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CAPÍTULO 1 A SILVICULTURA CLONAL Nas últimas décadas, tem-se assistido a um constante aumento no interesse pela silvicultura clonal, decorrente tanto das vantagens do processo quanto da possibilidade de contornar problemas de determinadas doenças, heterogeneidade e profundidade dos plantios florestais. A área dos plantios clonais vem ampliando cada vez mais em todo território brasileiro, graças a disponibilidade de clones selecionados para as mais diversas regiões e propósitos comercias, aliando a um custo competitivo. Além disso, esse aumento tem possibilitado a implantação de projetos de reflorestamento em áreas até então não indicadas, dada a falta de material genético via seminal adaptado a atender a tal propósito. Diante de crescente interesse pelo uso de clones nos projetos florestais, tanto pelas grandes empresas quanto pelos pequenos investidores, inclusive produtores rurais, tem-se percebido consideráveis avanços tecnológicos nos processos de seleção, de clonagem de árvores e nas práticas silviculturais adotadas na implantação e condução dos plantios florestais. Em razão da importância dos plantios clonais, a denominação “silvicultura clonal” tem sido empregada para designar o conjunto de técnicas silviculturais adotadas em um programa de implantação e manejo de uma floresta clonal. Dessa forma, em termos gerais, a “silvicultura clonal” pode ser caracterizada como a que compreende o processo de formação de uma floresta clonal, desde a seleção da árvore superior, multiplicação vegetativa, avaliação de árvores selecionadas em teste clonal, produção de mudas, o estabelecimento e a condução da floresta clonal até a colheita florestal. Historicamente, a silvicultura clonal foi estabelecida a muitos anos para Cryptomeria japonica no Japão sendo também conhecida e aceita para as espécies populus spp. e Salix spp. Nas zonas temperadas e várias outras espécies florestais em diferentes partes do mundo. (OHBA, 1993; ZSUFFA ET AL., 1993). Nas regiões tropicais e subtropicais, atualmente, o Eucalyptus constitui- se em um dos gêneros mais explorados e tem merecido atenção especial na silvicultura clonal. A importância das espécies de Eucalyptus em um programa de silvicultura clonal advém, principalmente, dos interesses econômicos, das experiências adquiridas na silvicultura em varias condições ambientais, do domínio da tecnologia para as mais diversas aplicações, do uso dos produtos advindos das árvores, da existência da grande variabilidade genética das populações para os mais variados propósitos comercias, para razoável facilidade de propagação vegetativa, aliada as características de rápido crescimento (XAVIER, 2002; ASSIS; MAFIA, 2007). No Brasil, relatos apontam que as plantações colônias com Eucalyptus aumentam consideravelmente a partir da década de 1970; A heterogeneidade dos plantios e a incidência de cancro foram decisivas para o desenvolvimento da técnica de estaquia em escala operacional, considerado hoje referencia mundial no controle de doenças dessa espécie (ALFENAS et al., 2004). Em termos gerais, as características da silvicultura clonal são justificadas por: uniformidade dos plantios, possibilitando maior controle sobre a qualidade dos produtos; aproveitamento de combinações genéticas raras, como híbridos de Eucalyptus grandis x E. urophylla ; maximização do ganho em profundidades silvicultural e quantidade tecnológica da madeira em uma única geração de seleção; possibilidade de contornar problemas de doenças, como “cancro” (Cryphonectia cubensis); possibilidades de duas , três e quatro cotações economicamente viáveis; custo acessível e competitivo para as empresas; experiências adquiridas e avanços técnicos/científicos ao longo dos anos na silvicultura; e opções de técnicas de propagação vegetativa em desenvolvimento em diversas áreas da ciência. A silvicultura clonal com Eucalyptus é uma das mais evoluídas e se encontra bem estabelecida; os resultados verificados em campo tem levado à sua implementação de forma intensiva e em diferentes regiões do mundo (Figura 1.1 A). Outro exemplo de silvicultura clonal no Brasil refere-se à heveicultura, em que a clonagem foi alternativa para contornar o problema de doenças, produtividade de látex e adaptação local (Figura 1.1 B). No estabelecimento de um programa de heveicultura é possível encontrar vários clones apropriados para diferentes regiões brasileiras, tendo-se como forma principal de produção de mudas o processo de propagação vegetativa por enxertia. No caso das espécies do gênero Pinus, dado a sua grande importância econômica a silvicultura clonal almejada há vários anos, porém, em razão da grande dificuldade de clonagem por vias tradicionais, a clonagem em nível de famílias selecionadas tem sido adotada. O desenvolvimento de técnicas biotecnológicas mais avançadas, como a embriogênese somática, tem proporcionado um grande avanço nesse sentido, embora as dificuldades ainda persistam quando se objetiva a multiplicação de materiais não-juvenis. Em outras espécies florestais, a silvicultura clonal está em nível de desenvolvimento no Brasil, com diferentes graus de avanço. As espécies liquidambar (Liquidambar styraciflua), grevílea (Grevillea robusta), erva-mata (Ilex paraguariensis), compresso (Compressus lusitanica), teca (Tectona grandis), criptoméria (Cryptomeia japonica), acácia-negra (Acacia mearnsii), pupunha (Bactris gasipaes), paricá (Schizolobium amazonicum), entre outras, porém se enquadradas nesse grupo. Os avanços na biotecnologia tem encontrado na silvicultura clonal um veículo para sua expansão e implementação de novas tecnologias voltadas à área florestal. Entre estas tecnologias, a cultura de tecidos por meio da micropropagação e embriogênese somática tem sido alvo de vários alvos de pesquisa, assim como a possibilidade de implementação da transformação genética para obtenção de plantas com desempenho silvicultural e tecnológico de interesse comercial. Princípios Biológicos da Silvicultura Clonal Para maior compreensão da silvicultura clonal, o entendimento dos princípios específicos da biologia e dos conceitos de multiplicação das plantas torna-se pré-requisito. Para as plantas superiores de forma geral, a propagação pode ser conseguida pelas vias sexuada e assexuada; a primeira caracteriza- se por ter a semente como elemento de propagação, enquanto a segunda tem nos propágulos vegetativos o meio de multiplicação da planta. Estas formas de propagação de plantas podem ter seus elementos de propagação conceituados como: Semente: elemento de reprodução das plantas que resulta da fecundação e desenvolvimento de óvulo maduro, compreendendo o embrião, as substâncias de reserva e um ou mais tegumentos. Normalmente, é o resultado da recombinação genética entre plantas. A também o termo Semente Sintética, usando para embriões produzidos via embriogênese somática, os quais são posteriormente encapsulados. Propágulo Vegetativo: em geral, é qualquer estrutura que serve para propagação ou manipulação vegetativa de uma planta. É o elemento de propagação da planta que não envolve recombinação genética, permitindo a reprodução fiel do genótipo da planta, dada a totipotência da célula vegetal. A propagação vegetativa somente é possível devido a capacidade que células, parte de órgãos ou órgãos tem para regenerar órgãos ou plantas, em razão da sua totipotência. Essa é a capacidade de qualquer célula do organismo vegetal de regenerar uma planta completa. Uma célula reprogramada se torna totipotente, ou seja, adquire a habilidade de reproduzir uma planta inteira,da mesma forma que uma oosfera fertilizada. Assim, enquanto na micropropagação a remeristematização leva à formação de gemas e raízes, no caso da embriogênese somática, leva à formação de embriões. Porém, o embrião é uma estrutura bipolar, ao passo que os meristemas são unipolares. Para melhor entendimento das implicações das formas de propagação da silvicultura e pressupondo que um organismo pode ser descrito por seu fenótipo (F), que resulta dos efeitos genotípicos (G), dos efeitos ambientais (E) e da interação “genótipo x ambiente” (GE), elas podem ser representadas conforme a expressão mostrada na figura 1.2. Assim, na propagação vegetativa ou assexuada de plantas, a constituição genérica é mantida inalterada das plantas resultantes, formando clone. Entretanto, se a propagação realizar-se por via sexuada, a semente constitui a fonte de propágulo, acarretando variação genotípica entre as plantas descendentes (família). Como conseqüência, da forma de propagação, pode-se observar para que as variações fenotípicas entre plantas propagadas assexuadamente, oriundas de um mesmo antecessor, são decorrentes apenas das variações ambientais (e’). Entretanto, quando a propagação se realiza por meio de sementes, as variações observadas entre as plantas são proporcionadas pelas variações genéticas (g’) e, também, do ambiente (e’), bem como pela interação entre ambas (g’e’). Uma das principais implicações da forma de propagação das plantas está no fato de os plantios via propagação assexuada constituírem-se em populações com maior uniformidade em ambiente homogêneo (Figura 1.3 A) em relação àquelas oriundas de sementes (Figura 1.3 B), o que se torna vantajoso em muitas situações no campo da silvicultura intensiva, como é o caso do eucalipto e da seringueira. No entanto, a uniformidade genética das populações clonais pode torná-las mais vulneráveis às variações adversas no ambiente. Clonagem de Árvores e a Silvicultura Clonal A silvicultura clonal, como um sistema silvicultural, surgiu no início do século XX e baseava-se na enxertia como processo de propagação. Entretanto, os procedimentos adotados seguiam práticas horticulturais, que na maioria das vezes eram consideradas inapropriadas para a silvicultura, em razão dos custos de propagação e do desconhecimento da especificidade dos clones (LIBBY; AHUJA, 1993). Com os avanços na propagação vegetativa e sua efetiva aplicação na silvicultura, os conceitos de “silvicultura clonal” tornaram-se mais abrangentes que os da “clonagem de árvores”, praticada nos dias atuais. A silvicultura clonal significa muito mais do que simplesmente clonar uma árvore. No entanto, a clonagem constitui-se em um pré-requisito para esta silvicultura. Caracterização da Clonagem de Árvores De modo geral, o termo “clone” significa um grupo de plantas geneticamente idênticas, derivadas assexuadamente de um antecessor comum. Entretanto, esse termo pode ser caracterizado de três formas: 1) historicamente, o “clone” constitui-se de um grupo de plantas obtidas a partir de propágulos vegetativos de uma planta, como, por exemplo, o processo de clonagem pela propagação vegetativa via estaquia de Eucalyptus, utilizado na formação de florestas clonais; 2) culturas de células que, por intermédio da tecnologia desenvolvida na biologia, tem permitido o desenvolvimento da chamada linha celular, em que, a partir de diferentes células de um mesmo organismo, obtêm-se diferentes clones; e 3) o desenvolvimento da tecnologia de manipulação de DNA tem permitido o seqüenciamento e a clonagem de um simples gene. Nesse último caso, com a implementação da engenharia genética, a partir da década de 1970, a manipulação do DNA tornou-se possível, permitindo a introdução de genes de uma espécie no genoma de outra, de forma controlada, gerando os chamados “organismos transgênicos”. Na silvicultura clonal, o termo clone refere-se a um grupo de plantas obtidas a partir de propágulos vegetativos de uma planta. Nesse caso, todo o processo envolvido no programa de silvicultura clonal inicia-se com a seleção de árvores superiores, que darão origem aos clones por meio do processo de clonagem. A clonagem de árvores é praticada há várias décadas com os mais variados propósitos, podendo ser citados como exemplos: 1. Multiplicação de genótipos selecionados para uso em programas de melhoramento genético, visando formar pomares de sementes, bancos clonais para hibridação etc. 2. Multiplicação de clones selecionados, visando compor bancos clonais. 3. Pesquisa em geral, devido à uniformidade e repetibilidade das plantas oriundas de um mesmo clone. 4. Conservação de germoplasma. 5. Multiplicação vegetativa de mudas oriundas de sementes quanto a quantidade desejada para propagação é insuficiente para o programa proposto. Nesse caso, enquadram-se as sementes provenientes de coleções de procedências, famílias selecionadas e cruzamentos controlados. 6. Método alternativo de propagação de plantas, principalmente nas situações em que a propagação sexuada (semente) é difícil e de alto custo. 7. Multiplicação vegetativa de genótipos selecionados (clones) para atender aos propósitos da silvicultura clonal. Outras aplicações da propagação vegetativa podem se tornar evidentes, dependendo da espécie e do uso desta na silvicultura. Portanto, a silvicultura clonal assume dimensões adicionais, que se destacam em relação à simples clonagem de árvores. Caracterização da Silvicultura Clonal Tem sido desenvolvida uma caracterização mais precisa da silvicultura clonal, que, isoladamente ou em combinação com outras técnicas silviculturais, distingue-se do mero uso da clonagem de árvores. Assim, com base em Libby e Ahuja (1993), o que realmente qualifica a silvicultura clonal são algumas características básicas: 1. O fato de a clonagem de árvores constituir um pré-requisito para a silvicultura clonal, por ser a técnica básica na produção de mudas nessa atividade. 2. Necessidade de conhecimento sobre o desempenho do clone. A utilização de testes clonais é um instrumento importante na avaliação dos clones, em razão da utilização almejada; o desempenho do clone pode ser acompanhado ao longo do ciclo de produção, bem como o comportamento em diferentes sítios. Informações sobre a especificidade de uso aliadas ao desenvolvimento silvicultural indicarão o uso mais apropriado. 3. Conhecimento das técnicas mais adequadas de propagação e manejo em viveiro de determinado clone, dada a necessidade de atender à produção de mudas clonais. 4. Necessidade de adequação de práticas silviculturais em que a definição de espaçamento de plantio, nutrição, tratos culturais e ciclos de rotação econômica deve atender às exigências de comportamento e uso final de um determinado clone. 5. A diversidade genética entre os clones deve ser conhecida, visto que os plantios clonais apresentam, em geral, menor base genética em relação aos plantios via semente. 6. Possibilidade de captura de ganho genético adicional em relação ao processo sexuado. Isso se deve ao fato de que, na seleção do clone, captura- se, além da variação genética aditiva, a variação não-aditiva. Nessas condições, combinações genéticas raras e favoráveis para determinadas situações podem ser clonadas, antecipando resultados que demandariam longo tempo no processo sexuado para recomendações comerciais. 7. Possibilidade de utilização de genótipos de alta produtividade, adaptação e uniformidade a custos competitivos, o que torna a silvicultura clonal um atrativo do pontode vista comercial. 8. Oportunidade de usar tecnologias inovadoras, como a transformação genética, na obtenção de plantas de interesse comercial, as quais podem ser multiplicadas para um projeto de floresta clonal. A silvicultura clonal deve ser qualificada como aquela em que o clone deve ser bem conhecido quanto aos aspectos silviculturais e de uso final, visando atender requisitos técnicos e econômicos. Dessa forma, é uma silvicultura que compreende todo o processo de formação da floresta clonal, desde a seleção da árvore superior, passando pela multiplicação vegetativa, avaliação em teste clonal, produção de mudas, até o estabelecimento da floresta no campo. A clonagem de árvores é, portanto, apenas parte integrante da silvicultura clonal. Silvicultura Clonal, Genética e Biotecnologia A silvicultura clonal é um ramo da silvicultura que tem permitido grandes avanços na utilização de algumas espécies florestais. Dada a importância da silvicultura clonal, modelos de desenvolvimento vêm sendo ajustados e propostos, sendo o melhoramento genético parte integrante do programa clonal. As estratégias clonais devem estar diretamente ligadas ao melhoramento genético, uma vez que seleções sem recombinações futuras conduzem a um programa estático, sem processo posterior. O sucesso da silvicultura clonal é dependente da obtenção de clones com características desejáveis ao processo produtivo. Assim, combinações genéticas com características que atendam à demanda devem ser selecionadas na população ou obtidas mediante melhoramento genético. Em um moderno programa de silvicultura clonal, ações de melhoramento genético são complementares e essenciais, pois um apropriado programa de melhoramento genético florestal constitui suporte ao fornecimento de novos clones que atendam à necessidade dessa silvicultura. Novos desenvolvimentos em biotecnologia e suas aplicações em espécies florestais têm contribuído para ampliar o potencial da silvicultura clonal. Essas tecnologias têm proporcionado oportunidades de multiplicação rápida e eficiente de genótipos selecionados, constituindo-se em uma importante ferramenta para o melhoramento genético florestal, entre outras aplicações. Contudo, muitas dessas tecnologias ainda carecem de desenvolvimentos básicos para uma real aplicação na área florestal. Na silvicultura clonal, o melhoramento genético e a biotecnologia são interdependentes e complementares e alavancam o desenvolvimento da silvicultura. Capítulo 2 BIOLOGIA DA PROPAGAÇÃO CLONAL No processo evolutivo das técnicas de propagação de plantas, o desenvolvimento da ciência, aliado ao processo produtivo, mostrou-se sempre necessário para alcançar os objetivos almejados na multiplicação e preservação de material genético selecionado. O conhecimento de algumas áreas da propagação de plantas é considerado imprescindível ao bom desempenho no processo de multiplicação destas. Hartmann et al. (2002), por exemplo, citam a arte da propagação, a ciência da propagação e o conhecimento das plantas. A arte da propagação: o sucesso da propagação de plantas requer domínio da técnica para manipulação adequada do seu crescimento. Características como habilidade, prática, dedicação e experiência pessoal na condução do processo de propagação das plantas são indispensáveis. A existência de informações científicas de determinadas técnicas e uma ampla aplicação destas, para as mais variadas espécies e usos, facilitam a adoção de uma em detrimento da outra de forma mais racional e viável na propagação daquela planta. A ciência da propagação: a propagação de plantas requer perspicácia e conhecimento quanto à morfogênese, desenvolvimento e crescimento, bem como conhecimento básico de física, química, nutrição e aspectos de ecologia do ambiente de propagação. Esses conhecimentos podem ser obtidos empiricamente durante o processo de propagação das plantas e incrementadas pelo conhecimento adquirido no ensino formal de química, física, botânica, genética e fisiologia de plantas, assim como pelas informações científicas advindas dos avanços obtidos na pesquisa científica. O conhecimento das plantas: no processo evolutivo das técnicas de propagação, as várias técnicas foram avaliadas, aperfeiçoadas e, ou, ajustadas às diferentes exigências fisiológicas e ambientais de cada espécie, em função dos objetivos desejados, das experiências adquiridas, dos avanços tecnológicos e da estrutura disponível. Assim, o sucesso da propagação está no conhecimento das plantas e das técnicas adequadas a ela em uma dada condição e necessidade. As três áreas de conhecimento da propagação de plantas mencionadas são complementares e necessárias, em que a teoria compartilhada com a prática, aliada ao conhecimento da planta que está sendo multiplicada, permitem alcançar os objetivos com maior eficiência e qualidade. A maioria das espécies lenhosas normalmente é de natureza heterozigótica, imposta pela alogamia quase que obrigatória no processo de reprodução de plantas; na maioria das espécies, a forma principal e natural de propagação é por via seminal. Diante disso, a alternativa utilizada no setor florestal para obtenção de materiais superiores, visando atingir determinados propósitos, foi o uso da propagação vegetativa no processo de produção de mudas clonais. As expressões “propagação vegetativa”, “propagação assexuada” e “propagação clonal” de plantas têm sido utilizadas rotineiramente para designar a multiplicação e produção de novas plantas usando propágulos vegetativos de uma planta ou clone específico. No entanto, em algumas situações, determinada expressão pode ser preferida em função dos objetivos que esta busca enfocar; assim, a expressão “propagação assexuada” tem sido utilizada, principalmente, quando se pretende referenciar o modo de reprodução de uma planta; a expressão “propagação vegetativa” tem sido utilizada mais para referenciar a forma de propagação de uma planta em um processo de produção de mudas; e, quando se tratar de produção de mudas de um determinado clone; a expressão “propagação clonal” tem sido empregada. Logicamente que essas expressões têm sido utilizadas de forma indiscriminada e que em muitas situações elas são formas alternativas de expressar o modo de propagação de uma determinada planta. Outras expressões, como “propagação agâmica” e “propagação somática”, também são encontradas na literatura para referenciar esse tipo de propagação de plantas. No entanto, de modo geral, a expressão “propagação vegetativa” tem sido aquela com maior difusão nas diversas áreas que atuam com a propagação de plantas. Princípios Biológicos da Propagação de Plantas Na propagação vegetativa, a mitose é o processo responsável pelo controle, desenvolvimento e crescimento das plantas, na qual é mantida a identidade genética da planta matriz. Dessa forma, um propágulo constitui-se de parte de uma determinada planta usada para produzir uma ou mais novas plantas. Entre os vários tipos de propágulos incluem-se as sementes (propagação sexuada), estacas, estruturas florais, segmentos vegetativos e vários tipos de estruturas especializadas, como gemas, calos, bulbos, estolões. O uso de um propágulo em detrimento de outro está em função dos objetivos desejados, da espécie, da disponibilidade de material vegetativo e da estrutura de propagação disponível. A ciência da propagação de plantas baseia-se em alguns dos princípios básicos da biologia. Em um processo de organogênese in vitro, por exemplo, segundo Peres(2002), várias são as etapas envolvidas na regeneração de uma planta (Figura 2.1). “Organogênese” significa o processo de neoformação de partes aéreas, raízes ou de outros tipos de explantes, na condição in vitro ou in vivo, contrastando com a “embriogênese”, na qual se forma uma estrutura semelhante ao embrião, com eixo polar (radícula – parte aérea) completo. A condição in vitro indica, literalmente, no vidro, termo aplicado para designar crescimento de células, tecidos ou órgãos vegetais em meio de cultura, sob condições assépticas. “Desdiferenciação” constitui-se no processo pelo qual uma célula diferenciada perde suas características específicas, reassumindo atividades meristemáticas, ou seja, trata-se de um processo de alcançar um estado meristemático não diferenciado em células previamente diferenciadas. O termo “competência” é usado para descrever o potencial de uma determinada célula ou tecido em se desenvolver em uma forma particular, como, por exemplo, a competência para iniciar enraizamento adventício, um embrião ou uma flor. O desenvolvimento da competência por um tecido requer certa quantidade de tempo e, ou, exposição a um sinal endógeno ou exógeno. A “indução” indica o que causa a iniciação ou desenvolvimento de uma estrutura ou processo. O termo “determinação” refere-se ao grau de comprometimento que um grupo de células tem perante um direcionamento naquele momento. A “diferenciação” significa as mudanças fisiológicas, morfológicas e anatômicas que ocorrem em uma célula, tecido, órgão ou planta, durante o desenvolvimento do estado meristemático ou juvenil para o adulto. Todo o processo de regeneração de uma planta pela propagação vegetativa somente é possível dada a totipotencialidade das células vegetais em manifestar, em momentos diferentes e sob estímulos apropriados, a potencialidade em iniciar um novo indivíduo multicelular. Em vista da “totipotência” que toda célula viva possui, esta tem potencial para produzir um organismo inteiro, desde que possua informação genética para tal expressão gênica. O termo “expressão gênica” refere-se aos padrões de desenvolvimento e crescimento das plantas, decorrente da informação genética contida no genoma daquela planta, associada às condições ambientais. Dessa forma, as variações fenotípicas observadas em plantas são manifestações resultantes das informações genéticas para formação de suas estruturas, padrões de crescimento e funções, exercendo controle primário no processo de propagação. Embora a organogênese seja um processo considerado empírico, segundo Peres (2002), o desenvolvimento de um protocolo é facilitado se forem seguidos alguns princípios e conhecimentos fisiológicos. De acordo com esse autor, normalmente o sucesso da propagação por organogênese in vitro é dependente principalmente da etapa de aquisição de competência, pois, quando um explante falha em desenvolver organogênese in vitro, esta se dá normalmente na etapa de aquisição de competência. Contudo, pouco se conhece, até o momento, sobre os mecanismos envolvidos nesse processo. De acordo com o exposto, o conhecimento dos princípios básicos da biologia ajuda a compreender melhor a propagação de uma planta, facilitando a sua multiplicação clonal, assim como acompanhar a história do desenvolvimento do organismo durante o seu ciclo vital, ou seja, a “ontogenia” da planta. Ação Hormonal nas Plantas Hormônios vegetais são um grupo de substâncias orgânicas de ocorrência natural que, em pequenas concentrações, influenciam os processos fisiológicos de crescimento, diferenciação e desenvolvimento (DAVIES, 1995). São substâncias conhecidas há muito tempo, porém sua ação nas plantas foi melhor entendida nos últimos anos. Entre os hormônios de plantas mais conhecidos e de interesse na propagação de plantas, destacam-se as auxinas, giberelinas, citocininas, etileno e ácido abscísico. Em certas condições, essas substâncias possuem efeito quando aplicadas nas plantas exogenamente, sendo denominadas de reguladores de crescimento vegetal e, ou, fitorreguladores. Auxinas: São compostos com atividade biológica similar àquela do ácido indol-3-acético (AIA), incluindo a capacidade de promover o alongamento de coleóptilos de segmentos de caules, divisão celular em culturas de calos em presença de citocininas, formação de raízes adventícias em folhas ou caules destacados e outros fenômenos do desenvolvimento relacionados com a ação do AIA (TAIZ; ZEIGER, 2004). Segundo Válio (1985), as auxinas são sintetizadas nas plantas, principalmente em regiões de crescimento ativo, como meristema apical, gemas auxiliares e folhas jovens, sendo translocadas para diferentes órgãos, de acordo com o mecanismo de transporte polar e basípeto. O AIA é a principal auxina nos vegetais superiores (TAIZ; ZEIGER, 2004); segundo esses autores, embora quase todos os tecidos vegetais sejam capazes de produzir baixos níveis de AIA, os meristemas apicais, as folhas jovens, os frutos e as sementes em desenvolvimento são os principais locais de síntese desse hormônio. A aplicação da auxina em órgãos isolados promove aumento da resposta, paralelamente ao aumento da concentração até certo nível, após o qual ocorre efeito inibitório. Entretanto, a resposta da planta à auxina endógena ou exógena varia tanto com a natureza do tecido quanto com a concentração da substância presente. As principais aplicações das auxinas na propagação de plantas são a indução de raízes adventícias em estacas e o controle da morfogênese na micropropagação. Segundo Taiz e Zeiger (2004), as auxinas também promovem o crescimento de caules e coleóptilos, inibem o crescimento das raízes, regulam a dominância apical, retardam o início da abscisão foliar e regulam o desenvolvimento das gemas florais e frutos. Fisiologistas têm buscado definir o modo de ação química das auxinas nas plantas. Acredita-se que a promoção de crescimento pelas auxinas ocorre por meio de dois mecanismos: a) pela promoção de transporte de íons H+ pelas paredes celulares, aumentando sua extensão; e b) pela indução da transcrição de RNAm específico necessário para promover o crescimento. Em morfogênese, a aplicação de auxina parece capaz de apagar programas de diferenciação celular, revertendo células em estado de diferenciação e reabilitando a divisão celular. Dentro do grupo auxinas, Taiz e Zeiger (2004) salientam que o AIA ocorre em todos os vegetais, mas outros compostos relacionados apresentam atividade auxínica; mostarda e milho contêm ácido indol-3-butírico (AIB). Além do AIA, várias outras substâncias com funções regulatórias de crescimento semelhantes e com aplicação na propagação das plantas são produzidas sinteticamente: ácido indol-3-butírico (AIB), ácido naftalenoacético (ANA), 2,4- diclorofenoxiacético (2,4-D), entre outros. Citocininas: Constituem um grupo de hormônios de grande importância no crescimento das plantas, tendo em vista os efeitos na divisão celular e diferenciação de gemas. Os meristemas dos ápices radiculares são as regiões da planta de maior síntese de citocininas livres, as quais parecem se mover pelo xilema até a parte aérea, juntamente com a água e os sais minerais absorvidos pelas raízes (TAIZ; ZEIGER, 2004). O equilíbrio entre auxina e citocinina é uma das relações primárias na propagação de plantas, em que uma alta relação auxina/citocinina favorece o enraizamento; uma baixa relaçãofavorece a formação de brotações; e um alto nível de ambas favorece o desenvolvimento de calo. Vale salientar também que a interação entre citocinina, ácido abcísico e giberelinas controlaa dormência de sementes. Além dos efeitos na divisão celular, as citocininas também são importantes na morfogênese in vitro pela indução do caule, no crescimento de caules e raízes, na expansão foliar, no movimento dos nutrientes, no retardamento da senescência foliar, entre outros (DAVIES, 1995; TAIZ: ZEIGER, 2004). As citocininas de maior interesse na propagação de plantas e de ocorrência natural são a zeatina (ZEA) e a isopenteniladenina (2iP). Quanto às citocininas produzidas sinteticamente, além das citadas anteriormente, existem a 6-benzilaminopurina (BAP), a cinetina (KIN) e o thidiazuron (TDZ). Giberelinas, Ácido Abscísico e Etileno: As giberelinas ocorrem em altas concentrações nas sementes imaturas e nos frutos em desenvolvimento e possuem importante função na germinação e no controle da dormência. Ocorrem também em altas concentrações em ápices caulinares, sendo transportadas no interior da planta pelo xilema e floema (DAVIES, 1995). Entre as funções nas plantas estão aquelas relacionadas com a promoção do alongamento de brotações por meio da divisão celular e alongamento, além da regulação da transição da fase juvenil para a adulta em muitas plantas lenhosas. Mais de 125 formas de giberelinas foram encontradas nas plantas, embora somente algumas se apresentem fisiologicamente ativas e, em particular GA1 e GA4, sejam responsáveis pelos efeitos nas plantas, sendo as demais precursores ou metabólicos (TAIZ; ZEIGER, 2004). O ácido giberélico (GA3) é uma das mais importantes como produto comercial. O ácido abscísico enquadra-se na classe de inibidores de crescimento e é considerado importante em muitas atividades das plantas. Na propagação de plantas, esse inibidor está envolvido na germinação e dormência, bem como na embriogênese e produção das sementes (HARTMANN et al., 2002). O etileno é um regulador de crescimento gasoso com estrutura química muito simples e que, segundo Hartmann et al. (2002), pode ter efeitos profundos no crescimento das plantas, incluindo a epinastia, quando em alta concentração, senescência e abscisão de folhas e frutos, promoção do florescimento, estimulação das gemas laterais e estimulação da produção do látex. Na propagação, o etileno pode induzir enraizamento adventício, estimular a germinação em algumas sementes e superar a dormência. Outros hormônios: além das substâncias citadas, outros compostos químicos naturais ocorrem em plantas e são considerados como hormônios. Incluem-se nesta classe as poliaminas, os brassinoestereoides, os jasmonatos, os salicilatos, alguns complexos oligossacarídeos e inositol trifosfato. Juvenilidade e Maturação em Plantas Lenhosas As plantas apresentam ao longo da sua vida consecutivos períodos de crescimento vegetativo (formação de caule, folhas e raízes) e de desenvolvimento reprodutivo (formação de flores, frutos e sementes), determinados por padrões sazonais baseados em mudanças climáticas (temperatura, luz e, ou, precipitação) e pela resposta às mudanças durante o ciclo de vida. Ciclos de vida superiores a dois anos caracterizam as plantas perenes, as quais apresentam repetidos ciclos vegetativo-reprodutivos, anualmente, binualmente ou em períodos mais longos. Em geral, arbustos têm maior período de juvenilidade em relação às árvores e, embora a fase madura ocorra em plantas herbáceas anuais e perenes, esta é geralmente menor quanto à duração; as mudanças nas características morfofisiológicas associadas às trocas de fase são menos distintas do que em outras plantas (HACKETT, 1987). As mudanças ocorridas durante esses ciclos apresentam grande importância no processo de propagação de plantas, em que podem ser caracterizadas as seguintes fases (Figura 2.2): Fase juvenil: é caracterizada pela predominância de características juvenis, correspondente ao estádio inicial de crescimento vegetativo das plantas após a germinação e, em algumas plantas, pela incapacidade dos meristemas apicais em induzir florescimento mesmo que condições favoráveis para isso existam. Fase de transição juvenil/adulta: caracteriza-se pela transição entre a fase vegetativa e produtiva, ou seja, pela passagem da planta da fase juvenil para uma condição madura. Fase adulta: corresponde àquela fase com predominância das características maduras em relação às juvenis. É caracterizada principalmente, pela fase reprodutiva das plantas, ou seja, pela fase em que ocorre o florescimento e frutificação da planta. O ciclo de vida de muitas espécies refere-se às fases juvenil e adulta, nas quais as características morfológicas e fisiológicas são diferentes. Após a germinação da semente, a planta inicia uma fase de crescimento vegetativo muito rigoroso, durante a qual a floração não pode ser induzida, mesmo que as condições externas sejam favoráveis (SALISBURY; ROSS, 1978). Assim, a fase juvenil de algumas plantas é caracterizada pelo não florescimento, grande vigor e presença de espinhos; e a fase adulta, pelo florescimento e frutificação, reduzido vigor e ausência de espinhos (HARTMANN et al., 2002). Quanto à regulação da troca de fase, evidências predominantes sugerem que a planta necessita ter um determinado tamanho antes de entrar na fase adulta (HACKETT, 1987). Além disso, segundo Hackett e Murray (1993), as mudanças ocorridas em função da trocas de fase com o desenvolvimento da planta variam de espécie para espécie, e as maiores alterações ocorrem no período precedente à maturação, resultando em formas transicionais. Segundo esses autores, as características relacionadas à maturação são estáveis, porém reversíveis, para determinadas características, variando em decorrência do tempo de desenvolvimento. Para Greenwood (1992), a maturação é uma determinação celular regulada por fatores intrínsecos e extrínsecos das células do meristema apical. A maturação frequentemente é confundida com a idade cronológica, embora seja reversível sob certas condições, e a idade, provavelmente não. De modo geral, com o avanço da idade, a planta ou órgão tende à senescência e morte, enquanto o meristema apical adulto de plantas pode ter sua juvenilidade restaurada, ou seja, rejuvenescida (HUANG et al., 1990). Segundo Hackett e Murray (1993), as características de maturação se arquivam em função de sua relativa estabilidade e são transmitidas por meio das divisões celulares de uma geração somática para a próxima. Com base na conceituação de maturação apresentada por Fortanier e Jonkers (1976), podem-se descrever três tipos de idade em uma planta: Idade cronológica: refere-se ao tempo decorrido desde a germinação da semente até a data de observação da planta, ou seja, é a idade registrada do tempo de vida de uma planta ou propágulo. Idade ontogenética: refere-se à passagem da planta por sucessivas fases de desenvolvimento, as quais incluem embriogênese, germinação, crescimento vegetativo e reprodutivo. Corresponde à maturação da planta, passando pela fase juvenil, de transição juvenil-adulta e adulta. Idade fisiológica: corresponde ao aspecto de vigor fisiológico da planta, como sanidade e status nutricional e hídrico. Refere-se aos aspectos negativos da idade, como perda de vigor, aumento da suscetibilidade às condições adversas ou a deterioração em geral. De modo geral, em algumas espécies florestais, há um gradiente da juvenilidade ontogenética em direção à base da árvore, sendo ele variável entre espécies (HACKETT, 1987), o que promove aumento da maturação em função da maior proximidade com o meristema apical (GREENWOOD; HUTCHISON, 1993). A maior juvenilidade da região basal das plantas se deve ao fatode que os meristemas mais próximos da base foram formados em uma fase com maior grau de juvenilidade, dada a proximidade com a fase de germinação, do que os das regiões terminais, que possuem maior grau de maturação (Figura 2.3). O conhecimento do gradiente de juvenilidade em plantas lenhosas é de grande importância em um processo de propagação clonal, uma vez que a origem dos propágulos vegetativos utilizados possui efeito marcante na produção de mudas e no comportamento da futura planta. Os propágulos vegetativos de diferentes posições da planta retêm os níveis específicos de juvenilidade (ou maturidade) quando são retirados da planta e propagados vegetativamente. Como resultado, a morfologia e a fisiologia das plantas resultantes dos propágulos oriundos das diferentes partes da planta matriz podem apresentar diferenças significativas dentro das três categorias de fase: juvenil, juvenil/adulta e adulta. O conhecimento da espécie, a definição dos objetivos a serem alcançados com determinada técnica de propagação vegetativa, a escolha e o uso correto dos propágulos vegetativos são de extrema importância. Quando desejado um comportamento mais juvenil da planta a ser propagada, devem-se utilizar propágulos oriundos das partes mais juvenis (fase juvenil) da planta matriz. Por outro lado, quando se deseja uma planta com comportamento maduro, tal como a manifestação do florescimento precoce e porte reduzido, devem-se preferir propágulos oriundos das partes mais adultas (fase adulta) da planta matriz. Na propagação vegetativa das plantas, os conceitos apresentados anteriormente são de grande importância, em razão dos diferentes tipos de propagação de plantas e dos objetivos almejados. A compreensão do ciclo de vida das plantas facilita o entendimento da biologia da propagação e serve como suporte nas atividades de multiplicação clonal em espécies florestais. O entendimento da troca da fase juvenil para a adulta permite conduzir com maior sucesso o processo de clonagem de árvores selecionadas, resultando em maior eficiência da etapa de seleção, melhoramento e clonagem e, consequentemente, em uma silvicultura clonal mais eficiente. Efeitos da Maturação Na propagação clonal em espécies florestais, as principais conseqüências da mudança da fase juvenil para adulta de uma planta estão relacionadas a efeitos no crescimento, efeito topófise e ciclofíse, mudanças nas características foliares e caulinares, capacidade de enraizamento, competência reprodutiva, alterações bioquímicas e expressão gênica. A mudança de fase em espécies florestais é um fenômeno bem mais complexo, em que está envolvido um número bem maior de alterações do que as aqui apresentadas, as quais, na sua maioria, ainda não são bem conhecidas e entendidas. Hábito e Vigor de Crescimento das Plantas Entre os principais efeitos da maturação relacionados com o hábito de crescimento e os efeitos no crescimento em altura e diâmetro das plantas. O crescimento das brotações das plantas pode variar em função da maturidade dos propágulos que as originaram. Segundo Greenwoog e Hutchison (1993), na propagação vegetativa pela enxertia ou estaquia, por exemplo, as plantas originadas de propágulos juvenis possuem maior tendência em apresentar hábito de crescimento ortotrópico do que aquelas plantas originadas de propágulos mais maduros. Dependendo da espécie, podem-se observar plantas com nítido hábito de crescimento plagiotrópico quando esta se origina de propágulo vegetativo maduro na propagação clonal. O crescimento plagiotrópico refere-se à situação em que algumas plantas propagadas vegetativamente têm crescimento desviado da posição vertical (ortotropia) e continuam seu crescimento de forma similar a uma ramificação lateral (crescimento plagiotrópico). Segundo dados experimentais de Greenwood e Hutchison (1993) e Parker et al., (1998), árvores originadas por enxertia ou enraizamento de estacas de propágulos juvenis de Tsugar canadensis e Pinus taeda, tendem a exibir maior número de brotações por unidade de área, bem como maior tendência ao crescimento ortotrópico, em comparação com aquelas de propágulos maduros. Em Araucaria angustifolia e Coffea arabica, mudas produzidas por enraizamento de estacas coletadas de brotações laterais continuam tendo crescimento plagiotrópico, enquanto estacas coletadas de brotações da parte apical se desenvolvem normalmente (HARTMANN et al., 2002), sendo a mesma resposta encontrada em Platamus accidentalis (LAND et al., 1995). Para espécies do gênero Eucalyptus, não foram encontrados estudos referentes aos efeitos de gradientes de maturidade dos propágulos utilizados na propagação. Contudo, em viveiro e campo, podem-se observar plantas com características que lembram o crescimento plagiotrópico (Figura 2.4). Na literatura têm sido amplamente abordados os conceitos de topófise e ciclófise, embora estes ainda não sejam bem compreendidos. Em espécies florestais, esses efeitos possuem especial importância, tendo em vista as dificuldades encontradas na propagação vegetativa em várias situações na produção de mudas. No caso em estudo, topófise refere-se ao efeito na propagação clonal resultante da diferença de estádio de desenvolvimento potencial fisiológico do meristema apical, quando comparado com outras áreas meristemáticas da planta, independente do processo de maturação do meristema apical (DODD: POWER, 1998). Em outras palavras, o fenômeno de topófise pode ser entendido como um efeito da origem do propágulo vegetativo que se manifesta nos processos assexuados de reprodução, por meio do menor ou maior desempenho na propagação vegetativa. A ciclófise refere-se ao efeito na propagação clonal decorrente do processo de maturação do meristema apical. É o estádio em que se encontram as regiões meristemáticas da planta no momento da seleção do propágulo vegetativo (DODD; POWER, 1998). Pode-se dizer que o efeito topófise relaciona-se com a idade fisiológica, e o efeito ciclófise, com a idade ontogenética. Os termos topófise e ciclófise podem se confundir quando analisados quanto à morfologia dos propágulos vegetativos envolvidos no processo de propagação clonal. Nesse processo, a minimização desses efeitos está na utilização de propágulos vegetativos fisiologicamente mais novos e em idade ontogenética mais juvenil quanto possível. Exceções são apresentadas em algumas coníferas florestais, com Araucaria angustifolia, na qual pode ser observado que os propágulos vegetativos provenientes das brotações apicais (ortotrópicas) originam plantas com crescimento tipicamente na vertical, enquanto propágulos provenientes das brotações laterais (plagiotrópicas) resultam em plantas com crescimento na horizontal, independentemente da idade dos propágulos vegetativos. Crescimento em Altura e Diâmetro das Plantas Informações científicas contemplando a influência do grau de maturação do propágulo vegetativo no crescimento em altura e diâmetro das plantas propagadas vegetativamente são pouco conhecidas e compreendidas. No entanto, segundo Greenwood e Hutchison (1993), a capacidade de crescimento em altura e diâmetro de uma planta pode ser afetada pelo uso de propágulos vegetativos provenientes de árvores de diferentes idades. Segundo esses autores, pesquisas demonstram redução na capacidade de crescimento em altura e diâmetro, com envelhecimento ontogenético, na propagação clonal por enxertia e, ou, por estaquia a partir de propágulos com diferentes idades. Elas salientam ainda, que isso pode ser decorrente do acréscimo da capacidade deenraizamento com o aumento da maturação, em que menores crescimentos em altura e diâmetro podem ser decorrentes de um menor vigor do sistema radicial em propágulos mais maduros utilizados em um processo de propagação clonal. Propágulos vegetativos mais juvenis não somente produzem maior crescimento do caule, como também sustentam maior produção de folhas e biomassa (GREENWOOD, 1992). O estágio juvenil possibilita o maior crescimento vegetativo da planta e a produção de grande área foliar, como também a produção de fotoassimilados a serem, posteriormente, utilizados no desenvolvimento dos frutos e do sistema radicular, facilitando a absorção de água e íons do solo (BOLIANI, 1986). Alguns autores têm sustentado que o reduzido crescimento em diâmetro e altura em árvores mais velhas se deve ao aumento da complexidade e tamanho da árvore, isto é, à idade e não à maturação (HACKETT, 1987; ZIMMERMANN et al., 1985, citados por GREENWOOD; HUTCHISON, 1993). Contudo, de acordo com esses autores, o fato de enxertos de mesmo tamanho inicial, de árvores com idades diferentes, apresentarem taxas de crescimento diferenciadas indica que o decréscimo do potencial de crescimento é também relacionado às características de maturação. A mesma conclusão pode ser extraída de pesquisa realizada por Parker et al., (1998), que, avaliando mudas originárias de enxertia em plantas de Pinus elliotti, após seis anos no campo, observaram crescimentos em altura e diâmetro significativamente superiores em mudas resultantes de enxertos com idade de 6 a 9 anos (juvenis), em comparação com aquelas de enxertos com idades acima de 40 anos. Enfim, as informações científicas indicam que menor vigor pode ser decorrente do envelhecimento, da maturação ou de ambos. Anatomia Foliar e Caulinar Durante o desenvolvimento ontogenético, a planta apresenta uma série de alterações morfológicas relacionadas com partes foliares e caulinares, como mudanças de forma, dimensão, pigmentação (clorofila e antocianina), atividade fotossintética, entre outras. Segundo vários autores (BOLIANI, 1986; HACKETT, 1987; FOUDA, 1996; HARTMANN et al., 2002), essas mudanças decorrem da troca da fase juvenil para a adulta, afetando sensivelmente a propagação vegetativamente das plantas. Em Eucalyptus, por exemplo, na fase juvenil as folhas são largas, extensas e sem pecíolo, enquanto na fase adulta são alongadas e apresentam um pecíolo distinto (Figura 2.5 A). Diferenças similares podem ser observadas em algumas espécies do gênero Pinus (Figura 2.5 B). Em algumas situações, tem sido relatada a maior resistência foliar a doenças com o envelhecimento ontogenético; segundo Greenwood e Hutchison (1993), especula-se que seja devido à maior resistência e penetração do fungo. Conforme Fouda (1996), folhas de Ramos juvenis apresentam forma mais cônica, epiderme recoberta por uma fina camada de cutícula com alta densidade estomatal e mesofilo espesso com ductos de resina menores e em menor concentração do que em folhas adultas, ramos juvenis apresentam córtex, floema, zona cambial, medula e raios do xilema e floema mais espessos do que adultos. Em Tectona grandis, o número de elementos de vaso e comprimento e a largura dos elementos de vaso e de fibra forem menores em estacas caulinares oriundas de plantas juvenis, com dois meses de idade (HUSEN; PAL, 2006). Esses valores cresceram com o aumento da idade da planta matriz, sendo maiores naquelas de 30 anos. Segundo os autores, as referidas características anatômicas podem ser usadas como marcadores confiáveis do grau de maturação na espécie estudada e, talvez, em outras espécies. Capacidade de Enraizamento Adventício Uma das mais consistentes expressões da maturação em plantas lenhosas refere-se ao potencial da regeneração; em que a redução da capacidade do enraizamento de propágulos vegetativos, com o envelhecimento ontogenético, tem sido considerada um dos principais efeitos na propagação clonal. Vários estudos indicam que o potencial de enraizamento de propágulos vegetativos, obtidos em diferentes alturas da planta matriz, varia com o gradiente de maturação. Assim, propágulos coletados do ápice e dos ramos laterais das plantas geralmente apresentam menor potencial de enraizamento do que aqueles coletados das regiões mais próximas à base da árvore, embora ocorram grandes variações em se tratando de espécies. Para a maioria das espécies lenhosas, estacas de mudas juvenis enraízam facilmente, enquanto outras provenientes de plantas mais velhas o fazem com maior dificuldade, ou definitivamente não enraízam. Vale salientar que a juvenilidade muitas vezes se perde antes mesmo de a planta alcançar a maturação reprodutiva. Estudos em plantas de Tsugar heterophylla têm indicado que o potencial de enraizamento de propágulos coletados de diferentes alturas da árvore matriz traz evidências da existência de um gradiente de maturação, com o grau de maturação aumentando à medida que se aproxima do ápice da planta (GREENWOOD; HUTCHISON, 1993). O gradiente de maturação e seus efeitos no enraizamento podem variar entre as diferentes espécies. Para Eucalyptus grandis, por exemplo, trabalhos têm mostrado que estacas cotiledonares têm alto potencial de enraizamento, enquanto estacas coletadas acima do 15° nó apresentam baixo enraizamento ou não enraízam (HACKETT, 1987). Para Eucalyptus viminalis e Eucalyptus pauciflora. Hackett (1987) relata que o alto potencial de enraizamento é perdido completamente após o quarto nó. Em Eucalyptus camadulensis, esse mesmo autor relata enraizamento de 40-50% em estacas do centésimo nó e, em Eucalyptus deglupta, 100% de enraizamento em estacas coletadas acima do centésimo nó. Há varias décadas tem sido estudado o efeito da idade sobre o enraizamento de estacas de Hevea brasiliensis (seringueira). Grego___ (1951) afirma que, além da diminuição dos índices de enraizamento com o aumento da idade da planta fornecedora de propágulos, o tempo de enraizamento também é bastante influenciado. Segundo esse autor, nessa época, dados experimentais com matrizes de Hevea brasiliensis, indicaram que estacas obtidas com plantas de um mês de idade apresentaram 95% de enraizamento aos 28 dias, sendo observada redução gradual do percentual de enraizamento e aumento do tempo de resposta ao enraizamento à medida que as estacas foram obtidas de matrizes mais velhas. Estas resultaram em apenas 7,5% de enraizamento aos ____dias em plantas com 13 meses de idade e nenhuma resposta a partis dos 24 meses de idade nas condições experimentais adotadas. Também Stahel (1947) afirma que a propagação de Hevea brasiliensis por estacas é bem sucedida somente quando estacas são coletadas de plantas muito novas ou de partes basais do caule de plantas mais velhas. Para Ilex paraguariensis (erva-mate), Sand (1989) obteve enraizamento de 91,7% e 39,4% em estacas caulinares e foliares respectivamente, provenientes de plantas matrizes de um ano de idade e de apenas 6,8% e 2,6% para aquelas oriundas de plantas de 60 anos. Esses resultados indicam que o fator de juvenilidade se perde após ____ anos de idade, sem, no entanto, ter ainda alcançado a maturação reprodutiva, a qual se iniciaria após o quinto ano de vida. Além do aumento dos percentuais de enraizamento em propágulos mais juvenis, a melhor qualidade e a maior rapidez de formação do sistema radicial também têm sido citadas (GOMES, 1987), denotado pelo aumento no vigor radicial (número e comprimento de raízes), relatado por Schneck (1996). Sand (1989) avaliou o comprimento médio das maiores raízesde estacas oriundas de plantas de erva-mate com ____ meses, 18 meses e 60 anos de idade, em comparação com estacas oriundas de rebrotes de plantas de 60 anos, e obteve 11,5; 10,6; 8,4;___ 5,8cm, respectivamente, para os quatro tratamentos, ressaltando a importância do fator juvenilidade dos propágulos no vigor do sistema radicial. De maneira geral, pode-se admitir que, quanto mais juvenil for o propágulo vegetativo a ser propagado, maior é a chance de sucesso de enraizamento, quer em termos de percentual, rapidez de formação e qualidade das raízes, quer pela capacidade de crescimento da nova planta. Competência Reprodutiva A competência reprodutiva, definida como a capacidade das plantas para formação de estruturas reprodutivas sob condições naturais ou induzidas, tem sido utilizada tradicionalmente como critério para caracterizar a fase adulta da planta, ou seja, a mudança da fase juvenil para adulta (HACKETT; MURRAY, 1993; HARTMANN et al., 2002). Na maioria dos casos, a produção regular de flores é o único critério prático para identificação do final da fase juvenil de uma planta (HACKETT, 1987). Entretanto, recentemente esse critério de troca de fase tem sido bastante questionado, uma vez que a inaptidão de plantas jovens em florescer não necessariamente indica incompetência reprodutiva, visto que a manipulação das condições ambientais e, ou, tratamentos hormonais podem induzir a floração repetidamente nessas plantas (GREENWOOD; HUTCHISON, 1993). Na grande maioria dos casos, porém, a competência reprodutiva se manifesta quando a planta apresenta tamanho mínimo e entra no estado maduro. Na maioria das coníferas, características como a relação estróbilos masculinos e femininos produzidos têm sido usadas como melhor indicador do estado de maturação, quando comparado à competência reprodutiva. De modo geral, quanto maior a idade destas plantas, maior a produção de estróbilos masculinos em relação aos femininos (GREENWOOD, HUTCHISON, 1993). Alterações Bioquímicas Uma serie de estudos têm sido conduzidos em espécies lenhosas visando a identificação de marcadores bioquímicos de juvenilidade dos propágulos. Em Castanea sativa, Vasquez e Gesto (1982) encontraram maiores teores endógenos de substâncias promotoras de enraizamento em propágulos juvenis. Garcia et al. (2000) avaliaram possíveis diferenças na composição proteica de vários órgãos juvenis e adultos de plantas de oliveira (Olea europeae) e concluíram que a composição proteica de órgãos adultos e juvenis de uma mesma planta ou de plantas diferentes foi qualitativamente similar; contudo, pelo menos um grupo de polipeptídeos de 29 KDa foi mais fortemente expresso em tecidos adultos. Relações similares também foram obtidas em vários cultivares de diferentes origens genéticas. Níveis endógenos de reguladores de crescimento têm sido medidos em tecidos juvenis e maduros de várias espécies por diferentes autores. Segundo extensa revisão feita por Hackett (1987), há diferenças nos conteúdos endógenos de auxinas e outros promotores entre tecidos juvenis e adultos; os maiores teores foram encontrados em propágulos juvenis, em relação aos maduros. Estudos realizados por Mullins (1995), Fouret et al. (1986) e Moncalén et al. (2001) resultaram na conclusão de que propágulos maduros apresentaram maior conteúdo de ABA, quando comparado aos juvenis. Resultados similares foram encontrados para cultivares de macieira. Moncalén et al. (2001) e Andrés et al. (2002), concluíram que a relação citocinina/IAA decresce com o decorrer da maturação de propágulos. Day et al. (1995) constataram que folhas juvenis continham mais citocininas ativas do que folhas adolescentes ou adultas. Geneve (1985, citado por HACKETT, 1987) encontrou diferenças significativas no conteúdo de etileno em tecidos maduros e juvenis, porém elas não afetaram o percentual de enraizamento. Em estudo com Pinus radiata, Fraga et al. (2002) concluíram que indivíduos juvenis foram caracterizados por menor grau de metilação de DNA e alta relação de poliaminas livres e poliaminas solúveis conjugadas com ácido perclórico, enquanto árvores adultas mostraram maior grau de metilação no DNA e baixa relação de poliaminas livres e poliaminas solúveis conjugadas com ácido perclórico. Com base nesses resultados, os autores propuseram que ambos os indicadores estariam relacionados com a perda da habilidade morfogênica com o avanço da maturação e, consequentemente, com a não- aptidão de estabelecimento in vitro de propágulos adultos de Pinus radiata. Além das variações entre tecidos juvenis e adultos citadas anteriormente, outra têm sido relatadas, como a concentração de proteínas solúveis em tecidos, a concentração de proteínas solúveis em tecidos, a concentração de DNA em folhas (ALI; WESTWOOD, 1996), o teor de poliaminas (REY et al., 1994) e o conteúdo de clorofila (HUANG et al., 2003) e de antocianina nas folhas (GREENWOOD, 1992; HACKETT; MURRAY, 1993). Expressão Gênica A expressão gênica também é influenciada pelos efeitos da maturação dos tecidos vegetais, pois ativação ou suspensão gênica transcricional ocorre de forma diferenciada ao longo do desenvolvimento das plantas. Pesquisas têm reportado o efeito da idade ontogênica dos propágulos na expressão gênica, principalmente dos genes relacionados à fotossíntese. Hutchison et al. (1990) mostraram que a família do gene CAB é mais fortemente expressa em propágulos juvenis de plantas de Larix sp. crescendo sob condições de luz, em relação a propágulos adultos. Esses autores não encontraram diferenças na expressão dos genes rbc S com a idade. Woo et al. (1994) demonstraram que os pecíolos juvenis e adultos de Hedera helix crescidos in vitro responderam diferentemente à expressão de HW 101 e HW 103 mRNA. Na sequência, Kuo et al. (1995) descreveram um sistema de fosforilação em Sequoia no qual uma proteína de 32 kDa pode ser fosforilada somente em tecidos adultos, enquanto naqueles juvenis uma proteína de 31 kDa foi fosforilada. De modo geral, existem poucas informações disponíveis quanto ao relacionamento entre a expressão gênica e a mudança de fase (maturação) em plantas lenhosas. Os modelos que buscam explicar a regulação da expressão gênica na maturação são mais especulativos do que preditivos. Rejuvenescimento e Revigoramento Na silvicultura clonal, a seleção dos clones ocorre normalmente na fase adulta da árvore devido à maior confiança no processo seletivo, uma vez que a árvore expressa o seu máximo potencial silvicultural, tecnológico, adaptação a sítios específicos, entre outras, na idade de rotação desejada, para determinada finalidade. Em geral, a eficiência no processo seletivo dos clones é inversamente relacionada com a facilidade de propagação vegetativa. Dessa forma, para obtenção de sucesso na multiplicação de plantas adultas, é necessário explorar a maior capacidade de propagação de material juvenil, seja pela utilização de propágulos provenientes de partes juvenis da planta, seja pela promoção de rejuvenescimento de partes da planta adulta. Rejuvenescimento pode ser considerado uma forma de reverter a planta do estádio adulto para o juvenil, recuperando a competência da totipotência. Em geral, algumas características relacionadas à maturação mostram-se mais fáceis de serem revertidas do que outras, e os respectivos tratamentos para promoção do rejuvenescimento influenciam de forma diferenciada, sugerindo que o rejuvenescimento ocorre em termos relativos e não absolutos (HACKETT; MURRAY, 1993). De modo geral, pode-se dizer que a maturação é estável, mas reversível ou manipulávelem certas condições, e que o rejuvenescimento pode ocorrer de forma total, parcial ou progressiva. Uma série de métodos para reverter ou manter a juvenilidade das plantas têm sido descritos: aplicação de ácido giberélico; propagação vegetativa seriada; poda drástica ou poda de gemas apicais; neodiferenciação de gemas; apomixia; meiose para células; indução de ramos adventícios em porções de raízes; utilização do crescimento juvenil originado dos esferoblastos (crescimento em forma de “verrugas” que às vezes são encontradas no caule), entre outros. Hackett (1987) cita a propagação sexuada natural como o método mais eficiente em promover o rejuvenescimento de partes adultas de uma planta, uma vez que origina a parte mais juvenil da planta (embrião) a partir da parte mais madura (órgão frutífero). Entretanto, os métodos de rejuvenescimento mais utilizados na área florestal relacionam-se à propagação vegetativa seriada pela enxertia, pela estaquia e pela micropropagação, sendo os demais menos estudados e relatados, resultando em menor conhecimento dos seus efeitos sobre o rejuvenescimento ou maturação da juvenilidade. Com a relação ao revigoramento, essa metodologia consiste em adotar práticas culturais que propiciam maior vigor fisiológico à planta, de forma que origine propágulos vegetativos com melhor desempenho na propagação clonal. Assim, a adoção de manejo nutricional e hídrico busca uma melhoria na condição fisiológica da planta, assim como o uso da poda drástica visa a indução de brotações dormentes em regiões mais juvenis, constituindo um método de revigoramento eficiente em um processo de propagação clonal. Rejuvenescimento por Enxertia Seriada Neste processo, propágulos maduros são enxertados em partes juvenis de um porta-enxerto e, a partir de sua brotação, são coletados novos propágulos, os quais são novamente enxertados em um novo porta-enxerto juvenil, e assim seriadamente, até obter os resultados desejados (Figura 2.6). Dessa forma, o rejuvenescimento pela enxertia seriada consiste em enxertar em série propágulos vegetativos do clone desejado. A enxertia seriada é um método de rejuvenescimento que demanda muito tempo (ELDRIDGE et al., 1994), podendo ainda apresentar problemas de incompatibilidade (KIM et al., 1993) em algumas espécies florestais. Para Eucalyptus e Pinus este método de rejuvenescimento tem sido aplicado em algumas circunstâncias nos programas de silvicultura clonal. O grau de rejuvenescimento obtido depende do número de reenxertias do enxerto no porta-enxerto juvenil, bem como da espécie/clone envolvida (HUANG et al., 1990). Resultados experimentais têm mostrado que duas (KIM et al., 1993), quatro (KAO; HUANG, 1993; ASSIS, 1996) ou quatro a seis (ELDRIDGE et al., 1994) reenxertias são suficientes para rejuvenescer o material até o ponto de ele enraizar facilmente, tendo-se suas variações em termos de espécie/clone. A técnica de rejuvenescimento por enxertia seriada foi empregada com sucesso na obtenção de material juvenil satisfatório para o enraizamento de estacas de matrizes selecionadas de Pinus oocarpa e Pinus caribaea var. hondurensis, após a terceira enxertia seriada (MURAYAMA; FERRARI, 1988). Em experimentos de enxertia seriada com Eucalyptus trabutii, Siniscalco e Pavolettoni (1988) concluíram que propágulos adultos foram revertidos a condições juvenis de forma gradual, conforme os sucessivos ciclos de enxertia. Nas seis reenxertias feitas, os resultados de sobrevivência dos enxertos encontrados foram: 52%, 69%, 78%, 71%, 57% e 76%, respectivamente, da primeira até a sexta reenxertia. Para seringueira (Hevea brasiliensis), Muzik e Cruzado (1958), testando o enraizamento de propágulos oriundos de plantas com uma e cinco enxertias seriadas (matrizes de 8 a 10 anos de idade), obtiveram em torno de 30% de enraizamento em oito semanas com estacas coletadas de plantas com a quarta e quinta reenxertias. Segundo esses autores, estacas coletadas do clone original e da primeira, segunda e terceira enxertias não obtiveram nenhuma resposta para enraizamento. O fato de enxertar propágulos adultos de uma planta em porta-enxertos juvenis promover o rejuvenescimento evidencia a translocação de substâncias da parte juvenil (porta-enxerto) para a parte adulta (enxerto), induzindo um estádio mais juvenil nesta última. No entanto, Hackett (1987) salienta que o potencial de enraizamento (que atualmente ainda é a maior expressão de maturidade ou juvenilidade) de tecidos juvenis e adultos é uma característica das células do sítio de iniciação radicial, não sendo, portanto, relacionado à translocação de promotores ou inibidores. Alternativamente, o rejuvenescimento pela enxertia seriada feita in vitro, denominada de enxertia in vitro ou microenxertia, pode ser obtido com maior rapidez e eficiência em comparação à enxertia convencional, uma vez que propágulos de menor dimensão e mais juvenis são utilizados. A microenxertia ou enxertia in vitro consiste em enxertar, sob condições assépticas, um meristema ou ápice caulinar sobre um porta-enxerto estabelecido in vitro. Aplicações de enxertia in vitro, visando o rejuvenescimento de algumas espécies de plantas, são descritas por diversos autores. Pliego-Alfaro e Murashige (1987) e Zaczek e Steiner (1997), por exemplo, obtiveram resultados satisfatórios mediante o uso de enxertia in vitro com explantes coletados de plantas adultas, mostrando a restauração da competência ao enraizamento para Persea americana e Quercus rubra. Huang et al. (1996) afirmaram que sucessivas enxertias in vitro, em curtos intervalos de tempo, a partir de ápices meristemáticos extraídos de tecidos adultos de Sequoia sempervirens, restauraram características juvenis mais rapidamente, podendo essa técnica ser aplicada com o propósito de rejuvenescimento. Kretzschmar e Ewald (1994) e Ewald e Kretzschmar (1996) também confirmaram a influência do rejuvenescimento por meio da enxertia in vitro em explantes oriundos de árvores adultas de Larix na propagação clonal desta espécie. Em Eucalyptus, Bandeira (2004) concluiu que a enxertia in vitro apresenta potencial de aplicação no rejuvenescimento de clones adultos de interesse comercial. Rejuvenescimento por Estaquia Seriada Neste processo, propágulos maduros (estacas) são enraizados e, a partir de sua brotação, são coletados novos propágulos (estacas), os quais são novamente enraizados, e assim seriadamente, até obter os resultados desejados. Dessa forma, o rejuvenescimento pela estaquia seriada consiste em enraizar em série propágulos adultos do clone desejado. O efeito da confecção de estacas a partir de brotações daquelas enraizadas, em relação ao rejuvenescimento em Eucalyptus spp., resultando em efeito positivo sobre o enraizamento, foi citado por Eldridge et al., (1994). Segundo esses autores, resultados satisfatórios no enraizamento de Eucalyptus, decorrentes do efeito do rejuvenescimento, podem ser obtidos após duas ou mais gerações de estaquia seriada. De acordo com Wendling (2002), em avaliação de miniestaquia seriada em quatro clones de Eucalyptus grandis, após sete subcultivos, essa técnica mostrou-se mais eficiente no rejuvenescimento de clones com menor grau de juvenilidade, para as características de enraizamento, sobrevivência e vigor radicial e aéreo. O reaparecimento de características morfológicas juvenis e a melhoria no enraizamento de estacas pelo uso da estaquia seriada também foram mencionados por Bonga e Aderkas (1993). Entretanto, apesar dessas citações de uso da estaquia seriada visando o rejuvenescimento em espécies florestais, ainda existempoucos relatos com base científica, embora a técnica seja considerada potencial para esse propósito. Rejuvenescimento por Micropropagação O rejuvenescimento por micropropagação consiste em estabelecer em cultura in vitro explantes do clone desejado e subcultivar sucessivamente em meio de cultura adequado com reguladores de crescimento, o que resulta em plantas com características mais juvenis. Em muitos casos, os resultados obtidos pelo uso da micropropagação visando obter efeitos de rejuvenescimento são comparáveis aos da enxertia e estaquia seriada. Nessas condições, rejuvenescimento parcial tem sido obtido pelos sucessivos subcultivos de meristemas apicais de brotos micropropagados, proporcionando melhoria no enraizamento de gemas alongadas in vitro. Segundo Bonga e Aderkas (1993), após cinco ou seis subcultivos in vitro, clones adultos de Eucalyptus são considerados suficientemente rejuvenescidos ou com reatividade capaz de permitir uma subsequente propagação por estaquia. Entretanto, vale salientar que as dificuldades inerentes ao processo de micropropagação, bem como a própria resposta das espécies à cultura in vitro, proporcionam respostas diferenciadas, em, que somente após alguns subcultivos pode-se avaliar a resposta do rejuvenescimento. Segundo Franclet et al. (1987), a técnica da micropropagação é eficiente no rejuvenescimento de propágulos maduros, embora muitas espécies arbóreas maduras não possam ser micropropagadas em escala comercial, provavelmente em razão da falta de otimização das condições de cultura in vitro e do número insuficiente de subcultivos adotados. Em experimento conduzido com explantes de Sequoias sempervirens coletados de árvores com 50 e 500 anos de idade, esses autores chegaram à conclusão de que o principal fator de rejuvenescimento pela micropropagação foi o tempo de exposição dos explantes à citocinina BAP (benzilaminopurina). Assim, menores períodos entre um subcultivo e outro aumentaram o rejuvenescimento, principalmente dos propágulos das árvores de 500 anos. Uma aplicação direta do rejuvenescimento pela micropropagação seriada na área florestal é a propagação clonal pela microestaquia, a qual é baseada no máximo de aproveitamento da juvenilidade dos tecidos vegetais, cujo desenvolvimento e aplicação em Eucalyptus tiveram como origem os trabalhos realizados por Assis et al. (1992). Na propagação clonal de alguns clones de Eucalyptus pela microestaquia no Brasil, onde o objetivo principal é a melhoria do desempenho de enraizamento das microestacas, resultados satisfatórios têm sido obtidos após 10 a 12 subcultivos pela micropropagação; os efeitos de rejuvenescimento alcançados são atribuídos principalmente aos subcultivos intensivos e à utilização da citocinina BAP (benzilaminopurina) aos meios de cultura. Titon (2001), avaliando a sobrevivência na saída da casa de vegetação, o enraizamento na saída da casa de sombra e a sobrevivência das mudas aos 50 dias, observou, em clones de Eucalyptus grandis, resultados superiores na microestaquia em relação à miniestaquia. Essa diferença foi mais pronunciada em clones com maior dificuldade de enraizamento, indicando, nesses casos, possível efeito de rejuvenescimento dos clones com o uso da microestaquia. Para o mesmo experimento, as mudas oriundas da microestaquia apresentaram altura e diâmetro de colo aos 50 dias e peso de matéria seca de raiz aos 28 dias iguais ou superiores aos da miniestaquia, reforçando a suposição de maior grau de juvenilidade das microestacas. Também resultados de pesquisa obtidos por Xavier et al. (2001) apontaram a eficiência do rejuvenescimento de dois clones híbridos de Eucalyptus grandis pela micropropagação, a qual foi constatada pela superioridade dos resultados obtidos na microestaquia sobre a miniestaquia, em relação ao percentual e à velocidade de enraizamento. No entanto, tem sido constatado que, após algum período de coleta de microestacas nas microcepas, estas têm perdido gradativamente o grau de juvenilidade obtido pelo rejuvenescimento quanto ao enraizamento, indicando que o rejuvenescimento obtido pela micropropagação não é permanente. Da mesma forma, o uso de mudas de microestacas não reproduz os mesmos efeitos de juvenilidade das mudas de micropropagação. Apesar das dificuldades encontradas para propagação clonal pela micropropagação de clones de Eucalyptus, esta tem sido considerada a principal técnica potencial para incrementar o enraizamento de gemas alongadas in vitro, principalmente devido aos recentes avanços com plantas transgênicas, embriogênese somática e tecnologia de sementes sintéticas usadas para restaurar a condição juvenil de plantas fisiologicamente maduras. De modo geral, a micropropagação tem sido considerada uma técnica com grande potencial no rejuvenescimento de espécies florestais. Contudo, essa técnica ainda carece de desenvolvimento cientifico para sua plena utilização, além de ser onerosa e exigir mão-de-obra especializada. Revigoramento Vegetativo De modo geral, pode-se caracterizar o revigoramento como certas práticas culturais que objetivam propiciar maior vigor fisiológico em brotações da planta, de forma que proporcione propágulos vegetativos vigorosos e responsivos à propagação clonal. Existem inúmeras formas de se obter o revigoramento vegetativo, e uma das principais, na silvicultura clonal, é pelas podas drásticas ou corte raso. Nesse processo, propágulos juvenis são obtidos pelo abate de árvores adultas selecionadas, buscando induzir o crescimento de gemas dormentes existentes na base da cepa. Esse procedimento de obtenção de propágulos vegetativos está baseado no fato de que as características juvenis são mantidas naquela porção de crescimento da árvore. Assim, com base no gradiente de juvenilidade em árvores, brotações juvenis surgem a partir de gemas dormentes presentes na porção de cepa remanescente, após serem dadas as condições para crescimento em função da retirada do efeito de dominância apical exercido pela parte aérea decepada pelo abate da árvore. Esse sistema tem sido usado com sucesso na produção de estacas mais juvenis de Eucalyptus, em que, após a decepa da árvore, as brotações obtidas são utilizadas como a base para propagação clonal comercial desta espécie. Outras formas de obtenção de brotações juvenis, fundamentadas nesses princípios citados, como o anelamento e o uso do fogo na base da planta matriz, também são citadas (ALFENAS et al., 2004). O revigoramento por tratos silviculturais também têm sido adotado com eficiência no processo de propagação clonal. E entre estes, citam-se adubações, irrigações e manejo direcionado para obtenção de maior número possível de brotações vigorosas. Outra forma de revigoramento em plantas são as podas sucessivas, as quais visam aumentar a produção de propágulos vigorosos e manter a juvenilidade destes. Esse procedimento é o que vem sendo adotado em jardins clonais, nos seus diferentes sistemas de manejo das cepas, em que estas são mantidas baixas, buscando manter produção de brotações juvenis aptas à formação de propágulos com bom potencial de enraizamento. O melhor conhecimento das exigências nutricionais, hídricas e de manejo dos clones componentes de programas de silvicultura clonal também leva à formação de brotações mais vigorosas e aptas para o processo de propagação vegetativa. Em Eucalyptus, isso comprova pelo fato de que clones com maior tempo no programa de clonagem respondem melhor ao enraizamento e à formação das mudas, visto seu melhor conhecimento e ajuste mais refinado de suas exigências. Em algumas situações,
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