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1 Beatriz Cavalcanti Regis Aula 6 – Lívia (Youtube) + Sanar Residência Médica INTRODUÇÃO • Crise epiléptica: é a ocorrência transitória de sinais e/ou sintomas decorrentes da atividade anormal excessiva ou síncrona no córtex cerebral. ✓ Os sinais e sintomas dependem do local do encéfalo onde essa atividade anormal excessiva se inicia, se ela se propaga e como se propaga para outras regiões. ✓ Há situações em que há crise epiléptica e não há epilepsia. Porém, para que haja epilepsia, tem que haver crises epilépticas. Logo, epilepsia é um subconjunto no grande conjunto de crises epilépticas. ✓ Podem ser convulsivas (manifestação motora com abalos ou contração muscular) ou não convulsivas. ✓ Nem toda convulsão é uma crise epilética, pois há a crise não epiléptica psicogênica. Assim como, nem toda crise epiléptica representa epilepsia. • Epilepsia: é uma doença cerebral caracterizada por predisposição persistente de gerar crises epilépticas, e pelas consequências neurobiológicas, cognitivas, psicológicas e sociais dessa condição. ✓ Requer a ocorrência de pelo menos 1 crise epiléptica. ✓ Ocorre fora da vigência de um insulto agudo (crise não provocada). ✓ Há situações em que o indivíduo apresenta crises epilépticas, mas não sofre de uma predisposição persistente, logo, não é epilepsia, mas sim crises sintomáticas agudas. - Exemplo 1: mulher de 65 anos, diabética, apresentou crises epilépticas devido a uma hipoglicemia grave (30mg/dL) – insulto cerebral agudo; após a correção, não ocorreram mais crises. - Outros exemplos de insultos agudos: metabólicos, hidroeletrolíticos, infecções e drogas (sistêmicos); AVE, TCE e meningoencefalite (neurológicos). Se as crises epilépticas ocorrem no prazo de até 7 dias após a instalação de insultos neurológicos, são consideradas dentro da fase aguda, logo, são crises sintomáticas agudas. DEFINIÇÃO OPERACIONAL – DIRETRIZ ILAE • Critérios: 1. 2 crises epilépticas não provocadas com intervalo > 24h. - Paciente com 1 crise tem chance de recorrência de 40%, já aquele com 2 crises, a chance de recorrência é de 70%. 2. 1 crise não provocada e uma probabilidade de crises subsequentes semelhante ao risco geral de recorrência após 2 crises não provocadas (≥ 60%). - Lesão cerebral no passado. 3. Diagnóstico de uma síndrome epiléptica após 1 crise. ETIOLOGIA • Combinação de fatores genéticos + ambientais. • Há algumas epilepsias em que basta a mutação de 1 gene para causar um quadro de epilepsia. Ao passo que, em outras, a exposição à fatores ambientais agressivos (ex.: traumatismo cerebral por arma de fogo) desenvolvem epilepsia. E, ainda, em outros tipos de epilepsia, os fatores genéticos e ambientais se combinam em proporções mais ou menos diferentes. • Classificação: ✓ Genética: epilepsia mioclônica juvenil e epilepsia ausência da infância. ✓ Secundárias: - Estrutural: AVE, TCE, alterações congênitas, neoplasias. - Infecciosa: meningoencefalites, abscesso, HIV, tuberculose, neurocisticercose. - Metabólica: hipoglicemia, sepse, DHE e ácido- básico, uremia, intoxicações e abstinência. - Imune: encefalites imunomediadas, esclerose múltipla. ✓ Desconhecida. EPIDEMIOLOGIA • 1 em cada 10 pessoas vai apresentar alguma crise epiléptica durante a vida, nem sempre implicando no diagnóstico de epilepsia. • Prevalência de epilepsia ativa: 0,6%. • Mais de 50 milhões de pessoas no mundo vivem com epilepsia. • Incidência: 60 casos/100.000 hab. • Maiores taxas em regiões de renda média ou baixa. CLASSIFICAÇÃO CRISE FOCAL • Originada em uma rede neuronal limitada a um hemisfério. 2 Beatriz Cavalcanti Regis Aula 6 – Lívia (Youtube) + Sanar Residência Médica • Perceptiva/Simples (preserva a consciência) X Disperceptiva/Complexa (consciência comprometida). • Aura: sensações referidas pelo paciente, decorrentes da ativação pelo ritmo ictal de uma região cortical limitada. Lobo frontal (2º mais comum). ✓ Curta duração e tendência a ocorrer durante o sono. ✓ Atividade motora involuntária clônica do lado contralateral, posturas tônicas assimétricas (posição do esgrimista) e comportamentos hipermotores bizarros (tipo pedalar ou automatismos sexuais). Lobo temporal (1º mais comum): ✓ Quadro prodrômico (aura) de sensação de mal- estar epigástrico ascendente ou eventos cognitivos complexos (sensação de medo, déjà vu, alucinações olfatórias ou gustatórias). ✓ Perda de consciência com postura de olhos bem abertos sem interagir com o meio com duração entre 30 segundos a 2 minutos. ✓ Automatismos motores (mastigação, movimentos com lábios e movimentos aleatórios e estereotipados ipsilaterais dos membros). ✓ Postura distônica da mão contralateral e desvio cefálico ipsilateral. ✓ Causa mais comum: esclerose mesial temporal. Lobo occipital: ✓ Manifestações visuais como imagens distorcidas, flashes de luz ou até alucinações visuais complexas; cegueira; desvio tônico do olhar; piscamento repetitivo; vômito ictal. Lobo parietal: ✓ Fenômenos sensitivos contralaterais (parestesia); vertigem; desorientação espacial. CRISE GENERALIZADA • Originada em algum ponto e rapidamente envolve redes neuronais distribuídas de forma bilateral. • Comprometimento do nível de consciência. Tônico-clônica (mais comum): ✓ Perda súbita do nível de consciência muitas vezes associada a um grito seguido por rigidez e, mais posteriormente, abalos clônicos dos membros com duração de poucos minutos. ✓ Pode apresentar cianose, mordedura da língua e liberação esfincteriana. ✓ Após o término do quadro motor, o paciente não volta imediatamente ao nível de consciência prévio, permanecendo por vários minutos com sonolência excessiva, agitação psicomotora ou confusão mental (fase pós-ictal). Ausência: ✓ Típica da infância; breve duração (5 a 10 segundos) de perda de consciência com olhar fixo aberto e o indivíduo praticamente imóvel. Mioclonias: ✓ Abalos amplos e breves dos membros. ✓ Ex.: epilepsia mioclônica juvenil → frequente; iniciada em adolescentes jovens; combinação clínica variável de convulsão tônico-clônica generalizada, ausência e particularmente mioclonias. Tônica: contração súbita e sustentada. Atônica: perda do tônus. AVALIAÇÃO • Anamnese (principal): paciente e testemunha do(s) evento(s); início, durante e após; fatores precipitantes e circunstâncias; evento(s) prévio(s); história familiar. • Exames laboratoriais: glicemia, eletrólitos, hemograma, função renal, função hepática, urina 1 e, eventualmente, exames toxicológicos. • Exame neurológico. • Eletroencefalograma (EEG): suporte ao diagnóstico, tipo de crise, área de início das crises, tipo de epilepsia, especificidade alta e sensibilidade baixa (pois pode não captar a epilepsia no momento do exame). ✓ Solicitar: EEG em sono e vigília. ✓ Biomarcadores relativamente específicos para epilepsia: descargas ou paroxismos epileptiformes. ✓ EEG normal não exclui epilepsia. ✓ Vídeo-EEG. • Exame de neuroimagem: TC e RM de crânio (preferível). DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS • Síncope, crise não epiléptica psicogênica, ataques de pânico ou de hiperventilação, distúrbios do movimento, mioclonia benigna neonatal/da infância, vertigem, mioclonia do sono, distúrbios do sono, migrânea com aura, AIT, arritmias cardíacas e distúrbios metabólicos. SÍNCOPE • É a perda passageira de consciência devido a hipoperfusão cerebral, caracterizada por início rápido, duração curta e recuperação espontânea completa. • Causas: ✓ Síncope reflexa: recorrência, < 40 anos, gatilhos (ver situação chocantes, sentir dor, refeição, passar tempo prolongado em pé, lugares lotados ou quentes), ativação autonômica (palidez, suor, náusea e vômito) rotação da cabeça ou pressão no sino carótido, ausência de doençacardíaca. ✓ Síncope cardiogênica: esforço ou posição supina, palpitações, história familiar de morte súbita inexplicada em idade jovem, cardiopatia estrutural ou coronariopatia, ECG e ECO. 3 Beatriz Cavalcanti Regis Aula 6 – Lívia (Youtube) + Sanar Residência Médica ✓ Síncope ortostática: hipotensão, ocorre em determinadas situações (durante ou após se levantar; após tempo prolongado em pé; ao levantar depois de esforço; hipotensão pós- prandial; início ou mudança de dosagem de drogas vasodepressivas ou diuréticos que leva a hipotensão; presença de neuropatia autonômica ou parkinsonismo). ✓ Síncope convulsiva: presença de fenômenos motores devido ao baixo fluxo cerebral, que causa alterações eletrolíticas e excitação de áreas cerebrais. Característica Síncope convulsiva Crise epiléptica Início de mioclonia Após a perda de consciência Imediato Desvio do globo ocular Para cima Lateral Ritmo da mioclonia Arrítmico Rítmico Padrão de mioclonia Multifocal Envolve músculos bilaterais proximais e distais Duração da mioclonia 1-15 segundos 30 segundos a 2 minutos Apresentação pós- ictal Fadiga, sem confusão Confusão Incontinência urinária Pode ocorrer Pode ocorrer CRISES NÃO EPILÉPTICAS PSICOGÊNICAS • Distúrbios súbitos e limitados no tempo, motores, sensoriais, autonômicos, funções cognitivas e/ou emocionais que podem imitar crises epiléticas. • Falta de atividade neuronal excessiva no EEG. • Sua expressão é parte dos transtornos conversivos, no qual conflitos psicossociais são convertidos em sintomas físicos, ao invés de expressos. • Prevalência: sexo feminino, população idosa e epilepsia comórbida. • Fatores precipitantes: eventos traumáticos (abuso sexual, dificuldade de enfrentamento de situações difíceis. • Diagnóstico: critérios para transtornos conversivos do DSM-V e não requer a presença de fatores psicológicos. • Diferem dos transtornos factícios e fingimentos, pois o paciente não esta fingindo sintomas. • Para diferenciar da epilepsia propriamente dita → vídeo-EEG, exames de imagem, prolactina (aumenta consideravelmente após uma crise epiléptica) e avaliação psiquiátrica (depressão, ansiedade, somatizações, TEPT, transtornos dissociativos e transtornos de personalidade). • Interrogatório: descrição detalhada; questionar à testemunha se todas as crises são iguais; solicitar filmagem da crise; fatores precipitantes; sintomas prodrômicos; frequência e duração do evento; fatores que aliviam; sintomas pós-ictais; resposta ao tratamento. Característica Crise tônico- clônica generalizada Crise psicogênica não epiléptica Síncope Situação Acordado ou dormindo Acordado Normalmente em posição ortostática Vocalização No início, se houver Durante a crise Nenhuma Movimentos propositais Ausentes Ocasionais, incluindo evasão Ausentes Mordedura Língua Lábios, braços, outras pessoas Raramente mordedura da língua Micção Frequente Raro Ocasional Duração 1 a 5min 50-60min 1 a 2min Ferimentos Frequentes, leves, cabeça, rosto Raros, mas são possíveis vários hematomas no couro cabeludo e rosto Se início repentino Pós-ictal Cansaço, confusão, sono Alerta, explosão emocional Recupera a consciência em 2 a 3min; alerta INDICAÇÃO DE TRATAMENTO COM DROGAS ANTIEPILÉPTICAS • Indicação na primeira crise: anormalidades epileptiformes no EEG, lesão estrutural em neuroimagem (tumor cerebral), alteração focal no exame neurológico ou crise convulsiva durante o sono. • Duas ou mais crises: indiciado de rotina em função do alto risco de recorrência. • Descontinuação do antiepiléptico: pode ser discutida pós um intervalo de crises convulsivas entre 2 a 4 anos. SÍNDROMES EPILÉPTICAS • Síndrome de West: ✓ Início 3-7 meses de idade; 4 Beatriz Cavalcanti Regis Aula 6 – Lívia (Youtube) + Sanar Residência Médica ✓ Espasmos infantis, retardo mental e EEG com padrão de hipsarritmia; ✓ Prognóstico neurológico ruim; ✓ Tratamento: vigabatrina (1ª opção); topiromato ou valproato (2ª opção). • Convulsões febris: ✓ Mais comum; ✓ Crianças de 3 meses a 5 anos; ✓ Não aumentam o risco de epilepsia no futuro quando na forma simples. • Epilepsia de ausência da infância: ✓ Crianças de 3 a 12 anos; ✓ Olhar fixo por poucos segundos que se repete várias vezes ao dia; ✓ Ausência de sintomas pós-ictais; ✓ Geralmente desencadeadas por hiperventilação; ✓ EEG: surtos de complexo espícula-onda a 3Hz; ✓ Tratamento: valproato de sódio e etosuximida. • Síndrome de Lennox-Gastaut: ✓ Início 3-8 anos; ✓ Retardo mental associado a crises de ausência atípica, tônicas e atônicas; ✓ EEG: anormalidades da atividade elétrica cerebral de base e, em vigília, complexos lentos de espícula- onda lenta (< 3Hz), enquanto durante o sono aparecem surtos generalizados de ritmo rápido (10Hz), chamado ritmo recrutante. ✓ Difícil controle, sendo comum a politerapia. • Epilepsia benigna da infância com descargas centro- temporal (epilepsia rolândica): ✓ Início 3-13 anos (pico de 9-10 anos); ✓ Crises focais simples (motora e/ou sensitivas), envolvendo face, língua, lábios e orofaringe, com intensa sialorreia e incapacidade para falar, sem perda da consciência; ✓ EEG: anormalidade característica na região centro- temporal ativada pelo sono; ✓ Benigna e geralmente não necessita de tratamento. - Quando necessita: carbamazepina e oxcarbazepina (1ª opção); gabapentina ou valproato (2ª opção). • Epilepsia de ausência juvenil: ✓ Início 7-17 anos; ✓ Crises de ausência típica; ✓ Crises tônico-clônicas generalizadas podem preceder as crises de ausência. ✓ Crises mioclônicas podem ocorrer. ✓ EEG: complexos de espícula onda a 3,5-4 Hz, com atividade elétrica cerebral de base normal. ✓ Tratamento: valproato, lamotrigina ou levetiracetam. • Epilepsia mioclônica juvenil: ✓ Início 13-18 anos; ✓ Crises mioclônicas ocorrem preferencialmente ao acordar e precipitadas por privação do sono, estresse e foto-estimulação; ✓ Podem se associar a crises tônico-clônicas generalizadas e, menos comumente, a crises de ausência. ✓ EEG: complexos de poliespículas-onda lenta simétricos a 3-4 Hz; ✓ Tratamento: valproato (1ª opção); lamotrigina, levetiracetam, topiramato e clobazan (2ª opção).
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