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1 Beatriz Machado de Almeida Farmacologia – Antidiarreicos – Aula 2 Reposição de eletrólitos e antidiarreicos A palavra diarreia é proveniente da palavra “dia” (sem parar) e “rheein” (fluir ou escorrer). A massa das fezes e sua consistência é diretamente proporcional a quantidade água que o indivíduo deixou de absorver. A maioria dos casos de diarreia resulta em distúrbios do transporte intestinal de água e eletrólitos. Ou seja, qualquer patógeno que cause distúrbios na absorção de água ou eletrólitos pode causar diarreia. Outra definição é “evacuação muito rápida de fezes muito líquidas” Em geral, 200g é o limite de água nas fezes para um indivíduo saudável. Epidemiologia • Segunda causa de morte em crianças abaixo de 5 anos; • Prevenível e tratável; • 1,7 bilhões de casos de doenças diarreicas em crianças por ano; • 525.000 mortes anuais < 5 anos; • Diarreia é a causa líder de má nutrição em crianças abaixo de 5 anos; As doenças diarreicas então entre as 10 principais causas de mortes no mundo. As doenças diarreicas no Sul são a 5ª maior causa de morte e no hemisfério norte não aparece nem entre as 10. Logo, conclui-se que é uma doença que acomete mais os países mais pobres. Porque nesses locais tem saneamento básico comprometido e as crianças acabam sofrendo mais. Observando todo esse panorama, vendo que mata bastante crianças, é necessário entender a relação de água com o TGI. Relação água/trato gastrointestinal LÍQUIDO NO TG I Aqui tem um exemplo do tanto de água que circula no TGI e o quanto que é excretado nas fezes. Lembra que aproximadamente 200g por dia é o comum? Nessa figura fala um pouco menor, 150g. Então, uma pessoa que ingerir aproximadamente 2L de água, 1,5L de saliva, 1L de suco gástrico, 2L de suco intestinal, 1L de suco pancreático e 200ml de secreção de muco do colón, tem como somatório de tudo o valor de líquido que passa no TGI por dia. Dá quase 10L, porém apenas 150ml é eliminado. Nós temos uma capacidade imensa de reabsorção. Em relação à reabsorção, o intestino delgado absorve cerca de 7,5L por dia e o colón 1,4L, ou seja, é um volume muito grande que passa pelo TGI, mas em indivíduos hígidos há uma capacidade enorme de reabsorção de líquido ao longo do TGI. Qualquer distúrbio gastrointestinal que dificulte a reabsorção de água em uma dessas regiões seja no delgado ou colón, leva o indivíduo a excretar mais água e assim, ele pode se encaixar no diagnóstico de diarreia. Diarreia A dejeção intestinal normal não deve provocar dor nem desconforto e, quando ela provoca esse tipo de sensação, algo não está adequado, assim o indivíduo tem constipação ou tem diarreia. A diarreia pode ser: aguda (resolução em aproximadamente 2 /3 semanas) ou crônica (acima de 4 semanas). As diarreias têm uma variação muito grande, podendo ser desde leves e autolimitadas até casos graves que podem levar à morte. E pode levar a morte quando o indivíduo tem complicações por conta da desidratação, perdendo rápido água e eletrólitos, levando à desidratação, leva o choque hipovolêmico e leva a graves distúrbios eletrolíticos que são responsáveis pelas complicações. Diarreia aguda Características A diarreia aguda é quando o indivíduo tem eliminação diária de 250g de fezes por 2 a 3 vezes por dia. Pode ou não estar associado com náusea, vômitos, mal estar, cólica e febre. Outra coisa importante é que nas Antidiarreicos 2 Beatriz Machado de Almeida Farmacologia – Antidiarreicos – Aula 2 infecções agudas, o quadro da diarreia pode aparecer entre 8 a 48 horas após a ingestão do contaminante. Pode ser dividida em dois tipos: • Alta: Afecções que acometem o jejuno e íleo. Normalmente as fezes são mais aquosas e volumosas, com náuseas, vômitos e com pouca ou nenhuma febre e prostração; • Baixa: Afeta mais o cólon. O indivíduo apresenta mais cólicas e as fezes normalmente podem ter muco, pus e sangue, além de ter mais febre e ser sensível à palpação). As manifestações clínicas são diferentes tanto o aspecto. Diarreia crônica Características Quando a diarreia não se resolve em torno da 3º semana entrando na 4º semana, o indivíduo apresenta um quadro de diarreia crônica. O diagnóstico é basicamente a queixa do paciente, história clínica, as características da diarreia e o exame físico. Normalmente a diarreia crônica está associada a outra doença (Ex. Crohn, colite ou alguma outra patologia de base) ou a intolerância a alguma substância. O diagnóstico estará ancorado com o diagnóstico principal. Então, os mecanismos fisiopatológicos (alterações osmóticas, secretoras, disabsortivas, inflamatórias, motoras, exsudativas e associadas a doenças metabólicas) estão associados a essas alterações. Logo, toda e qualquer doença que leva alteração no TGI a nível de osmolaridade, secreção, hormônio ou de má absorção, como por exemplo, doença de Crohn, lesão nos nervos que inervam o TGI ou doenças que levam alterações metabólicas. Diarreia Etiologias No geral, quando se trata das principais causas, não separando entre aguda e crônica: infecções intestinais bacterianas, toxinas liberadas por essas infecções, viróticas, parasitárias, doenças de base (normalmente associadas a diarreias crônicas), efeito indesejado de medicamento (Ex. laxativos, antibióticos, aines). Obs. os efeitos gastrointestinais dos aines são estomacais, não chegam a ser intestinais. Medicamentos quimioterápicos X antibióticos: • Quimioterápicos: eles não são seletivos a células tumorais. Normalmente, células que tem um número maior de reprodução (ex. epitélios gastrointestinais), acabam sofrendo bastante. No intestino, elas diminuem a capacidade de absorver eletrólitos e água, fazendo com que o bolo fecal se torne mais aquoso. • Antibióticos: alteram a microflora intestinal e diminuem o muco produzido, diminuindo a proteção do epitélio gástrico e intestinal e, consequentemente, a capacidade de absorção de água e eletrólitos. Sintomas de desidratação: oligúria, sede, boca seca, hipotensão postural, perfusão capilar diminuída. Lembrando que em adultos, a redução do turgor e da elasticidade da pele e enoftalmia (quando o globo ocular apresenta pequeno afundamento) não é tão característica. É mais caracterizada em idosos e crianças. Cólera A cólera é muito importante, pois leva a um quadro diarreico severo, gravíssimo, onde o indivíduo praticamente evacua em forma de jato. O mecanismo, e uma das principais causas de morte do indivíduo infectado, embora seja desidratação, é a seguinte: Imagem: representação do Vibrio cholarae. Ele libera uma toxina que é internalizada aos enterócitos, que no reticulo endoplasmático (processador de proteínas), sofre uma modificação estrutural. Então, uma vez engolfado, a toxina é modificada e liberada no interior da célula. No interior da célula, ela interage com uma enzima chamada adenil ciclase, que é responsável por 3 Beatriz Machado de Almeida Farmacologia – Antidiarreicos – Aula 2 converter ATP em AMPc. O AMPc, uma vez liberado para dentro do enterócito, estimula uma fosfoquinase chamada de PKA. Uma das atividades intracelulares dessa fosfoquinase é diminuir a ação da bomba de sódio que tem um cotransporte com um próton. Então se diminui a atividade dessa bomba, com ativação da PKA, diminui a reabsorção de sódio. A água tende a seguir o mesmo caminho do sódio, ou seja, o sentido do íon sódio é o mesmo sentido da água. Em condições normais, a reabsorção de sódio equivale a reabsorção de água. Quanto mais sódio se consegue reabsorver, mais água também é reabsorvida. Se a toxina da cólera impede/bloqueia o transporte de sódio da camada apical para o interior do enterócito, ela também bloqueia a passagem da água, por questões de gradiente de concentração. Ou seja, umamenor absorção do fluido e uma maior secreção do fluido equivale a uma diarreia grave. Aproveitando essa imagem, além da bomba de sódio mostrada, o sódio também entra na célula por um co-transporte de sódio e glicose. Esse transportador funciona da seguinte forma: quando 2 moléculas de sódio e 1 molécula de glicose se ligam, ele modifica a sua conformação e joga essas moléculas para o interior da célula (2 de sódio e 1 de glicose), facilitando mais a passagem da água do ambiente externo para o intracelular. Rotavírus Principalmente nas crianças, é um importante causador da diarreia. É um vírus, portanto, o mecanismo dele para causar a diarreia é muito diferente do mecanismo da cólera. O rotavírus entra nos enterócitos e lesiona essas células levando a morte, então, ele se replica na célula intestinal e vai infectar outras células posteriormente. Quando ele sai, vai deixar resíduos que levam o enterócito a morte. Uma vez que o enterócito não funciona mais para absorver líquidos e eletrólitos da forma correta, o indivíduo vai apresentar mais água e mais quadros diarreicos. Alimentos alérgenos Todo quadro de diarreia provocado por alergia a alimento deriva da histamina. Então, uma vez que o alimento alérgeno é ingerido, essas proteínas que vão provocar a alergia, caem na corrente sanguínea e estimulam as células do sistema imune. Essas células produzem citocinas, que circulam no sangue em diversas partes do corpo (inclusive no intestino) e provocam a degranulação de mastócitos e a liberação de histamina. A histamina, por sua vez, vasodilata a região, aumenta a permeabilidade vascular e estimula a contração da musculatura lisa, ou seja, aumenta o peristaltismo, diminui o tempo que o alimento fica na região intestinal para ser absorvido tanto água quanto eletrólitos. Consequentemente, aumenta o trânsito e o indivíduo vai evacuar mais rapidamente. 4 Beatriz Machado de Almeida Farmacologia – Antidiarreicos – Aula 2 Uma outra representação mostrando que o aumento do peristaltismo está diretamente relacionado com o estímulo de neurônios (colinérgicos principalmente) envolvidos na secreção gastrointestinal e envolvidos na inervação das criptas intestinais. O aumento da ativação dos neurônios colinérgicos é que vai estimular a contração muscular e o aumento do peristaltismo, levando o indivíduo a evacuar mais vezes. O objetivo agora é fazer um resumo das principais causas para que se possa entender como os fármacos podem atuar em causas parecidas com as apresentadas. Porém, existem outras vias mais complexas, Problemas de absorção intestinal Outros problemas que podem ocasionar quadros diarreicos, além das bactérias, vírus, alergias, são os problemas de absorção intestinal, não só, mas normalmente, problemas crônicos como doença de Chron, doença celíaca ou colite ulcerativa. A superfície de absorção dos enterócitos é muito alta, tem as microvilosidades que aumenta essa superfície de contato entre nutrientes, o líquido a ser absorvido e a célula. Se essas doenças alteram essas microvilosidades, causam danos, e a superfície de contato dos nutrientes e dos líquidos com os enterócitos fica prejudicada, e então o indivíduo vai absorver menos nutrientes, menos água e pode ter quadros diarreicos. Tratamento A maioria dos casos sem toxemia ou prostração, sem sensibilidade abdominal e sem sangue nas fezes → hidratação oral, e eventualmente, antidiarreicos. Tratamento farmacológico em adultos → reservado para sintomas persistentes ou significativos. Os antidiarreicos incluem fármacos antimotilidade, adsorventes e fármacos que modificam o transporte de água e eletrólitos. Existem diferentes causas que podem levar o indivíduo a quadros diarreicos, a depender do agente etiológico, ou da causa da diarreia, o tratamento pode variar. É importante conseguir realizar o diagnóstico diferencial, entender o que está provocando a diarreia no paciente para trata-lo da melhor forma possível. O bom é que a maioria dos casos de diarreia, o indivíduo não apresenta toxemia, ou seja, não apresenta um nível de toxinas circulantes no sangue que seja suficiente para provocar infecções sistêmicas. O indivíduo, na maioria dos casos, também não apresenta prostração. Normalmente são indivíduos que não tem nem sensibilidade abdominal e não apresentam fezes sanguinolentas. Tudo isso depende muito da região do intestino que está sendo acometida, mas na maioria das vezes, apenas uma hidratação oral e, eventualmente, o uso de antidiarreicos já são suficientes para a melhora do paciente. As crianças são mais acometidas, e para elas os quadros diarreicos são mais graves, assim como nos idosos. O tratamento farmacológico para adultos é reservado apenas para sintomas persistentes ou significativos, a minoria dos casos. Então, na grande maioria dos casos, em adultos, a hidratação oral já é suficiente para que o indivíduo não tenha uma piora importante e não venha a apresentar os sintomas característicos da desidratação e um agravamento do quadro. Qual o grande problema do tratamento antidiarreico não específico? Lembrando que pode tratar diarreia com antibióticos, fármacos que aumentam a absorção da água, aumentam a formação do bolo fecal, pode tratar também apenas com hidratação oral. Então, se for uma diarreia provocada por uma bactéria, por exemplo, e tratar apenas a diarreia em si, é possível mascarar o agente etiológico e o indivíduo apresentar uma infecção sistêmica a partir de uma infecção intestinal. É importante identificar a causa da diarreia, principalmente a diarreia persistente. A partir daí se define qual é o tratamento específico. Tratar de forma não especifica pode agravar o caso. Dúvida: existe algum tratamento base que é indicado antes do rastreio da causa da diarreia? Resposta: Hidratação oral! É a hidratação porque se busca só repor o que o indivíduo está perdendo. Enquanto não encontra a causa da diarreia, a hidratação oral é o tratamento base. Caso o indivíduo chegue com um quadro de desidratação importante, em uma 5 Beatriz Machado de Almeida Farmacologia – Antidiarreicos – Aula 2 emergência, a reidratação é venosa, porém situações em que o indivíduo pode ir para casa, mesmo não sabendo como e nem o porquê, a reidratação oral é o mais indicado. O tratamento empírico também é a hidratação oral!!! Então, os grandes problemas são: • Mascarar o quadro clínico; • Atrasar eliminação dos microrganismos e toxinas; • Aumentar risco de infecção sistêmica. Logo, se tratar qualquer indivíduo com os antidiarreicos, pode ter todos esses problemas citados se o tratamento não for o correto, não for o especifico. Hidratação oral A hidratação oral visa repor tanto eletrólitos quanto água, fornecendo os eletrólitos e a glicose (não necessariamente é um eletrólito, mas participa/auxilia na captação do sódio) e garantido que o indivíduo absorva mais água pós ingestão desse soro. O soro é distribuído pelo SUS contendo 3,5g de cloreto de sódio, 2,9g de citrato de sódio dihidratado, 1,5g de cloreto de potássio e 20g de glicose. Na imagem acima, demonstra como que esses íons participam da absorção de água. Então, a primeira bomba, importante no funcionamento dessa captação, é a bomba co- transporte de sódio e glicose. Nessa bomba, duas moléculas de sódio são absorvidas para cada molécula de glicose e isso justifica a presença de glicose nesse soro para reidratação oral. Vale lembrar que também há um transportador sódio e H+, que não está representado na imagem, mas ele existe e comprova, mais uma vez, a importância do sódio na entrada desse íon e, consequentemente, de água também. Além disso, há a entrada de potássio também, que é feita pela bomba de sódio e potássio. Lembrando: o sódio e glicose entra nos enterócitossem gasto de energia, por co-transporte, só que haveria um momento que saturaria o enterócito de sódio e não conseguiria fazer mais com que essa bomba co-transporte de sódio e glicose funcionasse, então para isso eu preciso de uma outra bomba que retire o sódio do enterócito para garantir que bomba co-transporte continue funcionando e a bomba que faz isso é a de sódio e potássio. Então, a bomba de sódio e potássio garante que o sódio saia do enterócito e essa bomba sódio e glicose continue funcionando perfeitamente. Então, se o movimento do sódio é para que ele entre na célula, ou seja, que ele saia da membrana basal e vá para a basolateral, é necessário que o movimento do sódio ocorra no sentido da seta cinza claro (presente na borda do enterócito) e a água também vai acontecer nesse sentido (representado na imagem entre os enterócitos). SORO CASEIRO As garrafinhas coloridas são alternativas do soro com sabores para maior aceitação infantil. Nobert – criador do soro caseiro. 1L de água + 1 colher de café de sal + 1 colher de sopa bem cheia de açúcar. Outras alternativas: soro com a osmolaridade variada/ quantidade de eletrólitos variada tem uma maior aceitabilidade pelos pacientes infantis porque é colocado um corante com um sabor, então é mais fácil o consumo. Uma boa recomendação é a sopa de galinha não gordurosa, porque nessa sopa se tem uma concentração de eletrólitos e osmolaridade parecidas com a do soro caseiro ou da OMS. Então é possível fazer com que o indivíduo se hidrate e absorva alguns nutrientes, já que ele está evacuando muitas vezes e, algumas vezes, está com náuseas e geralmente não consegue fazer uma refeição adequada, 6 Beatriz Machado de Almeida Farmacologia – Antidiarreicos – Aula 2 Fármacos antimotilidade Loperamida • Imagem: representação química • É amplamente utilizado no tratamento da diarreia. • Loperamida é o principal representante dos fármacos que alteram a motilidade. A sua função é diminuir a motilidade gastrointestinal, ou seja, diminuir a velocidade do trânsito intestinal. Então se conseguimos permitir que o bolo fecal fique mais tempo em contato com os enterócitos, fornecemos aos enterócitos a possibilidade desse líquido ser mais absorvido. A loperamida é um opióide, assim como a codeína, morfina, que também são opióides. A loperamida têm atividade se ligando a dois receptores opioides, para exercer suas funções fisiológicas (normalmente analgésicas): Receptores μ (Mi) ou chamados de MOR (Mi Opioids Receptors) e receptores δ (Delta), também chamados de DOR (Delta Opioids Receptors). Também existe o receptor Kappa. ambos no Sistema Nervoso Periférico. O mais famoso é o μ, pois é o principal na atividade analgésica. A atividade da loperamida nesses receptores diminui a motilidade gástrica, havendo, por exemplo, a dificuldade da liberação de cálcio pelos neurônios pré- sinápticos. A loperamida é ativa por via oral, então pode-se ingerir como comprimidos/cápsulas e é 40 a 50 vezes mais potente que a morfina como um antidiarreico, então essa potência indica que o fármaco necessita de uma dosagem menor para provocar 50% do seu efeito máximo. Com essa explicação, compreende-se que é necessária uma dosagem de 40 a 50 vezes menor que a morfina para provocar efeitos antidiarreicos. Outra característica importante da loperamida é que ela apresenta baixa penetração no SNC e isso é essencial, pois não apresenta, assim, um rebaixamento da consciência. Obs. Os opioides, no geral, causam rebaixamento de consciência, uma depressão geral no SNC que pode levar, como exemplo, a uma depressão respiratória. Além das características citadas anteriormente, a loperamida também apresenta um risco menor de causar uma dependência por sua baixa penetração no SNC. A loperamida apresenta uma atividade antissecretória contra a toxina da cólera, bloqueando o ligante da toxina a nível intracelular e impedindo que a toxina da cólera aumente a atividade da adenilciclase e interfira na bomba de sódio e próton, como visto anteriormente. A representação esquemática das atividades da loperamida mostra que ela se liga a receptores MOR/Mi de neurônios pré-sinápticos, colinérgicos, diminuindo a liberação da acetilcolina (ACh) reduzindo, por conseguinte, o estímulo de contração muscular lisa, diminuindo a motilidade. Além disso, a loperamida ligada a receptores DOR/delta há a diminuição de secreção dos líquidos pelos enterócitos, lembrando que em diversos momentos da passagem de um alimento pelo TGI, líquidos são secretados; com isso, se há diminuição dessa secreção é fornecido menos água para o sistema que está deficiente de absorção. Além de diminuir o movimento peristáltico nos MOR e a secreção de líquidos pelos enterócitos, a loperamida também estimula a absorção de água pelos mesmos, completando as três formas antidiarreicas. • Poucos efeitos adversos; • Sem potencial significativo de abuso; Superdosagem pode causar: constipação, depressão do SNC (crianças – barreia hematoencefálica que não funciona completamente)), íleo paralítico (falta de motilidade provocada pela falta de motilidade). Não recomendado para < 2 anos. Em pacientes com doença inflamatória intestinal ativa envolvendo colón, usar com muita cautela ou contra indicar seu uso → prevenir megacólon tóxico! Lembrar que é a loperamida isolada, não necessariamente associada a um antiespasmódico, que causa esse megacólon. Normalmente, é muito comum associar dois tipos de tratamentos antidiarreicos, sendo o mais frequente a hidratação oral ou intravenosa (quadros mais graves) com fármacos 7 Beatriz Machado de Almeida Farmacologia – Antidiarreicos – Aula 2 antimotilidade, espessor do bolo fecal ou que aumente a absorção de água. Outros exemplos de opioides: difenoxilato, meperidina e codeína. Apresentam como efeito indesejado a constipação - efeito colateral, e por essa razão, a classe foi utilizada como fármacos também antimotilidade. Clonidina A clonidina é outro fármaco antimotilidade, seu uso principal é como antihipertensivo, da classe agonista de receptor α2-adrenérgico, e uma vez ligado a esse receptor, a clonidina estimula a proteína G a inibir a atividade de secretar neurotransmissores como a noradrenalina, por exemplo. A clonidina interage com neurônios entéricos e enterócitos, estimula a absorção e inibe a secreção de líquidos, tudo através da inibição de noradrenalina. Esse fármaco também aumenta o trânsito intestinal e tem uso interessante em diabéticos e diarreicos crônicos, pois o receptor α2-adrenérgico também está envolvido na liberação de insulina. Por que alguns fármacos são cloreto de alguma coisa e outros não são, por exemplo, paracetamol? Porque, fisicoquimicamente essa molécula já é estável e não precisa de nenhum ion para estabilizá-la. Na figura acima é possível notar a clonidina se ligando aos receptores α2 adrenérgicos, que são receptores acoplados à proteína G, receptores metabotrópicos. A proteína G (nesse neurônio, é inibitória) é formada por três frações: β (beta), γ (gama) e α (alpha). Uma vez que a clonidina se liga ao receptor α2, a unidade αlfa da proteína G se liga à Adenilato Ciclase (a adenilato ciclase converte o ATP em AMPc); o AMPc produzido irá estimular a produção de PKA e esse, por sua vez, irá diminuir a entrada de íons cálcio no interior dos neurônios pré-sinápticos. Lembrando que cálcio, dentro de células que liberam vesículas, são fundamentais para a movimentação dessas vesículas. Se restringir a abertura desses canais, diminui a liberação de neurotransmissores na fenda sináptica (noradrenalina), provocando uma menor atividade da musculatura lisa/menor motilidade. Com a motilidade reduzida, o tempo de contado do bolo fecal/líquido intestinalcom os enterócitos será maior. A clonidina é útil em pacientes com diarreia causada por abstinência opioide. Por exemplo: paciente com dor crônica. fez uso de opioide por tempo prolongado e atualmente irá retirar o opioide de seu tratamento. Uma das consequências da retirada de um opioide é a diarreia. Como efeitos colaterais (são basicamente relacionados ao efeito farmacológico), destacam-se hipotensão (visto que seu principal uso é como anti-hipertensivo), fadiga, boca seca e sedação (efeitos comuns a fármacos α2 adrenérgicos). Alguns pacientes relatam também disfunção erétil. 8 Beatriz Machado de Almeida Farmacologia – Antidiarreicos – Aula 2 Fármacos antissecretores Ocreotida (sst) Os fármacos antissecretores são responsáveis por inibir a secreção de algumas substâncias que estimulam a liberação de líquidos no trato gastrointestinal. Como representante principal, a Ocreotida (SST) é uma substância análoga a somatostatina, ou seja, todos os efeitos fisiológicos que a somatostatina possui são semelhantes aos efeitos provocados pela ocreotida. Por ser análogo a esse hormônio, esse fármaco consegue inibir a diarreia provocada por tumores secretores de hormônios no pâncreas e no TGI (inibição de gastrina, colecistocinina, glucagon, insulina, secretina, suco pancreático e serotonina). Em casos de tumores pancreáticos ou tumores do TGI, por exemplo, em que existe uma liberação exagerada dessas substâncias e, consequentemente, uma diarreia, a administração de ocreotida se mostra bastante eficiente. Como resultado final na melhora da diarreia, acontece uma redução da secreção do fluido intestinal. Como ocorre também a inibição de serotonina, verifica-se uma diminuição da velocidade da motilidade gástrica e uma diminuição da contração no músculo vascular liso, principalmente correspondente ao fluxo portal e ao fluxo esplênico. Desse modo, o indivíduo, por conseguir reduzir o fluxo portal e esplênico, ele consegue aumentar o tempo de permanência do bolo fecal no TGI, atividade praticamente exclusiva da Somatostatina e da Ocreotida. • A sinalização de traços perpendiculares em vermelho na imagem acima, significa inibição, no caso de um esquema farmacológico. Quando tem uma seta preta como vista acima, significa estímulo. A Ocreotida funciona da mesma forma que a Somatostatina. A proteína G é estimulada pelo receptor de somatostatina, e o seu domínio αlfa bloqueia por consequência o Adenilato Ciclase, gerando menor produção de AMPc, menor ativação de PKA e por consequência menor fosforilação de transportadores de canais, liberando, então, menos substância em órgãos e células que possuem caráter secretório como no pâncreas (diminui insulina, glucagon, outros hormônios como os vistos em slide anterior). Lembrando da vasoconstrição esplênica e portal: isso ocorre porque uma vez ativado o receptor de somatostatina, outra porção da proteína G inibe a enzima óxido nítrico sintetase/sintase (eNOS), que é responsável por produzir óxido nítrico em alguns tecidos, em alguns vasos. O NO é uma molécula vasodilatadora, então, se bloqueia a ação da eNOS, diminui a quantidade de NO nos vasos e isso provoca vasoconstrição, tanto no baço quanto na região que promove o fluxo portal. Efeitos indesejados: normalmente são dependentes da duração do tratamento (quando mais longo o tratamento, mais chances o indivíduo tem de apresentar esses efeitos): náuseas, formação de cálculos biliares, inchaço ou dor no local da administração (IM), hipo/hiperglicemia ou eventos cardiovasculares e endócrinos, são mais raros, no entanto, podem ocorrer. Etiltelotriaste • Utilizada em associação ao análogo à SST ou com a SST. • Tumores carcinoides (uma das principais escolhas) • Inibição da Triptofano hidroxilase (enzima envolvida na síntese da serotonina que é um neurotransmissor responsável por estimular as regiões do TGI a secretar seus líquidos, além de influenciar na motilidade do TGI). 9 Beatriz Machado de Almeida Farmacologia – Antidiarreicos – Aula 2 Aproximadamente 6L do que ingerimos é secreção nossa! Se for reduzida a secreção, por consequência a diarreia também será reduzida! Os antidiarreicos então, não atuam apenas aumentando a absorção de água, mas reduzem a secreções produzidas no TGI (atuação dos antissecretores). A triptofano hidroxilase que converte o triptofano (aminoácido) em serotonina (neurotransmissor). Logo, se essa enzima é bloqueada, ocorre redução na produção de serotonina, reduzindo a secreção de líquidos e a motilidade gastrointestinal. Efeitos indesejados: Constipação, náuseas, depressão, edema periférico, flatulência e redução do apetite. São efeitos normalmente correlacionados com a redução da produção de serotonina que não tem função apenas no TGI. Apresenta também redução do apetite e a depressão que é dependente da concentração de serotonina (presente na fenda sináptica do SNC) e norepinefrina no SN. Fármacos higroscópicos e Formadores do bolo fecal • Substância higroscópica possui alta afinidade por água (ex: sal, arroz). • Absorvem água (ele não estimula o paciente a fazer isso, ele mesmo faz) e aumentam o volume fecal, diminuindo a liquidez das fezes do indivíduo. Não resolve a desidratação e não impede que o corpo gaste água secretando líquido. • Policarbofila absorve 60x sua massa em água; • Úteis em diarreias agudas e em diarreias crônicas leves em pacientes com SII (síndrome do intestino irritável); • Também podem se ligar a algumas toxinas bacterianas, diminuindo a absorção dessas toxinas pelo TGI. Normalmente são polímeros. OU TROS FÁRMACOS HIG ROSCÓPICOS A administração deles é por meio da injeção submucosa no canal anal, essas substâncias drenam a água do canal anal para a submucosa, gerando inchaço, dor na área administrada, pode gerar sangramentos. Salicicato de bismuto • Diminuem a secreção de líquidos no intestino; • Se liga a toxinas bacterianas; • Recupera o revestimento da mucosa gástrica (também é utilizado como antiácido, pessoas com gastrite, irritações gástricas no geral. Magnésia bisurada possui bismuto em sua formulação, por exemplo); • Possível efeito antibacteriano; • Muito útil em diarreias do viajante; • Efeitos colaterais: língua e fezes escurecidas. Probióticos • TGI → ampla microflora comensal necessária. • Uso de ATB/Outras doenças; • Preparações contendo: Lactobacillus GG; Saccharomyces boulardii; 10 Beatriz Machado de Almeida Farmacologia – Antidiarreicos – Aula 2 Antibióticos • Sempre usar? • Quais as consequências? ❖ Resistência; ❖ Erradicação da flora intestinal (microbiota); ❖ Aumento do custo (sus, custo pessoal); • Quando usar? ❖ >65 anos; ❖ >14 dias da doença (testar infecção por protozoário); ❖ Imunossupressão; ❖ Sepse.
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