afirma ainda que é natural a atração pelo sexo oposto, e diferente de outros crimes que surgem da paixão momentânea, ou seja, meros atos de impulso. Afirma que as punições para esse caso funcionam como um incentivo. Atualmente essa conduta que no Brasil já foi objeto do Direito Penal e Direito Civil, é restrita ao campo moral. A impunidade não parece ter reduzido ou aumentado a sua frequência, pois grande parte dos valores da sociedade brasileira tem passado por uma massiva relativização. Quanto à sodomia, enquanto desvio, hoje é legalmente aceita, ainda que não moralmente. As leis não procuram prevenir estes delitos com os melhores meios possíveis. Quanto ao homicídio de crianças oriundas de relacionamentos extraconjugais, soa como absurdo que esse tipo de delito fosse frequente. Entretanto, dado o contexto histórico, percebe-se que era a prática de em erro para encobrir outro, de forma totalmente reprovável. Ao abordar o suicídio, Cesare Beccaria destaca que se trata de uma situação em que se houver punição recairá sobre a família. O único capaz de julgar seria Deus. Na Legislação Penal Brasileira, há previsão de punição apenas para o induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, conforme Artigo 122 do referido diploma legal DAS PENAS O autor ressalta sobre as penas, quando cita a origem, seus objetivos, a pecuniária, dos atos de violência, das penas aos nobres, da infâmia como punição, do banimento e confisco, da brandura das penas, da pena capital, da prisão, dos atentados, cúmplices e perdão. Para se prevenir o crime, Beccaria cita como indispensável à aplicação do Princípio que hoje é conhecido como Taxatividade, assim há maior segurança jurídica, diante da clareza na aplicação da lei. Quantoàs penas, elas se mostram como necessárias e possuem finalidade preventiva e repressiva. Contudo, elas não devem ser instrumentos geradores de violência. Por exemplo, a pena capital, hodiernamente conhecida como pena de morte, é um ato de violência. Conforme o autor, seu caráter preventivo não é efetivo quando comparada com a prisão perpétua, pois a primeira, apesar de drástica, é rápida, mas a segunda, enquanto duradoura, transmite a sensação de punibilidade para as pessoas. Além disso, o sentimento de compaixão quando alguém é executa o permite que transborde sensação de desamparo em relação ao próprio Estado. Corrobora com os dizeres as proibições do Artigo 5º, XVII, alínea a, quanto às penas de morte e alínea e, quanto às penas cruéis. É defendido o Princípio da Igualdade, ao passo que os nobres devem ser punidos da mesma forma que os súditos. Novamente, trata-se da sensação de impunidade em torno das pessoas. É possível se traçar um paralelo com a crise política atual, em que determinados representantes democraticamente eleitos pelo povo possuem foro privilegiado, o que pode ter descrença no Poder Judiciário do Brasil, embora previsto constitucionalmente, no Artigo 10, I, b e c. Quanto à infâmia, a punição, era utilizada incisivamente nos delitos relacionados à honra, no qual historicamente é possível rememorar à Lei de Talião, pois era desonrado aquele que a outrem desonrou. O autor observa ainda que essa punição era oriunda do povo e não das leis. A honra também é garantida no Artigo 5º, X da Constituição. É ponderado que os prejuízos que o banimento pode trazer podem ser mais danosos que o exílio, pois o indivíduo perde totalmente o vínculo com a sociedade na qual estava inserido. Atualmente, a Constituição proíbe penas de banimento, conforme artigo 5º, XLVII, d. Quanto à prisão, somente a lei pode fixar as circunstâncias em que um indivíduo pode ser preso. Atualmente, no Direito Penal Brasileiro, constitui a principal pena aplicada. É prevista constitucionalmente no Artigo 5º, XLVI, a, “privação ou restrição da liberdade”. O perdão da pena é abominado por Cessare Beccaria, pois ele afirma que embora a vítima tenha o direito de perdoar o criminoso, ela não pode impedir que seja punido. Deve o juiz cumprir o que preconiza a lei, pois a pena é uma resposta à sociedade e não apenas a vítima. Ao se fazer uma análise de um dos múltiplos conceitos do Direito Penal como o ramo do Direito Público que regula o poder de punir do Estado, observa que o livro induz ao conhecido “ius puniendi”, ou seja, o poder-dever de punir. CONSIDERAÇÕES FINAIS A obra de Beccaria foi de extrema importância para o Direito Penal, não apenas à época em que foi publicada, mas até a atualidade; os preceitos contidos nela foram adotados por diversos países, e as análises do autor contribuíram para a construção da ideia de igualdade legal entre os homens. Além disso, a inspiração em Hobbes e Montesquieu, ou seja, sua influência iluminista e contratualista, e os ensinamentos do autor sobre o controle do despotismo e as limitações do poder do soberano se constituíram base para a visão moderna de Estado. Em um dos capítulos do livro, Beccaria defende a ideia de que é preferível prevenir o crime a puni-lo, e que todo sábio legislador deveria esforçar-se em impedir o mal, em vez de repará-lo. E como forma primordial de prevenção de crimes, o autor defende a educação. A ideia de Beccaria é extremamente atual, e a legislação brasileira prevê aplicação de medidas socioeducacionais (por meio do previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente) a menores de idade que entrem em conflito com a lei. A educação se mostra, cada vez mais, importante base sem a qual não é possível atingir a meta de uma sociedade saudável, consciente e com taxas criminais diminuídas. Não é somente a ideia de prevenção criminal que se encontra de acordo com a legislação vigente no Brasil; diversos dos pontos tratados pelo autor podem ser verificados na atualidade. Alguns deles foram executados da maneira que Beccaria previa correta, o que demonstra um grande nível de evolução da época de publicação da obra até os dias de hoje. No entanto, muitos outros pontos defendidos pelo autor não se concretizaram, e alguns aspectos das críticas de Beccaria se mantêm, até hoje, estagnados, prova de que ainda há muitas coisas do Direito Penal que precisam ser modificados.
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