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Anna Beatriz Fonseca | MED UNIFTC 2020.2 – 3º semestre CONCEITO Desnutrição é o estado de deficiência ou excesso tanto de macronutrientes quanto de micronutrientes causa desequilíbrio entre o suprimento de energia, de nutrientes e a demanda do organismo, alterando a garantia na manutenção, no crescimento e nas funções metabólicas. CLASSIF ICAÇÃO A desnutrição energético-proteica (DEP) pode ser classificada como: ▪ Primária: Oferta insuficiente de nutrientes (um ou todos componentes estão ausentes da dieta, ex.: carboidratos, proteínas, lipídeos, vitaminas e minerais), multifatorial, envolvendo aspectos de natureza médica e social; ▪ Secundária: Associada a outras doenças ou situações, que mesmo a ingestão sendo adequada, resulta na má absorção, utilização ou armazenamento deficientes, perda excessiva ou aumento da necessidade de nutrientes, aumento do gasto energético e diminuição da ingestão alimentar. QUANTO Á FORMA CLÍNICA O tempo e a gravidade contribuem para a definição e a classificação da desnutrição: ▪ Tempo de curso: Identificar indevidos com peso adequado para estatura, emagrecida, parada de crescimento ou emagrecida e com parada de crescimento; Figura 1: Modelo esquemático conforme o tempo de curso da desnutrição. ▪ Gravidade: Há as formas moderada e grave, essa última sendo: Marasmo, Kwashiorkor e Kwashiorkor-marasmático. QUANTO A OMS Uso em qualquer faixa etária. ▪ O uso do escore Z (desvio padrão) é mais sensível permitido avaliar melhor a evolução da criança; ▪ Levar em consideração as curvas para crianças especiais ou com necessidades especiais, quando necessário. Desnutrição grave quando: ▪ Circunferência do braço < 115mm; ▪ Escore Z de peso para estatura abaixo de -3; ▪ Presença de edema bilateral nas crianças com Kwashiorkor. Classificação de Gomez e Waterlow não é frequentemente utilizada, apenas a da OMS: Indicadores - P/A, P/I, A/I, IMC/I, CB/I (circunferência braquial para idade): Figura 2: Indicadores utilizados pela OMS. FISIOLOGIA Temos alterações sistêmicas, gerando adaptações fisiológicas do organismo. ▪ A curto prazo podem prejudicar o equilíbrio metabólico, funcionamento de órgãos e sistemas, estando diretamente relacionado ao aumento; ▪ A longo prazo tem-se redução do crescimento, diminuição do desenvolvimento neuropsicomotor e maior risco futuro para doenças crônicas não transmissíveis. ALTERAÇÕES EM ÓRGÃOS E SISTEMAS SISTEMA ENDÓCRINO Diminuição de T3, T4, insulina e TGF-1, Aumento de glucagon, GH e cortisol. Há também a diminuição de glicose incialmente com diminuição dos estoques de glicogênio. SISTEMA IMUNOLÓGICO Ocorre diminuição da imunidade celular com atrofia do timo, linfonodos e amígdalas, diminuição da contagem de linfócitos Pediatria Anna Beatriz Fonseca | MED UNIFTC 2020.2 – 3º semestre TCD4 (TCD8 encontram-se preservados), hipersensibilidade tardia, diminuição de fagocitose e IgA secretora e aumento da suscetibilidade a infecções. SISTEMA GASTROINTESTINAL Tem-se atrofia das vilosidades com perda de dissacarídeos, hipoplasia de criptas e permeabilidade intestinal alterada, o que vai dificultar a absorção de nutrientes, além de atrofia pancreática, sobre crescimento bacteriano devido a diminuição da acidez gástrica e, no Kwashiorkor, pode notar infiltrado gordurosa do fígado. Mesmo quando ocorre a reintrodução alimentar, a absorção de alimentos pode estar comprometida devido à perda de integridade da mucosa. SISTEMA CARDIOVASCULAR Comprometimento das miofibrilas com piora na contratilidade, diminuição do débito cardíaco, bradicardia, hipotensão e predisposição a arritmias (bradicardia + baixa contratilidade + distúrbio eletrolíticos). SISTEMA RESPIRATÓRIO Diminuição da massa muscular torácica, piora da função ventilatória à hipóxia e risco de piora da função respiratória se houver hipocalemia e hipofosfatemia. SISTEMA NEUROLÓGICO Redução do número de neurônios, sinapses, arborizações dendríticas e mielinização, bem como diminuição do tamanho do cérebro (córtex cerebral mais fino e crescimento cerebral mais lento) e da função global (cognitivo, social e emocional), motora e memória. SISTEMA HEMATOLÓGICO Anemia normocrômica (exacerbada por deficiência de ferro e folato e/ou infecções – ex.: malária e outras infecções parasitárias) com coagulação preservada. DIAGNÓSTICO Para o diagnóstico da desnutrição, é fundamental considerar os aspectos geográficos heterogêneos no Brasil, pois há áreas com: ▪ Fome por escassez de recursos econômicos, prevalecem as formas graves tipo marasmo (ex.: Região Nordeste); ▪ Riqueza de recursos naturais, mas com desconhecimento da oferta adequada de alimentos regionais disponíveis para as crianças (ex.: mingau contendo apenas água e farinha), prevalecem as formas graves tipo Kwashiorkor; ▪ Deficiência de micronutrientes está relacionado com a fome oculta. ANAMNESE ▪ Antecedentes neonatais; Antecedentes nutricionais Aspectos psicossociais; Condições de saneamento básico; Presença ou não de doenças associadas. EXAME FÍSICO Exame físico completo, incluindo a aferição de medidas antropométricas prioritariamente, e a analise das curvas da OMS. ▪ Na ausência de medidas antropométricas é avaliado os sinais de emagrecimento intenso visível, alterações dos cabelos, dermatoses, hipotrofia muscular e redução do tecido celular subcutâneo. EXAMES LABOLATORIAIS ▪ Hemograma; TGO, TGP; FA, GGT; Uréia, creatina; Proteínas totais e frações; Colesterol total e frações, triglicérides, glicemia em jejum; Sumário de urina; Hemocultura, urocultura, coprocultura; RX tórax PA e perfil; Parasitológico de fezes, lâmina direta giárdia e ameba; Sorologia HIV. FORMAS CLÍNICAS DE DEP GRAVE: MARASMO Característico de lactentes jovens (crianças menores de 12 meses): ▪ Emagrecimento acentuado, baixa atividade e comportamento apático e letárgico, irritabilidade, atrofia muscular e subcutânea com desaparecimento da bola de Bichat, costelas visíveis e nádegas atróficas, abdome pode ser globoso (hepatomegalia rara), membros delgados, cabelos finos e escassos; Pequeno para a idade. Figura 3: Características clínicas do marasmo. Anna Beatriz Fonseca | MED UNIFTC 2020.2 – 3º semestre KWASHIORKOR Caraterístico de crianças mais velhas (acima de 2 anos): ▪ Alterações na pele (lesões hipocrômicas ao lado de hipercrômicas, com descamação), acometimento dos cabelos (textura, coloração e facilidade em se soltar do couro cabeludo), hepatomegalia (decorrente de esteatose) e ascite, face de lua (edema de face), hipoalbuminemia e/ou anasarca, apatia e/ou irritabilidade; ▪ O edema é geralmente bilateral simétrico: Figura 4: O edema começa nos pés, progride para as mãos e em casos grave pode envolver a face. Teoria para Kwashiorkor: ▪ Whitehead e Alleyne: Má-adaptação (quebra irregular da gordura e dos músculos, provavelmente devido ao consumo suficiente de carboidrato, criando uma lacuna no suprimento de ácidos graxos e aminoácidos essenciais) do metabolismo proteico e lipídico à privação crônica de alimentos; ▪ Golden e Ramdath: Estresse oxidativo, por radicais livres (= lesão da membrana celular: manifestação da desnutrição edematosa) e pelo aumento do consumo ou diminuição na produção dos antioxidantes (cisteína = glutationa). TRATAMENTO Entre as crianças desnutridas graves internadas, quais são as principais causas de óbito? Hipotermia, hipoglicemia e distúrbios hidroelétricos e Hipofosfatemia, hipomagnesemia e hipopotassemia, Síndrome de realimentação, Quadros infecciosos. DESNUTRIDOS GRAVES ▪ Politicas públicas sociais: Combate a fome e a pobreza; ▪ Trabalho multifatorial; ▪ Trabalho educativo, através dos protocolos da OMS, que direciona a atenção dos profissionais às principais causas de óbitos na população. Tratamentodividido em três fases, de estabilização (inicial) e reabilitação, realizadas a nível hospitalar, e acompanhamento, realizada a nível ambulatorial. OBJETIVOS DO TRATAMENTO HOSPITALAR Figura 5: Etapas no tratamento da DEP grave. Figura 6: Fases das etapas do tratamento da DEP grave. Lembrar que a suplementação do ferro só acontece na segunda semana, pois é quando termina o tratamento de infecções. Critérios de transição da internação para alta: Redução do edema, Bom apetite (75% de RUTF2 programada para o dia), > 6 meses de idade. Critérios de alta: ▪ Deixar de ser DEP grave; ▪ Quem deve estar envolvido? o Equipe interdisciplinar: Serviço de referência o Pediatra (nutrólogo); o Identificação das crianças com DEP, comorbidades e suplementação de micronutrientes; o Atendimento nutricional: Hábitos alimentares e educação nutricional; o Psicólogo: Diagnóstico das relações familiares e do contexto emocional; Anna Beatriz Fonseca | MED UNIFTC 2020.2 – 3º semestre o Serviço social: Entrevista social, visita domiciliar, oficinas em cozinha experimental, cursos de capacitação profissional. ▪ Como prevenir reincidias? o Acionar instâncias protetoras, ex.: Concelho tutelar, prefeitura, serviços sociais locais, governo. ▪ Onde será acompanhado? o Onde haja tratamento ambulatorial adequado. ▪ O que irá comer? o Órgãos governamentais irão prover alimentos para a criança; Acionar Ministério Público. ▪ Vínculo mãe-filho: Trabalhar vinculo durante a internação. Questão: Mãe apresenta vinculo deficiente com o filho de 5 meses, Não pega no colo, leite materno suspenso com 4 meses. Não tem paciência para dar comida. Durante internação para tratar DEP grave, melhorou vinculo, porém ainda permanece longe do ideal. À alta como proceder? Mãe manterá acompanhamento com psicóloga e o bebê será cuidado por ela, porém com supervisão. TRATAMENTO DEP GRAVE SEGUNDO 10 PASSOS DA OMS 1. Hipoglicemia: Glicemia sérica menor que 54 mg/dL; 2. Hipotermia: Temperatura axilar menor que 35°C; 3. Desidratação (sem choque): o Preferir sempre hidratar por via oral: • Hidratação por via oral (menor quantidade de sódio, maior de potássio, acrescida de micronutrientes): Iniciada com 5 mL/kg a cada 30 minutos por 2 horas, seguidos de 5 a 10 mL/kg, com reavaliações a cada hora (cerca de 70 a 100 mL/ kg de ReSoMal); • Hidratação intravenosa: 30 mL/kg de soro glicofisiológico ao meio (0,45 mEq/L de sódio) em 2 horas. o Hidratar no mínimo em 12 horas; o Não suspender dieta durante fase de expansão. 4. Distúrbios hidroeletrolíticos e acidobásicos: o Correção lenta; o Lembrar que muitas vezes as crianças estão em homeostase; o Hipernatremia e hipopotassemia são normais; o Hipofosfatemia é fator de mau prognóstico e maior morbimortalidade, devendo sempre ser corrigida. 5. Tratar infecções: o Iniciar uso de antibióticos (ATB) precocemente mesmo sem foco; o Se foco suposto, direcionar ATB para o foco; o Rastrear com culturas; o Solucionar HIV sempre. 6. Terapia nutricional: o Fase de estabilização (1 a 7 dias para crianças com descompensação clínica ou infecciosa): Isentas de lactose; o Fase de reabilitação: Recuperação nutricional (1,5 a 2 vezes a recomendação de nutrientes para sua idade): Menor oferta de lactose. 7. Reposição de micronutrientes: o Vitaminas A: • Se sinais de hipovitaminose fazer hiperdoce nos dias 1, 2 e 15 de internação; • Se não houver sinais de hipovitaminose: ❖ Se for receber suplementação diária, não necessita de hiperdoce; ❖ Se não receber a suplementação diária, fazer hiperdoce no dia 1. o Ácido fólico: • 5mg no 1º dia e 1 mg nos dias subsequente por pelo menos 15 dias. o Zinco, Salênio, Cobre e Maganês: • Repor 2 vezes a RDA. 8. Monitoração da terapia nutricional instituída: 5 g/kg/dia o ganho mínimo para lactentes; 9. Estimulação (sensorial, emocional e do desenvolvimento); 10. Acolhimento da mãe. PREVENÇÃO ▪ Orientação ao aleitamento materno exclusivo; ▪ Orientação para a introdução de alimentos complementares; ▪ Vigilância sequencial do crescimento e desenvolvimento; ▪ Orientações quanto à higiene no preparo de alimentos e de utensílios; ▪ Cuidados com a água.
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