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1 Síndromes digestivas (semiologia) Marcela Cavalcanti 2018.2 Síndromes digestivas Ascite Significado: liquido na cavidade peritoneal, não representa uma doença, mas uma manifestação comum a varias doenças A sua principal causa é a hipertensão portal relacionada à cirrose hepática. Exame físico Quando volumosa, abdome apresenta-se globoso com paciente em pé ou deitado A cicatriz umbilical pode aplanar-se ou até mesmo everter (ao contrario do que ocorre na gravidez e no meteorismo) Se for devido à hipertensão porta, é comum a presença de circulação colateral em forma de cabeça de medusa Se não for muito volumosa e com tônus da musculatura abdominal reduzida: abdome em avental, com paciente em pé e forma de batráquio com paciente deitado. Sinal de piparote: positivo em ascite muito grande geralmente superior a 5l e pode ser negativo de acordo com a tensão da parede abdominal Macicez móvel de decúbito: detecta ascite a partir de 1,5l A ascite pode ser graduada em 3 estágios: I: só detectada em US II: ascite moderada detectada no exame físico III: grande ascite com importante distensão abdominal Exames complementares a) Radiografia: pouco valor para o diagnostico de ascite b) Ultrassonografia: método de escolha para o diagnostico de pequenas coleções liquidas no abdome que aparecem como imagens anecoides (livres de eco). Tambem diz se o derrame peritoneal está encistado ou se faz parte de massas complexas (sólidas e liquidas ao mesmo tempo – hematomas, abcessos, tumores necrosados) Pode, frequentemente diagnosticar a causa da ascite ao demonstrar alterações compatíveis com cirrose, massas abdominais ou pélvicas, metástases, cistos pancreáticos e etc. Util também na realização de punções diagnósticas ou terapêuticas c) Tomografia computadorizada Etiologia das ascites: 1. Hipertensão porta na hipertensão porta, os capilares sinusóides atuam como válvulas de escape, gotejando linfa para o espaço peritoneal. É necessário classificar a hipertenão portal em pré-sinusoidal, pós-sinusoidal ou intra-sinusoidal As obstruções pré-sinusoidais dificilmente geram ascite pois não envolvem os sinusóides porém apresentam outras manifestações graves como circulação colateral, varizes de esôfago sangrantes e esplenomegalias. É o que ocorre, por exemplo, na esquistossomose. As obstruções pós-sinusoidais, por sua vez, geram uma ascite geralmente grave e de difícil controle porém sem manifestações mais graves. Ocorre na síndrome de Budd-Chiari. 85% dos casos de ascite são causados pela cirrose hepática, que origina a hipertensão portal pelos dois mecanismos patogênicos (pré e pós sinusoidal) sendo portanto chamada de intrassinusoidal. Nesse caso, ocorrem tanto a ascite como outros sinais clínicos de hipertensão portal. 2 Síndromes digestivas (semiologia) Marcela Cavalcanti 2018.2 Obs: A ascite formada pela HP envolve apenas o mecanismo de aumento de pressão, portanto, o liquido formado tem característica transudativa, ou seja, POUCA PROTEINA. 2. Doença peritoneal São as neoplasias (primarias ou metástases para o peritônio) e as infecções (especificamente a tuberculose peritoneal) Fisiopatogenia: - aumento da permeabilidade dos capilares do peritônio devido ao processo inflamatório - obstrução dos capilares linfáticos que ligam a cavidade peritoneal aos plexos linfáticos diafragmáticos pelas células tumorais, impedindo a drenagem adequada. - liberação, por tumores, de substancias angiogênicas que aumentam a permeabilidade peritoneal Obs: é uma ascite do tipo exsudativas, ou seja, com elevado teor de proteínas a) Ascite neoplásica segunda causa mais comum de ascite liquido amarelo-citrino mas que pode se tornar hemorrágico ou quiloso - sugere fortemente ascite neoplásica as neoplasias mais frequentemente associadas são: tumor de ovário, câncer colorretal, câncer de estomago, de pâncreas. Menos comumente: linfoma, mama, pulmão, útero, mesotelioma, prostata, colangiocarcinoma e neoplasia maligna de esôfago. Características do liquido ascítico: citologia positiva em amostra única em 80% dos pctes, mas em 97% quando realizado em 3 paracenteses; elevados níveis de proteína, LDH e colesterol e gradiente de albumina <1,1g/dl Obs: marcadores tumorais devem ser analisados com cautela principalmente em pacientes com cirrose hepática, especialmente do sexo feminino, pois sua elevação pode ser encontrada sem que haja tumor. b) Tuberculose peritoneal é secundária à reativação de um foco latente disseminado pelo sangue. Logo, é uma tuberculose pós-primária e por isso, em cerca de metade dos casos, não se encontram evidencias da tuberculose em pacientes com ascite tuberculosa. Os principais achados clínicos são a ascite e febre. O liquido ascítico é amarelo-cítrico, sendo raramente quiloso ou hemorrágico A contagem de leucócitos gira em torno de 500 a 2000 células/mm3 sendo principalmente de mononucleares Para o diagnostico: enzima adenosina deaminase (ADA) apresenta alta especificidade e sensibilidade (porém diminuem em pacientes com cirrose hepática); pesquisa da micobacteria por PCR e laparoscopia. Diarreia aguda É a diarreia que dura menos de 2 semanas e na maioria das vezes tem etiologia infecciosa. Em outros casos pode ser causada por medicamentos, ingestão de toxinas, isquemia, doença inflamatória intestinal. Em geral são leves, cursando com 3-7 evacuações diárias e com perda de menos de 1 litro de água nas fezes. Em casos mais graves, como na cólera, o paciente pode evacuar mais de 20 vezes ao dia e perder 5 litros de água nas fezes, cursando com desidratação, hipovolemia, choque circulatório e acidose metabólica. Obs: síndrome de gastroenterite aguda: quando a diarreia é acompanhada de náuseas, vomito e dor abdominal difusa, normalmente causada por infecções virais ou intoxicação alimentar Obs: intoxicação alimentar: ingestão de toxinas pré-formadas presentes em alimentos mal preparados ou estragados que foram previamente contaminados com micro-organismos (a síntese de enterotoxinas ocorre fora do TGI). O principal agente causador é o Staphylococcus aureus. Diante de um quadro de diarreia aguda, devemos definir se a mesma é inflamatória ou não inflamatória DA inflamatória: geralmente afetam o cólon, manifestando-se com diarreia de pequeno volume e múltiplos episódios ao dia, dor no quadrante inferior esquerdo, tenesmo e urgência fecal 3 Síndromes digestivas (semiologia) Marcela Cavalcanti 2018.2 DA não inflamatória: geralmente afeta o intestino delgado, manifestando-se com diarreia de grande volume, poucos episódios e dor periumbilical podendo ser acompanhada de outros sintomas que caracterizam a síndrome da gastroenterite aguda. Normalmente não necessita de exames para investigação de agente etiológico nem de tratamento especifico, apenas de suporte visando manter a hidratação. A solicitação de exames é necessária apenas nos casos descritos na tabela a seguir: Apendicite Causa mais comum de abdome agudo não traumático Mais encontrada entre os 10 e os 30 anos com leve predomínio do sexo masculino Patogênese: Relacionada à obstrução do lúmen apendicular sendo a causa mais comum a presença de fecalito. Também pode ocorrer devido à hiperplasia dos folículos linfoides, obstrução por áscaris, bário e corpos estranhos além de tumores. A obstrução apendicular evolui rapidamente para obstrução em alça fechada, a secreção cumulada leva à estase, que como consequência leva a um supercrescimento bacteriano, principalmentede E. coli e B. fragilis O aumento da pressão intraluminal e a distensão do órgão comprometem o retorno venoso e o suprimento arterial resultando num estado de isquemia que pode evoluir para necrose e perfuração A perfuração ocorre cerca de 48 horas após o inicio dos sintomas caso não haja nenhuma intervenção Perfuração bloqueada: quando o omento e o intestino delgado bloqueiam a perfuração formando um abcesso periapendicular. Nesse caso, o paciente pode se encontrar oligossintomático, queixando-se apenas de pequeno desconforto na fossa ilíaca direita. Pode haver uma massa palpável (plastrão) Perfuração para o peritônio livre: ocorre uma peritonite difusa com formação de múltiplos abcessos (pelve, sub-hepático, sub-diafragmático e entre alças). Paciente apresenta dor abdominal de grande intensidade e difusa, presença de abdome em tábua e temperatura muito elevada (39-40) podendo o paciente evoluir para sepse. Curso da dor Inicialmente a distensão do órgão produz dor periumbilical ou epigástrica mal definida (dor visceral) Algumas horas depois a dor se torna referida na fossa ilíaca direita Quando o processo inflamatório ultrapassa a serosa e atinge o peritônio parietal (aproximadamente 12 horas após o inicio dos sintomas), a dor muda de característica e se torna bem localizada no quadrante inferior direito, no ponto de McBurney, intensa e acompanhada de descompressão dolorosa à palpação (sinal de Blumberg positivo) Obs: esse padrão de migração clássico da dor é o sintoma mais confiável para o diagnóstico 4 Síndromes digestivas (semiologia) Marcela Cavalcanti 2018.2 Sintomas associados: alterações no hábito intestinal (constipação mais frequente), vômitos, febre (na ausência de complicações, raramente ultrapassa 38,5) Apresentações atípicas: manifestações urinarias e hematúria microscópica, dor ao toque retal ou exame ginecológico Exame físico: paciente geralmente imóvel no leito, febril, hipersensibilidade do abdome à palpação sobretudo no ponto de McBurney com defesa abdominal inicialmente voluntária e depois involuntária. Um achado precoce é hipersensibilidade cutânea no quadrante inferior direito ao pinçamento da pele. Apendicite em situações especiais Na criança: quadro atípico caracterizado por febre alta, letargia, vômitos intensos e episódios diarreicos mais frequentes. A progressão do quadro inflamatório é mais rápida e a taxa de perfuração é maior, sendo a peritonite generalizada mais frequente por incapacidade do omento e do intestino delgado de conter a perfuração. No idoso: temperatura menos elevada, dor insidiosa ocasionando diagnostico tardio e maior taxa de perfuração. Na gestante: emergência cirurgia extrauterina mais comum Nos pacientes com AIDS: dependendo do grau de imunossupressão do pacinete podemos encontrar causas especificas da apendicite como linfoma não Hodgkin e sarcoma de Kaposi. O diagnostico pode ser feito tardiamente devido as queixas abdominais crônicas e o transito intestinal lento próprio desses pacientes, levando a uma maior taxa de perfuração. Apendicite crônica ou recorrente Surtos de dor abdominal na fossa ilíaca direita, recorrentes, sem presença de irritação peritoneal. Ocorre principalmente em crianças Parece ocorrer pela obstrução parcial intermitente da luz apendicular Critérios diagnósticos: historia de mais de um mês de ataques recorrentes (3 ou mais), sensibilidade a palpação do quadrante inferior direito sem evidencias de irritação peritoneal, achados radiológicos que variam de preenchimento incompleto à não visualização do apêndice. Diagnóstico História + exame físico e as vezes exames complementares Exames laboratoriais: leucocitose moderada (10.000 a 15.000ce´l/mm3) com neutrofilia e desvio à esquerda. Contagens acima de 20.000 indicam gangrena e perfuração. sedimentoscopia pode estar alterada quando o apêndice se localiza próximo ao ureter ou bexiga rotina de abdome agudo: 10 a 15% dos casos apresenta imagem compatível com fecalito em FID radiografia pode ser útil para excluir condições como litíase urinaria, obstrução de intestino delgado e ulcera perfurada. Ultrassonografia: limitações pela distensão abdominal e obesidade. Útil em pacientes com diagnostico duvidoso. Tomografia computadorizada: método de maior acurácia diagnóstica Em pacientes jovens cuja US e TC foram inconclusivas, indica-se a realização de videolaparoscopia diagnóstica Diagnóstico diferencial Mais comum: linfadenite mesentérica, doença inflamatória pélvica (DIP), ruptura de folículo ovariano, cisto ovariano torcido e gastroenterite aguda Diverticulite Macro ou microperfuração de um divertículo que pode ter tanto repercussões clinicas limitadas como pode levar a abcesso, obstrução, formação de fístula e peritonite A provavel causa é mecânica: restos de conteúdo luminal que se alojam no interior do divertículo e endurecem formando fecalitos que comprometem o suprimento sanguíneo. Com isso surgem perfurações que geram um processo inflamatório pericolonico que fica obstruído por deflexões do peritônio (peridiverticulite) Manifestações clínicas: febre, leucocitose, dor abdominal baixa que piora com a defecação e sinais de irritação peritoneal (defesa e dor à descompressão). Dor e hipersensibilidade predominam em quadrante inferior esquerdo (pode ocorrer no direito confundindo o diagnostico com apendicite) 5 Síndromes digestivas (semiologia) Marcela Cavalcanti 2018.2 Hipertensão Portal a síndrome da hipertensão porta é composta basicamente pela esplenomegalia congestiva, varizes gastroesofágicas e circulação colateral visível no abdome. Na cirrose, a HP também contribui para a encefalopatia hepática. Fisiopatologia: - aumento da resistência vascular em nível pré-hepático (esquistossomose), intra-hepático (cirrose) ou pós-hepático (síndrome de Budd-Chiari) e também pelo aumento do fluxo sanguíneo portal pela vasodilatação esplâncnica Obs: na cirrose hepática a obstrução ao fluxo ocorre por dois mecanismos: resistência estrutural pela formação de nódulos fibrosos e elevação do tônus intra-hepático pela contração de células Obs: retenção de vasodilatadores esplâncnicos Obs: a HP pós-sinusoidal e intrassinusoidal tem grande tendência a formar ascite, enquanto a pré-sinusoidal raramente a causa (quando causa é leve) Etiologia: Pré-hepáticas Intra-hepáticas (pré-sinusoidal, sinusoidal e pós-sinusoidal) Pós-hepáticas 1. Intra-hepáticas Sinusoidal e pós-sinusoidal – doenças do parênquima hepático Pré-sinusoidal – obstrução dos pequenos ramos intra-hepáticos da veia porta HP intra-hepática sinusoidal a principal causa é a cirrose hepática presença de nódulos de regeneração comprime os sinusóides, a fibrose do espaço de Disse e contração dos miofibroblastos hepatite aguda: colapso dos sinusóides resultante da compressão gerada pela necrose hepática hepatite crônica: também chamada de hepatite de interface HP intra-hepática pré-sinusoidal A principal causa é a esquistossomose Nas fases precoces da esquistossomose a HP é decorrente de uma reação granulomatosa nas vênulas hepáticas devido a deposição de ovos. Essa reação inflamatória leva a uma fibrose e obliteração das vênulas portais Com o passar do tempo os espaços porta se tornam intensamente fibrosados – fibrose de simmers HP intra-hepática pós-sinusoidal Doença hepática veno-oclusiva: deposição de matriz de fibronectina em torno das veias centrais dos lóbulos Manifesta-se com icterícia, hepatomegalia congestiva e dolorosa, ascite e varizes gastroesofágicas, elevação de aminotransferases e bilirrubina Complicação comum no transplante alogênico de célulastronco Icterícia Pigmentação amarelada da pele, esclerótica, e frenulo da língua pela bilirrubina
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