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História da ~ - ----; História da ANTESDA NQUISTA EDUARDO CÓES NEVES ., CADERNOS DE ARQUEOLOGIA - 2 Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN . 1a SR 04 05 ~~~~~ ~ __ ~ __ ~~ __ ~~ ~~~~~~06 07 S E O INíC10 DA PR-º.!l~"ºAº,_Çg.R.1f\1JºtL.".""""" ...",""~",.".,,"",,º"~ E SOCIEDADES COMPLEXAS 10--------'--'--=+.".~~ S S~~OS ARQUEOLÓGICOS E CULTURAS DAAMAZÔNIA 11 , , , 14 ."'-I.'~UI~LOGIA - CADERNOS DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL APRESENTAÇÃO Este 2° Caderno de Educação Patrimonial trata de um tema muito especial, no campo da arqueologia, A História da Amazônia Antes da Conquista, cuja leitura vai pouco a pouco povoando questões que passam à margem da educação formal. Na verdade, um belo presente do Prof. Dr. Eduardo Góes Neves dedicado a 1aSR, pleno de sensibilidade e inteligência.Um tema de grande importância para a arqueologia brasileira, embora pouco conhecido pelo homem amazõnida. O texto reflete a experiência e a dedicação do arqueólogo nos seus dez anos de estudo e pesquisa nesta nossa continental e misteriosa Amazônia indígena. Patrimônio das águas, mitos, lendas e florestas. Aqui vive um povo solene, herdeiro da tradição ora e que resiste mesmo vivendo sob o ís, ainda hoje, ouve-se nas ta carapanãs, nos umbrais das casas as as víaqensde barco, como bem cita eves, a voz do índio ou do caboclo celebrando narrativas imemoriais, o que confere valor inestimável à palavra proferida, enquanto construção de uma identidade cultural. Considerando a ausência do documento escrito no período pré-colonial, a arqueologia torna- se fonte única e inesgotável de conhecimento sobre esse passado, marcado pela tradição oral, e nos abre portas para o entendimento da história dos nossos mais arcaicos ancestrais: os povos indígenas. É sobre essa cultura, distante no tempo e no espaço, inscrita na cerâmica e nos seus fragmentas arqueológicos que trata este Caderno, lançando uma nova perspectiva de aprendizagem na esfera da Educação Patrimonial ao privilegiar saberes e memórias subterrâneas. Se por um lado nos dá prazer e alegria à edição deste Caderno, fruto do Projeto Amazônia Central, cuja equipe de arqueólogos, sob a coordenação do Pro{ Eduardo G. Neves, tem caminhado lado a lado conosco na luta pela preservação do patrimônio arqueológico, por outro, causa-nos tristeza a perda brutal de um de seus· pesquisadores, no exato momento em que se comemorava os dez anos de um árduo e grandioso trabalho na Amazônia Central. Portanto, é com enorme pesar que o IPHAN, através de sua 1aSuperintendência Regional, dedica este Caderno, in memorian, ao arqueólogo, Prof. Dr. James Brant Petersen e às futuras gerações da Amazônia, na esperança de ler, em sua verde paisagem, uma outra história, que assimile o respeito sagrado pela vida e pela nossa cultura. Seja no céu ou na terra, saiba, Jim, que seu amor e dedicação pela Amazônia iluminarão sempre os nossos caminhos na defesa desse rico patrimônio arqueológico. Boa Leitura! Maria Bernadete Mafra deAndrade. Superintendente Regional do IPHAN/1 aSR 04 - ""éiZônia Antes da .smo temático ática, clara, conjunta e eó 090 Prof. Dr, Eduardo p'-"~;O. o a Amazônia, eza e a diversidade garculU·ra c;.. •• ~,,;u,."'!.~,·cos, já que as ~:"irir:lelnto sobre a ocupação o averão de ser preenchidas s; miras só possíveis mediante a eoIógicos - o grande os nós, e "' •..••"'-""tC>uede órgão a:::::UE:lO~ógiroe responsável políticas públicas nessa ...c:._.~"1rU r<>c~;.· ~-se a apoiar o IPHAN e e ção do ~~:>nTO sobre os bens arqueo ógicos da ;;azônia, e tem como pressuposto uma certeza: tal reta só poderá ser realizada satisfatoriamente com artícipação das comunidades na azonas, essas ações foram a sistemática, em 2004, no âmbito e antamento de Sítios e Coleções édio Amazonas, quando uma ; TESDA CONQUISTA equipe de educadores e a q eólogos visitou a sede dos municípios Itacoatiara, Parintins, Barreirinha, Boa Vista do Ramos, Maués, Urucurituba, São Sebastião do Uatumã, Itapiranga; Silves, Urucará e undá, no baixo Amazonas. Nessa expedição, foram cadastrados 61 sítios, visitados outros 46 já conh e ci do s , inventariadas 47 coleções arqueológicas aos cuidados de outras instituições e terceiros e 66 objetos avulsos. A informação sobre arqueologia atingiu cerca de 540 pessoas e foram realizadas oficinas em 11escolas. Em 2005, a proposta é dar continuidade ao trabalho, avaliando o estado de conservação dos sítios arqueológicos já conhecidos no município de Manaus e atualizar seus registros. Os objetivos perseguidos são, além de estabelecer parcerias locais, dispor de dados atualizados sobre os sítios, de maneira a permitir implementar, juntamente com as municipal idades, as medidas de proteção necessárias à sua preservação . O IPHAN agradece ao caro professor Eduardo Neves por aceitar o convite para a realização desta produção e tê-Ia concretizado com tanta competência. Catarina Eleonora Ferreira da Silva, Arqueóloga IPHAN Patrícia Maria Costa Alves, Chefe da Divisão Técnica 1a SR/IPHAN 05 A5.j~I:Ol'OGIA-CADER os DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL I. INTRODUÇÃO Existem diferentes maneiras de se aprender sobre o passado. Normalmente, essa aprendizagem se faz na escola, através da leitura dos livros. Em outros casos, pode-se aprender sobre o passado através das estórias contadas dos pais para os filhos, ao longo do tempo. Na verdade, é justamente fora da sala de aula, em conversas em longas viagens de barco, ou à noite na rede, que o conhecimento sobre passado é transmitido dos mais velhos para os mais novos de uma maneira mais viva e significativa. a Amazônia tem sido assim, desde que os primeiros índios aqui chegaram há mais de dez mil anos. a ela época, e em alguns casos até o presente, era apenas através da tradição oral, repetida de geração a geração, que a história dos povos indígenas era contada. eo oqía oferece uma outra maneira de re passado porque é a ciência ,'tõC'....ILJ""r es do, no presente, dos restos . dígenas que viveram há a res de anos atrá a maioria dos casos, esses povos não deixaran escrito sobre sua cultura, sua religião, suas foi.. ..> ••• de vida. O que resta apenas são objetos por eles produzidos e abandonados. É a partir do estudo desses objetos que sua história pode ser contada. O raciocínio empregado pelos arqueólogos é relativamente simples: ele funciona do mesmo modo que o de um caçador que, andando pelo mato, encontra um tapiri abandonado ou uma capoeira velha. Esse tapiri e essa capoeira indicam que aqueles locais, em algum momento do passado, já foram uma casa ou uma roça, que alguém ali já viveu ou plantou, mesmo que não haja ali nada escrito sobre essas atividades. Na Amazônia, a arqueoloqia apresenta uma perspectiva privilegiada para o entendimento da história dos povos indígenas que aqui viviam antes do início da colonização européia em 1500. O que é mais 06· interessante é que essa história parece ser diferente do que as crianças brasileiras, índias ou não, têm aprendido na escola, conforme será visto nesse texto. A região amazônica apresenta condições únicas para a realização de atividades de educação ligadas ao conhecimento, estudo e valorização do patrimônio arqueológico. Tais condições estão ligadas ao fato de que, na Amazônia, há uma forte continuidade cultural e biológica entre, por um lado, as antigas populações indígenas que ocuparam os sítios arqueológicos e, por outro, as populações caboclas e indígenas contemporâneas, dispersas pela vastidão da floresta e áreas ribeirinhas, pelas cidades do interior ou pelas grandes cidades como Manaus, Belém, Porto Velho Macapá, Boa Vista ou Rio Branco. Em outras partes do Brasil, atividades de educação patrimonial, voltadas para a arqueologia têm um caráter mais artificial, uma vez que houve em muitos casos uma total substituição das populações indígenas pré- coloniais por populações contemporâneas mestiças ou de origem européia, africana ou asiática. Em linhas gerais, há no interior da Amazônia pelo menos dois grupos sociais geralmente distintos. Emprimeiro lugar, os diferentes povos indígenas, pertencentes a diferentes categorias étnicas, que são seus habitantes desde tempos antigos. Em segundo lugar, há as populações caboclas resultantes da miscigenação dos povos indígenas locais, e de outras áreas, com as populações nordestinas que para lá migraram, para trabalhar naextração da borracha, nos séculos XIX e xx. Em casos como esses, o objetivo da educação patrimonial pode mostrar como a arqueologia pode ser uma fonte importante para o conhecimento do passado e, quem sabe, contribuir para criar uma alternativa econômica, voltada para o turismo que explore o patrimônio arqueológico. Tais podem ser os casos em municípios como Parintins, Silves, Maués e Urucurituba. .o I ÍCIO DA OCUPAÇÃO HUMANA ã..'1J:ue-:Jk>c::t;a,a antigüidade dos achados expressa em anos antes do ou em anos antes e depois de cristo. .e ra alternativa é normalmente mais - mas neste texto optei por usar a segunda antes e depois de Cristo) porque o uso do ário em anos ac/dc é mais simples, permitindo aos e' ores correlacionar eventos e processos no passado amazônico com eventos em processos oco=dos em outros locais do planeta. ,., .. a"·~:J- mana da Amazônia se iniciou anos. Datas ao redor de 9.200 anos o as na escavação da Caverna da Pedra íntada, uma gruta localizada no atual município de onteAlegre, no Pará. Os achados em Pedra Pintada mostram que esses habitantes antigos tinham uma :::.r""1~("l.,...,;·i~ basea a a caça, pesca e também na esta ue para algumas . as a Amazônia. O fato te egre terem sido feitos em a gruta não q er dizer que os primeiros habitantes a Amazônia tenham sido "homens das cavernas". O que ocorre é que grutas e cavernas, pela própria ro eção a ra Que oferecem, têm melhores - ação de ma eriais. ao contrário • aberto, geralmen e expos os à ação da a erosão e de outras intempéries. Nesses mos tipos de sítio, as condições de preservação são normalmente piores, embora haja várias exceções, conforme se verá a seguir. mazõ ia, a bacia do . G ~ a a Estado do Mato Grosso, uma gruta, conhecida como Lapa do Sol, forneceu aJg as datas ainca mais antigas, ao redor de cerca de 2. anos C. Esse sítio foi escavado na década de setenta ueólogo brasileiro, Eurico Miller, com o auxílio dos índios Nambiquara que vivem na área. As condições de preservação do sítio, no A HISTÓRIA DA AMAZÔNIA ANTES DA CONQUISTA entanto, que sofreu uma intensa ação de cupins, misturando talvez as camadas arqueológicas, faz com que essa data seja tomada com cautela e que novas escavações sejam realizadas no local para confirmá-Ias. De qualquer modo, diferentes partes da Amazônia já eram ocupadas ao redor de 6.000 AC. As evidências vêm de locais tão diversos como a serra dos Carajás, no Pará; a bacia do rio Jamari, em Rondônia; a região do rio Caquetá (Japurá), na Colômbia; o baixo rio Negro, próximo a Manaus e o alto Orinoco, na Venezuela. Embora os dados sejam ainda escassos, é provável que essas antigas populações tivessem seu modo de vida organizado ao redor da caça, pesca e coleta, mas que também tivessem domesticado algumas plantas, conforme dados obtidos, por exemplo, na Amazônia equatoriana. As formas antigas de agricultura da Amazônia eram provavelmente bastante parecidas com algumas práticas atuais, tal como o cultivo nos quintais em ias suspensas, geralmente sobre canoas abar. -',.as • de plantas medicinais ou temperos, cof-, ,..iferentes tipos de pimentas. O mesmo pode ser dito das numerosas plantas cultivadas atualmente por índios e brancos na Amazônia: mandioca, mamão, pupunha, açaí, abacaxi, pimentas, amendoim para citar apenas alguns exemplos de uma lista extensa, foram plantas domesticadas no passado pelos antigos índios. Numa época em que se discute alimentos transgênicos, clonagens e engenharia genética, o exemplo da mandioca é ilustrativo e impressionante, já que os índios (de fato, provavelmente as índias) do passado desenvolveram uma tecnoloqia sofisticada, baseada no uso do ralador,do tipiti, do cumatá, que transforma uma planta extremamente venenosa em vários produtos importantes como o beijú, a farinha, a tapioca e até o caxiri, dentre outras coisas. 07 A2~QUI:ot.OGIA -CADER OS DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL 11I.A DOMESTICAÇÃO DE PLANTAS EO INíCIO DA PRODUÇÃO CERÂMICA Parece claro, no entanto, que embora o processo de cultivo de plantas seja bastante antigo na Amazônia - remontando talvez a 6.000 AC ou mais - o surgimento de modos de vida dependentes da agricultura foi um processo muito mais recente, tendo se iniciado há mais ou menos 3.000 anos. Essa hipótese é baseada no fato de que, a partir dessa época, ficam mais visíveis as evidências de grandes aldeias sedentárias ocupadas, em alguns casos, por centenas de pessoas por muitas décadas, o que é compatível com economias plenamente agricolas. Durante, portanto, cerca de 5.000 anos, entre 6.000 AC e 1.000 AC, a ocupação humana da Amazônia foi realizada por populações que mantinham uma economia mista, baseada na caça, pesca, coleta e em uma agricultura de baixa intensidade. Algumas populações indígenas da Amazônia mantêm esse modo de vida até hoje. Talvez o exe as cor' ecido seja o dos Maku do alto rio 1YV,+r.:'jTi°in de serem exemplos de atraso, aku apresentam adaptações está eO e na s cedidas, e por isso antigas, às condições ecológicas da floresta tropical úmida na terra firme. É na Amazônia que se encontram algumas das cerâmicas mais antigas produzidas em todo o continente americano. Tradicionalmente, arqueólogos associaram o início da produção . cerâmica ao desenvolvimento da agricultura, trabalhando com a premissa de que essa tecnologia - ligada à produção e vasos para o armazenamento e cocção - permite o processamento mais efetivo de alimentos. Os dados sobre o início da produção cerâmica na Amazônia mostaram que o quadro é mais complexo, uma vez que as datas mais antigas, ao redor de 5.000 AC e 3.500 AC, vêm de contextos anteriores à plena adoção da agricultura, conforme discutido anteriormente. Atualmente, as cerâmicas mais antigas conhecidas na Amazônia foram identificadas nas regiões do litoral do Salgado, no Pará, e no baixo Amazonas, próximo a Santarém, também no Pará. Em ambos casos, os sítios onde essas cerâmicas foram identificadas são sambaquis. Sambaquis são sítios arqueológicos bastante particulares, identificados em praias, áreas ribeirinhas ou lagunares por todo o mundo. Sambaquis são formados pelo acúmulo intencional de conchas e terra, formando verdadeiras colinas artificiais, em alguns casos com vários metros de altura. Atualmente, acredita-se que os sambaquis eram locais de moradia, mas também funcionavam como cemitérios, uma vez que é comum a identificação de sepultamentos humanos nesses sítios. No Brasil, os sambaquis mais conhecidos e estudados são os do litoral sul e sudeste, distribuídos desde o litoral do Rio Grande do Sul até o Rio de Janeiro. No sul e sudeste, os sambaquis mais antigos são fluviais, com datas recuando a mais de 7.000 anos AC, no sítio Capelinha, localizado no vale do Ribeira, em São Paulo. Sambaquis litorâneos são um pouco mais recentes, com datas recuando a cerca de 4.000 anos AC, obtidas no litoral do Paraná. A partir dessas datas antigas, sambaquis foram sendo construídos e habitados no sul e sudeste até cerca de 1.000 anos DC. os sambaquis foram bem ados, mas há informações -- - - - a distribuição em áreas como nos gado, Amapá e Maranhão, no baixo róximo a Porto de Móz, nas regiões de tarém, em ltapiranga, no Amazonas e até o vaie do aooré, em Rondônia. Essa distribuição não é, no o, contínua. A região do Salgado, no litoral do Dará, é um ambiente bastante rico, formado por ang ezais e uma grande rede de rios e •••••..••ib,-.n<> essas' 005, sabe-se da ocorrência e po devido à destruição cara a mineração de cal. Cientistas Domingos Ferreira Penna, fundador o useu Emilio Goeldi, em Belém, realizaram pesquisas com sambaquis do Salgado no final do século XIX. mas foi apenas nas décadas de sessenta e - +", • XX q e, graças às pesquisasde ;:;':;~"H;e-soe natas para os sambaquis do '=•....i::t.l••os í icam que esses sítios c~arr.~ ()S sambaquis do sul e sudeste, a' porta e diferença que contêm cerâmicas com idades de até 3.500 anos AC. Essas cerâmicas, conhecidas como Mina, estão entre algumas das mais . as o . ente. os sambaquis do sul e , as cerâmicas são quase ocorrem, são m . o mais As datas de 3.500 anos AC para as cerâmicas Salgado fazem parte do quadro mais amplo do ',.,',rinna rod çãocerfu . co ·nenteamericano. e s an'gas são """""'~""G,rlas. a e 4.000 AC, em um amplo arco . do r oral do Equador, a oeste, à foz do as, ao leste. Esse arco contorna o norte do con te, passando pelo litoral norte da Colômbia e pelo fitora . ame. Nesses pontos, cerâmicas com datas entre 4.000 e 3.500 AC foram encontradas, em alguns casos em sítios do tipo sambaqui. As cerâmicas mais antigas das Américas, no entanto, foram localizadas no interior do continente, mais ., A HISTÓRIA DA AMAZÔNIA ANTES DA CONQUISTA precisamente na Amazônia brasileira, na região do baixo Amazonas, próximo à Santarém. Nessa região, em frente à ilha do Ituqui, no sambaqui fluvial da Taperinha, identificou-se nos anos 80, cerâmicas com datas remontando a quase 5.000 AC. Os resultados são, no entanto, ainda debatidos e há necessidade de mais pesquisas na região para confirmá-Ios. As regiões do baixo Amazonas, do estuário, a Amazônia central e a bacia do alto Madeira são algumas das áreas com maior potencial arqueológico na Amazônia. No estuário, incluindo a ilha de Marajó e o Amapá, há uma das seqüências arqueológicas mais longas de todo o continente. Essa seqüência começa, pelo menos, com as ocupações associadas às cerâmicas Mina, com as já mencionadas datas de 3.500 AP, e continua na ilha de Marajó, com uma série de cerâmicas diferentes, num processo que culmina com uma grande explosão cultural datada do final do primeiro milênio DC, ou seja, cerca de 500 anos antes do início da colonização européia. Essa explosão é indicada pela proliferação de uma série de cerâmicas distintas - embora com alguns traços em comum, como, por exemplo a pintura policroma. No Amapá as cerâmicas características desse processo são conhecidas como Aristé, Mazagão, Aruã, Cupixi e Maracá. As cerâmicas Maracá são conhecidas desde o século XIX, sendo compostas por urnas funerárias antropomorfas, com a forma de indivíduos sentados sobre bancos, em muitos casos semelhantes aos' bancos usados por grupos indígenas atuais da região da Guiana. Tais urnas encontram-se sempre colocadas em grutas, na região do igarapé do Lago, a oeste de Macapá, mas há também sítios a céu aberto com cerâmicas Maracá, embora sem urnas . Atualmente, o crescimento econômico da região e a falta de proteção dos sítios têm colocado uma grande ameaça a esse patrimônio, uma vez que há informações que sítios Maracá têm sido destruídos por colecionadores de peças. 09 Ai1~Uf:OLOGIA - CADER OS DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL IV. A EMERGÊNCIA DE SOCIEDADES COMPLEXAS As diversas cerâmicas do Amapá não são ainda muito bem datadas. A exceção são as cerâmicas Aris té, conhecidas também na Guiana Francesa, que têm datas que remontam ao século IV ou V DC. O interessante nesse caso é que parece haver uma clara relação entre os índios Palikur, atuais habitantes da região litorânea próxima à cidade de Oiapoque, e os grupos indígenas que produziram as cerâmicas Aristé e que viveram na mesma região. Se correta, essa hipótese indica que os Palikur e seus ancentrais vivem nessa área há cerca de- 1.500 anos. Do mesmo' modo que as cerâmicas aracá, umas funerárias Aristé são também enco tradas em grutas, enquanto que há sítios a cé aberto que correspondem a antigas aldeias. Alguns desses sítios estão inclusive localizados sob aldeias cont=mporáneas, como é o caso de Kumene, na Terra Indígena do Uaçá. O fato de haver uma re'ação direta entre os Palikur e os grupos ue param a região antes do início da rmite que se utilize a tradição - e estudo de sítios arqueológicos . o a arqueologia pode e o para o conhecimento da s ona os i líqenas, A cerâmica Aristé tem uma grande beleza, marcada pela decoração pintada e modelada e por uma grande diversidade de formas. Talvez o sítio Aristé mais conhecido seja Kunani, um poço artificial onde se depositaram vários vasos e umas funerárias, ocaIizado próximo à cidade de Calçoene e escavado por Emilio Goeldi no final do século XIX. Do mesmo modo que as cerâmicas de Maracá, os sítios Aristé são também ameaçados pelo interesse de COlecionadores particulares e pela proximidade com a Guiana Francesa, o que facilita o contrabando de peças. Dentre os diversos tipos de artefatos cerâmicos há umas funerárias, vasos, estatuetas antropomorfas, tangas e bancos. A decoração pintada inclui motivos antropomorfos, zoomorfos e abstratos, sempre com alguma combinação entre vermelho, laranja, branco e preto. A decoração plástica inclui o modelado de diferentes técnicas de incisão e excisão. A beleza das cerâmicas Marajoara torna-as bastante cobiçadas, sendo, sem sombra de dúvida, a maior categoria de objetos arqueológicos contrabandeados no Brasil atualmente. Sítios com cerâmicas Marajoara são bastante característicos: normalmente são aterros artificiais, conhecidos como tesos, que têm alguns metros de altura e dezenas de metros de comprimento. Os tesos, bastante numerosos, são distribuídos na parte leste da ilha, numa área de extensos campos naturais, alagados durante uma boa parte do ano, localizada ao redor do lago Arari. Apesar de uma história mais que centenária de pesquisas, não existe ainda uma cronologia precisa para a fase Marajoara, embora haja um consenso que enquadra sua duração do século IV ao século XIV DC, portanto por durante cerca de mil anos. As cerâmicas Marajoara são as representantes mais antigas da chamada Tradição Polícroma da Amazônia. Sítios com cerâmicas polícromas têm uma ampla distrbuição, incluindo, além da ilha de Marajó, toda a calha dos rios Amazonas e Solimões, desde a cidade de Silves, no Amazonas, até acima da cidade de Iquitos, no Peru. Além dos rios Amazonas e Solimões, cerâmicas polícromas são também encontradas nos baixos e médios cursos dos rios Madeira, Negro, Japurá-Caquetá, Icá-Putumayo e Napo, dentre outros. Curiosamente há, no baixo Amazonas, uma área onde não se encontram cerâmicas polícromas. Essa área inclui um trecho que vai do rio Tocantins e Amapá, a leste, até a região das cidades de Nhamundá, Parintins e Maués, no Amazonas, a oeste. Nesses locais encontram-se sítios com cerâmicas bastante distintas, mas também de grande beleza, pertencentes à chamada Tradição Incisa ePonteada. 10 Na ilha de Marajó, as cerâmicas mais conhecidas são associadas à chamada fase Marajoara. Cerê.nlcas Marajoara compõem acervos de museus e coleções particulares no Brasil e exterior, sendo caracterizadas por uma grande beleza e uma imensa diversidade de formas e de padrões de decoração. .., MAPA DOS SíTIOS ARQUEOLÓGICOS E CULTURAS DA AMAZÔNIA RIO UATUMÃ (REPRESA DE BALBINA) ~3 ÁREA DE MONTE ALEGRE(CAVERNA DA PEDRA PINTADA) 2 TRADiÇÃO POUCROMA DA AMAZONIA 8 ÁREA DOS RIOS ~4 F":SE MARACÁFASE NAPO NHAMUNDÁ E TROMBETAS @ CAPfTA1SDE 3 MANIFESTAÇÃO DA TRADiÇÃO 9 RIO JAMARI (REPRESA DE SAMUEL) 15 FASEARISTÉESTADOS POLlCROMA DAAMAZONIA BRASILEIROS li=" 4 SiTIO SANGAY 10 ABRIGO DO SOL 16 FASEARUÃ 5 LAGO YARMACOCHA 11 SERRA DOS CARAJÁS 17 TRADiÇÃO POUCROMA DA AMAZONIA,FASE MARAJOARA 6 PROJETO DA AMAZONIA CENTAL, ÁREA DE SANTARÉM 18 SITIOS DA TRADIÇÃO MINAsITIo AÇUTUBA IANTIGA CULTURA TAPAJÓS) 11 GRtIPIONI, Luis Donisete & Barreto, Cristiana (org.) Map of archaeological sites and cultures of Amazonia. In Amazonia; native traditions. São Paulo; Brasil Connects Cultura & Ecologia, 2004. p. 38. hiaptado do mapa conforme sítios arqueológicos priorizedos na pesquisa do arqueólogo Eduardo Goes Neves. AZeOOl:OLOGIA - CADER OS DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL No baixo Amazonas e baixo Solimões, desde pelo menos Coari até Parintins, é muito comum a ocorrência de cerâmicas conhecidas como Paredão, assimdenominadas por causa de um sítio localizado na estrada do Paredão, em Manaus, pelo arqueólogo alemão Peter Hilbert. Sítios Paredão são muito comuns na área de Manaus, sendo que muitos desses sítios têm sido destruídos pelo rápido crescimento da cidade. Pesquisas feitas em Iranduba, no Amazonas, mostram que essas cerâmicas foram produzidas entre os s • VIII e XI DC. A cerâmica Paredão não apresenta a esma elaboração vista nas cerâmicas policrornas e ncisas e ponteadas, mas apresenta uma bela pintura vermelha em .linhas finas com motivos em espiral e ern grega, que às vezes podem ser também' cisos. Talvez a categoria mais comum de va Pa· ão sela as grandes umas funerárias o..... s~ pre decoradas com dois dos ou ovais, formando Z os, geralmente - DOCa,nariz e sobrancelhas De rca s dos exemplos mais belos de umas Paredão são encontrados na comunidade de Canarana, no município de Maués. No baixo rnazonas e baixo Solimões, cerâmicas Paredão foram substituídas, nos sítios arqueológicos, por ocupações com cerãmicas polícromas por volta do ano 10000 DC. A característica mais marcante das cerâmicas polícromas é, como indica seu próprio nome, a decoração pintada em vermelho e preto sobre uma base branca. Do mesmo modo que no Marajó, no entanto, cerâmicas polícromas são também decoradas pelo modelado, incisão, excisão etc. A cronologia mostra que sítios com cerâmicas polícromas tomam-se paulatinamente mais recentes à medida que se percorre rio acima o Amazonas- Solimões e seus afluentes, desde a foz até os contrafortes dos Andes. Tal padrão indica que a Tradição Polícroma é um fenômeno com uma origem claramente amazônica, e não andina, conforme se propunha nas décadas de cinqüenta e sessenta. Assim, as datas indicam que, enquanto o início das cerâmicas polícromas data do século IV DC na ilha de Marajó, as cerâmicas polícromas mais antigas da Amazônia central datam do século IX DC, no médio Solimões do século XII DC, no alto Amazonas do século XIII DC. O significado dessa expansão não é claro. Não se pode dizer, no momento, se o padrão nas datas indica um processo de expansão demográfica e colonização de novas áreas ou se ele indica relações de troca e comércio responsáveis pela expansão das cerâmicas polícromas. De qualquer modo, é certo que as populações que produziram essas cerâmicas foram as mesmas que testemunharam e foram descritas pelos primeiros viajantes europeus que passaram pela Amazônia nos séculos XVI e XVII. Essas descrições sugerem que, em alguns casos, as populações que produziram cerâmicas polícromas no alto Amazonas e no rio Solimões viviam em grandes aldeias, às vezes com poucos milhares de pessoas, e eram governadas por chefes supremos que comandavam também outras aldeias de grande porte. Ainda de acordo com os cronistas dos séculos XVI e XVII, esses grupos mantinham relações de comércio com outras aldeias distantes. A arqueologia amazônica tem, nos últimos anos, confirmado tais descrições, indicando que, de fato, alguns sítios com cerâmicas polícromas correspondem a aldeias de grande porte, às vezes com dezenas de hectares de área. As mais antigas ocupações na Amazônia. a) cerâmica da fase Areão, Salgado, PA. (Segundo Correa & Simões 1971). b) pontas de flecha. Sítio Dona Stella - Iranduba - AM. c-i) cerâmica hachurada zonada. c-d) fase Ananatuba. (Segundo Meggers & Evans 1967). f) adorno de pote globular. g-h) cachimbo tubular e sua decoração. (PRÓUS 1992: 431) 13 Lll THA DO TEMPO Primórdios do tJadição PolÍCromana Ilha de ~ SITIO TAPERlNHA 3.000 A 2.800 BP FASE MARlUOARA SmoCAVERNA As primeiros oeeôrecos I Primeiros cocícodos que TRADIÇÃO ~GA da AmérIca sõo procedentes TAPIUOS DA PEDRA PINTADA des1e sítio. Cate e <pWno do ugem no t>a1:ro lvrvzDnos. fIoresIcr 8 ir'1cJo do ~cbs mc:iore<; Valas ponios de projéteis cIomesficoçõo cbs p/cn= 1.600 A 600 BP fdeto!!ças no boDD Amazr.wlOs. arasiDn o lYBSBnÇCJde 7.100 A 6.700 BP I AO 400A 1.400 FASEARUÃca;a:bBs a.:gasno baK>.hTaaJas 1.200 A 300 BP I AD 800 A 1.700 1.600 A 300 B AD 1.400 A 1.700 11.200 A 10.{)00 BP 1 Ll 1 5.000 I 4.000 I 3.000 2.000 I I 1.000 I 500 I síTIO TRADiÇÃO MINA NA COSTA DO ATLÂNTICO Grtx:x:lsvivendo nos ricas áreas IDeitrJlcrs dó costo. ~ de scrmboquis 5.700 A 3.300 BP ~c. gmde5 .">áls 5.700 A 3.300 BP nbe'!.:::;::::::ooJ AD500A 1.700 •Comércio regional 05caXaíc5 do ~ Sub·!radiçó.o Guam Flote$clmento ocs COQCno m:oo iVnazcvla 1.100 A 400 81 10 90C A 1.600 eu J f'»3Ut •e:;e 1.000 BP •Maior expamão da, lId9!aç<1Senfi_ A populoçõo <D Anr:IroI> es1ó esfmcxJo ~ âe mih>e5 de pessoas. 600 ID .400 Franceses, holandeses, Ingleses e portugueses negociam com GS fOO105. Estabeleclmorrto de forles e coôceos eurooétas: AO 1583 A 1631 'ÚHimos índios Aruôs no baixo Amazonas. AO 1816 • .0 ! 1.500 I 1.600 I 1.700 I 1.800 I 2.000 I 1961 Primeira. reservo indígena brasi!elra: Parque Nacional do Xlngu, no sul:do Amazona,S'. 1969 Crlaçõo da Fundoç60 Naclonol do fndto (fUNAI) 1973 fstabeleclmanto do Estalulo do Indlo, que recomenda a Integração dos povos Indr.genas à população nacional. 1.900 I 1980 As pcputoções lt:'1digenas começam a crescer. 1988 Á nova conitltutção brasileira recohece o direito Indfgena sobre a terra. cctnne e linguas. 2004 A população indígena está estimada em .500.000 Indlos. Eles pertencem a 210 etlnjos diferentes, falam cerca de 130 línguas e vivem em 610 á~easdemercados.. tAproximadamQnte 12% do terl'Hórlo naclonalt. •Primeiro mlssêo Cristã na Ilha de- Marojó Jesuito, ...robe!ecefCJm mJsSÔ6S por IOdo extensão do rio. T•ttrimelro dNOldo do tio AmOlona.pelO' N/XInhól. "1I11'f~ dO (]fOr'des vIIOStx» Cr-:vojal. AO 1644 1000 populaçoo Incllgana. entre o O/opoque e O AmozOf1O' é rncvIdo poro 891ém pe/ol parIV\lVOKlS. AO 1784 A 1798 AO 1541 1874 Últimos topoJós vtsícs no 6180 de Scnlorém. 1890 Apogeu do cicio do bonccho na AmoZônio. 1910 F<KldaçOo do SelVlço do I'IO!eçOO 00 10010 no 81os11, 16 EOLOGIA - CADERNOS DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL Embora dividam características comuns, pode-se perceber uma certa variabilidade quando se comparam cerâmicas polícrornas na bacia Amazônica. Assim, por conta disso, essas cerâmicas recebem diferentes denominações regionais, a partir de suas características decorativas particulares. Algumas dessas denominações são relativamente bem conhecidas. Além da Marajoara há: Miracanguera, na região de Silves, Itacoatiara e Urucurituba; Borba no baixo Madeira; Guarita nas regiões de Manaus, baixo rio Negro, Manacapuru, Codajás e Coari; Tefé, na região da cidade de Tefé; São Joaqui e Pirapitinga, no alto Solimões; Zebu na região e entorno de Letícia, na Colômbia; Nofurei na Colômbia, mas na região de Arara ara, o rio Caquetá (Japurá); Caimito, no alto Amazonas e rio Ucayali, no Peru e, finalmente Napo, no rio Napo, Equador. Em linhas gerais, algumas tendências são otáveis: primeiramente, parace e .a maior de vasos com etangulares à medida que a ,·egião do rio Napo, ezrremo oes e da distribuição r-~";rr,lN:,,::pO:íl::romas, é comum a ocorrência de pratos a ra padrão análogo de mudança é visto nas umas funerárias: no alto Amazonas é muito mais comum a presença de umas antropomorfas polícromas onde raços e pernas são modelados, destacando-se dos vasos, e uanto nas umas antropomorfas o marajó, braços e pernas são normalmente pinta ou modelados junto ao corpo dos vasos. Uma das questões mais interessantes relativas à expansão da tradição polícrorna na Amazônia é o entendimento do hiato nessa expansão, encontrado entre a ilha de Marajó e a região de Silves. Nessa ampla área, os sítios encontrados até o momento foram ocupados por populações que produziram cerâmicas bastante diferentes, associadas à chamada tradição Incisa e Ponteada. Do mesmo modo que os sítios polícromos dos rios Amazonas e Solimões, os sítios com cerâmicas incisas e ponteadas podem ser bastante grandes, com vanos hectares de área e terras pretas antrópicas, indicando que eram grandes aldeias sedentárias ocupadas por populações numerosas.Talvez as cerâmicas mais conhecidas relacionadas a essa tradição sejam as Tapajônicas ou de Santarém. Trata-se, assim como no caso do Marajó, de cerâmicas bastante sofisticadas, incluindo formas bastante complexas e técnicas de produção incluindo a pintura e o modelado. Os tipos de vasos tapajônicos mais conhecidos são os vasos de cariátides e de gargalo, que têm esses nomes devido à sua forma e decoração. Nessas categorias de vasos prevalece a decoração modelada, composta por motivos zoomorfos - como pássaros, morcegos, répteis e mamíferos e também antropomorfos, incluindo as próprias cariátides. Na cerâmica tapajônica é comum também a presença de estatuetas antropomorfas, em alguns casos bastante naturalistas, onde se podem perceber detalhes da pintura corporal, o uso de jóias e diferentes tipos de penteado. Talvez a categoria mais conhecida de estatuetas tapajônicas sejam as de base semilunar, estatuetas representando mulheres adornadas, nuas, sempre com uma base em forma de meia lua. Cerâmicas tapajônicas são encontradas em uma grande área que tem como centro a atual cidade de Santarém. Santarém está localizada sobre um grande sítio arqueológico, atualmente bastante destruído, devido ao crescimento da cidade. Cerâmicas tapajônicas são encontradas em acervos de museus brasileiros e estrangeiros, bem como em coleções particulares. A região de Santarém e entorno, apesar de seu grande interesse, é ainda muito mal conhecida do ponto de vista arqueológico, não havendo, por exemplo, nem uma cronologia básica para os sítios. As poucas datas disponíveis indicam que a ocupação tapajônica data pelo menos do final do primeiro milênio DC. Essa ocupação durou até o século XVII DC, portanto após a chegada dos europeus à Amazônia. Informações sobre seu modo de vida podem ser lidas nos relatos de missionários que com eles conviveram. A HISTÓRIA DA AMAZÔNIA ANTES DA CONQUISTA Cerâmica :;0 Amapá e :::::3 M3S + enores. a) carimbos. b) estatueta feminina de barro. úffia Maracá. orna Marajó e) uma Aristé f) uma Marajoara (a-b: adaptado de PROUS 1992: 497) (c-f: acervo fotográfico do arqueólogo Eduardo Goes Neves) 17 :..:r:~'Ol()GIA-C ER OS DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL Próximo à Santarém, na reqiao dos rios Nhamundá e Trombetas, bem como na região de Parintins, encontram-se cerâmicas também pertencentes à tradição incisa e ponteada, conhecidas como Konduri. Cerâmicas Konduri são também bastante sofisticadas, com uma prevalência da decoração modelada em motivos antropomorfos e zoomorfos, com a diferença de que os vasos parecem ser geralmente maiores que os tapajônicos. Os fragmentos desses vasos são normalmente conhecidos como "caretas" e comumente enco tra e áreas de terra preta e roças por toda a regiã _ a eologia Konduri é ainda menos co ecida q e a tapajônica, mas acredita-se que as populações que produziram essas cerâmicas tenham sido contemporâneas. Um aspecto interessante da arqueologia Konduri é a presença de um pequeno, mas .a: ório de estatuetas de pedra &- - '"e resentam seres humanos _",,:>..::-. ••e para onças e sucurís, ou {),'"'"~!rrnOmtle,as estatuetas têm rações, mas não se sabe como eram - as. iconografia de algumas das estatuetas lembra bastante a das grandes esculturas de pedra encontradas na região de SanAugustín, nos Andes colombianos. Outras estatuetas, no entanto, têm traços em comum com os desenhos encontrados nas 'pranchetas de madeira, usadas para aspiração de paricá, produzidas pelos índios Maués até o século XIX. Outra categoria de artefatos de pedra associados à cerâmica Kônduri são os muiraquitãs. Muiraquitãs não são exclusivos da região do Nhamundá e Trombetas, já que há informações de sua ocorrência em locais como a ilha de Marajó, Santarém, alto Tapajós e até mesmo a região onde foi construída a usina hidroelétrica de Balbina, no rio 18 Uatumã, ao norte de Manaus. Muiraquitãs são. normalmente bastante pequenos, sendo quase sempre zoomorfos, em forma de sapo. A rocha utilizada é geralmente esverdeada, mas há também muiraquitãs feitos com rochas brancas e com outros motivos zoomorfos, além de sapos, tais como peixes e morcegos. Há também casos de muiraquitãs antropomorfos, embora sejam bem mais raros. Muiraquitãs são também encontrados fora da Amazônia, nas Guianas e ilhas do Caribe. Não é ainda claro se a região do Nhamundá- Trombetas era o único centro de produção a partir do qual circulavam esses artefatos ou se eles eram produzidos em vários locais diferentes. O fato, no entanto, é que a distribuição de muiraquitãs por uma ampla área indica que as populações amazônicas do final do primeiro milênio DC não estavam isoladas, mas sim integradas em redes de comércio ou em outros tipos de rede que permitiam o contato entre si. Devido a seu tamanho reduzido e alta portabilidade, muiraquitãs são peças que correm riscos de roubo e contrabando. Além da calha do Amazonas nas áreas do alto Madeira e Purus, o quadro da arqueologia parece ser um pouco diferente. No Acre, próximo a Rio Branco, achados recentes têm mostrado a ocorrência de estruturas artificiais, feitas de terra, com formas geométricas quadrangulares ou circulares, com dezenas de metros quadrados de área, conhecidas como geóglifos. Não se sabe ainda qual a idade dos geóglifos do Acre, mas correlações com estruturas semelhantes construídas na Bolívia sugerem que eles devem datar do primeiro milênio DC. No momento, é difícil estabelecer uma correlação entre os geóglifos! e os povos indígenas que ocupam atualmente a região do alto Purus. A HISTÓRIA DA AMAZÔNIA ANTES DA CONQUISTA : ~ -; - :;a Santarem. - :::e gargalo. pedestal. -....G;.''''''"'' ae PRO S 1992:445) OS DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL 20 Fase Mazagão e estilo Maracá. a) uma de estilo Maracá com cabeça troncônica. b) tampa de urna hemisférica. c) tampa globular. d) urna Maracá zoomorfa. a) apud Museu Paraense Emilio Goeldi 1980). b-c) segundo Meggers & Evans 1957). (Adaptado de PROUS 1992: 500) ondônia, na bacia do alto .a arqueologia também -e bora com um potencial )-,=::-:::'-"C ........,,'e- ,...D. É em Rondônia que se encontra • r diversidade lingüística entre os povos - ames de línguas Tupi, o que sugere que essa seja a ;:: 'e origem dos povos Tupi. É também a região O",~nn-,nia q e estudos' genéticos sugerem ter sido e d esticação original de importantes ~ a 'oca e a pupunha. Ro dônia, o que .;;- terra preta de índio da ~ '-G e .000 anos de idade. Na de solo - que são e têm uma grande importância . recentes, datando de mais ou _e' ade. As terras pretas talvez e ue os ambientes pe as popu lações ~'C1"" antes da conquista. eta são procuradas c:a sa de seu potencial de cultivo, e sabe que esses solos foram dios no passado. Os processos que ção são ainda desconhecidos, ais provável é que eles resultam do o de restos orgânicos osso de peixe - . ais, cascas de frutas e raízes, fezes, carvão etc em aldeias sedentárias ocupadas ui os anos ou décadas. Na calha do !"1CIZCInaSe S imões, sítios com cerâmica Paredão, Po>licroJna e cisa e ponteada são normalmente := e A HISTÓRIA DA AMAZÔNIA ANTES DA CONQUISTA Na periferia sul da Amazônia, na bacia do alto Xingu, no atual Estado do Mato Grosso, pesquisas arqueológicas recentes têm trazido evidências surpreendentes que mostram, nos séculos Xlil e XIV DC,. a presença de grandes aldeias circulares, com dezenas de hectares de área, cercadas por aterros artificiais e conectadas por largos caminhos. Como no caso dos índios Palikur e da cerâmica Aristé do Amapá, parece, no .caso do alto Xingu, haver continuidade histórica direta entre, por um lado, as populações pré-coloniais que construíram e viveram nessas grandes aldeias e, por outro, os povos indígenas que atualmente ocupam a região, no Parque Indígena do Alto Xingu. ' Além dos locais discutidos, há outras áreas na Amazônia brasileira que são ainda muito mal conhecidas arqueologicamente. Entre essas áreas há, entre outras, as bacias dos rios Javari e Juruá, a bacia do rio Branco e toda a área de interflúvio no planalto das Guianas,desde Roraima até o Amapá e também o grande interflúvio entre os rios Madeira, Tapajós, Xingu e Tocantins ao sul. O crescente avanço das frentes de colonização, principalmente no sul da Amazônia, leva um grande risco ao patrimônio arqueológico dessas áreas. Com a destruição desse patrimônio, desaparecem também as oportunidades de conhecimento de algo sobre a história dos povos indígenas que habitaram esses locais. 21 JUiQ~I:oLOGIA - CA u5R OS DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL • Cerâmica de tradição Policroma. a-c) umas funerárias poücromas da fase Marajoara. b, c) segundo Palmatary, 1960. a) segundo Torres, 1940. d) tanga Marajoara. (Apud A. Costa, 1938). (PROUS 1992: 437) 22 .. - - - ---- ...\~ .• _--_ • ."."'I \ , G ------+- .. . Ô A TES DA CONQUISTA to Estatuetas Santarém. a) coleção do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP b) estatueta de base semilunar. c) estatueta unípede. b-c) Segundo Correa 1971. (PROUS 1992: 448) 23 ,UC~~:OUOGlIA - C :lERNOS DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL ~_:_--c-----:..,. .. (.rrr O 3~•• Tradição 'Borda Incisa' e urnas Miracanguera. c, e oordas, e localização da decoração. (coleções particulares). f, g) machados amazônicos. h) coleção do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP. i-k) tradição Policroma, umas funerárias de Miracanguera e de Silves (fase Guarita). i-j) segundo Museu Paraense Emílio Goeldí, Rio 1981. k) segundo Torres, 1940. (PROUS 1992: 435) 24 . o ~ ,.. ~.. " e .- .; .Ó> .. "di _. • . " .4. •.•. t.l_ .a .•. ; . to... a"""'e e, há um outro tipo de arqueológico bastante comum em algumas partes da Amazônia, mas a- a pouco estudado: as gravuras e pinturas es. Essessítios podem estar localizados - ;; _-=- __ asso rocha ou, mais as ou matacões nas cecraís no meio dos rios. As •••..•..~~.•e te preservadas em locais abrigos, eram normalmente se do o preto menos sã mais abundantes: eitas através do icoteamento da rocha e são . e's, nas épocas de estio em rios s, como o Uaupés e Içana, o médio e , o hamundá e Trombetas, o Xingu, a-a. Devido à dificuldade de datação, ã se sabe ainda a antigüidade dos sítios de a-e azô ia, em mesmo sua A HISTÓRIA DA AMAZÔNIA ANTES DA CONQUISTA relação com os outros tipos de vestígios identificados na região. Na caverna da Pedra Pintada, em Monte Alegre, foi proposto que as pinturas datariam de cerca de 8.000 Be, mas essas datas são ainda disputadas. A breve discussão aqui apresentada permite que se perceba a riqueza e diversidade do patrimônio arqueolégico da Amazônia. O estudo e preservação desse patrimônio, herança de todos, é o único caminho para entender a rica história pré-colonial da região. A ocupação da Âmazônia é um dos problemas sociais e ecológicos mais importantes do Brasil contemporâneo. O entendimento das formas de vida antigas na região - revelado pela arqueologia - pode nos ajudar a traçar parâmetros para avaliar como essa ocupação se constitui no presente. 25 •• CerImic:a :::R OS DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL a) poço funerário de Kunani. Fase Aristé. b) abrigo funerário n.? 2 da montanha de Aristé. c) formas Aristé. (PROUS 1992: 503) A HISTÓRIA DA AMAZÔNIA ANTES DA CONQUISTA Temática Santarém e Konduri a, b) 'ídolos' de esteatita. Rio Trombetas. (a: MAE-USP. b: Curvelo (Museu de História Natural da UFMG). c) muiraquitã de pedra verde. (Apud Koeller-Asseburq, 1951). c-g) adornos zoornorfos: cobra, urubu, macaco e sapo. (Museu de Arqueologia e Etnologia da USP). (Adaptado de PROUS 1992: 450) 27 ARQUEOLOGIA - CADERNOS DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL Artefatos do baixo Amazonas. a-b) adorno de borda e alças Konduri. (Museu de H"IS ória Natural da UFMG). c) estilo globular. (Segundo Hilbert, .1955). (Adaptado de PROUS 1992: 452) 28 ----------------------~-----------------~~--~~----------------------------~-----------===~~Im A HISTÓRIA DA AMAZÔNIA ANTES DA CONQUISTA BIBLIOGRAFIA 1- GRUPJONI. Luis Donisete & Barreto, Çristiana (org.) Amazonia: native traditions. São Paulo: Brasil Con ects Cultura & Ecologia, 2004. 264p. - 2 - PROUS, André. Arqueologia Brasileira. Brasília: UnB, 1992. Sítío arqueológiro Nova Cídade. Manaus - Amazonas. Foto: Carfos Augusto da Silva. 29 = istória da Amazônia Antes da Conquista experiência e a dedicação do arqueólogo I es eves nos. seus dez ;anos de estudo e esta assa continental e misteriosa Amazônia
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