Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Campinas 2017 LÍVIA FORNACIARI MARCOS A INCONSTITUCIONALIDADE DO INSTITUTO DA SÚMULA VINCULANTE CONSIDERANDO OS PRINCÍPIOS DO DIREITO Campinas 2017 A INCONSTITUCIONALIDADE DO INSTITUTO DA SÚMULA VINCULANTE CONSIDERANDO OS PRINCÍPIOS DO DIREITO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade Anhanguera de Campinas, como requisito parcial para a obtenção do título de graduado em Direito. Orientador: Andresa Bertão LÍVIA FORNACIARI MARCOS A INCONSTITUCIONALIDADE DO INSTITUTO DA SÚMULA VINCULANTE CONSIDERANDO OS PRINCÍPIOS DO DIREITO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade Anhanguera de Campinas, como requisito parcial para a obtenção do título de graduado em Direito. Aprovado em: __/__/____ BANCA EXAMINADORA Prof(ª). Titulação Nome do Professor(a) Prof(ª). Titulação Nome do Professor(a) Prof(ª). Titulação Nome do Professor(a) Dedico este trabalho a minha amada mãe, que acredita serenamente no meu potencial, e à Maria Bela, minha princesa. AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus pelo acalento nas horas difíceis e por me guiar em tudo o que faço. Agradeço infinitamente a compreensão e o carinho da minha amada, querida e maravilhosa mãe, que nos momentos difíceis me deu consolo e me encorajou. Gratidão e amor indescritíveis. RESUMO O ordenamento jurídico brasileiro adotou o juspositivismo e o civil law como pilares do sistema e a Constituição Federal os elenca detalhadamente através dos chamados princípios constitucionais e da tripartição de poderes. No entanto, o estudo por levantamento bibliográfico demonstrou que o instituto da súmula vinculante, que se apresenta como ativismo judicial, oferece afronta direta a esses elementos, tornando-o inconstitucional. Sua inconstitucionalidade fica evidente quando analisada pela ótica dos princípios constitucionais da legalidade, da inafastabilidade da jurisdição, do devido processo legal, da ampla defesa e contraditório, da coisa julgada e da independência do juiz, inclusive porque, neste ultimo exemplo, o magistrado é obrigado a aplicar súmula vinculante no caso concreto, sob pena de ser responsabilizado por ato de insubordinação. Em outro aspecto, o estudo em tela demonstrou que a essência do instituto está na transposição do concreto para o abstrato, de modo que se exclui os fatores concretos dos paradigmas para se alcançar o enunciado vinculativo. E, ainda, pôde- se verificar pela análise cronológica da edição sumular, pela matéria enunciada e pelo exame da frequência do seu cancelamento e revisão, que o instituto é utilizado, sobretudo, para regulamentar matérias de Direito Tributário, Administrativo e Processual, sugerindo, por fim, novos estudos. Palavras-chave: Súmula vinculante; Ativismo judicial; Inconstitucionalidade; Princípios constitucionais; Civil law; ABSTRACT The Brazilian legal system adopted juspositivism and civil law as pillars of the system and the Federal Constitution drains them through the so-called constitutional principles and the tripartition of powers. However, the study by bibliographic survey showed that the institute of the binding summary, which presents itself as judicial activism, offers direct affront to these elements, making it unconstitutional. Its unconstitutionality is evident when analyzed from the point of view of the constitutional principles of legality, the inafasability of jurisdiction, due process of law, ample defense and contradictory, res judicata and independence of the judge, also because, in this last example, the magistrate is obliged To apply binding precedent in the specific case, under penalty of being blamed for an act of insubordination. In another aspect, the on-screen study has demonstrated that the essence of the institute is in the transposition of the concrete to the abstract, so that the concrete factors of the paradigms are excluded to reach the binding statement. And, also, it could be verified by the chronological analysis Of the summative edition, by the matter stated and by examining the frequency of its cancellation and revision, that the institute is mainly used to regulate matters of Tax, Administrative and Procedural Law, suggesting, finally, new studies. Key-words: Binding summary; Judicial activism; Unconstitutionality; Constitutional principles; Civil law; LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Princípio da legalidade no mundo .......................................................... 26 Tabela 2 – Independência do juiz nas Constituições do mundo .............................. 34 Tabela 3 – Análise comparativa das súmulas vinculantes do Brasil ........................ 54 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ................................................................................................... 11 2. ESTRUTURA DO ORDENAMENTO JURÍDICO ............................................... 13 2.1. PERFIL DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL......................................................................... 13 2.2. JUSNATURALISMO E JUSPOSITIVISMO .............................................................................................................. 13 2.3. COMMON LAW E CIVIL LAW ........................................................................................................................... 15 2.4. ACEPÇÕES DO TERMO “CONSTITUIÇÃO” ........................................................................................................... 16 2.5. DA TRIPARTIÇÃO DE PODERES ......................................................................................................................... 18 2.6. DA ATIVIDADE LEGISLATIVA NO BRASIL ............................................................................................................ 19 2.7. ATIVISMO JUDICIAL ...................................................................................................................................... 20 2.7.1. A súmula vinculante na Constituição Federal ........................................................................... 21 3. PRINCÍPIOS DO DIREITO DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO .... 24 3.1. ASPECTOS GERAIS: PRINCÍPIOS X REGRAS: APLICAÇÃO ........................................................................................ 24 3.2. A FUNÇÃO DO PRINCÍPIO ............................................................................................................................... 25 3.3. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ............................................................................................................................. 26 3.4. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO .............................................................................................. 28 3.5. PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL ........................................................................................................... 30 3.6. PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO........................................................................................... 31 3.7. PRINCÍPIO DA COISA JULGADA ........................................................................................................................ 32 3.8. PRINCÍPIO DA INDEPENDÊNCIA DO JUIZ ............................................................................................................ 35 4. ASPECTOS DAS SÚMULAS VINCULANTES NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ............................................................................................................ 37 4.1. DIFERENÇA ENTRE SÚMULA VINCULANTE, SÚMULA COMUM E LEI ..........................................................................37 4.2. LEI 11.417 – REGULAMENTA A SÚMULA VINCULANTE: EDIÇÃO, REVISÃO E CANCELAMENTO ..................................... 38 4.3. APLICAÇÃO DO INSTITUTO E CONSEQUÊNCIAS ................................................................................................... 40 4.4. ANÁLISE GERAL DAS MATÉRIAS SUMULADAS ..................................................................................................... 42 4.4.1. Análise cronológica da utilização do instituto .......................................................................... 42 4.4.2. Análise por matéria.................................................................................................................. 42 4.4.3. Análise da eficácia por cancelamento ou revisão ..................................................................... 43 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 44 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 46 ANEXOS ................................................................................................................... 54 ANEXO A ................................................................................................................................................................ 55 11 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho visa demonstrar a inconstitucionalidade do instituto da súmula vinculante no Brasil, instituído pela Emenda Constitucional nº 45 de 2004 e posteriormente regulamentada pela Lei 11.417/2006. Diz-se inconstitucional porque, como se verá ao longo do trabalho, o Brasil adotou o sistema civil law em seu ordenamento jurídico juspositivista, guiando- se, sobretudo, pelo princípio da legalidade em todos os seus aspectos e, por esse motivo, a edição sumular contraria toda a sua essência e sua estrutura, quedando- se, assim, inconstitucional. Além da oposição ao princípio da legalidade, a súmula vinculante no Brasil afronta a tripartição dos poderes e as atribuições de cada um deles, porquanto ao judiciário não é atribuída função legislativa, ao contrario, lhe é designada a função de aplicar e garantir o cumprimento da lei originada nos demais poderes, apenas. Isso demonstra que a Emenda Constitucional que implementou a súmula vinculante extrapolou os limites constitucionais e ensejou determinada espécie de ativismo judicial. Em suma, o ativismo judicial é produto da mora e da omissão do Poder Legislativo e se concretiza na postura proativa do magistrado na busca da efetivação de determinado valor diante de uma matéria submetida a seu julgamento; Consequentemente é perfeitamente possível sua prática no instituto da súmula vinculante. Sabe-se que direito é fato social, e como fato social está em constante mutação. Essa mutação é sentida principalmente pelo juiz de primeiro grau pois é aquele que analisa os fatos ainda sem interferência da justiça, fatos não lapidados (ou deturpados) pelas decisões, aqueles fatos reais. Assim, é o juiz de primeiro grau que tem condições de tomar providencias puras capazes de garantir a formação de seu convencimento, conforme o artigo 371 do Novo Código de Processo Civil; contudo frente ao instituto sumular vinculativo, que torna cogente determinado entendimento, esse juiz perde as prerrogativas do seu exercício de convencimento, expressado pelo princípio da independência do juiz, e se torna aplicador e replicador de decisões verticalizadas, o que ataca diretamente o Estado Democrático de Direito. 12 Nesse sentido, percebe-se que a súmula vinculante é capaz de afetar princípios primordiais da relação jurídica como, por exemplo, a inafastabilidade da jurisdição, o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório, a coisa julgada, entre outros. Com efeito, o instituto em tela é praticado, essencialmente, pelo sistema common law que não compõe originalmente o ordenamento jurídico brasileiro. Contudo, embora se saiba que os costumes e os precedentes se constituem como fontes do direito, se fazendo imprescindível para a evolução da norma, sabe-se que essa norma deve ter origem no Poder Legislativo, e não no Poder Judiciário. De outro modo, sabe-se que a súmula vinculante foi criada para garantir agilidade e segurança jurídica ao judiciário, por isso, considerando esse aspecto, será analisado, no presente trabalho, o perfil da prática do instituto, para verificação de sua eficiência, tomando por base a frequência de sua edição, revogação e as matérias reguladas. 13 2. ESTRUTURA DO ORDENAMENTO JURÍDICO 2.1. Perfil da Constituição da República Federativa do Brasil Primeiramente, cabe dizer que a Constituição Federal brasileira é composta por um texto formal e escrito; é dogmática pois elaborada pelo Poder Constituinte; é promulgada pois deriva do trabalho do Poder Constituinte, que é composto pelo povo; é de conteúdo analítico, uma vez que comporta todos os assuntos que se entendeu relevante para sua formação, isto é, além das normas gerais (MORAES, 2012, p. 8-11). Além disso, a Carta Magna do Brasil é caracterizada por sua estabilidade rígida, só podendo ser alterada através de emenda constitucional atendendo os requisitos do artigo 60 da CF, como se verá adiante. 2.2. Jusnaturalismo e Juspositivismo Os termos jusnaturalismo e juspositivismo são empregados para exprimir as formas de existência da norma jurídica e seu estudo é datado desde o século V a.C, como se verá adiante. O direito natural é aquele que tem em toda parte a mesma eficácia (o filósofo [Aristóteles] emprega o exemplo do fogo que queima em qualquer parte), enquanto o direito positivo tem eficácia apenas nas comunidades políticas singulares em que e posto. (BOBBIO, 2006, p. 17). O jusnaturalismo, ou direito natural, compreende diversos entendimentos, dentre eles o de justiça divina, justiça da natureza, realidade pessoal e realidade além da vontade dos particulares, a qual todos estão submetidos, independente da vontade de alguém. (BITTAR, 2009, p. 26). Sendo o jusnaturalismo espontâneo, Aristóteles o identifica na educação familiar, que é dada aos filhos, praticada por eles durante a vida e reproduzida de geração em geração, como tradição familiar. Observe que o que se considera nesse exemplo não é o teor da educação, mas sim a repetição dos ensinamentos por força da tradição familiar (BOBBIO, 2006, p. 16). Cícero, filosofo grego, por sua vez, define jusnaturalismo como sendo uma lei verdadeira, cuja instituição divina não se possa ab-rogar nem permitir 14 derrogar, pois sendo imutável, será lei única e eterna, para todas as nações em todos os tempos (CAVALIERI, 2010, p. 19). O Juspositivismo, contudo, representa o sistema escrito de normas de direito, não importando se suas origens são estas ou aquelas, mas sim como é, uma vez sancionada (BOBBIO, 2006, p. 16). Assim, uma vez sancionada, determinada norma passa a ser de observância obrigatória, sendo que seu descumprimento possui sanção respectiva. Nessa seara, Aulo Gelio, aproximadamente aos 130 d.C. referiu-se ao jusnaturalismo como algo sem interferência do homem, enquanto que o juspositivismo como o que é ou por convenção de todos ou por ditado pelo homem. Mais tarde, Julius Paulus “Prudentíssimus”, mais conhecido como Paulo, conceituou os direitos aqui tratados como sendo o primeiro universal e moral, e o segundo, nomeado por ele como direito civil, aquele cujas coisas e atos regulados são necessariamente uteis, presos no tempo e no espaço (BOBBIO, 2010, p.19). Em 1.273, São Tomás de Aquino, por sua vez, criou duas possibilidades da formação do direito positivo, sendo a primeira por conclusão, determinada pela indução do raciocínio logico, ou seja, que se utiliza do silogismo para explicar a razão de ser; e a segunda que parte da observação darealidade genérica e busca a especificidade da aplicação objetiva, por exemplo, onde existe crime (realidade genérica) deve haver sanção (especificidade) (BOBBIO, 2010, p. 20). O estudo desses institutos demonstrou que, ao contrario do que se tentou demonstrar durante muitos anos, o jusnaturalismo e o juspositivismo são complementares, haja vista que o segundo decorre do primeiro, isto é, só haverá norma positivada, se houver direito natural a ser tutelado, por exemplo o direito à vida (GUSMÃO, 2012, p. 53). Ainda sobre o juspositivismo, uma das ideias supremas regidas por esse instituto é a legalidade, responsável por obrigar o individuo a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, somente se determinado comando estiver disposto em lei escrita, não questionável, e sim imposta, ideia contida no Artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal, in verbis: Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; 15 2.3. Common law e Civil law O common law e o civil law são dois sistemas jurídicos distintos, sendo o primeiro criado pelos próprios juízes e o segundo criado pelo Estado. Surgido na Inglaterra, o common law significa direito comum e é definido como o conjunto de decisões judiciais baseadas na tradição, no costume e na continuidade, sendo que os julgados atuais fazem precedentes para o futuro e constituem fontes de direito (WAMBIER, 2009, p. 54). O common law não foi sempre como é hoje, mas a sua principal característica sempre esteve presente: casos concretos são considerados fonte do direito. O direito inglês, berço de todos os sistemas de common law, nasceu e se desenvolveu de um modo que pode ser qualificado como “natural”: os casos iam surgindo, iam sendo decididos. Quando surgiam casos iguais ou semelhantes, a decisão tomada antes era repetida para o novo caso. Mais ou menos como se dava no direito romano. (WAMBIER, 2009, p. 54) Paolo Grossi exalta o sistema common law, dizendo que se o direito é coisa de jurista, então é jurista que deve fixá-lo e exprimi-lo, pois, na sua opinião, isso garante o desenvolvimento da justiça em relação às necessidades sociais (GROSSI, 2006, p. 55-56). No entanto, por Bobbio, Jeremy Bentham, jurista e filósofo inglês, critica o common law indicando 5 defeitos, sendo eles 1) a incerteza e a insegurança jurídica de saber se determinado ato é ou não ilícito e se caso ilícito, qual será a sanção correspondente; 2) retroatividade do direito comum, isto é, se determinado caso não puder ser decidido utilizando-se os precedentes, criar-se-á um novo precedente que surtirá, então, efeito retroativo; Quando o juiz cria um novo precedente, a saber, quando, achando-se diante de um caso que não pode ser resolvido com base numa norma deduzível das sentenças precedentes, resolve esse caso com uma norma que na realidade ele mesmo cria ex novo, tal norma tem eficácia retroativa, visto que é aplicada a um comportamento que foi assumido quando ela própria não existia ainda (BOBBIO, 2010, p. 98). 3) aplicação do princípio da utilidade, que deveria ser ausente nesse tipo de sistema. Disso entende-se que o princípio da utilidade (o que é mais útil, justo e 16 eficaz) entra em conflito com o princípio da imparcialidade que deve ter o juiz; 4) o quarto defeito apontado por Bentham, está na possível falta de competência do juiz para criar determinado precedente; 5) Falta de controle do povo, isto é, não há mecanismos de controle de abuso de poder a ser exercido pelo povo (BOBBIO, 2010, p. 97-99). Como se nota, Bentham critica o sistema common law comparando-o ao civil law, que é, segundo Thomas Hobbes, o poder exclusivo do soberano de pôr o direito, onde esse monopólio do Estado é imprescindível para assegurar seu poder absoluto (BOBBIO, 2010, p. 34). Para Hobbes, o civil law pressupõe a existência de duas características, quais sejam, o formalismo e o imperativismo. O formalismo se refere a autoridade de estabelecer a norma e o imperativismo é o comando que diz o certo e o errado. O civil law pode ser identificado sobretudo nos sistemas jurídicos dispostos em ordenamentos (códigos), já que possui estruturação e sistematização de assuntos e temas, pressupõe a hierarquia entre os textos legais e também a exigência de procedimentos formais para alteração dos mesmos. 2.4. Acepções do termo “constituição” Em sentido geral, o termo “constituição” compreende o modo de composição ou a estrutura de alguma coisa ou objeto (NETO, 1999, p. 16). No dicionário comum a palavra “constituição”, além do significado acima, também corresponde a “Lei fundamental num Estado, que contem normas de formação dos poderes públicos, direitos e deveres dos cidadãos” (AURÉLIO, 2010, p. 192). Contudo, no dicionário jurídico, o termo “constituição” se apresenta mais aprofundado representando o conjunto de regras e preceitos essenciais, criados a partir da soberania de determinado povo que objetiva a organização política e a concretização dos diretos e deveres de cada indivíduo (SILVA, 2012, p. 164). Como se vê, o mero estudo do termo não é capaz de satisfazer a compreensão do que vem a ser a constituição de um país, pois cada autor, como se verá adiante, faz uma tomada diferente do tema propondo ao longo dos anos diferentes entendimentos e abordagens. São diversas as acepções do termo “constituição”, passando por setores sociológicos, filosóficos, políticos, até alcançar o jurídico. LASSALE, em sua 17 empreitada sociológica sobre o tema, diz que Constituição é o registro em linguagem escrita da “soma dos fatores reais de poder”, que ao obter a forma escrita, deixam de ser simples fatores reais, assumindo a posição de instituição jurídica obrigatória, que, por sua vez, para ter validade, deve estar ajustada à realidade da sociedade, pois se assim não estiver, correrá o risco de ser apenas uma folha de papel. (LASSALE, 2002, p. 68). De nada serve o que se escreve numa folha de papel se não se ajusta à realidade, aos fatores reais e efetivos do poder. (LASSALE, 2002, p. 68). Contrapondo-se à ideia de Lassale, surge Carl Schmitt para o qual a Constituição é ato de um poder soberano, que dita a ordem social, política e jurídica, mas não se torna absoluta por isso, porquanto não surge de si mesma, e sim da vontade política daquele que a dá (NETO, 1999, p. 19). A essência da Constituição não está contida numa lei ou numa norma. No fundo de toda normatização reside uma decisão política do titular do poder constituinte, quer dizer, do Povo na Democracia e do Monarca na Monarquia autêntica. (SCHMITT, 1932, p.27). Quando Carl Schmitt identifica que na verdade a Constituição se dá pela vontade política, este remonta a ideia apresentada por Platão, na obra “A República”, onde seu personagem Trasímaco traz que justiça é relativa e que depende do mais forte e do mais poderoso, (apud CLARET, 2000, p. 16); Nota-se que da fala de Trasímaco pode-se extrair a ideia de Estado Soberano, aquele que concentra a vontade política e o jus persequendi e o jus puniendi, que detém o poder de tomar decisões em relações de terceiros, através da jurisdição, (LARAIA, 2008, p. 27). No mesmo período de Carl Schmitt, Hans Kelsen apresenta a Teoria Pura do Direito, que explica o ponto de partida do processo de criação do Direito Positivo, admitindo dois planos distintos: O primeiro plano jurídico-positivo que é a norma hipotética, pressuposta, invisível (norma constitucional) e o segundo plano, chamado logico-jurídico, que é a norma material e visível (norma infraconstitucional), que depende da validade do primeiro plano (NETO, 1999, p. 21). 18 (...) a norma fundamental é a instauração do fato fundamental da criação jurídica (...). Ela é o ponto de partida de um processo: do processo de criação do Direito positivo. Ela própria não é norma posta pelo costumeou pelo ato de um órgão jurídico, não é uma norma positiva, mas uma norma pressuposta (...) (NETO, 1999, p. 21). No Estado Democrático de Direito, a Constituição é formulada pelo Poder Constituinte responsável pela manifestação soberana da vontade política de um povo social e juridicamente organizado (MORAES, 2012, p. 24). A ideia de Poder Constituinte surgiu com as Constituições escritas, e haverá sempre um novo Poder Constituinte quando houver uma nova Constituição, independente de existir ou não outras anteriores. Segundo MELLO FILHO, a titularidade do Poder Constituinte é do povo, porem seu exercício é delegado a um órgão representante da vontade popular (MELLO FILHO, 1985, p. 14). Com efeito, a Carta Magna dispôs em seu artigo 60, §4º, II e IV, que não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir o voto direto, secreto, universal e periódico, pois são mecanismos que garantem o Estado Democrático, e impediu, também, a abolição ou alteração que prejudique os direitos e garantias individuais do Homem, fornecendo-lhes status de cláusula pétrea. 2.5. Da tripartição de poderes Estados Democráticos de Direito adotaram a tripartição de poderes em executivo, legislativo e judiciário, conforme a ideia apresentada por Montesquieu em sua obra “O Espirito das Leis”, visando controlar e limitar o poder estatal, conferindo autonomia, independência e harmonia entre as funções e instituições do Estado. Nesse tipo de Estado não há que se falar em supremacia de qualquer um dos Poderes em relação ao outro (SILVA, 2004). Ao desenvolver a teoria da separação dos poderes, Montesquieu buscou impedir que o julgador tivesse poder arbitrário sobre a vida dos indivíduos (que seria caso legislasse e julgasse ao mesmo tempo) ou tivesse a força de opressor (caso tivesse as atribuições do Poder Executivo). A tripartição dos poderes está associada ao Estado Democrático de Direito e o Brasil assim declarado no Art. 2º, da CF, inclusive com clausula pétrea de separação dos poderes, conforme ditames do Artigo 60, Parágrafo 4, inciso III, da 19 CF, possui os três poderes acima indicados. O Poder Executivo é encarregado de governar o povo e administrar os interesses públicos, bem como traçar diretrizes orçamentárias e projetos prioritários, rejeitar ou sancionar leis e editar medidas provisórias. Nesse último caso, o poder executivo exerce função legiferante autorizado pela Constituição Federal. Já o Poder Legislativo é responsável por, principalmente, formular, discutir e aprovar leis, fiscalizar os gastos de recursos públicos e a execução dos programas do Poder Executivo. Outras atribuições do poder legislativo é aprovar o Orçamento da União e cuidar das contas do presidente da República. Por fim, o Poder judiciário é incumbido de aplicar a lei e garantir o seu cumprimento por todos. 2.6. Da atividade legislativa no Brasil A Constituição Federal previu uma sequência de atos que devem ser observados pelos órgãos legislativos para a realização das espécies normativas previstas no artigo 59 da CF: Emenda à Constituição, lei complementar, lei ordinária, lei delegada, medida provisória, decreto legislativo e resolução. Alexandre de Moraes define processo legislativo como Juridicamente, o conjunto coordenado de disposições que disciplinam o procedimento a ser obedecido pelos órgãos competentes na produção de leis e atos normativos que derivam diretamente da própria constituição, enquanto sociologicamente, o conjunto de fatores reais que impulsionam e direcionam os legisladores a exercitarem suas tarefas (MORAES, 2012, p. 671). A não observância dos atos procedimentais para elaboração legislativa acarreta a inconstitucionalidade formal da lei ou do ato normativo, possibilitando pleno controle de constitucionalidade tanto pelo método difuso como pelo concentrado (MORAES, 2012, p. 671). Ainda segundo Alexandre de Moraes, o respeito ao devido processo legislativo é imprescindível para a consagração do princípio da legalidade, porquanto o Estado somente pode exigir do povo o cumprimento de uma norma se ela estiver em consonância com a Carta Magna (MORAES, 2012, p. 672). Sabe-se que a atividade legislativa erga omnes no Brasil é desempenhada, mormente, pelo Poder Legislativo, mas existem hipóteses que 20 permitem a produção normativa por órgãos de outros poderes, como por exemplo a Medida Provisória e decretos autônomos, pelo Executivo. 2.7. Ativismo judicial Note-se que ao longo do presente trabalho se falou sobre a atividade legislativa do poder legislativo e do poder executivo, mas não se falou sobre o poder judiciário na função legislativa. Isto porque o judiciário tem função apenas de aplicador da norma e para isso deve utilizar os mecanismos de interpretação oferecidos pela própria lei e pela prática doutrinaria. É importante frisar, a título de adendo, que embora a afirmação acima seja correta, é admitida atividade legiferante do judiciário apenas para regimentos internos e para atos do Conselho Nacional de Justiça, que, por sua vez, não alcançam todos os indivíduos, ou seja, não é erga omnes, por isso será desconsiderada neste trabalho. Voltando à função típica do poder judiciário no Brasil, tem-se que em decorrência do juspositivismo e do civil law, seus membros não poderiam inovar pela criação de conteúdo normativo, mas somente pela interpretação do existente, no entanto, a inovação é frequente. A inovação legislativa feita pelo poder judiciário recebe o nome de ativismo judicial que, segundo Marshall, é a recusa dos Tribunais em se manterem nos limites impostos pelo legislativo (VALE, 2015). Por outro lado, Ran Hirschl entende que o ativismo judicial é a transferência progressiva dos poderes do legislativo para o judiciário, de modo a reger as transformações sociais que tendem a formar grupos privilegiados em detrimento de outros (VALE, 2015). Segundo Uadi Lamegos Bulos, “ativismo judicial é o ato em que os juízes criam pautas legislativas de comportamento, como se fossem próprios membros do Poder Legislativo”. O referido doutrinador explica ainda que sua prática torna o judiciário descomedido, afastando o magistrado da função jurisdicional, passando a atuar de maneira contrária às normas constitucionais. (BULOS, 2014) No entanto, mais moderado, Luís Roberto Barroso considera que: A ideia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização de valores e fins 21 constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes. (BARROSO, 2013, p. 357). Flavio Gomes distingue duas espécies de ativismo judicial: o inovador, onde o juiz cria a norma ou o direito, e o revelador no qual o juiz complementa o entendimento de uma norma por agregação de princípio ou valor. Essas espécies ocorrem no caso concreto, aferidas conforme o teor da súmula e da matéria (GOMES, 2009). Em suma, o ativismo judicial é produto da mora e omissão do Poder Legislativo e se concretiza na postura proativa do magistrado na busca da efetivação de determinado valor diante de uma matéria submetida a seu julgamento. 2.7.1. A súmula vinculante na Constituição Federal O ativismo judicial desempenhado pelo magistrado é pautado na inovação e no extrapolamento de suas funções, principalmente quando a decisão inovadora passa a ter efeitos além de determinado processo judicial, passando a constituir fonte normativa protagonizada pelo instituto da súmula vinculante. A súmula vinculante foi instituída no ordenamento jurídico brasileiro pela Emenda Constitucional nº 45 de 2004, que acrescentou o artigo 103-A à Constituição Federal de 1988, e tem o objetivo de consolidar e pacificar a jurisprudência em relação a determinada matéria. Do latim, summula significa sumário ou índice de alguma coisa, e de acordocom De Plácido e Silva, súmula seria algo “que de modo abreviado explica o teor ou o conteúdo integral de alguma coisa” (SILVA, 2012, p. 558). Ainda sobre a definição do termo “súmula”, Evandro Lins e Silva bem explica tanto o termo, como sua origem. Súmula foi a expressão de que se valeu Victor Nunes Leal, nos idos de 1963, para definir, em pequenos enunciados, o que o Supremo Tribunal Federal, onde era um dos seus maiores ministros, vinha decidindo de modo reiterado acerca de temas que se repetiam amiudadamente em seus julgamentos (SILVA, 1998, p. 34). 22 A súmula vinculante é de edição exclusiva do Supremo Tribunal Federal e, após ser promulgada pelo Supremo, todos os tribunais inferiores são obrigados a seguirem tal entendimento. Miguel Reale explica que súmulas [...] são como que uma sistematização de prejulgados, ou, numa imagem talvez expressiva, “o horizonte da jurisprudência”, que se afasta ou se alarga à medida que se aprimoram as contribuições da Ciência Jurídica, os valores da doutrina, sem falar, é claro, nas mudanças resultantes de novas elaborações do processo legislativo. (REALE, 2004, p. 175) Já conforme José Rocha súmula vinculante é “uma norma geral, provavelmente, a mais geral do ordenamento brasileiro, pois obriga a todos os membros do Poder Judiciário, das administrações públicas das três esferas de governo e, por extensão, a toda sociedade brasileira”. (ROCHA, 2009, p. 19). Em outro sentido, porém, Carmem Lucia Antunes, atual ministra presidente do STF, teceu críticas à época do projeto da Emenda Constitucional que implementou a súmula vinculante no ordenamento jurídico brasileiro, alertando para a função paralegal do instituto com força de norma constitucional, e pior ainda, seu efeito reformador emprestado pelo ativismo judicial, in verbis: O objeto, pois, do pronunciamento do Supremo Tribunal Federal é exatamente a matéria constitucional. Como a súmula terá, na fórmula proposta, vinculatividade, obrigatoriedade e definitividade, ela não terá, quando editada pelo STF, “força de lei”, mas “força de norma constitucional” (...) somente modificável pelo Poder Legislativo por emenda constitucional. O Supremo Tribunal Federal estaria transformado em verdadeiro “poder constituinte de segundo grau”, ou “poder constituinte reformador”. E completa (...) O cidadão não terá como participar, direta ou indiretamente, da elaboração da norma contida na súmula [vinculante], vendo-se marginal do processo de sua formação e positivação, e sendo-lhe retirado, assim, um dos direitos fundamentais, qual seja, o de poder vir a participar diretamente, até, pela iniciativa popular, do processo de sua elaboração. Assim, segundo a ministra, se no Estado Democrático de Direito (art. 1º, CF) todo poder emana do povo (art. 1º, Parágrafo Único, CF) através do sufrágio do voto direto (art. 14, CF), que expressa a vontade soberana popular para eleger o Poder Legislativo (art. 44, CF), responsável por discutir e aprovar leis (art. 59, CF), a 23 súmula vinculante editada pela Máxima Corte do país, subtrai do povo um de seus direitos fundamentais que é a representatividade na formulação de leis, inclusive pelo fato de o instituto em voga não permitir a iniciativa popular no processo de elaboração. Esse e outros aspectos da súmula vinculante serão tratados no capítulo 4. 24 3. PRINCÍPIOS DO DIREITO DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO O presente trabalho tece a relação da súmula vinculante com os princípios constitucionais a partir da análise crítica de sua inconstitucionalidade formal frente ao ordenamento jurídico. Tratando o trabalho dessa relação com os princípios cabe definir alguns conceitos importantes para entendimento e leitura do que aqui se busca. Para tanto, segue breve reflexão do que vem a ser e a diferença de princípios e regras do direito no ordenamento jurídico brasileiro. 3.1. Aspectos gerais: princípios X regras: aplicação Primeiramente cumpre destacar que ambos são fontes de direito, contudo configuram modos distintos de aplicação. As regras, segundo Canotilho, são normas que prescrevem imperativamente uma exigência, isto é, ou permitem ou proíbem algo (CANOTILHO,1997) Para Dworkin (apud JUDICE, 2007), filósofo do direito americano, as regras são aplicáveis à maneira do tudo-ou-nada, pois ou é aplicada integralmente no caso concreto, e então é válida, ou é indiferente e em nada contribui para a decisão, e por isso é inválida para aquele caso concreto. Quando duas regras colidem, uma afasta a aplicação da outra por meio da subsunção, por exemplo, a lei especial derroga a lei geral, a lei posterior afasta a anterior, etc. ((apud JUDICE, 2007). Já princípios, para o aludido autor, são padrões que devem ser observados pois são dotados de valor econômico, político e social que idealizam uma situação específica para exigir justiça, equidade ou qualquer dimensão de moralidade. Ainda segundo Dworkin (apud JUDICE, 2007), princípios são abstratos e determinam padrões gerais a serem seguidos (JUDICE, 2007). Entretanto, quando ocorre colisão de princípios, é necessário ponderar a força relativa de cada um deles, tomando um em maior consideração, sem abandonar ou invalidar o outro (LARAIA, 2009, p. 16). Tangendo a essa ideia, Roberty Alexy (apud JUDICE, 2007), filósofo do direito alemão, aponta que princípios são como “mandados de otimização”, que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível atentando-se para as possibilidades jurídicas e fáticas do caso (JUDICE, 2007). No entanto, de acordo com o inglês Herbert Hart, filósofo do direito, princípios e regras se distinguem por dois aspectos. O primeiro deles é uma questão 25 de grau, onde os princípios são mais extensos e gerais e menos específicos que as regas. O segundo deles é que os princípios estabelecem certo objetivo, finalidade ou valor, e partindo de certo ponto de vista concluir-se-á se desejável mantê-los simplesmente por mantê-los ou aderi-los por majoração de sua aplicação (LARAIA, 2009, p. 17). Os princípios, conforme Laraia, não são criados e sim identificados pelos juristas nos fatos econômicos, sociais, políticos e jurídicos, e por isso não estão sujeitos a regras de validação e reconhecimento, pois são “natos”. Nesse sentido Pontes de Miranda leciona: Ninguém deve improvisar princípios jurídicos, como ninguém pode fazer regras econômicas, políticas ou morais. É com tijolo que se constroem casas, e não com palavras. É das realidades que se tiram os princípios, de modo que entre as leis e eles pode haver paralelismo e a ineficácia daquelas será proporcional à discordância entre uns e outros (MIRANDA, 2005, p. 232-233). Por fim, Bertoncini ao interpretar Canotilho conclui que se o ordenamento jurídico fosse formado isoladamente por regras ou princípios haveriam problemas, já que a contribuição de cada um é imprescindível ao equilíbrio da dinâmica do judiciário, in verbis: Um sistema só de regras geraria um ordenamento rígido e fechado, exigindo uma quantidade absurda de comandos para atender às necessidades naturalmente dinâmicas da sociedade. Por sua vez, um ordenamento jurídico exclusivamente principiológico produziria insegurança, haja vista o elevado grau de abstração dos princípios, voltados de modo secundário à prescrição de comportamentos. (BERTONCINI, 2002, p.78) 3.2. A função do princípio Os princípios do direito atuam de diferentes maneiras no ordenamento jurídico e o autor Sergio Sérvulo da Cunha anota seis funções: a) gerar normas (função nomogenética); b) orientar a interpretação (função hermenêutica); d) inibir a eficácia de norma que os contrarie (função inibitória); d) suprir a falta de norma (função supletiva); e) regular o sistema (função de regulação do sistema); f) projetar o texto sobre a sociedade (função de projeção) (CUNHA, 2006, p. 191). 26Mais ampla e aceita é a interpretação do autor Carlos Henrique Bezerra Leite que leciona três funções, quais sejam a) informativa, aquela destinada ao legislador, oferece sugestões para formulação de novas normas jurídicas de acordo com os anseios da sociedade; b) interpretativa, destinada ao aplicador do direito, oferece significado e sentido às normas através de métodos de hermenêutica; c) normativa, também destinada ao aplicador do direito, atua de forma direta, por exemplo na derrogação de uma norma por um princípio (LEITE, 2014, p. 65), o princípio da norma mais favorável ao trabalhador (CF, art. 7º, caput), e de forma indireta, na aplicação do princípio da preclusão no âmbito processual (DELGADO, 2011, p. 198). Nota-se que os princípios possuem funções específicas no ordenamento jurídico e assim exercem papel fundamental em todos os âmbitos do direito. 3.3. Princípio da legalidade Constituição Federal – Artigo 5º, inciso II: ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. A noção de legalidade é compreendida de diversas maneiras e uma delas é a de que a forma e a matéria das leis infraconstitucionais devem seguir um mandamento constitucional, sabendo que isto só pode ser imposição de caráter constitucional ou supraconstitucional. O princípio aqui tratado visa combater o poder arbitrário do Estado, determinando que só por meio das espécies normativas em consonância com o devido processo legislativo constitucional é que se pode criar direitos e obrigações para indivíduo (MORAES, 2012, p. 41). Assim, o princípio da legalidade - presente nas Constituições brasileiras de 1824 (art. 179, inciso I), 1891 (art. 72, § 1º), 1934 (art. 113, 2)), 1946 (art. 141, § 2º), 1967 (art. 150, § 2º) e 1988 (art. 5º, inciso II - atual) - partindo da lei como primado soberano, cessa o privilegio da vontade caprichosa do déspota ou detentor do poder, transformando-se mais em garantia constitucional do que em direito individual, pois, embora não tutele especificamente um bem, ele assegura ao particular a prerrogativa de repelir as injunções impostas por outras vias que não seja a da lei (MORAES, 2012, p. 41). Em outras palavras, entende-se que a presença do princípio da legalidade como base do ordenamento jurídico é a garantia contra o arbítrio do Estado, pois 27 sua ausência implicaria a inexistência do Estado Democrático de Direito (TAVARES, 2012, p. 665). Como se vê, o princípio da legalidade é o ápice do Estado Democrático de Direito, pois quando retirada a ideia de Estado como editor do ordenamento jurídico, ainda resta a soberania da vontade popular do qual emana o poder daquele para editar, fornecendo à legislação, em qualquer caso, legitimidade suficiente para ser respeitada e obedecida. Nas palavras de André Ramos Tavares: É regra que aponta a presença de um Estado de Direito, pois, retirando o arbítrio do Estado, exige-se que sua conduta esteja amoldada à lei, como expressão da vontade geral (TAVARES, 2012, p. 664). O princípio da legalidade na Constituição Federal brasileira de 1988 está expresso nos seguintes dispositivos: TABELA 1: PRINCÍPIO DA LEGALIDADE NO BRASIL Dispositivo Matéria Comando textual Art. 5º, Inciso II, CF Constitucional / civil "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei" Art. 5º, Inciso XXXIX, CF Constitucional / penal "não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal" Art. 150, Inciso I, CF Constitucional / tributário É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: "exigir ou amentar tributo sem lei que o estabeleça" Art. 37, Caput, CF Constitucional / administrativo "a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência" Fonte: autora (2017). Importante notar que a expressão “será obrigado” do artigo 5º, inciso II da CF, abrange, além de obrigações, direitos, porquanto não há obrigação sem direito correlato, uma vez que o gozo de um direito próprio subtende o dever de respeitar o gozo do mesmo direito pelo outro indivíduo. Nas palavras de André Ramos Tavares “não há, pois, direito sem dever correlato” (TAVARES, 2012, p. 667). Aqui a ideia de 28 legalidade deixa o campo puramente formal e avança sobre a ideia de justiça proporcionada pela ordem constitucional, de modo que corresponda aos seus valores e mandamentos. A exigência da legalidade, por sua vez, ampara-se em dois aspectos. O primeiro corresponde à lei posta, pela ótica de sua formalidade. O segundo corresponde ao comando propriamente dito, impondo que não se crie direito ou dever sem amparo legal, isto é, se não há lei, não há suporte para qualquer exigência ou benefício público (TAVARES, 2012, p. 668). Segundo Alexandre de Moraes há motivos para que ocorra o monopólio da atividade legislativa pelo Parlamento, sendo três: i) trata-se de sede institucional dos debates políticos, ii) caixa de ressonância para efeito de informação e mobilização da opinião pública, iii) órgão que por ser eleito democraticamente torna a lei não apenas expressão dos sentimentos dominantes em determinado setor social, mas sim a vontade resultante da síntese de posições antagônicas e pluralistas da sociedade (MORAES, 2012, p. 42). O princípio da legalidade está estreitamente relacionado com o devido processo legislativo, que é aquele que estipula e cumpre os ritos e as fases procedimentais da edição de uma lei (discussão, votação bicameral, sanção ou veto) obedecendo a ordem constitucional sobre o assunto. Além disso, deve-se atentar para a competência da matéria tratada na lei constitucional e infraconstitucional, uma vez que é ao Poder Legislativo compete uma parte das matérias e ao Presidente da República outras matérias, via decreto, medida provisória e regulamento para a fiel execução da lei (TAVARES, 2012, p. 667). 3.4. Princípio da Inafastabilidade da jurisdição Constituição Federal - Artigo 5º, inciso XXXV: a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; Conforme ensina Sylvio Motta e Gustavo Barchet, o princípio da inafastabilidade da jurisdição consagra-se como verdadeiro alicerce do Estado de Direito da sociedade civilizada e democrática, pois o Estado que chama para si o 29 monopólio da justiça, evita a autotutela1 indiscriminada do barbarismo. Além disso, a inafastabilidade da jurisdição é regra que submete ao Poder Judiciário todo e qualquer conflito de interesse juridicamente relevante, para que seja julgado sob o ângulo imparcial do juiz. (MOTTA e BARCHET, 2007, p. 207). O aludido princípio é destinado ao legislador e dispõe que o mesmo não deve tentar impedir o exercício do acesso à justiça pelo indivíduo que se ache em situação de lesão ou ameaça a direito. Nas palavras de Nelson Nery Jr.: Nisso reside a essência do princípio: o jurisdicionado tem o direito de obter do Poder Judiciário a tutela jurisdicional adequada. A lei infraconstitucional que impedir a concessão da tutela adequada será ofensiva ao princípio constitucional do direito de ação. [...] todo e qualquer expediente destinado a dificultar ou mesmo impedir que a parte exerça sua defesa no processo civil atenta contra o princípio da ação e, por isso, deve ser rechaçado (NERY JR., 2004, p. 133 – 138). O princípio da inafastabilidade da jurisdição no ordenamento jurídico brasileiro carrega consigo algumas prerrogativas próprias, como por exemplo, o fato de não ser admitido no Brasil o contencioso administrativo, sendo que apenas o Poder Judiciário tem competência para decidir com força definitiva, fazendo coisa julgada. Em outras palavras, aindaque o litigio tenha sido iniciado na esfera administrativa onde a decisão tenha sido desfavorável, o litigante insatisfeito poderá submeter a demanda à tutela jurisdicional, pois só assim será feita a decisão irreformável e definitiva, desvinculada da esfera administrativa (MOTTA e BARCHET, 2007, p. 207). O princípio em voga assume também outras abrangências e veda a cobrança de valores exagerados a título de custas e emolumentos judiciais, de modo a não constituir impedimento ou dificuldade de acesso ao judiciário para o indivíduo menos favorecido economicamente. Em outro aspecto, a inafastabilidade da jurisdição não significa, contudo, assegurar o duplo grau de jurisdição, porquanto se sabe que o processo de competência originária do STF não é submetido a reexame. Ainda nesse sentido, é pacífico na doutrina o fato de que não é toda e qualquer matéria que pode ser apreciada pelo judiciário, uma vez que a tripartição de poderes 1 Não obstante, a legislação permite a autotutela em casos de legítima defesa, estado de necessidade, desforço pessoal em esbulho possessório, penhor legal, entre outros (MOTTA e BARCHET, 2007, p. 207). 30 fornece ao senado federal, órgão do Poder Legislativo, por exemplo, a legitimidade para julgar o presidente da república em processo de impeachment (MOTTA e BARCHET, 2007, p. 208). No que tange ao instituto da súmula vinculante, o princípio da inafastabilidade da jurisdição é passível de ser violado caso o STF edite uma súmula sobre determinada matéria a que algum litigante proponha ação em sentido contrário, o juiz de primeira instancia deverá indeferir a petição inicial sob a alegação de falta de condição de ação, isto é, pedido juridicamente impossível. Assim decorre a ideia de que o presente instituto afronta o princípio consagrado na Carta Magna, porquanto está condicionando a apreciação pelo judiciário da lesão ou ameaça a direito, violando, consequentemente, o artigo 60, §4º, IV, da CF, que fez clausula pétrea dos direitos e das garantias individuais. 3.5. Princípio do devido processo legal Constituição Federal - Artigo 5º, inciso LIV: ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; O princípio do devido processo legal em verdade expressa um direito, por isso pode ser enquadrado na função normativa indireta que se deve ao fato de seu comando ser literal. Esse princípio consta em Constituições de vários países, inclusive na Declaração Universal dos Direitos do Homem. No Brasil foi expresso inauguralmente na Constituição Federal de 1988 no artigo 5º, inciso LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. O devido processo legal compreende vários aspectos jurídico-formais. O primeiro a se observar é a garantia concedida à parte em utilizar todos os meios jurídicos existentes para buscar a satisfação de seu pretendido direito. Em determinado momento o princípio do devido processo legal se funde com o do contraditório, pois como se nota, utilizar todos os meios jurídicos existentes para demonstrar o direito é, senão, o próprio contraditório (TAVARES, 2012, p. 741). Outrossim o devido processo legal também abrange a noção da plenitude de defesa, que significa direito à defesa técnica, à publicidade da decisão, à citação, à produção ampla de provas, ao juiz natural, aos recursos legais e constitucionais, à decisão imutável, à revisão criminal, ao duplo grau de jurisdição. Nesse sentido 31 também é compreendida a ideia da ampla defesa, pois o processo realizado em consonância dos ritos processuais, por consequência alcança a ampla defesa. De outro modo, no aspecto material, o referido princípio compreende a noção de proporcionalidade no tocante à vida, à liberdade e à propriedade (TAVARES, 2012, p. 741). Ainda sobre o devido processo legal, André Tavares cita Guilherme Amorim Campos da Silva dizendo que a Emenda Constitucional nº 45/2004 que acrescentou o inciso LXXVIII “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”, apresentou certa repetição, pois o inciso anterior (LIV) é aberto em relação ao tipo de processo, abrangendo, portanto administrativo e judicial, além disso, o que diz respeito à razoável duração e à celeridade, entende-se que o processo deve ser rápido o suficiente para socorrer o jurisdicionado e lento o suficiente a garantir a produção de provas, ampla defesa e contraditório, ideias também captadas pelo inciso anterior (TAVARES, 2012, p. 743). Das lições acima, conclui-se que ordenamento jurídico brasileiro, na crítica de Guilherme Amorim Campos da Silva, resultou no “paradoxo da dispersão de enfoques”, onde se cria normas programáticas pensando suprir a crise da sobrecarga do judiciário, que não passam de promessas vãs (TAVARES, 2012, p. 744). Com efeito, em relação ao instituto da súmula vinculante, o princípio do devido processo legal recebe afronta pois, nas lições de José Anchieta da Silva o texto constitucional homenageia o cidadão com a garantia do devido processo legal, no entanto, em relação ao cidadão comum, o que não é parte, adotando-se a súmula, não haverá qualquer processo. Haverá apenas uma decisão impedindo o ingresso na jurisdição. Os cidadãos sobre cujas cabeças recairá o tal efeito vinculante estarão reduzidos a meros figurantes (apud GOMES, 2009). 3.6. Princípio da ampla defesa e do contraditório Constituição Federal - Artigo 5º, inciso LV: aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; O princípio da ampla defesa é responsável por garantir à parte condições de levar ao processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade, bem 32 como o direito de calar-se ou omitir-se, caso entenda necessário (MORAES, 2012, p. 111). Já o princípio do contraditório é exteriorização da ampla defesa, porquanto permite à outra parte reagir à ação da primeira, isto é, nas palavras de Alexandre de Moraes: “a todo ato produzido pela acusação caberá igual direito da defesa de opor- se-lhe ou de dar-lhe a versão que melhor lhe apresente, ou ainda, de fornecer uma interpretação jurídica diversa daquela feita pelo autor” (MORAES, 2012, p. 112). Sobre isso, Nelson Nery Junior diz: O princípio do contraditório, além de fundamentalmente constituir-se em manifestação do princípio do Estado de Direito, tem íntima ligação com o da igualdade das partes e o do direito de ação, pois o texto constitucional, ao garantir aos litigantes o contraditório e a ampla defesa, quer significar que tanto o direito de ação, quanto o direito de defesa são manifestação do princípio do contraditório. (NERY JR, 1995, p. 122). Entende-se, ainda, que enquanto o princípio do contraditório compreende o exercício do direito de ação, a ampla defesa é compreendida como o direito de defesa ampla e irrestrita, podendo-se afirmar, portanto, que na relação processual um depende do outro. De acordo com Nelson Nery Junior, os referidos princípios não são mera formalidade processual, posto que a não observância destes gera efeitos decisivos no processo, quer dizer, a não observância do contraditório acarreta nulidade de atos processuais gerando, assim como a não observância da ampla defesa, o cerceamento de defesa (NERY JR, 2004, p. 174.) Com efeito, impedir determinado ato ou recurso considerando que a sentença foi proferida de acordo com entendimento de súmula vinculante, é inviabilizar o contraditório e a ampla defesa, porquanto o esgotamento das vias judiciais deve se dar com o esgotamento de instancias (GOMES, 2009). 3.7. Princípio da coisa julgada Constituição Federal - Artigo 5º, inciso XXXVI: a lei não prejudicaráo direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada; Código de Processo Civil - Artigo 506. A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não prejudicando terceiros. 33 O princípio da coisa julgada em verdade é um instituto e se perfaz com a manifestação final e definitiva do princípio da inafastabilidade jurisdicional. Consiste na decisão judicial irrecorrível, quer porque intempestivo, quer em virtude de impossibilidade processual. A coisa julgada é responsável por fornecer ao processo e às partes segurança e estabilidade das decisões judiciais. Segundo Osmar Mendes Paixão Côrtes, o direito da coisa julgada compreende a certeza de que as relações jurídicas não podem ser alteradas sem previsão, pois isso as tornaria instáveis e inseguras quanto ao futuro, presente e até mesmo passado (CÔRTES, 2008, p. 28). É por esse motivo que o ordenamento jurídico brasileiro prevê no Código de Processo Civil de 2015: Art. 502. Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso; Art. 503. A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida; Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, [salvo exceções]; Art. 506. A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não prejudicando terceiros. Na Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (decreto-lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942): Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. A coisa julgada alcançada pela sentença ou acórdão transitado em julgado consolida a aplicação do direito ao caso concreto e estabiliza a relação entre as partes do processo, proporcionando que elas saibam qual a próxima providencia a se tomar. Vê-se, então, que a segurança jurídica formada no caso concreto possui força de lei com efeito para as partes. Pelos ensinamentos de Barbosa Moreira, apud Geila Lídia Diniz: 34 A segurança pode ser constatada por mais de um ângulo de expressão: para o vencedor, a certeza de que a sua situação é aquela definida na sentença e não outra qualquer, passando a ter o direito à observância do julgado; para o vencido, não obstante os efeitos psicológicos de ter sucumbido na demanda, a definição de que o seu interesse deve submeter-se ao de seu adversário, na exata proporção determinada na sentença, nem menos, nem mais; para a sociedade, a confiança na seriedade e eficiência da máquina judicial, capaz de resolver, em definitivo, os conflitos que lhes são submetidos; e, por fim, ao Estado, que fica desonerado da obrigação de repetir a mesma prestação jurisdicional quantas vezes lhe solicitar a parte irresignada (DINIZ, 2009, p. 27): A coisa julgada contém dois aspectos, sendo o primeiro formal, onde a decisão não aceita mais recurso, ou seja, transitou em julgado, e o segundo material, onde se considera o bem tutelado reconhecido ou denegado pela sentença irrecorrível. A Constituição Federal não especifica nem exclui nem um dos aspectos, portanto, interpreta-se a norma de forma ampla. Com efeito, o instituto da coisa julgada é muito relacionado com a irretroatividade de nova lei, atingindo, dessa forma, apenas o legislador como um dispositivo de vedação. Contudo, é preciso valer-se da hermenêutica constitucional, de modo a ampliar a interpretação da norma que impede que o Poder Judiciário vá contra a coisa julgada (LEITE, 2006, p. 159). No tocante ao instituto da súmula vinculante, o princípio da coisa julgada é violado no momento em que a decisão determinado processo alcança a forma de um enunciado genérico aplicável a casos semelhantes. Ou seja, a decisão que deve ter efeito inter partes, passa a ter efeito erga omnes, alcançando terceiros. Nas lições de José Anchieta (apud GOMES, 2009), o instituto da súmula vinculante é capaz de gerar a sentenciação maciça por intermédio da vinculação, promovendo a supressão de instancias. É impossível, em face desse direito fundamental, proferir-se decisão judicial cuja execução alcance quem não foi litigante, quem não teve a oportunidade de se defender, fazer prova, expor suas razões, discutir o fato e o Direito [...] (CUNHA, apud GOMES, 2009). 35 3.8. Princípio da independência do juiz O Poder Judiciário, ao contrário do Legislativo e Executivo, não é eleito por voto popular, mas sim pela presunção de conhecimento jurídico aferido em rigoroso concurso público ou no notório saber em sabatinas de Tribunais superiores. Dessa forma, o Judiciário está sujeito exclusivamente às leis oriundas dos órgãos legiferantes, voz da vontade popular, e expressa, nas decisões judiciais, as aspirações da sociedade (TOLEDO, 2005). Nas palavras de Lucia Toledo “os juízes se legitimam a cada processo, a cada decisão que proferem, na medida em que esse processo foi corretamente instruído e essa decisão foi legalmente prolatada” e ainda possuem função jurídico- politica, pois satisfazem de modo definitivo e irrevogável os interesses jurídicos da sociedade. Para isso é necessário que o juiz possua independência - assegurada pela Lei Orgânica de Magistratura Nacional, artigo 35, inciso I: “São deveres do magistrado: cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício” - de modo que assegure o Estado Democrático de Direito. O ministro Celso de Mello (apud GOMES, 2009) leciona que a independência do juiz para decidir com autonomia as controvérsias, se traduz na prerrogativa destinada a proteção da coletividade contra eventuais interferências ilegítimas do poder estatal. Tamanha a importância do princípio em voga, segue abaixo um breve apanhado das Constituições democráticas no mundo que o dispõe de forma expressa: TABELA 2: INDEPENDÊNCIA DO JUIZ NAS CONSTITUIÇÕES DO MUNDO País Dispositivo Comando textual Alemanha Art. 97 Os juízes são independentes e somente se submetem à lei Áustria Art. 87 Os juízes são independentes no exercício de suas funções judiciárias Dinamarca Art. 64 No exercício de suas funções os magistrados devem se conformar à lei 36 Espanha Art. 117 A justiça emana do povo e ela é administrada em nome do rei por juízes e magistrados que constituem o poder judiciário e são independentes, inamovíveis, responsáveis e submetidos exclusivamente ao império da lei França Art. 64 O presidente da República é garante da independência da autoridade judiciária. Ele é assistido pelo Conselho superior da magistratura. Uma lei orgânica traz estatuto dos magistrados. Os magistrados de carreira são inamovíveis Grécia Art. 87-2 A justiça é composta por tribunais constituídos de magistrados de carreira que possuem independência funcional e pessoal." (art. 87- 1) - “No exercício de suas funções, os magistrados são submetidos somente à Constituição e às leis; eles não são, em nenhum caso, obrigados a se submeter a disposições contrárias à Constituição. Irlanda Art. 35-2 Os juízes são independentes no exercício de suas funções judiciárias e submetidos somente à presente Constituição e à lei." Itália Art. 101 A justiça é exercida em nome do povo. Os juízes se submetem apenas à lei Portugal Art. 218-2 Os juízes não podem ser tidos por responsáveis de suas decisões, salvo exceções consignadas na lei Fonte: Autora (2017). O princípio da independência do juiz é afrontado pelo instituto da súmula vinculante, porquanto este segundo impõe ao magistrado que interpretação deve seguir e, pior ainda, que prova deve prevalecer no caso concreto. Embora restrinja a ação do magistrado apenas em casos regulados por súmula vinculante, nos casos que incide, o instituto fere o princípioda independência, sendo, portanto, nesse caso, inconstitucional na matéria (GOMES, 2009). 37 4. ASPECTOS DAS SÚMULAS VINCULANTES NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO 4.1. Diferença entre súmula vinculante, súmula comum e lei Inicialmente, cumpre esculpir, mesmo que brevemente, a definição de lei e sumula comum, nas palavras de Motta e Barchet A súmula não se confunde com a lei. A lei é ato que obriga, dotado de alto coeficiente de generalidade e abstração. A súmula, por sua vez, é uma interpretação que o Poder Judiciário dá à lei quando da sua aplicação em casos concretos. A lei tem caráter coercitivo. A súmula apenas denota-lhe o alcance, dando um significado mais concreto à abstração legal. A lei é legislativa porque, em regra, emana do Poder Legislativo. A súmula é judicial porque sempre emana do Poder Judiciário. A lei comporta várias formas de interpretações. A súmula jamais comporta interpretação analógica (Motta e Barchet, 2007, p. 762). Em sentido amplo, nas palavras de De Plácido e Silva, súmula É o que de modo abreviadíssimo explica o teor, ou o conteúdo integral de alguma coisa. Assim, a súmula de uma sentença, de um acórdão, é o resumo, ou da própria ementa da sentença ou do acórdão (SILVA, 2012, p. 558). No Brasil, o instituto sumular foi criado na década de 1960 pelo Supremo Tribunal Federal como forma de pacificação de sua jurisprudência, através da Comissão de Jurisprudência composta pelos Ministros Gonçalvez de Oliveira, Pedro Chaves e Victor Nunes Leal, sendo este último, como já mencionado no subtítulo 2.7.1. o mentor do instituto. Neste momento da história, o referido Tribunal alterou seu regimento interno para admitir e dispor a súmula, num processo de escolha dos temas, discussão técnico-jurídica, aprovação, publicação para conhecimento de todos e vigência. Marcelo Alves Dias de Souza ensina que a súmula comum foi monopolizada pelo STF até o surgimento do Código de Processo Civil de 1973, que passou a autorizar, em seu artigo 479, a edição de súmula pelos tribunais superiores (STJ, TSE e TST). Atualmente, o Código de Processo Civil de 2015 trata o tema nos seguintes dispositivos: Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê- la estável, íntegra e coerente. 38 § 1o Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante. § 2o Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação. A súmula comum possui mero efeito elucidativo e orientador, porquanto reflete a corrente majoritária do entendimento adotado pelos ministros dos tribunais superiores, não obrigando, todavia, o juiz a quo a decidir conforme aquele enunciado. A doutrina entende que essa espécie sumular funcionou, na prática, como bussola de precedentes, auxiliando o advogado na exaustiva pesquisa jurisprudencial (SOUZA, 2012). Entretanto, a súmula vinculante, como o próprio nome sugere, vincula e obriga o aplicador da norma a seguir determinado entendimento, conforme se verá a seguir. 4.2. Lei 11.417 – Regulamenta a súmula vinculante: edição, revisão e cancelamento A súmula vinculante é tratada pela Constituição Federal em seu artigo 103-A, in verbis: O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. Nos termos do artigo acima transcrito, a súmula vinculante deverá ser aprovada por maioria de 2/3 dos votos do Supremo Tribunal Federal (8 votos), devendo tratar sobre matéria constitucional que tenha sido objeto de decisões reiteradas no Tribunal. Ainda, tem por objetivo superar controvérsia atual sobre a validade, a interpretação e a eficácia de normas capazes de gerar insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos. Como se vê abaixo: CF - 103-A, § 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a 39 administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. Gilmar Mendes, ministro do STF, declara que considerando a ampla competência que tem o Supremo Tribunal Federal, as súmulas vinculantes podem abranger questões atuais sobre interpretação de normas constitucionais isoladas ou em face de normas infraconstitucionais que poderão ser federais, estaduais ou municipais, embora seja possível que trate apenas de interpretação da própria Constitucional como em casos submetidos à Corte para discutir a interpretação da Constituição Federal adotada pelos órgãos jurisdicionais (MENDES, 2008, p. 966). Outro notável requisito para edição da súmula vinculante é a preexistência de reiteradas decisões sobre matéria constitucional. Essa ideia, ainda conforme o aludido autor, pressupõe a maturidade da questão controvertida através da reiteração das decisões, vedando que seja baseada em decisão isolada. De outra forma, é necessário que ela seja espelho da jurisprudência da Corte (MENDES. 2008, p. 967). Ainda, Gilmar Mendes identifica que os requisitos acima acabam por definir o conteúdo das súmulas vinculantes, em regra, formuladas a partir de questões processuais de massa ou homogêneas, de matéria previdenciária, administrativa, tributária e processual, suscetíveis de uniformização e padronização (MENDES, 2008, p. 967). CF - 103-A, § 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade. Lei 11.417/2006 - Art. 3o São legitimados a propor a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante: I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III – a Mesa da Câmara dos Deputados; IV – o Procurador-Geral da República; V - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VI - o Defensor Público-Geral da União; 40 VII – partido político com representação no Congresso Nacional; VIII – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional; IX – a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; X - o Governador de Estado ou do Distrito Federal; XI - os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares. § 1o O Município poderá propor, incidentalmente ao curso de processo em que seja parte, a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante, o que não autoriza a suspensão do processo. O trecho acima transcrito revela que podem propor, revisar e cancelar os legitimados para propositura de ação direta de inconstitucionalidade, além dos que forem previstos em lei (também transcrito). Outrossim, consoante palavras de André Ramos Tavares, o processo de revisão das súmulas vinculantes é imprescindível para a evolução do direito e prevenção de seu engessamento, porquanto todos os enunciados com força geral obrigatória têm mecanismos semelhantes, então no presente instituto não poderia ser diferente (TAVARES, 2012, p. 436). Sabe-se que o instituto da súmula vinculante foi regulamentado pela Lei nº 11.417/2006, porém, consoante observa André Ramos Tavares, não se pode dizer quea Lei apresentou grandes novidades. A essência da diferença da CF para a Lei está na transposição do concreto para o abstrato-geral, isto é, entendeu-se que para alcançar o efeito erga omnes se deve criar um enunciado abstrato, onde se exclui os fatores concretos dos paradigmas levados até a Corte. 4.3. Aplicação do instituto e consequências A Emenda Constitucional nº 45 de 2004 conferiu ao texto constitucional uma contrapartida processual inerente a casos em que se deixar de aplicar súmula vinculante, seja por contraria-la seja por aplica-la indevidamente, valendo tanto para ato administrativo como para decisão judicial. 41 § 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso (grifado) Com efeito, a existência de sanção (anulação e cassação) aplicável no processo que desobedecer sumula vinculante, é a real afirmação da coercibilidade e obrigatoriedade do instituto, podendo o magistrado, de acordo com Ricardo Lewandowski (apud LENZA, 2013), ser responsabilizado por ato de insubordinação, embora não expressamente previsto na lei. Esse raciocínio decorre da interpretação das obrigações do magistrado dispostas na já citada Lei Orgânica da Magistratura Nacional que, em seu artigo 35, inciso I, dispõe que “são deveres do magistrado: cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício”, associada ao dispositivo da Constituição e da Lei n. 11.417/2006 que estabelecem que a partir da sua publicação na imprensa oficial, a súmula vinculante vinculará os órgãos do Poder Judiciário (LENZA, 2013). Da decisão ou ato que desobedecer súmula vinculante cabe reclamação ao STF, sendo essa reclamação instrumento jurídico com status constitucional que visa preservar a competência da Corte e garantir a autoridade de suas decisões. Para tanto, são legitimados ativos, nas palavras de Luiz Guilherme Marinoni (apud BORBA, 2013): (...) o jurisdicionado, em seu respectivo caso, reclama a autoridade dos fundamentos determinantes das decisões do STF em nome da coerência do direito e da segurança jurídica. Note-se que não está em jogo a declaração de constitucionalidade ou inconstitucionalidade de específica norma, mas a força ou autoridade dos seus fundamentos adotados pela Corte para decidir pela constitucionalidade ou inconstitucionalidade. Portanto, em vista da eficácia vinculante, legitimados são os prejudicados pelo ato que negou os fundamentos determinantes e aquele que o praticou. Esse último infringe a autoridade da decisão do STF, enquanto o primeiro por ser tutelado pelo precedente constitucional, necessita da reclamação (grifado). Como bem elucidado, tem legitimidade ativa para propor reclamação ao STF sobre aplicação de súmula vinculante os prejudicados pelo ato ou decisão que a desobedeceu, bem como aquele que a praticou. 42 4.4. Análise geral das matérias sumuladas Atualmente há 56 súmulas vinculantes editadas pelo STF, sendo que dentre elas, apenas uma está pendente de publicação, ou seja, ainda não possui validade e eficácia no ordenamento jurídico. A análise pontual de cada súmula vinculante gerou alguns resultados que serão explanados abaixo: 4.4.1. Análise cronológica da utilização do instituto Cinco meses após a promulgação da lei 11.417/2006, que regulamenta as súmulas vinculantes, o Supremo Tribunal Federal editou 3 (três) súmulas vinculantes, sendo de matéria trabalhista, constitucional e administrativo. Já no próximo ano, em 2008, editou 10 (dez) súmulas vinculantes sendo 2 (duas) de cada das seguintes matérias: constitucional, administrativo, tributário, processual, penal. Em 2009, por sua vez, foram editadas 14 (quatorze) súmulas vinculantes, entre elas: uma de constitucional, 2 (duas) de administrativo, 2 (duas) de tributário, 6 (seis) de processual, uma de penal, uma de trabalhista e uma de civil. No ano de 2010 foram editadas 3 (três) e em 2011 apenas uma, todas sobre direito tributário. Os anos de 2012 e 2013 não tiveram edição de súmula vinculante, passando em 2014 a produzir 5 (cinco), entre elas 2 (duas) sobre direito previdenciário, 2 (duas) sobre direito processual e uma sobre administrativo. O ano de 2015 é peculiar pela aprovação de 16 (dezesseis) súmulas vinculantes, sendo 5 (cinco) de constitucional e 5 (cinco) de administrativo, mais 4 (quatro) de tributário e 2 (duas) de processual. Durante 2016, entretanto, editaram apenas 3 (três) súmulas vinculantes, entre elas uma de constitucional, uma de administrativo e uma de direito penal. 4.4.2. Análise por matéria Dessa análise, conforme tabela 3 (pagina 54), observou-se que Direito Tributário é a matéria que mais contem súmula vinculantes, contendo ao todo 13 (treze), sendo 4 (quatro) sobre incidência de imposto (ISS, ICMS, taxa), e o restante 43 sobre depósito prévio para ação judicial, imunidade tributária, princípio da anterioridade, espécie de imposto aplicável, base de cálculo, entre outros. Em segundo lugar vem Direito Administrativo com 12 súmulas vinculantes sua maioria versando sobre direitos do servidor público, mais especificamente sobre remuneração. Empatado com Direito Administrativo está Direito Processual, abrangendo civil, penal e trabalhista, possuindo ao todo 12 (doze) súmulas vinculantes, sendo 5 (cinco) sobre competência e dessas 5, 3 (três) são sobre competência da justiça do trabalho. As demais versam sobre processo administrativo, recurso administrativo, honorários advocatícios, precatórios, acesso aos autos, etc. Em quarto lugar está Direito Constitucional com 10 (dez), abordando desde nepotismo e competência legislativa, até inconstitucionalidade da cobrança de taxa nas universidades públicas, entre outros. Com menor número de súmulas vinculantes está Direito Penal com 4 (quatro) entre assuntos que vão desde recepção de norma anterior pela Constituição Federal de 1988, estabelecimento penal, entre outros. Já Direito Previdenciário possui 2 (duas) súmulas vinculantes, uma sobre aposentadoria especial de servidor público e outra sobre gratificação. Direito do Trabalho também contém 2 (duas) súmulas vinculantes, sendo uma sobre contribuição social e outra sobre gratificação. Por fim, sobre Direito Civil, existe apenas uma súmula vinculante dispondo a ilicitude da prisão civil do depositário infiel. 4.4.3. Análise da eficácia por cancelamento ou revisão Nenhuma súmula vinculante foi cancelada ou revisada até o encerramento do presente trabalho. 44 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente trabalho proporcionou a análise do instituto da súmula vinculante no ordenamento jurídico brasileiro a partir do estudo da origem da Constituição Federal do Brasil, bem como pela análise da evolução histórica do instituto do juspositivismo aliado ao commow law, até alcançar a tripartição de poderes dada por Monstesquieu e adotada pela maioria dos países democráticos. Ademais, vislumbrou-se que o ativismo judicial exercido pelo Supremo Tribunal Federal através da súmula vinculante viola, sobretudo, o princípio da legalidade, pois considerando este, a súmula vinculante não poderia ter efeito vinculativo, já que seu modo de edição não compreende os mecanismos rígidos relativos ao processo legislativo da Carta Magna, inclusive porque os ministros da citada Corte não possuem o poder de representatividade, que é dado pelo sufrágio. Além disso, foi estudado o reflexo do instituto frente a diversos princípios do Direito, apurando-se que oferece afronta i) à independência do juiz já que o mesmo é obrigado, pela Lei Orgânica
Compartilhar