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PROCESSOS DO DESIGN THINKING AULA 1 Prof. Re-nato Antonio Bertão 2 CONVERSA INICIAL Seja bem-vindo! Ao longo das próximas aulas, apresentaremos de que maneira o modelo de pensamento dos designers tem sido reconhecido e utilizado por outras áreas do conhecimento como uma abordagem para solucionar problemas complexos de forma inovadora. Também vamos abordar um horizonte profissional no qual você, futuro designer, poderá integrar equipes de projetos focados em design thinking e atuar como design thinker. Independentemente da sua especialização na área de design (se gráfico, de produto, de animação, de serviços etc.), é fundamental que você entenda a dimensão e domine as ferramentas do design thinking. Esse novo campo de atuação que se baseia nas práticas do design tende a se expandir e ser assimilado por diversas outras áreas do conhecimento e, por meio de um processo cíclico, influenciar as práticas das diferentes modalidades de design. Um exemplo é o design de serviços, uma modalidade contemporânea do design em plena expansão e que se estrutura de forma muito similar ao design thinking. Já o design de produto cada vez mais tem se voltado para uma perspectiva mais ampla, a do product-service system (PSS), também conhecida como sistema de produto-serviço e que se aproxima muito das práticas de design thinking. O design thinking tem sido abraçado por profissionais e organizações que almejam inovar nos seus negócios e nas suas estruturas para obter vantagem competitiva. Nesse sentido, estão em expansão as oportunidades para atuar como design thinker ou como consultor em design thinking. Na busca pelas melhores posições no mercado, egressos de cursos de design, independentemente da modalidade, têm uma vantagem competitiva, pois já pensam como designers. Esperamos que você aproveite essa disciplina ao máximo e que ela lhe apresente um campo de atuação profissional para além da sua formação específica numa das modalidades do design. O universo do design, por natureza, é motivador pois, durante a sua prática, oportuniza-se um aprendizado intenso e distinto a cada projeto. Com a perspectiva multidisciplinar do design thinking, o potencial de aprendizado se expande e o desafio se torna mais instigante. 3 CONTEXTUALIZANDO Para entendermos o contexto desta nossa disciplina sugerimos um breve exercício. Inicialmente, leia com atenção esta definição de Torquato, Antunes e Willerding (2015), pesquisadoras da área de engenharia do conhecimento da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC): [...] o design thinking propõe que um novo olhar seja adotado ao se endereçar problemas complexos, um ponto de vista mais empático que permita colocar as pessoas no centro do desenvolvimento de um projeto e gerar resultados que são mais desejáveis para elas, mas que ao mesmo tempo financeiramente interessantes e tecnicamente possíveis de serem transformados em realidade. A definição anterior parece bastante objetiva e nos permite vislumbrar o contexto do design thinking; contudo, ela ainda carece de informação relativa à sua aplicabilidade. A seguir, recomendamos que você faça a leitura de um artigo publicado pela HSM Management, uma das principais publicações brasileiras na área de gestão e liderança. O artigo, denominado O design thinking põe foco no ser humano, de Stuber (2016), consultor da área de gestão, pode ser baixado neste link: <https://vanzolini.org.br/wp-content/uploads/2016/03/revista-hsm- design-thinking.pdf> (acesso em: 18 fev. 2019). Há várias considerações possíveis de serem feitas após a leitura desses conteúdos. Contudo, gostaríamos de destacar dois aspectos que vão permitir situar o design thinking contemporaneamente. O primeiro é o fato de os autores citados não serem profissionais ou pesquisadores do design. Isso denota que o design thinking não é de domínio exclusivo do designer, mas de um novo profissional, o design thinker. O segundo aspecto está relacionado com a questão da inovação no sentido de valor econômico e, conforme você pôde perceber no relato de Stuber (2016), ela tem sido motivo de preocupação de organizações distintas, globalmente. Após duas décadas de prática, o design thinking já não é um modismo da área de gestão e inovação, mas uma abordagem para se alcançar inovação, nas organizações. A sua estrutura conceitual baseia-se no design, porém cada vez mais ele é visto como uma abordagem multidisciplinar e, talvez por essa razão, continue repercutindo e sendo adotado por profissionais e organizações de áreas tão díspares como negócios, saúde pública e inovação social, entre outras. De certo modo, por meio do design thinking, as habilidades e o pensamento dos 4 designers têm sido capazes de impactar de maneira muito mais relevante a sociedade. TEMA 1 – O QUE É DESIGN THINKING? Para entendermos o design thinking é necessário irmos além da sua tradução simples para o português: pensamento de design. Ele se baseia no modo de pensamento dos designers mas, após a incorporação de conteúdos de outras áreas do conhecimento, hoje em dia ele pode ser definido como uma abordagem multidisciplinar para a solução de problemas. A seguir, vamos analisar algumas definições de design thinking, propostas por profissionais e teóricos da área, para percebermos a sua dimensão. Tim Brown, CEO da empresa de design Ideo, publicou um artigo na Harvard Business Review em que apresentou o que seja o design thinking para a área de negócios e que, depois de mais de uma década, ainda é considerado uma referência na área. Brown (2008, tradução nossa) define o design thinking como uma “[...] disciplina que usa as habilidades e métodos dos designers para atender as necessidades das pessoas com o que é tecnologicamente viável e com uma estratégia de negócios factível que pode ser convertida em valor para o cliente e em oportunidade de negócio”. Figura 1 – O artigo de Tim Brown sobre design thinking na Harvard Business Review Créditos: Rawpixel.com/Shutterstock. Fonte: Brown, 2008. Como podemos perceber na definição de Brown (2008), o design thinking vai além de um processo de design regular e expande seu espectro para o 5 ambiente dos negócios. Uma segunda definição do autor destaca que o seu uso também pode levar à inovação: “Design thinking é uma abordagem centrada no ser humano voltada para a inovação que surge com base nas ferramentas do designer e visa atender às necessidades das pessoas, às questões tecnológicas e aos requisitos para um negócio bem-sucedido” (Brown, [S.d.] citado por Design, [S.d.]). Uma definição mais didática e que detalha o modus operandi do design thinking é desenvolvida por Lockwood (2009, tradução nossa). Segundo ele, podemos definir o design thinking como um “[...] processo de inovação centrado no ser humano, que enfatiza observação, colaboração, aprendizado rápido, visualização de ideias, prototipagem rápida de conceitos e análise de negócio concorrente e que – finalmente – influencia a inovação e a estratégia de negócio”. Como você pode perceber pelas três definições já apresentadas, o design thinking não se restringe ao design e aos designers e tem um forte vínculo com inovação e negócios. Segundo Martin (2010), o design thinking é relevante por aplicar o raciocínio abdutivo aos problemas de negócios. Essa técnica dos designers, quando estendida a outros âmbitos, permite a obtenção de soluções inovadoras. Para o autor, os designers vivem no mundo da abdução porque sempre procuram novos pontos de vista, fazem questionamentos de explicações tradicionalmente aceitas e inferem mundos novos. Essas práticas, anteriormente vistas com receio, agora são comuns em cursos de graduação e pós-graduação em administração e negócios, assim como no cotidiano de muitas organizações vistas como inovadoras.A incorporação do design thinking no universo dos negócios acontece, segundo Liedtka e Ogilvie (2011), porque trata-se de uma abordagem sistemática para a solução de problemas que perpassa produtos, processos, inovação, modelos de negócio etc. Para Liedtka (2015), essa abordagem se torna atrativa para o ambiente de negócios pois combina o pensamento criativo (lado direito do cérebro) com o pensamento analítico (lado esquerdo do cérebro) e também porque tem foco no ser humano, ou seja, o cliente é visto como uma pessoa real, com problemas reais. Uma das maiores consultorias brasileiras na área de inovação, a MJV, apresenta uma definição que, de certa forma, sintetiza as anteriores. Disponível no livro Design thinking: inovação em negócios (Vianna et al., 2012, p. 13), ela 6 esclarece que, “como o nome já diz, o Design Thinking se refere à maneira do designer de pensar, que utiliza um tipo de raciocínio pouco convencional no meio empresarial, o pensamento abdutivo”, por meio do qual “são formuladas perguntas a serem respondidas com base nas informações coletadas durante a observação do universo que permeia o problema”. Nos parágrafos anteriores foi possível perceber que o design thinking está inserido no contexto de negócios e que, por meio de pensamento abdutivo e foco no ser humano, visa à solução de problemas e à inovação. Ocorre que, por sua característica interdisciplinar e multidimensional, o design thinking tem várias outras nuances a serem consideradas. Para isso, vamos examinar outras definições que vão lhe permitir obter uma visão mais sistêmica e aplicada a outras áreas. Como futuro profissional de design, essa perspectiva vai ser fundamental para você atuar com propriedade em projetos de design thinking. Os pesquisadores brasileiros Bonini e Sbragia (2011) enfatizam o papel do design thinking nas organizações e apresentam-no como um modelo de inovação organizacional que permite “o desenvolvimento de soluções criativas e, para isso, utiliza-se de metodologias de pesquisa centradas no usuário para atender aos desafios estratégicos da organização”. Ainda em relação à inovação, Bonini e Endo ([20--]) esclarecem que o design thinking é também uma ferramenta para a inovação, pois envolve todo esse processo, da geração de ideias até a sua inserção no mercado. Nesse sentido, como sugere Tschimmel (2012, tradução nossa), ele é entendido com uma “linha de pensamento que leva à transformação, evolução e inovação [...] e novas maneiras de gerenciar negócios”. Alguns autores como Smulders, Dorst e Vermass (2014), ao definirem design thinking, enfatizam sua origem nas técnicas, métodos e ferramentas do desenvolvimento de produtos, também conhecido como design industrial. Para eles, contemporaneamente esse escopo foi ampliado e o design thinking é usado como uma abordagem para solução de problemas gerais em áreas distintas do desenvolvimento de produtos. Além dos negócios, outras áreas estão usando design thinking, como serviços, saúde, educação, tecnologia da informação, inovação social etc. Gobble (2014, tradução nossa) ainda destaca que o design thinking “engloba um espectro de ferramentas e modelos, sendo que alguns foram emprestados de outras áreas do conhecimento, para refletir a sua preocupação 7 com a experiência humana”. A autora define o design thinking como uma cultura e não uma metodologia, pois ele permite a uma organização não somente abordar a inovação, mas também a forma como ela se estrutura. Essas características enfatizam a sua natureza e, talvez, justifiquem o motivo da difusão do design thinking em áreas que, até tempos atrás, eram reticentes a abordagens interdisciplinares. Para encerrar a nossa navegação pelas diferentes definições de design thinking, apresentamos a pragmática visão de Carr et al. (2010, tradução nossa), que o concebem como um “processo iterativo e exploratório envolvendo experimentação, criação e prototipação de modelos e coleta de feedback”. Para os autores, trata-se de um método que permite lidar com inovação em contextos confusos e mal estruturados. Essa definição traz à tona conceitos-chave, da área, que vamos explorar nas próximas aulas e vão lhe permitir entender, por exemplo, o papel da iteração e da prototipagem no processo de design thinking. Mesmo que um profissional ou pesquisador da área proponha uma definição para o design thinking contemporâneo, provavelmente ela vai ser motivo de controvérsia e questionamentos devido às suas diferentes vertentes e usos. Definir-se design thinking como um processo, método, conjunto de ferramentas, mentalidade, modelo ou abordagem são possibilidades viáveis, contudo, é importante que você, aluno, entenda profundamente essa área, pois, como futuro profissional do design, você será um sujeito relevante nela. Com a difusão do design thinking, os designers começam a ter influência estratégica nas organizações e poderão conduzir mudanças disruptivas, nesses ambientes. TEMA 2 – TRABALHANDO COM PROBLEMAS COMPLEXOS A maior parte das definições de design thinking que lhe apresentamos enfatizam que ele visa à solução de problemas. Os wicked problems, também conhecidos como problemas complexos, são aqueles nos quais o design thinking tem sido mais aplicado. Alguns autores também definem wicked problems como problemas capciosos ou mal definidos. Em relação à definição de um problema, Buchanan (1992) esclarece que se trata de um processo analítico no qual se identificam os seus elementos e são especificados os requisitos para uma solução de sucesso. Cabe lembrar que, no design, nem sempre existem wicked problems; por isso, tão importante quanto solucionar um problema é saber identificar um problema de design e um problema de design thinking. 8 Alguns autores, como Bahia e Campos (2016), identificam wicked problems como “demandas de complexa compreensão e, em primeira instância, sem solução precisa [,] [...] problemas únicos e de alto nível, que não possuem soluções verdadeiras ou falsas”. Para entender melhor, vamos aos exemplos: o design do assento de um veículo para transporte urbano, como um ônibus, mesmo sendo de alta complexidade, pode ser considerado um problema de design industrial. Já o design de um sistema de mobilidade urbana sobre rodas tem sua complexidade ampliada e, para se chegar a uma solução desse problema, há necessidade de emprego de uma abordagem multidisciplinar, por meio do design thinking. Outros bons exemplos e talvez ainda mais complexos poderiam ser citados: consumo de energia, saúde pública, acesso à educação etc. O conceito de wicked problems foi apresentado, inicialmente, fora do âmbito do design por Horst Rittel, na década de 1960, e refere-se a uma “classe de problemas do sistema social que são mal formulados, em que a informação é confusa, na qual há muitos clientes e tomadores de decisão com valores conflitantes e em que as ramificações em todo o sistema são completamente confusas” (Churchman, 1967, p. B-141, tradução nossa). A seguir, apresentamos algumas das características dos problemas complexos propostas por Rittel e Webber (1973). • Os problemas complexos não têm uma formulação definitiva, mas toda formulação de um problema complexo corresponde à formulação de uma solução que não pode ser verdadeira ou falsa, apenas boa ou má. • Para todo problema complexo há sempre mais de uma explicação possível, com explicações dependendo da visão de mundo e do background do designer. • Todo problema complexo é único, mas também pode ser um sintoma de outro problema, de nível mais elevado. • Nenhuma formulação e solução de um problema complexo tem um teste definitivo. • Resolver um problema complexo é uma operação sem espaço para tentativa e erro. Nela o solucionador de problemas complexos não tem o direito de estar errado – ele é totalmente responsávelpor suas ações. 9 Richard Buchanan (1992), professor e pesquisador americano na área do design, publicou um artigo, denominado Wicked problems in design thinking, que permitiu a consolidação de uma teoria sobre o foco do design thinking. Para ele, a indeterminação é um aspecto fundamental dos problemas complexos. Segundo Buchanan (1992), os problemas de design tendem a ser indeterminados e complexos porque o foco de interesse do design não é específico, mas universal, no seu escopo, o que o faz aplicável a qualquer área da experiência humana. Lidar com problemas complexos no contexto do design thinking torna-se desafiador pois é necessário reformulá-los e dar estrutura a problemas mal estruturados. Nelson e Stolterman (2003) alertam que é necessária uma abordagem balanceada, que não os simplifique nem tampouco os leve tão a sério. Quando analisados em situações reais envolvendo assuntos humanos, esses problemas revelam-se únicos e imprevisíveis. As organizações contemporâneas buscam a inovação em contextos de mercado e negócios bastante complexos. Nesse sentido, a sua busca por inovação pode ser vista como um exemplo de problema complexo. Por meio do design thinking e suas ferramentas, é possível obter uma compreensão múltipla da natureza e das ambiguidades de um problema complexo e, atuando com equipes multidisciplinares, ter melhores condições de se chegar a possíveis soluções. TEMA 3 – DESIGN CENTRADO NO SER HUMANO O design thinking pode ser entendido como sinônimo de design centrado no ser humano; contudo, é importante destacar que a proposição inversa nem sempre é aplicável. Também conhecido como human-centered design (HCD), esse modelo é considerado um dos pilares do design thinking. De certa forma, podemos considerar o HCD como uma versão mais holística do design centrado no usuário ou user-centered design (UCD). Antes da difusão do design thinking, essa terminologia predominava na área do design, particularmente para se referir ao design de interações entre homem e máquinas. No contexto da ergonomia, há uma norma ISO (2010), que trata de design centrado no ser humano em sistemas interativos. Em linhas gerais, a norma 9421-210 define HCD como uma abordagem do desenvolvimento de sistemas interativos que visa torná-los usáveis e úteis por meio do foco no usuário, nas 10 suas necessidades e requisitos. No contexto de desenvolvimento de produto, segundo Veryzer e Mozota (2005), o UCD ajuda a garantir que o produto atenda às necessidades do consumidor e à realidade do mercado. Para além do universo de produtos, quando pensamos em serviços, negócios ou organizações, o foco no ser humano ou no usuário parece imprescindível para a obtenção de bons resultados, em termos de design. A maioria das definições de design thinking que apresentamos no início desta aula enfatizam o centramento no ser humano. Isso acontece por meio do uso de técnicas e ferramentas como empatia, entrevista, observação direta, prototipação e teste com o usuário. Com isso, o design thinking consegue lidar com problemas complexos que, quase sempre, têm o elemento humano em seu contexto. De acordo com Giacomin (2012), algumas técnicas e ferramentas são emprestadas de áreas como a psicologia e a sociologia e outras têm sua abordagem redefinida pela prática do design. Brown (2008), CEO da Ideo, afirma que a inovação pode ser alimentada pelo entendimento do que as pessoas querem e necessitam, pelo que elas gostam ou não, pela maneira como os produtos são produzidos, embalados, comercializados, assistidos etc. Para o autor, uma abordagem centrada no ser humano, no contexto do design thinking, se for baseada em observação direta, pode capturar insights inesperados e também gerar soluções inovadoras para atender aos desejos do consumidor. A empresa de design Ideo não inventou o design centrado no ser humano, contudo tem sido uma das principais responsáveis pela sua difusão no contexto do design thinking aplicado a negócios e inovação, assim como a contextos sociais como saúde e educação. Isso é feito por meio de um modelo de HCD que, de certa forma, pode ser considerada a abordagem da Ideo para o design thinking. A publicação HCD Human Centered Design | Kit de Ferramentas – disponível para download, em português, neste site: <http://www.designkit.org/resources/1> (acesso em: 18 fev. 2019) – apresenta o design centrado no ser humano como um processo para obter novas soluções em produtos, serviços, ambientes, organizações e modos de interação (Ideo, 2009). Apoiando-se nos conceitos propostos por Brown (2010), em seu livro Design thinking, a Ideo considera que as soluções de HCD devem estar numa interseção de três lentes: a do desejo, que envolve as necessidades, desejos e 11 comportamentos das pessoas; a da praticabilidade, que envolve questões técnicas e organizacionais; e a da viabilidade, que envolve questões financeiras. Para a Ideo (2009), o processo de design centrado no ser humano acontece fundamentalmente de modo participativo e tem três fases: ouvir (to hear), criar (to create) e implementar (to deliver). Figura 2 – As três lentes do human-centered design Fonte: Ideo, 2009. Sintetizando, o HCD pode ser definido como uma abordagem para a solução de problemas – assim como para a inovação – que foca principalmente nas pessoas, de modo a entender suas demandas e, de alguma forma, envolvê- las no processo de design thinking. Nas próximas aulas, apresentaremos detalhadamente as técnicas e ferramentas, bem como a abordagem da Ideo, para que você entenda por que o HCD é fundamental para se viabilizar processos de design thinking. TEMA 4 – DESIGN THINKING E PENSAMENTO CRIATIVO Neste tema não vamos falar de criatividade, pois você tem uma disciplina inteira para entendê-la e, também, vai praticá-la intensamente ao longo de todo o curso de Design. Aqui, vamos tratar do pensamento criativo e de como ele se situa em relação ao design thinking. Atualmente, o design thinking é visto como um caminho para a inovação e profissionais de diversas áreas e organizações procuram dominar essa metodologia porque sabem que, de certa forma, estarão desenvolvendo seu pensamento criativo. 12 O design é uma atividade essencialmente criativa e talvez uma das áreas em que o pensamento criativo seja mais intenso. No processo de design thinking, uma das fases mais importantes é a da ideação, quando a criatividade impera e é fomentada por meio de distintas técnicas e ferramentas. Como o design thinking expande-se para além do universo do design e trabalha com equipes multidisciplinares e de diferentes backgrounds, a partir do momento em que essas equipes são treinadas para desenvolver seu pensamento criativo abre-se uma oportunidade única para a inovação. Martin (2010), conforme já comentamos, afirma que o pensamento abdutivo é um dos aspectos mais relevantes do design thinking. Esse tipo de pensamento pode ser entendido como um salto para a criatividade. Nesse sentido, Leigh, Huber e Tremblay Jr. (2012) pontuam que o pensamento criativo pode ser caracterizado como explorador, inovador e sem restrições. Segundo os autores, o pensamento criativo se estrutura em habilidades de pensamento divergente e convergente. Para eles, a associação de pensamento criativo, motivação e domínio de habilidades/conteúdos permite atingir altos níveis de produção criativa. Para entender o pensamento criativo dos designers, uma referência é a obra de Lawson (2005, tradução nossa), cujo livro Como os arquitetos e designers pensam está disponível para leitura na Biblioteca Virtual Pearson. Para o autor, os designers têm altos níveis de demanda de pensamento criativo pois necessitam lidar tanto com a identificação de problemas como com a obtenção de soluções para eles. Para dar conta de tal demanda, fazem uso de técnicase ferramentas que, de certa forma, definem o seu pensamento criativo ou, como denominamos contemporaneamente, o pensamento de design. Técnicas relacionadas ao pensamento criativo em design thinking podem ser disseminadas por outras áreas e por não designers, contudo somente a prática cotidiana é que vai permitir que a criatividade floresça. Para Davis (2010), a cultura da inovação em negócios, que faz com que o design thinking seja adotado por distintas organizações, torna imperativa a integração do pensamento criativo nos níveis hierárquicos de tomada de decisão. Sem uma sua adoção plena na estrutura organizacional, as oportunidades de inovação ficam limitadas. Tendo em vista que o design thinking e a criatividade são vistos atualmente como chaves de crescimento sustentável e de negócios de sucesso, 13 a adoção do pensamento criativo torna-se um requisito de sobrevivência para as organizações. TEMA 5 – DESIGN THINKING E INOVAÇÃO O apelo à inovação, no competitivo contexto econômico global, tem sido um dos responsáveis pela difusão do design thinking. O sucesso do livro de Tim Brown (2010), Design thinking: uma metodologia poderosa para decretar o fim das velhas ideias, seguido pela abordagem de obras como as de Roger Martin (2010), Jeanne Liedtka e Ogilvie (2011), entre outros, fez com que o design thinking entrasse na agenda de interesses de grandes empresas e corporações, assim como de entidades governamentais que promovem a inovação. Carlgren, Elmquist e Rauth (2014) destacam que, no ambiente de alta gestão, o design thinking é visto como uma abordagem da inovação centrada no ser humano que pode ser aplicada em qualquer área, de qualquer organização, para aumentar sua capacidade de inovação. Não é nossa intenção discutir, nesta disciplina, a inovação em si, mas, para entendê-la no contexto do design thinking, é necessário lembrar que podemos classificá-la em relação ao seu tipo (produto, processo organizacional, marketing) (Ocde, 2004) e ao seu impacto (se aberta, incremental, radical ou disruptiva etc.). Em geral, quando falamos de inovação como resultado de processos de design thinking, estamos nos referindo à inovação radical ou disruptiva, de qualquer tipo, que gere impacto nos negócios. Inovação, como você vai verificar ao longo do curso, diferencia-se de originalidade exatamente pelo seu aspecto de valor econômico agregado. Em função do interesse de profissionais de negócios – e também de diversas outras áreas –, acadêmicos e pesquisadores de gestão e design têm ofertado cursos de pós-graduação que visam desenvolver habilidades em design thinking e inovação. Em geral, esses cursos apresentam o design thinking como estratégia de inovação. Eles objetivam capacitar alunos para o uso e implementação de ferramentas e métodos de design thinking nas organizações, de forma a fomentar uma cultura de inovação. Mesmo considerando que uma organização tenha capacitado alguns dos seus profissionais para atuar com propriedade como design thinkers, a prática revela que há necessidade de haver uma cultura organizacional favorável ao design thinking, para que a inovação aconteça. De acordo com Van Reine 14 (2017), essa cultura de design thinking envolve, por parte da empresa, demonstrar uma inclinação para a experimentação, tolerância ao erro e estímulo à participação de todos no processo de inovação. Segundo o autor, a mudança de mentalidade, a aceitação do contraditório e o gerenciamento de tensões são os principais desafios das organizações para inovar em produtos e serviços por meio do design thinking. No cenário atual, consultorias no Brasil e no exterior vendem o design thinking como uma abordagem radical para a inovação. Contudo, Van Reine (2017) sugere uma abordagem mais realista, que considera o design thinking para a inovação uma mentalidade, no nível individual, e uma cultura, no nível organizacional. De certo modo, o maior desafio, tanto para indivíduos como para organizações que almejam inovar via design thinking, é estar inserido num ambiente que continuamente antecipa-se e ajusta-se às mudanças. Cases de inovação em produtos e serviços com base em processos de design thinking são relativamente fáceis de identificarmos, em diversas áreas; contudo, na maioria dos casos, não é possível aferir o impacto econômico de tais iniciativas de modo a evidenciar uma inovação de fato. Segundo Carlgren, Elmquist e Rauth (2014), esse impacto depende do contexto e inclui outros fatores além de inovação. No estudo desenvolvido pelos autores, verificou-se que, quando uma empresa ambiciona se tornar mais inovadora, a contribuição do design thinking nos negócios da organização é mais visível no longo prazo. Apesar de carecer de evidências empíricas e econômicas, o discurso relacionando design thinking à inovação tem sido adotado por governos de vários países, principalmente na Europa. A sua intenção é difundir a abordagem do design thinking de modo a fomentar a indústria criativa e o ambiente de startups para criar empregos e desenvolver uma cultura de inovação. No contexto da quarta revolução industrial, a inovação é um ativo fundamental para o desenvolvimento econômico e o design thinking é visto como um processo- chave para alcançá-lo. No Brasil, algumas iniciativas por parte dos setores público e privado trilham esse mesmo caminho. O design thinking, como abordagem, apresenta ferramentas que podem propiciar o desenvolvimento de soluções inovadoras para problemas complexos; contudo, o caminho para a obtenção de inovação no seu sentido pleno é repleto de variáveis que devem ser administradas em vários níveis, mas, principalmente, no nível profissional (capacitação dos designers thinkers) e no nível 15 organizacional (desenvolvimento de uma cultura da empresa). Sem essa articulação, relacionar design thinking e inovação torna-se um discurso vago. TROCANDO IDEIAS O Brasil é um país complexo e cheio de contradições em termos sociais, culturais, econômicos e ambientais. Que tal trocar ideias com seus colegas (via fórum on-line) e tentar identificar pelo menos três wicked problems (problemas complexos) nos quais o design thinking poderia ser aplicado na tentativa de se propor alguma solução que venha a beneficiar a sociedade, seja como um todo ou em alguns segmentos? NA PRÁTICA Para essa atividade sugerimos que você releia o Tema 3, Design centrado no ser humano, e também o case Diabéticos por uma semana, disponível nas páginas 49-52 do livro Design thinking: inovação em negócios (Vianna et al., 2012). Você pode baixar o livro gratuitamente neste link: <http://conteudo.mjv.com.br/ebook/design-thinking-inovacao-em-negocios> (acesso em 18 fev. 2019). A seguir, reflita e responda às seguintes questões: 1. Qual foi a abordagem de design thinking da equipe responsável pelo projeto, para monitoramento de pacientes crônicos? 2. Explique por que essa abordagem é relevante (ou não) para esse tipo de projeto. FINALIZANDO Nesta aula sobre design thinking apresentamos os conceitos iniciais de design thinking, de modo que você entenda como ele se situa no universo do design e, principalmente, no contexto contemporâneo, envolvendo diversas outras áreas como a de negócios. Nesse sentido, abrangemos distintas definições para que você possa perceber a dimensão do design thinking. A seguir foram examinadas as características dos problemas complexos que são o foco do design thinking, assim como a sua estratégia de design centrado no ser humano. Abordamos também o pensamento criativo como 16 fundamento das práticas de design thinking e, ao final, pudemos perceber que a relação entre design thinking e inovação tem suas condicionantes. É importante que você tenha uma boa compreensão dos tópicos desta primeira aula porque as seguintes serão baseadas em vários desses conceitosfundamentais do design thinking. Talvez esses primeiros conteúdos pareçam um tanto abstratos, contudo, nas próximas aulas, a dinâmica (seus modelos e ferramentas) do design thinking vai ficar mais clara e você vai ter condições de perceber sua aplicabilidade e relevância. 17 REFERÊNCIAS BAHIA, I. P.; CAMPOS, M. P. 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