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A INTERNACIONALIZAÇÃO DAS CIDADES: O Caso de Porto Alegre

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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS
ESCOLA DE GESTÃO E NEGÓCIOS
GRADUAÇÃO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS
A INTERNACIONALIZAÇÃO DAS CIDADES:
O Caso de Porto Alegre
Alice Lopes Duarte
Porto Alegre
2016
Alice Lopes Duarte
A INTERNACIONALIZAÇÃO DAS CIDADES:
O Caso de Porto Alegre
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel pelo Curso de Relações Internacionais da Universidade do Rio dos Sinos - UNISINOS
Orientador: Professor Mestre Álvaro Augusto Stumpf Paes Leme
Porto Alegre
2016
A todos que me auxiliaram, de alguma maneira, a completar esse trabalho com êxito, seja por meio acadêmico ou emocional. 
“Os países podem até fazer discursos na Organização das Nações Unidas (ONU), mas são as cidades que representam a periferia”.
Papa Francisco
Agradecimentos
Aos meus pais, Márcia e José Eduardo, obrigada pelo incentivo, pelos conselhos e pelas conversas sobre o futuro.
Ao meu irmão, Rodrigo, pela ajuda com a Lista de Siglas e por todos os momentos em que deixou de dormir para me auxiliar.
Aos meus avós, Marília, Aldo e Glecy, por sempre acreditarem no meu potencial e por terem tanto orgulho de mim.
Ao meu namorado, Luís Fernando, por ter tanta paciência nesse momento, que ele sabe que não é fácil para ninguém.
À minha amiga Maria, por ter me apresentado a paradiplomacia na teoria.
Ao meu primeiro chefe, Rodrigo Corradi, por ter me apresentado a paradiplomacia na prática.
Ao meu orientador, Álvaro Paes Leme, por ter tido paciência com essa orientanda tão ansiosa.
Aos demais colegas de Relações Internacionais, formandos de 2016/2, por terem se tornado pessoas infinitamente mais inteligentes, analíticas e conscientes desde o início do curso.
E, obviamente, a mim mesma, pela perseverança e dedicação para construir esse trabalho.
Resumo
O fenômeno da paradiplomacia – que pode ser definido, de maneira geral, como a política externa de entes subnacionais – é cada vez mais frequente nos municípios de muitos países. As cidades utilizam a política externa por diversas razões, dentre elas para obter maior visibilidade externa ou para captar recursos internacionais. O município de Porto Alegre, capital do estado do Rio Grande do Sul, no Brasil, possui uma das políticas externas subnacionais mais ativas do país. Sabendo-se disso, pretende-se definir a importância dos municípios para as Relações Internacionais e a maneira como a cidade de Porto Alegre se insere nesse contexto. Para isso serão analisados artigos e livros dos principais estudiosos sobre o assunto, além de documentos oficiais de institucionalização da paradiplomacia no Brasil e em outros países. Pode-se concluir que as cidades não são, de fato, tão importantes para o desenvolvimento das Relações Internacionais no mundo, entretanto Porto Alegre, apesar de não possuir uma estratégia de internacionalização, conseguiu maior visibilidade externa devido às atividades de Relações Internacionais do município. 
Palavras-chave: Paradiplomacia; Porto Alegre; Cidades; Política Externa Federativa.
Abstract
The phenomenon of paradiplomacy - which can be defined, generally, as the foreign policy of sub-national entities - is increasingly common in the cities of many countries. Cities use foreign policy for several reasons, among them for the external visibility or to capture international resources. The municipality of Porto Alegre, the capital of the state of Rio Grande do Sul, in Brazil, has one of the most active sub-national foreign policies of the country. Knowing this, we intend to define the importance of the municipalities for the International Relations and the way the city of Porto Alegre falls within that context. For it will be analyzed articles and books of the leading scholars on the subject, as well as official documents of paradiplomacy of institutionalization in Brazil and other countries.It can be concluded that the cities are not, in fact, truly important for the development of the International Relations, although Porto Alegre, despite not having an internationalization strategy, managed to improving the external visibility due to the activities of international city relations.
Keywords: Paradiplomacy; Porto Alegre; Cities; Federative Foreign Policy.
Lista de Siglas
AICE – Associação Internacional das Cidades Educadoras
AM – Amazonas 
BH – Belo Horizonte
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento
BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul
CEIC – Centro Integrado de Comando
CEMR – Conselho de Cidades e Regiões Europeias
CF/88 – Constituição Federal de 1988
CGLU – Cidades e Governos Locais Unidos
CNM – Confederação Nacional dos Municípios
CRECENEA – Comissão Regional de Comércio Exterior do Nordeste Argentino
CODESUL – Conselho de Desenvolvimento e Integração do Sul
CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
DEMHAB – Departamento Municipal de Habitação
DMLU – Departamento Municipal de Limpeza Urbana
EPTC – Empresa Pública de Transporte e Habitação
ERESUL – Escritório de Representação no Rio Grande do Sul
EUA – Estados Unidos da América
FAL – Fórum de Autoridades Locais pela Inclusão Social
FMCU – Federação Mundial de Cidades Unidas
FNP – Frente Nacional dos Prefeitos
FONARI – Fórum Nacional de Secretários e Gestores Municipais de Relações Internacionais
FSM – Fórum Social Mundial
GNS – Governo Não-Central
IDHM – Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
ICLEI – Conselho Internacional para Iniciativas Ambientais Locais
IPPUC – Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba
IULA – União Internacional de Autoridades Locais
Mercosul – Mercado Comum do Sul
MRE – Ministério das Relações Exteriores
MT – Mato Grosso
MUFPP – Pacto de Política Alimentar Urbana de Milão
ObservaPOA – Observatório da cidade de Porto Alegre
OEA – Organização dos Estados Americanos
OIDP – Observatório Internacional de Democracia Participativa
ONG – Organização Não-Governamental
ONU – Organização das Nações Unidas
OP – Orçamento Participativo
PDT – Partido Democrático Trabalhista
PEC – Proposta de Emenda Constitucional
PIB – Produto Interno Bruto
PL – Projeto de Lei
PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PMPA – Prefeitura Municipal de Porto Alegre
PPS – Partido Popular Socialista
PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira
PT – Partido dos Trabalhadores
PUCRS – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
RJ – Rio de Janeiro
RS – Rio Grande do Sul
SAF – Secretaria de Assuntos Federativos
SAFP – Secretaria de Assuntos Federativos e Parlamentares
SMGL – Secretaria Municipal de Governança Local
SRI – Secretaria de Relações Institucionais
UCCLA – União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa
UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul
URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
UT – Unidade Temática
WeGO – Organização Mundial de e-Government de Cidades e Governos Locais
100RC – 100 Cidades Resilientes
Sumário
1.	INTRODUÇÃO	12
2.	A PARADIPLOMACIA	21
2.1.	A Sociedade Internacional e as Causas da Paradiplomacia	21
2.2.	A Interdependência Complexa e a Paradiplomacia	26
2.3.	A Paradiplomacia no Brasil	30
3.	AS CIDADES E AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS	36
3.1.	As Cidades como Atores Políticos	36
3.2.	As Redes de Cidades	41
3.3.	As Grandes Cidades Internacionais	46
3.4.	As Cidades Brasileiras e a Internacionalização	51
4.	PORTO ALEGRE E AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS	60
4.1.	Porto Alegre e as Boas-Práticas	60
4.2.	Porto Alegre e Cooperação Bilateral	66
4.3.	Porto Alegre e a Cooperação Multilateral	72
4.4.	Porto Alegre e os Grandes Eventos Internacionais	79
CONSIDERAÇÕES FINAIS	86
REFERÊNCIAS	93
APÊNDICE A – ROTEIRO DA ENTREVISTA REALIZADA COM O GERENTE DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS DE PORTO ALEGRE – RODRIGO CORRADI	101
1. INTRODUÇÃO
O cenário internacional da atualidade é, definitivamente, deveras diferente do que costumava ser no período da Guerra Fria. Há, hoje, uma grande diversidade de Estados que podem ser considerados como potências,divergindo da formação bipolar de meados do século XX, quando apenas os Estados Unidos e a União Soviética disputavam as influências no sistema internacional. Tais países, como a Alemanha, os membros do BRICS[footnoteRef:1] e o Japão, conferem, à citada multipolaridade destacada, não somente uma diversificação econômica do mundo, com mais locais em que é possível fazer investimentos, mas também uma variação política, em que os Estados, apesar de não perderem sua importância, estão tendo que dividi-la com outros atores internacionais.  [1: Acrônimo, criado por Jim O'Neill, economista-chefe da Goldman Sachs, em 2001, que significava que Brasil, Rússia, Índia e China seriam os países do futuro, o que se concretizou em 2006, com a primeira reunião dos quatro países - em 2011, a África do Sul foi incorporada à cúpula, para que houvesse representantes de todos os continentes.    ] 
Dentre esses novos atores, que, além dos Estados – tradicionais e protagonistas dentro das Relações Internacionais –, começaram a se manifestar com relevância, estão as empresas transnacionais, que empregam, vendem e influenciam em escala global; as organizações internacionais, tais como a Organização das Nações Unidas ou a Organização Mundial do Comércio; as organizações não governamentais (ONGs), que por vezes atuam de forma significativa, como é o caso do Greenpeace; as sociedades terroristas; as facções criminosas; os blocos econômicos e, por fim, os agentes subnacionais (estados federativos, províncias, cidades) que passam a exercer, com outros agentes subnacionais ou com Estados, negociações e cooperações próprias, sem necessidade de aval do governo central.
A ação desses agentes subnacionais pode ser chamada de diversas maneiras, tais como diplomacia federativa, política externa federativa ou paradiplomacia, que é mais usual no campo das Relações Internacionais, atualmente. O conceito da “paradiplomacia” foi criado por Panayotis Soldatos, no início dos anos 1990, e tem o objetivo de demonstrar que a diplomacia não necessariamente é exercida pelos governos centrais, mas pode ser executada, também, por governos subnacionais, como prefeituras ou governos estaduais. A atuação desses governos regionais pode ocorrer das mais diversas maneiras, estabelecendo parcerias para cooperação técnica, definindo diretrizes diferenciadas de comércio internacional ou recebendo autoridades - chefes de Estado, embaixadores ou cônsules - para visitas oficiais. Os principais objetivos das práticas paradiplomáticas são a captação de recursos estrangeiros para o financiamento de projetos, o fomento à cooperação técnica internacional, a promoção do turismo e o intercâmbio de ideias entre governos. 
Apesar de se tratar de uma prática recorrente e que experimentou importante expansão a partir da década de 1990, a paradiplomacia não possui amparo jurídico, nem internacional, nem no âmbito interno. A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969, não delega aos entes subnacionais a possibilidade de celebrar quaisquer tipos de tratados internacionais, apesar de também não negar a possibilidade de isso ocorrer. Na Constituição Brasileira de 1988, também não existem menções sobre a prática da paradiplomacia, porém já tramitaram, no Senado Federal, projetos de lei para a completa vedação de qualquer celebração de tratados por entes subnacionais. Tais projetos, entretanto, não foram adiante e, hoje, ainda não há uma forma institucionalizada de negar por completo ou aceitar a paradiplomacia como ação dos agentes federativos.
No Brasil, a paradiplomacia iniciou com Leonel Brizola, governador do Rio de Janeiro, no ano de 1982, que instituiu um órgão de Relações Internacionais para o estado federado. Alguns anos mais tarde, em 1987, Pedro Simon, então governador do Rio Grande do Sul, criou a Secretaria Especial para Assuntos Internacionais, que visava atrair investimentos estrangeiros para o estado, assim como formar parcerias diversas com outros locais do mundo. Em 2008, Álvaro Chagas Castelo Branco (pp. 9) “revela a existência de pelo menos 65 ocorrências de atividades paradiplomáticas em território nacional, sendo 53 com estados federados, sete com municípios e cinco com outros agentes”.
 Dentre os entes subnacionais se destacam os municípios que iniciaram suas ações externas após a eclosão desse fenômeno nos estados da federação e, na atualidade, estão participando cada vez mais ativamente de processos de cooperação internacional, seja participando de redes de cidades (organizações importantes dentro das práticas paradiplomáticas, que reúnem diversas cidades que possuem interesses em comum e que buscam soluções para dinamizar as relações entre elas) seja estabelecendo relacionamentos com os consulados locais ou sediando grandes eventos internacionais. As prefeituras de muitas das cidades, do Brasil e do mundo, estão engajadas em estabelecer Relações Internacionais estáveis, criando secretarias, coordenações ou gerências, e em transformar seus municípios em Cidades Globais. 
As Cidades Globais[footnoteRef:2] não são, necessariamente, uma grande aglomeração urbana - algumas cidades com mais de 10 milhões de habitantes não ocupam essa posição - mas são municípios que possuem uma vasta interligação com as demais localidades do mundo. Bons padrões econômicos, índices sociais e de desenvolvimento satisfatórios, centros de pesquisa e infraestrutura são alguns dos pré-requisitos para uma metrópole ser considerada como uma cidade global. As maiores Cidades Globais do mundo são Nova Iorque, nos Estados Unidos, Londres, no Reino Unido, Tóquio, no Japão, e Paris, na França (SASSEN, 1991), porém existem algumas cidades de menor porte, como é o caso de Porto Alegre e Curitiba, no Brasil, Guadalajara, no México, e Turim, na Itália, que também são consideradas cidades internacionalizadas. [2: Conceito colocado em circulação por Saskia Sassen, holandesa especialista na relação entre o espaço urbano e a globalização, que publicou, em 1991, o livro intitulado com o próprio termo - "Cidade Global".] 
Porto Alegre é capital do estado do Rio Grande do Sul e possui uma das melhores qualidades de vida dentre as capitais dos estados brasileiros. Foi fundada em 1772, como Freguesia de São Francisco do Porto dos Casais e, em 1821, recebeu, de D. Pedro II, o status  de cidade. O município tem população, segundo o censo de 2010, de 1.409.351 pessoas e é o núcleo da Região Metropolitana de Porto Alegre, que tem 4,2 milhões de pessoas, o que corresponde a 2,1% do total da população do país. Além de abrigar eventos importantes, é modelo de administração pública para as demais cidades do país. Porto Alegre apresenta, também, um dos maiores Índices de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) do país, 0,805, considerado muito alto, e expectativa de vida média ao nascer de 76,42 anos (PORTO ALEGRE, 2016).
Economicamente, a cidade de Porto Alegre também consegue se destacar. O Produto Interno Bruto (PIB) da cidade, em 2013, segundo a Fundação de Economia e Estatística, era de 57 bilhões de reais e a taxa de desemprego na cidade, também em 2013, 5,6%. A cidade possui, além de indicadores populacionais e econômicos relativamente bons, um modelo internacional de democracia participativa, o Orçamento Participativo, criado pela administração de Olívio Dutra (1989-1992), em 1989, e considerado pela Organização das Nações Unidas (ONU) como uma das 40 melhores práticas de gestão pública urbana do mundo. Diversos outros governos municipais, de cidades do Brasil e do mundo, já vieram a Porto Alegre para conhecer as práticas do Orçamento Participativo e, muitas delas, acabaram implementando um modelo semelhante em suas cidades - como Belo Horizonte, Santo André, Rosário (Argentina) e Montevidéu (Uruguai) (PORTO ALEGRE, 2016). 
Porto Alegre é, em termos de paradiplomacia, uma das cidades brasileiras com maior atuação mundial. Além de ser co-fundadora da Rede Mercocidades - que reúne prefeituras dos países-membros do Mercosul –, participar e sediar o Bureau Executivo da Cidades e GovernosLocais Unidos (CGLU), uma das redes de cidades pioneiras em âmbito global, e compor a Rede Metropolis - seção metropolitana da CGLU . O município possui diversos irmanamentos - que foram resultado de cooperações em diferentes áreas - com as mais diversas cidades do mundo, como Tampa, nos Estados Unidos, Kanazawa, no Japão, Portalegre, em Portugal, Morano Calabro, na Itália, Punta del Este, no Uruguai, e Rosário, na Argentina (PORTO ALEGRE, 2016). Segundo Meneghetti Netto (2001, pp. 4):
Jean Bareth, um dos pais fundadores do CEMR, conceituou o irmanamento como uma forma muito avançada de cooperação. Também é importante salientar que existem vários outros termos usados para descrever a parceria de longo prazo entre duas comunidades: sistercities (Estados Unidos e México), twincities (Rússia, United Kingdom), friendshipcities (parcerias praticadas nas cidades japonesas e chinesas), partnerstadt (Alemanha) e jumelage (França). Entretanto, todos esses termos denotam o mesmo conceito de comunidades parceiras ou cidades irmãs.
Porto Alegre sediou, no ano de 2014, alguns jogos da Copa do Mundo de Futebol, um megaevento que foi tratado com destaque pela equipe de Relações Internacionais na Prefeitura Municipal. Tal fato possibilitou o início de relações com alguns países do mundo, que se interessaram pela cidade e que podem, no futuro, vir a investir aqui. Outra grande solenidade, cujas diversas edições já foram realizadas na cidade, a mais recente delas em janeiro de 2016, é o Fórum Social Mundial (FSM), que reúne sociedade civil e pesquisadores das ciências sociais para discussões sobre a comunidade em geral. Outra maneira de internacionalização da cidade foi através das boas-práticas, que atraem gestores de outros locais do mundo, que visam a adaptação dessas políticas públicas para suas cidades. O Orçamento Participativo (OP) é o principal exemplo disso em Porto Alegre, já que a cidade é pioneira no que diz respeito à democracia participativa.
Sabendo-se disso, o problema principal, a partir do qual o trabalho acadêmico encontra-se embasado, é "Qual é a relevância dos municípios para as Relações Internacionais, no início do século XXI, e como Porto Alegre se insere nesse contexto?". A partir dessa pergunta, busca-se desenvolver uma obra que a responda de maneira clara. O principal objetivo do trabalho é, então, definir qual é a relevância dos municípios para as Relações Internacionais, no início do século XXI, e a maneira como Porto Alegre se insere dentro desse contexto. 
Especificamente, buscam-se abordar algumas temáticas, como a Teoria da Interdependência Complexa, o conceito de paradiplomacia, as "Cidades Globais", as redes de cidades e os grandes eventos internacionais. Os objetivos específicos que norteiam esse trabalho são: 
1) Debater o conceito de paradiplomacia; 
2) Definir a teoria da interdependência complexa e a relação desta com a paradiplomacia; 
3) Caracterizar as principais cidades atuantes no Sistema Internacional; 
4) Descrever as redes de cidades e qual sua importância para a internacionalização das cidades; e 
5) Demarcar e analisar quais são as ações que Porto Alegre realiza em termos de Relações Internacionais. 
Este trabalho se justifica, socialmente, como extremamente importante para o conhecimento das sociedades das cidades, principalmente a de Porto Alegre, sobre as ações externas que estão sendo praticadas pela prefeitura. Muitos dos residentes dessas cidades internacionalizadas não se inteiram sobre as Relações Internacionais do lugar onde vivem, e, portanto, pensam que não há conexões do município com outros locais do mundo ou, ainda, que essas relações são meramente comerciais, não compreendendo o peso político dessas ações, que são, de fato, extremamente importantes para o desenvolvimento das cidades. Além disso, muitas das administrações municipais não se preocupam em disponibilizar compilações de dados de suas ações externas. Assim sendo, é considerável a leitura e apreciação dessa monografia pelos cidadãos de Porto Alegre e por aqueles que se interessam pela temática de Relações Internacionais da prefeitura. 
Academicamente, este trabalho de conclusão é importante para a continuidade do estudo sobre paradiplomacia no Brasil e é um dos pioneiros sobre as relações entre Porto Alegre e demais localidades do mundo. A comunidade acadêmica de Relações Internacionais ainda é muito carente de análises paradiplomáticas, o que justifica, ainda mais, a pesquisa sobre o assunto, que é deveras importante dentro desta comunidade. As Relações Internacionais das cidades, especificamente, são tema que, apesar de já explorado por alguns autoresnão assumem caráter de prioridade entre os estudantes da área de política exterior, o que corrobora a importância deste trabalho acadêmico. 
A argumentação pessoal da relevância desse projeto encontra-se no apreço da autora pela cidade de Porto Alegre, onde nasceu, vive e, inclusive, trabalha na Gerência de Relações Internacionais do município. Além disso, a política internacional - incluindo temas de cooperação técnica e comércio exterior - tem um grande valor na formação profissional e pessoal da responsável pela elaboração do trabalho.
O trabalho, então, estará dividido em três capítulos, sendo que o primeiro apresentará a teoria da paradiplomacia, assim como as práticas estabelecidas por esta. O segundo capítulo estipulará o papel das cidades dentro das Relações Internacionais na atualidade, situando-as dentro das relações consulares e na participação nas redes de cidades. O último capítulo tratará especificamente da cidade de Porto Alegre e suas práticas paradiplomáticas - relações com cidades-irmãs, redes de cidades das quais participa e, também, os grandes eventos que o município sediou nos últimos anos.
As definições metodológicas são deveras importantes para o prosseguimento de um estudo científico. Portanto, este terá um cunho teórico-empírico e vertente de pesquisa qualitativa. O trabalho será do tipo exploratório, além de se tratar de um estudo de caso, baseado, principalmente, em dados de entrevista, documentais e bibliográficos.
	A presente pesquisa será de caráter teórico-empírico, que, segundo Demo (pp. 21, 2013), é aquela pesquisa que “é dedicada a tratar a face empírica e factual da realidade, de preferência mensurável”. Buscar-se-ia, portanto, a explicação de um fato, fenômeno ou evento a partir de uma teoria. O trabalho “A Internacionalização das Cidades: O Caso de Porto Alegre” se enquadra nessa tendência de pesquisa por mensurar a importância dos municípios para as Relações Internacionais, sob a óptica da teoria da Interdependência Complexa – que, apesar de não tratar especificamente da paradiplomacia, é a que melhor explica o fenômeno da internacionalização dos entes subnacionais no Cenário Internacional.
	A vertente de pesquisa qualitativa é aquela que, segundo Cajueiro (pp. 23, 2012) e Lira (pp. 26, 2014), diferentemente da pesquisa quantitativa, não utiliza dados estatísticos, para obter seus resultados. Ambos destacam, também, que as pesquisas serão, por sua vez, mais descritivas, e analisarão fenômenos sociais que “vão além do quantificar e medir”. A pesquisa qualitativa mensura a “qualidade” dos dados apurados, portanto deve-se ter um cuidado maior na seleção das informações a serem apresentadas no trabalho.
	A análise do conteúdo pesquisado pode ser feita por meio de fichamentos, resumos ou esquemas, visto que deve haver uma descrição densa da temática selecionada pelo pesquisador. A partir dessa avaliação, pode-se concluir que o trabalho corrente será feito, sobretudo, a partir de dados qualitativos de pesquisa, visto que não serão utilizados quaisquer instrumentos de investigação estatística, visando enumerar e mensurar resultados a partir de dados numéricos. Analisar-se-ão dados qualitativos de documentos, livros e artigos científicos sobre a temática das cidades no âmbito das Relações Internacionais. 
	Os estudos acadêmicos podem ser classificados dentro de três tipos: exploratórios, descritivos e explicativos.As pesquisas exploratórias são mais comuns em âmbito de graduação e, segundo Cajueiro (pp. 16, 2012), buscam explorar um problema, no intuito de torna-lo explícito para todos. Seguem, essencialmente, “a análise de exemplos ou modelos que estimulem a compreensão e a discussão”. Já de acordo com Marconi e Lakatos (pp.71, 2012), as pesquisas exploratórias têm tripla finalidade, que são o desenvolvimento de hipóteses, o aumento da familiaridade do acadêmico com a temática e a modificação e clarificação de conceitos.
	A pesquisa “A Internacionalização das Cidades: O Caso de Porto Alegre” será, então, do tipo exploratória, já que visa clarificar a definição e a importância da paradiplomacia das cidades dentro do Sistema Internacional. Além disso, faz a análise de um exemplo – o caso de Porto Alegre – e busca aumentar o conhecimento da autora sobre a temática para demais pesquisas no futuro.
	O principal método de pesquisa utilizado nas ciências humanas e sociais, segundo Gil (pp. 37, 2010), é o estudo de caso. Tal método de pesquisa consiste no estudo aprofundado de um caso, para que então, depois, seja possível a compreensão de outros casos comparativos. Esse tipo de metodologia tem algumas vantagens e desvantagens. No primeiro grupo, se encontram os fatos em que são descritas ações da vida real, que reproduzem muito bem o contexto em que estão inseridas e que geram interesse da sociedade – não só da academia. Já, no segundo grupo, o das desvantagens, se enquadram a falta de rigor metodológico e a dificuldade de generalização dentro das ciências sociais.
	Cajueiro (pp. 22, 2012) discute a existência de três tipos de estudo de caso diferenciados. O primeiro é o estudo de caso descritivo, que procura apenas apresentar um caso em detalhes. O segundo é o estudo de caso interpretativo, que visa interpretar os dados, buscando classificar as informações dentro do fenômeno abordado. O terceiro é o estudo de caso avaliativo, que é o conjunto dos dois anteriores, descrever e interpretar. A presente pesquisa configura, de fato, um estudo de caso descritivo, que pretende exemplificar a importância das cidades nas Relações Internacionais, utilizando a experiência de Porto Alegre, que, apesar de não ser uma cidade global, vem se inserindo de forma exitosa no Sistema Internacional.
	As técnicas de pesquisa são os principais meios de coletas de dados. Nas ciências humanas, o mais comum são as pesquisas documentais e bibliográficas. As pesquisas documentais são baseadas em fontes de natureza primária ou secundária e, segundo Gil (pp. 30, 2010), “vale-se de toda sorte de documentos, elaborados com finalidades diversas, tais como assentamento, autorização, comunicação etc”. O significado principal de “natureza primária” desses documentos é de que não foram editados, são, portanto, originais. As fontes documentais podem ser divididas em escritas ou não escritas – escritas, como atas ou cartas, e não escritas, como fotografias ou vídeos – em primárias ou secundárias e em contemporâneas ou retrospectivas. 
	No trabalho “A Internacionalização das Cidades: O Caso de Porto Alegre”, serão usados diversos tipos de fontes primárias. Alguns dados estatísticos pesquisados por terceiros, como, por exemplo, aqueles retirados do ObservaPOA – Observatório da cidade de Porto Alegre. Documentos dos irmanamentos de Porto Alegre com as mais diversas cidades do mundo, e dados dos protocolos de cooperação técnica, das redes de cidades e dos grandes eventos internacionais que ocorreram em Porto Alegre, tais como a Copa do Mundo de Futebol Masculino, em 2014, e as diversas edições do Fórum Social Mundial (2001, 2002, 2013, 2014 e 2016). Tais dados serão retirados do sítio eletrônico da Prefeitura Municipal de Porto Alegre e, também, de entrevista com o responsável pela Gerência de Relações Internacionais da Prefeitura Municipal de Porto Alegre, Rodrigo Corradi.
	Outra técnica de pesquisa que é essencial em quase todas as áreas de estudo é a pesquisa bibliográfica. Tal técnica tem por base, segundo Marconi e Lakatos (2012, pp.57), “toda a bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo, desde publicações avulsas, boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, teses, material cartográfico etc”. Ou seja, deve-se fazer uma revisão sobre grande parte daquilo que já foi escrito e publicado sobre a temática selecionada para a pesquisa. 
	Gil (pp. 30, 2010) cita, em seu livro “Como Elaborar Projetos de Pesquisa”, que a grande vantagem de se utilizar pesquisa bibliográfica diz respeito ao fato de que há uma impossibilidade de, por exemplo, se percorrer diversas cidades do mundo para a obtenção de dados específicos sobre o tema da presente pesquisa, portanto a bibliografia existente sobre o assunto é essencial para que a autora possa ter acesso às informações necessárias. A desvantagem, porém, é que os dados, muitas vezes, são processados de maneira equivocada e, por isso, é preciso ser cuidadoso na seleção das fontes.
	Na presente pesquisa, se utiliza a técnica de pesquisa bibliográfica. Há a revisão de diversos tipos de textos, dentre eles livros, artigos científicos, monografias, dissertações de mestrado e teses de doutorado. A análise dessas obras é a base do estudo sobre a importância das cidades nas Relações Internacionais, pois, como mencionado no parágrafo anterior, não há como ter acesso aos dados necessários que não por meio de trabalhos realizados por outros autores.
2. A PARADIPLOMACIA
O termo “paradiplomacia” surgiu, segundo Maria Clotilde Meireles Ribeiro (2009), quando Panayotis Soldatos, da Universidade de Montreal, no Canadá, em meados da década de 1980, utilizou a palavra para descrever o fenômeno como a atuação internacional de entes não-centrais de um Estado-Nação, que pode ou não estar em conformidade com a política externa nacional. A definição de Soltados, combinada com o conceito de “microdiplomacia” – termo diferenciado, porém com o significado muito similar – utilizado por Ivo Duchaek, pesquisador da City University of New York, definem, atualmente, o que é a paradiplomacia. 
Há, entretanto, outras definições para o termo, exemplificando com o significado atribuído a palavra por Der Derian, em 1987, que defendia que a paradiplomacia era a diplomacia praticada por qualquer ator não estatal na comunidade internacional, como as organizações internacionais, organizações não governamentais e empresas transnacionais. Esse trabalho, no entanto, utilizará da significação atribuída por Soldatos e Duchaek, visando, especialmente, as Relações Internacionais dos entes subnacionais, como cidades e regiões. 
Para o entendimento do surgimento e evolução da paradiplomacia, devemos, primeiramente, compreender em qual contexto mundial o fenômeno iniciou o seu desenvolvimento intenso. Cabe destacar, também, quais as principais razões para o progresso das ações dos entes não-centrais nas Relações Internacionais.
2.1. A Sociedade Internacional e as Causas da Paradiplomacia
O conceito de paradiplomacia, como já especificado, surgiu em meados da década de 1980, em um contexto global bipolar, com dois grandes polos de poder mundial – capitalista e socialista. A evolução do fenômeno, porém, se intensificou a partir dos anos 1990, com o término da bipolaridade e início de um mundo multipolar e globalizado. O poder foi, portanto, redistribuído e houve um grande incentivo à redemocratização de diversos países. A democracia acarretou, também, na maior liberdade dentro dos países, o que possibilitou a ascensão de novos players.
A democracia e a liberdade geraram maior poder para os demais atores do Sistema Internacional se inserirem na dinâmica das Relações Internacionais juntamente com os Estados. Ator, por definição, é aquele que tem a habilidade de mobilizar recursos para atingir seus objetivos e a capacidade de exercer influência e poder sobre outros atores. As organizações internacionais, como a Organização das Nações Unidas e todas as agências dentro de seu amplo sistema, as organizações não governamentais, comoo Greenpeace, as empresas transnacionais e, inclusive, os entes subnacionais adquiriram mais poder e passaram a ter maior influência internacional. Esse aumento de importância não se deu somente pela liberdade adquirida após a expansão da democracia no globo, mas também às necessidades criadas por cada sociedade e pela Sociedade Internacional em si. Segundo Cezário (2011, pp. 38):
Todas as formas de atuação são construídas a partir das necessidades criadas por uma sociedade. Logo, a atuação internacional dos governos locais representaria uma demanda da atual sociedade globalizada.
Tais necessidades surgiram, principalmente, da variação dos temas discutidos internacionalmente. Enquanto no período que antecedeu ao final da Guerra Fria, os temas tratados na Comunidade Internacional eram, basicamente, aqueles relativos à segurança e à política, no fim dos anos 1980 e início dos 1990, já havia uma multiplicidade de temáticas para serem debatidas, tais como a preocupação com o respeito aos direitos humanos e ao meio ambiente. Um Estado-Nação, por mais organizado que seja, não consegue lidar com todas essas questões de maneira aprofundada, em cada cidade do seu território, por exemplo, e, como os cidadãos desejam que tais temas sejam geridos em sua região, o próprio município ou estado acaba tendo que atuar internacionalmente para suprir suas demandas.
A distinção entre o doméstico e o internacional sempre fora bem definida – havia assuntos de escopo doméstico, que importavam somente a este ou aquele país, e assuntos internacionais, que demandavam atenção de toda a Comunidade Internacional. Com a intensificação da globalização e com o desenvolvimento dos meios de comunicação, com destaque para a internet, essa diferenciação passou a ser muito pequena, visto que tudo o que acontece internamente em um país pode influenciar outros – já que o conhecimento é repassado muito mais rápido do que nos anos anteriores à difusão da internet. Portanto, segundo Gustavo de Lima Cezário, no livro Atuação Global Municipal – Dimensões e Institucionalização (2011, pp. 33), se todos estiverem cientes de que o doméstico e o internacional, hoje, compõem um ambiente único, em que se constrói a comunidade internacional, tal distinção não vai levar a implicações significativas.
Dois dos primeiros exemplos de paradiplomacia a serem conferidos no mundo foram a província de Quebec, no Canadá, e a Catalunha, na Espanha. Ambas com problemas de reconhecimento, já que não se sentiam parte dos seus respectivos países. Podemos considerar o nacionalismo, a partir dessas exemplificações, como a primeira das causas da internacionalização de entes subnacionais. Tanto Quebec quanto a Catalunha desejavam possuir uma política externa própria, por vezes, contrariando a política externa de seus países. Não podemos considerar, todavia, que a paradiplomacia é uma ferramenta de segregação, pois essas regiões, mesmo antes de aderirem às práticas paradiplomáticas, já possuíam um desejo de independência, o que não ocorre – na maioria dos casos – com governos locais esclarecidos com a temática do pertencimento ao Estado.
Cada ente subnacional possui, então, razões específicas para recorrer à paradiplomacia como instrumento de desenvolvimento. A primeira, já explicitada acima, decorre da busca por identidade própria, porém há diversos motivos que podem ser considerados aqui. Um deles é o fato de que a economia está globalizada, e, consequentemente, quem não adere à globalização, acaba ficando em desvantagem – tanto no âmbito de Estados quanto no de entes subnacionais. A globalização das comunicações foi um fator que, além de ter impulsionado o crescimento da paradiplomacia, gerou uma motivação para que outros governos locais explorassem as Relações Internacionais, já que, observando seus semelhantes atuando internacionalmente, decidem que é possível fazê-lo também.
A ineficiência ou negligência dos governos centrais é, da mesma forma, um pretexto para o início das atividades paradiplomáticas. Quando as políticas ou verbas do governo federal não são suficientes para os governos locais, é natural que estes busquem outras vias para adquirir o desenvolvimento necessário, seja ele político, social ou econômico. A inexistência de uma cooperação entre o governo do país e as cidades, por exemplo, em prol da preservação ambiental, pode acarretar na prática de paradiplomacia, buscando, em cidades que sejam semelhantes, por exemplo, em número de habitantes, estrutura urbana, relevo ou vegetação, colaboração para atingir os objetivos.
A paradiplomacia auxilia, também, a atrair recursos para o governo local. Dar visibilidade internacional para uma região é muito importante para que os investidores a conheçam e, assim, possam empregar capital, viabilizando o desenvolvimento. Essa visibilidade pode ocorrer de diversas maneiras, como sediando algum evento internacional de grande ou médio porte, investindo em atrações turísticas que possam aumentar o número de visitantes na cidade ou, até mesmo, utilizando propagandas de alguma boa prática existente na cidade ou região. Os investimentos são variados, podendo ser um apoio financeiro para construção de alguma infraestrutura necessária, a instalação de alguma grande empresa - o que gera empregos diretos e indiretos – ou aporte para políticas sociais já iniciadas ou a serem introduzidas no local.
Dentro da temática da paradiplomacia existem algumas categorizações, a primeira delas em relação às ações que são realizadas, podendo ser: a) clássica; b) de integração; e c) identitária. A primeira delas abrange as ações mais tradicionais de diplomacia, como a cooperação técnica e econômica e ações de marketing para atração de visitantes. A segunda é o desenvolvimento da paradiplomacia em rede, criando associações de governança cooperativa para que a integração regional aumente, de fato. O intercâmbio de estudantes e políticas culturais também são formas de ação dentro da paradiplomacia de integração. A última visa ao nacionalismo, que busca o reconhecimento e o apoio de outros entes subnacionais e, até mesmo, de Estados, para que consigam sua independência (RIBEIRO, 2009). 
Outra possível categorização é em relação ao âmbito internacional em que o governo local pretende atuar. Pode-se citar: a) regional transfronteiriça; b) microdiplomaciatransregional; e c) global. A regional transfronteiriça é aquela em que as cidades ou regiões possuem uma fronteira comum, como é o caso de Santana do Livramento (Brasil) e Rivera (Uruguai). Essas cidades buscam, geralmente, o desenvolvimento mútuo e conjunto, principalmente pelo trânsito intenso de pessoas, de uma cidade para a outra. Na microdiplomaciatransregional, os governos locais não possuem uma fronteira compartilhada, porém os países aos quais pertencem, sim, e utilizam da paradiplomacia para fortalecimento do contato e para o crescimento da região. A paradiplomacia global é aquela em que não há ligações territoriais entre os entes subnacionais e nem entre seus países, mas em que, mesmo assim, há o interesse de cooperar.
As categorizações citadas acima não são excludentes, podendo um governo local ter estratégias de paradiplomacia tanto transregional quanto global. É possível, também, que uma cidade ou região exerça paradiplomacia clássica e de integração regional ao mesmo tempo. Existe, apenas, uma hierarquia dentro da estratégia de cada governo local para saber-se em qual dessas categorias deve-se investir mais.
Há, entretanto, algumas diferenciações entre a paradiplomacia exercida por cidades (foco desse trabalho) e por regiões – estados, províncias ou qualquer outra forma de governo intermediária. A paradiplomacia praticada por regiões é, segundo Ribeiro (2009, pp. 38), mais limitada, por serem as regiões mais próximas do governo central. O foco da atuação internacional das regiões é, principalmente, econômico e comercial, visando a atração de investimentos para o governo local. Por isso, a preferência geralmente é por cooperações bilaterais, ao invés de redes de cooperação. A tendênciaé que seja uma política externa mais duradoura e alinhada com o governo central.
A paradiplomacia praticada pelas cidades, todavia, desfruta de um maior grau de liberdade, já que é mais distante do governo central. Os principais temas tratados pelas cidades são os sociais e culturais, que visam, em sua maior parte, ao desenvolvimento e ao bem-estar das comunidades. A cooperação via redes de cidades é um dos principais meios de formar alianças nesse nível de governo subnacional, porém as cooperações bilaterais existem, também, para o aprendizado das boas práticas da cidade com quem se coopera. A política externa da cidade não é, necessariamente, alinhada com a do governo central, principalmente por não tratarem de temas muito semelhantes – as cidades lidam mais com as lowpolitics[footnoteRef:3], enquanto os governos centrais e as regiões trabalham mais com as high politics[footnoteRef:4]. [3: “Baixa” política, como assuntos relativos ao meio ambiente e à cultura.] [4: “Alta” política, como assuntos de segurança e econômicos.] 
O enfraquecimento da soberania nacional é uma das principais críticas à paradiplomacia. Há estudiosos que consideram que a atuação paradiplomática reduz a importância da soberania de um Estado, o que não condiz com a realidade apresentada por Ribeiro (2009), visto que as ações internacionais dos governos locais auxiliam estes a que contemplem seus objetivos, sejam eles econômicos ou sociais, não desmerecendo a autoridade do país em que estão inseridos. Em alguns casos, como já visto anteriormente, é possível que a política externa dos entes subnacionais confronte a do Estado, porém ou se trata de assuntos em que o governo central não tem muita ingerência (lowpolitics) ou de locais que já possuíam um caráter separatista anteriormente, como a Catalunha e Quebec
Para melhor explicação de todos os demais tópicos do trabalho, como a atuação das cidades no Sistema Internacional, as grandes cidades mundiais, os principais exemplos de internacionalização de cidades brasileiras e o estudo de caso sobre a inserção internacional de Porto Alegre (Brasil), necessita-se de uma base teórica. A teoria que melhor se adequou às explicações sobre a importância das cidades nas Relações Internacionais foi a da Interdependência Complexa, formulada por Robert Keohane e Joseph Nye, em 1977.
2.2. A Interdependência Complexa e a Paradiplomacia
A teoria da Interdependência Complexa foi elaborada por Robert Keohane e Joseph Nye no ano de 1977, dentro do contexto do neoliberalismo político e da bipolaridade causada pela Guerra Fria. Apesar de os autores não explicitarem, em seu livro “Power and Interdependence”, a ação dos entes subnacionais e o fenômeno da paradiplomacia, que será mencionado pela primeira vez apenas no início da década de 1990, a Interdependência Complexa é a teoria que consegue melhor explicar, mesmo que parcialmente, a inserção das cidades no Sistema Internacional.
	A teoria da Interdependência Complexa tem algumas diretrizes básicas, baseadas no contexto do neoliberalismo político, tentando desconstruir, principalmente, a teoria realista, que, segundo Keohane e Nye, já deveria estar em desuso por não conseguir mais explicar as Relações Internacionais da modernidade. Os teóricos garantem que, na atualidade, não é mais possível que um Estado seja considerado o único ator e que este não coopere com outros players no Sistema Internacional.
	Um Estado “dependente” é aquele que é afetado por forças externas e necessita destas para garantir a sua sobrevivência, sabendo-se disso, “interdependência” pode ser analisada, basicamente, como atores que possuem dependência mútua. Essa interdependência é baseada nas grandes transações internacionais, sejam elas de bens, de dinheiro, de pessoas ou, até mesmo, de mensagens entre diferentes players no Cenário Internacional. Os autores alegam que essas transações sempre envolverão custos e benefícios, que necessitam ser mútuos, porém não significa que serão simétricos – até mesmo pela dificuldade de mensurar tais variáveis. Há, portanto, dois tipos de perspectivas que podem ser adotadas para analisar os custos e benefícios das operações internacionais, “A primeira foca nos ganhos conjuntos ou perdas conjuntas para as partes envolvidas. A outra enfatiza os ganhos relativos e as questões distributivas”.[footnoteRef:5] (KEOHANE; NYE, 2012, pp. 8). [5: “The first focuses on the joint gains or joint losses to the parties involved. The other stresses relative gains and distributional issues”.] 
	A Interdependência Complexa pretende ser, segundo os autores, uma estrutura para o funcionamento da Nova Ordem Mundial, que iniciou após o colapso da antiga União Soviética e o fim da Guerra Fria, no início da década de 1990. Keohane e Nye defendem que a natureza da política internacional se modificou e que não é mais possível mensurar, tão facilmente, a quantidade de poder que um Estado detém, por isso a teoria realista dificilmente conseguiria se enquadrar nesse novo cenário mundial. A maior quantidade de atores relevantes no Sistema Internacional, como transnacionais, Organizações Não Governamentais (ONGs) e Organizações Internacionais, também leva ao descrédito dos teóricos do Realismo, visto que esses argumentavam que apenas os Estados-Nação teriam verdadeiro destaque (KEOHANE; NYE, 2012). 
	A Interdependência Complexa possui três características principais: a multiplicidade de canais, as novas temáticas e a ausência de hierarquias e a menor importância da força militar. A primeira delas, a multiplicidade de canais, se refere a duas questões, à emergência de novos atores nas Relações Internacionais e aos canais diversos pelos quais eles se relacionam. Tais atores, que já foram citados anteriormente, são, basicamente, as ONGs, Organizações Internacionais, empresas transnacionais, os entes subnacionais (não citados pelos principais autores da teoria, porém incluídos, por esta ser a base do trabalho), além do tradicional Estado-Nação.
	Os canais, ou relações, podem ser divididos em interestatais, a forma mais tradicional, entre dois Estados-Nação, e a única reconhecida pelos teóricos realistas, transnacionais, que são as relações entre atores de diferentes nacionalidades, não controlados pelo Estado. O último, e mais importante para o entendimento e desenvolvimento do trabalho, é o canal transgovernamental, que são as relações de “dentro” dos Estados, realizadas por agências governamentais, prefeituras ou estados federativos. Essa forma de conexão pode ser realizada tanto dentro de um único Estado quanto por unidades subnacionais ou agências do governo de diferentes nacionalidades. Tal canal relativiza a ideia de interesse nacional, já que essas unidades podem utilizar diferentes formas de política externa (KEOHANE; NYE, 2012). 
	A segunda das principais características da Interdependência Complexa são as novas temáticas e alteração de hierarquias, que é, também, dividida em duas partes. A primeira delas diz respeito às novas temáticas que passaram a ser debatidas no Sistema Internacional. Os novos temas são, principalmente, ligados ao meio ambiente, como as emissões de gases estufa, a poluição das águas ou o desmatamento, podem ser, da mesma forma, alusivos à sociedade, como desigualdade social ou preconceito racial. Antigamente apenas alguns temas eram relativamente importantes, como as questões militares e econômicas, que eram consideradas high politics, ou “políticas altas”. Esse fato, em conjunto com a ascensão das novas temáticas – que se relacionam entre si – no Sistema Internacional, acarretou em uma alteração das hierarquias das temáticas tratadas internacionalmente (KEOHANE; NYE, 2012). 
	A última das principais características da teoria é a menor importância da força militar. Com o passar dos anos – e das guerras –, a utilização de poder bélico para solucionar quaisquer conflitos foi muito reduzida. Na atualidade, resolvem-se as questões pendentes com embargos econômicos ou sanções políticas, a força “bruta” só é usada em último caso e com raras exceções.Isso passou a ocorrer por que os efeitos de uma guerra ou punição militar são custosos, já que locais são destruídos e civis mortos, e incertos. Keohane e Nye justificam que o poder militar é usado mais raramente, por Estados, contra outros semelhantes com quem têm interdependência complexa, porém pode ser necessário contra outros países (KEOHANE; NYE, 2012).
	A paradiplomacia pode ser analisada por diversas ópticas, dentre elas a visão mais tradicional dentro das Relações Internacionais, o realismo. Sob essa perspectiva, a inserção internacional de atores subnacionais é abordada com base em movimentos de separação, como ocorre na Catalunha, Espanha, e em Quebec, Canadá, que visam a se tornar Estados-Nação. Diz-se, também, que a atuação desses players “interfere perigosamente nas prerrogativas do Estado-Nação” (ISER, 2013, pp. 13), já que esses agem internacionalmente buscando a sua independência do país ao qual pertencem. Essa teoria, entretanto, explica somente uma pequena parcela de entes subnacionais que atuam externamente, visto que a maioria das cidades e regiões tem outros objetivos principais com suas ações internacionais.
	O fenômeno da paradiplomacia é mais bem explicado, então, pela Interdependência Complexa, primeiramente porque a teoria destaca a existência de dois níveis no Sistema Internacional, a estrutura e o processo. Este último remete-se à dinâmica das relações entre os atores diversos e as redes de interação e barganha que desenvolvem entre si. Com isso, podemos destacar a ascensão de novos atores no Sistema Internacional, o que não era reconhecido pelos teóricos realistas. Dentre esses novos atores estão os entes subnacionais, que são atuantes há relativamente pouco tempo no cenário internacional e que, agora, participam interativamente com outros atores, tanto semelhantes, quanto diferentes – organizações internacionais, fundações internacionais e empresas transnacionais. De acordo com Guilherme Iser (2013, pp.15), é importante destacar a:
Capacidade e habilidade dos GNC[footnoteRef:6] de cumprir funções no plano exterior, alcançar objetivos de vinculação internacional e influenciar outros atores. Os GNC podem manter vínculos variados, promovendo seus interesses através de intercâmbios recíprocos que geram efeitos, criam laços entre diferentes sociedades e institucionalizam formas inovadoras de cooperação internacional. [6: GovernosNão-Centrais] 
	Keohane e Nye (2012) abordam, também, um assunto denominado como relações transgovernamentais, que, como já foi mencionado, são as relações entre diferentes estruturas de governos nacionais, que firmam relações com estruturas similares de outros países, com organizações internacionais e com outros atores não-governamentais – como as já citadas fundações internacionais e empresas. Por mais que os autores não citem explicitamente, essa definição remete aos entes subnacionais que são atuantes, hoje, no Sistema Internacional e que estabelecem múltiplos canais de relação com atores diversos. A diminuição da importância do poderio militar é, da mesma forma, uma questão relevante para a inserção dos atores não centrais no plano internacional, já que estes, em geral, não possuem exército próprio e tratam, em sua maioria, de temáticas mais “brandas”, como mudanças climáticas, democracia participativa e cooperação internacional (ISER, 2013).
	A teoria afirma, também, que são as assimetrias de poder que têm maior probabilidade de influenciar os atores internacionais a se relacionarem uns com os outros, pois a ideia de união é atraente, principalmente para aqueles países menos desenvolvidos e que, sob a óptica realista, são menos poderosos. A partir disso, pode-se justificar o esforço dos entes subnacionais, como as pequenas e médias cidades, salientando o caso de Porto Alegre, de se internacionalizarem, visto que, se relacionando com outros municípios ou regiões, podem estabelecer parcerias que acelerem o seu desenvolvimento como um todo.
	A Interdependência Complexa se encaixa duplamente na temática do trabalho quando concentramo-nos especificamente nas Redes de Cidades. Além de serem compostas por atores subnacionais, a própria rede é uma Organização Internacional, que, segundo Keohane e Nye (2012), é um dos principais “novos players” do Sistema Internacional e que tem como objetivos a cooperação entre os Estados – nesse caso cidades – e a discussão sobre as novas temáticas, principalmente nas relativas ao meio ambiente e planejamento urbano.É possível, portanto, explicar, mesmo que em parte, o fenômeno paradiplomático através de uma teoria muito usual nas Relações Internacionais.
2.3. A Paradiplomacia no Brasil
A paradiplomacia na República Federativa do Brasil teve origem, segundo Álvaro Chagas do Castelo Branco (2008), nos últimos anos do regime militar, quando este foi se tornando mais brando e foi permitida a primeira eleição direta para governadores, em 1982. Um dos pioneiros das práticas paradiplomáticas foi Leonel Brizola, quando governou o Rio de Janeiro, entre março de 1983 e março de 1987. Ele criou, durante o seu mandato, o primeiro órgão oficial de articulação internacional de um ente subnacional brasileiro. Outro precursor da atuação internacional de governos não centrais foi o governador do Rio Grande do Sul, Pedro Simon, que, em 1987, criou uma secretaria especial para assuntos internacionais.
De acordo com José Vicente da Silva Lessa (apud BRANCO, 2008), até o ano de 2002, já havia notificação de mais de 65 ações paradiplomáticas, sendo 53 dessas praticadas por estados federados, 7 por municípios e 5 por outros agentes. Os principais países parceiros desses eventos foram Alemanha, Argentina, Canadá, China, Estados Unidos, França, Itália e Suíça. Os assuntos mais tratados foram o comércio, a agricultura, o turismo, os cuidados com o meio ambiente, a troca de boas práticas sobre administração pública, ciência e tecnologia e integração regional.
Apesar da emergência da paradiplomacia no Brasil, não há uma unanimidade em relação à legalidade desse procedimento. O Brasil, como seu próprio nome anuncia, é uma república federativa, ou seja, uma república composta por estados federados, que detêm certa autonomia de atuação. Porém, uma das principais características de uma federação é a de que a política externa é matéria do governo central, portanto os estados-membros não possuem capacidade de ação internacional, como ocorre em confederações, por exemplo. Além disso, o governo brasileiro tem a característica de ser, na maior parte de sua existência, muito centralizador e isso se deve, principalmente, aos períodos autoritários de 1937-1945 e de 1964-1985.
A Constituição Federal do Brasil, de 1988, delega determinadas funções para cada uma das esferas – da União, do estado ou do município. Segundo Branco (pp. 7, 2008):
A autonomia das entidades federativas brasileiras pressupõe uma repartição de competências legislativas, administrativas e tributárias, sendo, pois, um dos pontos caracterizadores e asseguradores do convívio no Estado Federal.
Dentro dessa repartição de competências, encontramos, no artigo 21.I, que cabe à União manter quaisquer tipos de relações com estados estrangeiros e participar de organismos internacionais. Além disso, no artigo 84.VII e 84.VIII – que trata das atribuições que são somente do Presidente da República – é dito que manter relações com outros países, acreditar representantes diplomáticos e celebrar tratados, convenções e atos internacionais é função exclusiva do representante maior da Nação. Já, no artigo 25, parágrafo 1º, diz-se: “São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição”. É, portanto, a paradiplomacia uma ferramenta ilegal, aplicada por entes que não possuem capacidade.
Grandes estudiosos da Constituição, como Ferreira Filho e José Afonso da Silva defendem a unidade do Estado central para as Relações Internacionais, já que o documento máximo do país coíbe as práticas de paradiplomacia. As tentativas de atuação internacional pelos entes subnacionais– principalmente estados e municípios – vêm, então, sendo marginalizadas, já que não estão sob o amparo da Constituição.
Uma tentativa de criar mais possibilidades para os governos locais foi a introdução do Pacto Federativo, que visa a redistribuição de competências entre a União, os estados e os municípios. Dentre essas atribuições que seriam mais bem organizadas, está a capacidade de os estados federados e municípios atuarem internacionalmente. No âmbito municipal, a Confederação Nacional dos Municípios vem auxiliando, desde sua criação, em 1980, as cidades a garantirem parcerias internacionais para possibilitar seu desenvolvimento.
A formação de tratados internacionais no Brasil segue as regras da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969. Portanto, o representante brasileiro assina o tratado e este deve ser ratificado pelo Congresso Nacional e promulgado pelo Diário Oficial da União antes de entrar, de fato, em vigor. A Convenção de Viena, entretanto, não especifica que somente os Estados-Nação poderiam oficializar tratados, mas que esses deveriam, em suas Constituições Federais, delegar ou não esse poder aos governos locais. Cabe destacar, aqui, a diferenciação de “capacidade para celebrar tratados internacionais” e “competência dos poderes constituídos do Estado para formar e declarar a vontade estatal de assumir compromissos internacionais”, já que é possível que um estado ou município declare vontade de assumir um compromisso internacional – só que este deve ser efetivado pelo Governo Federal.
A dificuldade de conciliar os interesses do país com os dos entes subnacionais não é prioridade do Brasil. Diversos outros países passam ou já passaram por situação semelhante, quando os governos locais de seus territórios iniciaram seus processos de internacionalização. De acordo com Tatiana Lacerda Prazeres (pp. 284 in BARRETO; MARIANO; VIGEVANI; WANDERLEY, 2004):
A experiência de outras federações existentes hoje ilustra que este problema não se circunscreve apenas ao Brasil. Unidades federadas de países como Alemanha, Argentina, Canadá, Estados Unidos e Suíça têm apresentado interesse na atuação externa, o que acabou mesmo por motivar, nesses países, estratégias que viabilizaram, seja maior influência das ditas unidades na formulação da política externa nacional, seja mesmo sua participação direta no cenário internacional.
A Confederação Suíça possui uma experiência de paradiplomacia mais branda, já que se trata de uma confederação. No artigo 56 de sua Constituição Federal, a Suíça permite que seus cantões (como são chamadas as subdivisões do país) concluam tratados relacionados à matérias de suas competências, jamais contrariando os interesses nacionais. Para que tais atos internacionais sejam aplicados, de fato, é necessário o conhecimento e aprovação de algum órgão federativo (BARRETO; MARIANO; VIGEVANI; WANDERLEY, 2004).
A República Argentina modificou sua Constituição Federal em 1994 e, no seu artigo 124, autoriza que suas províncias celebrem tratados mediante aprovação do Congresso Nacional, esses devem tratar, principalmente, de assuntos relacionados ao desenvolvimento econômico e social do ente subnacional. Até a reforma constitucional, a doutrina e a jurisprudência da Argentina coibiam as ações internacionais de entes subnacionais – assim como o Brasil (BARRETO; MARIANO; VIGEVANI; WANDERLEY, 2004).
A República Federal da Alemanha já registrava ações de paradiplomacia por parte de seus Länderes (como são chamados os estados) desde 1871. Com a declaração da República de Weimar e com o Regime Nazista, tais ações foram reduzidas e, depois, extintas. Atualmente, no artigo 32.I da Constituição Federal, é definido que as Relações Internacionais devem ser conduzidas pela federação, porém se for matéria de interesse de um ou mais Länderes, estes devem ser consultados e precisam aprovar o tratado ou ato. Também, com a autorização prévia do Estado, os Länderes podem atuar internacionalmente e, inclusive, celebrar tratados – que serão posteriormente avaliados pelo governo central e, então, incorporados (BARRETO; MARIANO; VIGEVANI; WANDERLEY, 2004).
Não há como formular um modelo internacional de atuação externa de entes subnacionais, pois os países são muito diferentes – econômica, social e politicamente. É possível, porém, que alguns dos exemplos citados acima sejam tomados como modelo para o início da institucionalização da paradiplomacia, o que já é uma tendência mundial.
Como alternativa para solucionar a “informalidade” dos governos locais em suas tentativas de internacionalização, o deputado federal André Costa (PDT/RJ), que, além de parlamentar, é diplomata de carreira licenciado, apresentou uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) de número 475/2005 para institucionalizar a paradiplomacia. Conhecida como “PEC da Paradiplomacia”, a proposta tinha como objetivo a inclusão de mais um parágrafo no artigo 23 da Constituição Federal – que dispõe sobre as competências comuns entre União, Estados, Municípios e Distrito Federal. O deputado justificou a importância da emenda, dizendo que trazia vantagens para toda a federação, visto que os entes subnacionais podem captar mais investimentos e parcerias individualmente do que subordinados à União. Entretanto, a PEC foi rejeitada em 2006, após parecer negativo da Comissão de Constituição e Justiça, que alegou que os governos locais podem atuar internacionalmente, mas dentro dos limites impostos.
Em 2006, foi apresentado no Senado Federal, pelo Senador Antero Paes de Barros (PSDB/MT), o Projeto de Lei (PL) do Senado 98/2006, que versava sobre aplicação de normas internacionais no Brasil e outras disposições semelhantes. Após ter substitutivo apresentado pelo Senador Arthur Virgílio (PSDB/AM), o projeto possibilitaria que os entes subnacionais celebrassem convênios internacionais com unidades subnacionais de outros países – são chamados convênios pois não são incorporados às leis nacionais. Apesar de não representar toda a liberdade que os defensores dos governos locais desejam, seria um grande avanço para a atuação internacional desses. A esfera jurídica dos convênios seria, portanto, as leis dos estados e dos municípios e eles deveriam passar por avaliação do Ministério das Relações Exteriores (MRE). Esse fato impossibilitaria que todos os municípios, por exemplo, celebrassem convênios, já que há mais de 5500 cidades no Brasil – o MRE não conseguiria das parecer a todas. O PL foi negado por inconstitucionalidade, já que é, como já visto anteriormente, competência exclusiva do Presidente da República as relações com o exterior.
O Governo Federal, frente ao aumento da atuação internacional dos estados e cidades, criou, primeiramente, a Secretaria de Assuntos Federativos (SAF), que se tornou Secretaria de Assuntos Federativos e Parlamentares (SAFP) e que hoje se chama Secretaria de RelaçõesInstitucionais (SRI) para monitorar as ações dos entes subnacionais e pautar o Governo Federal dessas ações. Um dos principais eixos de atuação da secretaria é a cooperação internacional federativa, que trata de temáticas como o Mercosul, a Organização dos Estados Americanos (OEA) e a política de fronteiras.
Duas ações efetivas foram tomadas por essa Secretaria em relação às Relações Internacionais dos governos locais. A primeira delas foi a criação de escritórios regionais do Itamaraty nos estados e regiões, a exemplo do ERESUL, sediado em Porto Alegre. A segunda foi a criação da Política Externa Federativa, que, segundo Alberto Kleiman (pp. 105, 2009):
Trata-se de uma política governamental voltada para a promoção e a articulação de iniciativas externas promovidas pelos governos subnacionais, no sentido de apoiá-los na identificação de oportunidades, e com objetivo de estabelecer acordos de cooperação, bem como fomentar sua participação nos fóruns de negociação e cooperação.
A idealização dessa política, pelo Governo Federal, foi, de certa forma, para apoiar os entes subnacionais e, de outra, para garantir que esses não exerceriam política externaprópria podendo, eventualmente, contrariar os interesses da União.
Para os governos locais, existem algumas formas de intensificar e/ou institucionalizar suas ações internacionais. A primeira delas seria através do Direito Internacional Privado – realizar os tratados e atos internacionais por meio de fundações, associações ou empresas para que pudessem utilizar essas normas, que fogem do escopo do Direito Internacional Público, que são as relações somente entre detentores de personalidade jurídica internacional. A segunda seria o aumento do diálogo, inclusive pela Política Externa Federativa, com o Governo Federal. A terceira, e menos provável, seria uma reforma constitucional, adicionando os Estados, Municípios e Distrito Federal como aptos a celebrar tratados e a agir internacionalmente.
A atuação dos entes subnacionais, no entanto, não cessou. A participação em feiras de comércio e de intercâmbio cultural, em zonas de cooperação, como é o caso do Fórum CODESUL (Conselho de Desenvolvimento e Integração do Sul) – CRECENEA (Comissão Regional de Comércio Exterior do Nordeste Argentino) – uma cooperação entre estados brasileiros (Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina) e províncias argentinas (Chaco, Corrientes, Entre Ríos, Formosa, Missiones e Santa Fé). Mesmo que a atuação informal impeça o vínculo jurídico, os governos locais formam cada vez mais convênios de cooperação bilateral (ainda que não possuam validade para futuras cobranças).
Apesar de não possuírem amparo jurídico, os entes subnacionais brasileiros se mostram aptos para atuar internacionalmente, seus representantes vêm fazendo viagens internacionais e atraindo investimentos. Tanto estados quanto municípios estão atuando cada vez mais frequentemente no Cenário Internacional. Cabe destacar, então, as ações dos municípios, que serão a temática principal do capítulo seguinte desse trabalho.
3. AS CIDADES E AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
Os entes subnacionais vêm se inserindo de forma exitosa nas Relações Internacionais. Dentre eles se destacam as cidades, que, cada vez mais, criam estruturas municipais específicas para lidar com os assuntos internacionais e buscam maior visibilidade em ambiente externo, participando de redes de cidades e estabelecendo cooperações bilaterais. Além disso, o maior espaço para as novas temáticas, como as questões ambientais, também possibilitou o aumento da atuação dos municípios, que possuem maior ingerência para lidar com tais temas. Dessa forma, existem, no mundo, algumas cidades que são destaque por sua atuação global – tais como Barcelona e Cidade do México. 
3.1. As Cidades como Atores Políticos
A partir dos anos 1950, as áreas urbanas passaram a se multiplicar. A ideia de se morar em uma cidade, com infraestrutura, bons empregos e acesso à educação e à saúde, conquistou muitas famílias, que trocaram suas realidades rurais pela urbanização. Em 2015, estimou-se que 60% da população mundial estava vivendo em cidades, na América Latina, esse índice chega a 80%, o que demonstra o aumento da importância das prefeituras, principalmente as das grandes cidades, que passam a ser responsáveis por administrar mais recursos, que serão repassados para uma parcela maior da população (RIBEIRO, 2009).
A cidade deve ser uma articulação entre a administração pública, os agentes econômicos, como bancos e empresas privadas, a sociedade civil, por meio de Organizações Não-Governamentais e associações de bairros, a academia e a mídia. Conjuntamente, todos esses entes poderão transformar os municípios em locais melhores, nas mais diversas áreas e, tanto para seus habitantes, quanto para os turistas que os visitarem.
As cidades, essencialmente na última década do século XX e no século XXI, passaram a desempenhar papéis internacionais. Segundo Rodrigues (in RODRIGUES; ROMÃO; XAVIER, pp.35, 2009): 
Prefeitos e intendentes participam de eventos globais de cidades. Secretários e assessores de relações internacionais de municípios discutem e acertam agendas de cooperação regional e hemisférica. Técnicos municipais integram delegações oficiais – ou atuam diretamente – em conferências do sistema da ONU. Reuniões bilaterais e acordos de cidades-irmãs ou de cooperação técnica intermunicipal proliferam, entre recepções e viagens. Esta é a realidade, hoje, da paradiplomacia dos poderes locais, que se traduz num vigoroso movimento de internacionalismo municipal.
A política externa passa, então, a ser desenvolvida pelos municípios e leva em consideração a realidade interna e, também, a situação dos possíveis parceiros internacionais. Apesar de o Estado ainda ser protagonista, há uma tendência, no longo prazo, de que as ações internacionais das cidades se tornem uma das principais características da diplomacia nacional, já que contribuem para a integração nacional e para a diminuição das disparidades regionais, com a atração de investimentos pelo próprio município, sem ser necessário esperar uma ação do país, que já tem diversas outras funções.
Diante da realidade do aumento das ações externas dos governos locais, há uma categorização das cidades, que tem como parâmetro a importância internacional. O primeiro tipo são as Cidades Globais, como Nova Iorque, Tóquio e Londres, onde se encontram as matrizes das principais empresas transnacionais e onde há um controle muito grande das finanças globais. O segundo nível da categorização são as grandes metrópoles internacionais, como Paris, Milão, São Paulo e Rio de Janeiro, que são centros de convergência internacional, que recebem uma grande quantidade de turistas e muitos investimentos externos. O último tipo são as demais cidades, que possuem algumas funções internacionais específicas e que atuam se relacionando com outros municípios. (RIBEIRO, 2009).
A realidade das cidades, principalmente dos países que ainda não alcançaram o desenvolvimento – especialmente algumas localizadas na África, Ásia e América Latina – é, atualmente, preocupante. Os desequilíbrios dentro dos municípios são evidentes, indicadores como superpopulação, pobreza extrema, desigualdade social e precarização do trabalho são efeitos da urbanização acelerada, que ocorreu sem controle nos Estados mais pobres. A cidade mais populosa da Nigéria, Lagos, por exemplo, possui uma população urbana de 15 milhões de pessoas, tem um crescimento populacional de 6% a 8% ao ano e tem um orçamento anual de menos de 25% de Joanesburgo, na África do Sul. Isso mostra que, em muitos locais, ainda há diversas medidas a serem tomadas em âmbito interno, antes de haver a preocupação com a internacionalização (RIBEIRO, 2009). 
O mito de que as cidades trariam mais oportunidades foi desconstruído a partir dos dados alarmantes sobre as condições de trabalho da população. O desemprego estrutural ainda é uma das principais preocupações dos governos locais, porém o aumento do trabalho informal, decorrente do fechamento de vagas de emprego, é o que mais assusta a maioria das prefeituras. No Brasil, por exemplo, a população urbana passou de 12 milhões para 130 milhões nos últimos 50 anos, o que ocasionou em um excesso de mão-de-obra desqualificada e sem ocupação no mercado de trabalho (RIBEIRO, 2009). Percebe-se, então, certo despreparo das cidades de países em desenvolvimento para manejar todas as necessidades do povo e, além disso, a política externa municipal.
A partir do fato de que, atualmente, fenômenos globais causam impactos locais, dada a maior facilidade de comunicação entre as regiões, é necessário que se criem estratégias específicas para a internacionalização dos municípios, já que estes assumiram um papel importante na nova geografia do poder. Tais estratégias são, basicamente, acordos coletivos para o estabelecimento de metas – em longo prazo – para a projeção da cidade, ou seja, com a mobilização da população da cidade, dos governantes e dos meios de comunicação, é possível que se crie um plano de ação para que o município atinja o objetivo desejado: o aumento das ações internacionais.
Algumas cidades aplicaram,com sucesso, esse plano de ação. Barcelona é um dos principais exemplos de inserção internacional dos últimos anos.Iser (2013, pp.39) afirma que o início da internacionalização efetiva do município se deu quando foi escolhido como sede para os Jogos Olímpicos de 1992, em 1986:
Desde sua nomeação, em 1986, como sede dos Jogos, foi traçada uma estratégia nacional de transformação, gestão, marketing e projetos que iriam inserir Barcelona incisivamente no cenário internacional. Além do trabalho do setor público na revitalização e adaptação da cidade e dos investimentos do setor privado, houve um chamado à população para que exercesse seu papel de sujeitos ativos, colaborando de forma voluntária para o êxito do evento, o que despertou um sentimento vibrante nos seus cidadãos e entidades.
A partir dessa iniciativa, a cidade de Barcelona se tornou uma cidade reconhecida no mundo, atraindo diversos turistas e investimentos internacionais e, além disso, foram criadas redes e organizações no município.
A Conferência Habitat II (Agência da ONU para Assentamentos Humanos), que ocorreu em 1996, em Istambul, na Turquia, foi um marco para a atuação municipal. Os 171 governos centrais que estavam presentes na Conferência se juntaram às autoridades locais de mais de 500 cidades – foi a primeira vez em que GNCs puderam participar de um evento das Nações Unidas. A proposta dos governos locais era que se apresentassem suas boas práticas, para que os outros pudessem, também, resolver os problemas de suas comunidades. Nessa oportunidade, algumas cidades brasileiras, como São Paulo e Curitiba, expuseram políticas públicas para a melhoria das cidades. Nos últimos meses de 2016, ocorrerá, em Quito, no Equador, a Conferência Habitat III, que pretende ser maior e ainda mais efetiva do que a anterior.
Borja e Castells (1996) afirmam que, nos últimos 30 anos, houve uma reestruturação das funções exercidas pelo governo da cidade e que, por essa reestruturação, a internacionalização seria essencial. A primeira função a ser reorganizada é a econômica, que passaria de apenas funções de planejamento orçamentário e de publicidade turística da cidade para a criação de zonas empresariais – locais na cidade que estariam disponíveis para que agentes nacionais e internacionais invistam seu capital -, atração de investimentos em diversos setores do município e de visitantes, incrementando ainda mais o turismo na cidade.
A segunda função é relativa ao meio ambiente e à urbanização, setores em que a prefeitura deve alocar mais recursos, a fim de recuperar as áreas urbanas danificadas por ações naturais, como enchentes e deslizamentos de terras. Deve-se, também, criar estratégias de proteção do ambiente e, para isso, é necessário fazer parcerias com o governo central, com empresas privadas e com associados internacionais.
A terceira função é, hoje, essencial: a segurança pública. O governo local deve intensificar a repressão às drogas e ao crime, criando políticas públicas que protejam os cidadãos. Além disso, com o grande número de migrantes e refugiados chegando às cidades, é preciso reformular o sistema de justiça, para que sejam punidas, da maneira correta, ações de racismo ou de xenofobia.
A função social e cultural sempre foi a mais reconhecida pelas prefeituras. Socialmente, é fundamental que se intensifiquem esforços com vistas à ampliação de programas sociais, como os de geração de empregos, criação de moradias dignas, educação de qualidade e saúde pública para todos. Em âmbito cultural, é importante que toda a população, tanto os habitantes locais, quanto os turistas, se sintam agraciados pelas atrações disponibilizadas pela cidade.
A última função é a respeito da infraestrutura do município. Para que haja mais saneamento básico, um sistema mais completo de tecnologia de comunicação, vias públicas melhor sinalizadas e iluminadas e um conjunto de mobilidade urbana completo, são necessárias parcerias com empresas privadas, tanto nacionais, quanto internacionais, que auxiliarão o governo local a construir uma cidade melhor.
As cidades vêm investindo, também, em estratégias de marketing, que é, segundo Cezáreo (2011), uma orientação das políticas municipais para a criação ou atendimento das necessidades dos consumidores internos e externos. Isso contribui com a inclusão social, aumentando as oportunidades de emprego e a renda da população, além da atração de capital para a modernização do município. Por essas estratégias, é possível afirmar que os governos locais deixaram de ser apenas usuários do desenvolvimento, mas passaram a contribuir para ele.
Para que a imagem externa de uma cidade seja boa, internamente ela deve ser positiva, seus cidadãos devem ser engajados e acreditar no futuro do local onde vivem. Uma das maneiras de promover um município é através da marca-cidade, que, assim como a marca-país, tem o objetivo de criar uma identificação dos turistas e investidores. Diversas vezes, a criação da marca-cidade é iniciativa do próprio governo municipal, como é o caso da Rio Internacional, do Rio de Janeiro, porém a identificação pode vir através de empresas privadas, como foi o caso dos slogans da cidade de Nova Iorque (INY) e de Amsterdã (I amsterdam) (CEZÁRIO, 2011).
Toda a ação internacional, no entanto, pode ser considerada como uma estratégia de visibilidade externa. A participação em competições de boas práticas, nas quais os vencedores recebem, geralmente, prêmios em dinheiro ou em investimentos, a produção audiovisual, na qual uma cidade específica é promovida por um filme de Hollywood, por exemplo. Os grandes eventos internacionais, como Copa do Mundo e Olímpiadas, também conferem evidência aos governos locais.
A cooperação bilateral é uma das maneiras mais efetivas de internacionalização – e de visibilidade externa. Esse tipo de cooperação pode ocorrer de diversas maneiras, seja através de visitas de cortesia, visitas técnicas, tratados de cooperação técnica em alguma área específica ou irmanamento de cidades. A cooperação bilateral pode ocorrer por iniciativa das próprias cidades ou intensificada pela ONU Habitat ou pelas próprias redes de cidades e forma uma imensa teia de municípios interligados.
Outro tipo de cooperação importante é a cooperação de fronteira que, na atualidade, com os tráficos de drogas, de pessoas, de armas e, até mesmo, de biodiversidade acentuados, é muito importante para a segurança dos Estados-Nação e, inclusive, das cidades. A cooperação de cidades fronteiriças se resume, basicamente, ao compartilhamento de dados entre as duas prefeituras e na colaboração entre as polícias de fronteira dos dois Estados. Essa estratégia deve, entretanto, ser intensificada, pois não é muito utilizada, principalmente na América Latina.
As boas práticas são consideráveis quando falamos sobre planos de internacionalização. Tanto as políticas públicas criadas pela cidade e replicadas internacionalmente, quanto a busca por outros locais com algo semelhante ao que se procura aplicar, para que se compartilhem as experiências. Existem, como já citado, competições internacionais que buscam premiar as melhores práticas, que recebem o devido reconhecimento, além de serem reproduzidas – com as necessárias adaptações – em cidades de todo o mundo.
Outra maneira muito efetiva de se internacionalizar é através das redes de cidades. Essas redes facilitam o contato entre os governos locais e trazem muita visibilidade externa para os municípios que aderem a essa tática.
3.2. As Redes de Cidades
A sociedade, como um todo, se organiza em redes, tradicionalmente. Seres humanos, a grande maioria das espécies de animais e, inclusive, a Sociedade Internacional (com a presença de diversas Organizações Internacionais) são ordenados em redes. Com os municípios não é diferente e, por isso, existem diversas redes internacionais que visam unir as cidades e ampliar a sua participação internacional.
Uma rede internacional de cidades segue alguns preceitos básicos e comuns a todas as suas semelhantes. O primeiro deles, e talvez o mais importante,

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