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HIPOGLICEMIA A hipoglicemia é um evento adverso comum relacionado ao tratamento intensivo de DM, principalmente naqueles que fazem uso de insulina. É uma condição indesejável, já que causa sintomas perigosos e pode levar o paciente ao coma hipoglicêmico, com risco de óbito ou sequelas neurológicas, além de arritmias e isquemia cardíaca. Como principais causas de hipoglicemia temos a irregularidade dietética, erro na dose de insulina, exercício físico não programado – aumento da captação de glicose pelos músculos (aplicação deve ser feita em grupos que não serão trabalhados), ingestão excessiva de álcool – inibição da gliconeogênese hepática. Pode ser precipitada por condições de falência renal ou hepática, uso de drogas, associação com outras endocrinopatias – Addison. Valor de hemoglobina glicada abaixo de 7% já é considerado fator de risco para hipoglicemia. Bioquimicamente é definida como redução dos valores de glicose menores que 50-54mg/dL, mas com variabilidade aceitável de acordo com a condição do paciente para início dos sintomas. 1. Diagnóstico Normalmente é identificado pelo paciente a tríade de Whipple, que consistem em três achados básicos: • Sintomas de hipoglicemia Iniciados pela fase hiperadrenérgica, que é caracterizada por tremores finos de extremidades, sudorese fria, taquicardia, palpitações, hipertensão, e é seguida pela fase neuroglicopênica, marcada por dificuldade de concentração, incoordenação, ataxia, lentificação do pensamento, letargia, sonolência, coma e convulsões, além do déficit neurológico focal (perda do movimento ou função de local específico do corpo). • Glicemia capilar reduzida – menor ou igual a 70mg/dL • Melhora clínica evidente após administração de glicose 2. Classificação • Hipoglicemia grave: requer assistência de outra pessoa para administração de carboidratos ou glucagon, já que o paciente manifesta sintomas neuroglicopênicos • Hipoglicemia sintomática documentada: evento com sintomas e glicemia abaixo de 70mg/dL • Hipoglicemia assintomática: eventos sem sintomas típicos, mas com glicemia abaixo de 70mg/dL • Hipoglicemia relativa: apresentação de sintomas com glicemia superior a 70mg/dL Os mecanismos contrarreguladores em pessoas normais são desencadeados de forma reprodutível: glicemia abaixo de 85mg/dL ocorre a redução da secreção de insulina, valores abaixo de 70mg/dL ocorre a secreção aumentada dos hormônios contrarreguladores, quando a glicemia está em valores <55mg/dL ocorre o aparecimento de sintomas e, ao atingir valores menores que 35mg/dL, o curso é com disfunção cognitiva, convulsão e coma. Em pacientes que convivem com a hiperglicemia, os neurônios estão adaptados a captar menos moléculas de glicose, portanto podem apresentar sintomas de hipoglicemia em níveis relativamente altos, como >80mg/dL. Pelo contrário, em pacientes que estão acostumados com a hipoglicemia, os neurônios conseguem captar mais glicose, podendo manifestar sintomas de hipoglicemia quando os níveis séricos de glicose são menores que 40-45mg/dL. Em pacientes que possuem mal controle glicêmico crônico ocorre o “hypoglycemia unawareness”, que é a falta de percepção à hipoglicemia. Essa condição de hiperglicemia crônica leva à disfunção do sistema nervoso autonômico, prejudicando a resposta à hipoglicemia, assim não são apresentados os sintomas adrenérgicos iniciais e ocorre a redução da resposta dos hormônios contrarreguladores, e o pacientes evoluem de assintomáticos para síndrome neuroglicopênica de forma súbita, evoluindo rapidamente para crises convulsivas e/ou comas. 3. Tratamento Os pacientes com diabetes mellitus, em especial o tipo 1, devem sempre andar com um doce, para evitar progressão de sintomas quando forem iniciados, assim como deve evitar permanecer em jejum prolongado após dose de insulina regular e deve evitar exercícios extenuantes. Em quadros leves, a reversão da situação pode ocorrer com a ingesta de, mais ou menos, 15g de carboidrato, preferencialmente de glicose, em caso de não disponível, pode ser usado uma colher de sopa de mel ou de açúcar, 150mL de suco de laranja ou de refrigerante. Em casos graves, cuja definição engloba a necessidade de ajuda por terceiros por presença de sintomas neurológicos incapacitantes, a solução é a aplicação de injeção subcutânea de glucagon (0,5mg em menores de 5 anos e 1mg para maiores de 5 anos de idade), podendo ser repetido em 10 minutos em caso de ausência de resposta. Caso o paciente esteja no hospital, ocorre a aplicação de glicose hipertônica intravenosa, na dose de 25 a 50g (50 a 100mL de glicose 50%). Se a hipoglicemia estiver associada a quadros de desnutrição ou alcoolismo, antes da glicose deve ser administrada IM ou EV lenta de 100g de tiamina ou 5-10 ampolas de complexo B, a fim de evitar a encefalopatia de Wernick. A resposta à infusão de glicose é imediata, exceto se for desencadeada pelo uso excessivo de insulina de liberação intermediária, como NPH ou de hipoglicemiante oral, casos que poderão provocar nova queda. Nessas situações deve haver infusão continua de glicose (soro glicosado 10%) e estreita monitoração de glicemia por, no mínimo, 24h. A clorpropramida – sulfoniulreias – pode provocar hipoglicemia prolongada, de forma que o paciente deve permanecer internado por alguns dias. Complicações agudas do DM Clínica Integrada de Endocrinologia – aula 4 Nicole Sarmento Queiroga CETOACIDOSE DIABÉTICA (CAD) É a complicação mais grave do DM tipo 1. A ocorrência da cetoacidose é uma exacerbação do que ocorre normalmente no jejum. É marcado por três achados clássicos: hiperglicemia, cetonemia e cetoacidose metabólica com ânion-gap elevado. Ocorre em cerca de 30% dos adultos e 15-67% das crianças e adolescentes no momento do diagnóstico de diabetes. Nos pacientes com DM tipo 2 não é tão comum essa ocorrência, mas pode surgir em situações de estresse, como infecções graves. Quando o organismo e privado de fontes energéticas exógenas – alimentos, ocorre a queda da glicemia e dos níveis plasmáticos de insulina, aumentando, em contrapartida, a concentração dos hormônios contrarreguladores (glucagon, cortisol, GH e catecolaminas). Logo, as reservas energéticas passam a ser utilizadas, ocorrendo um consumo de glicogênio hepático, catabolismo muscular com geração de aminoácidos e lipólise com liberação de ácidos graxos e glicerol. No fígado, os ácidos graxos são convertidos em cetonas. 1. Hiperglicemia A presença de altos níveis séricos de glicose ocorre pela redução do seu uso pelos tecidos, pela diminuição da excreção na urina e pela hemoconcentração, resultante da diurese osmótica que ela induz. A glicemia pode variar entre 400- 800mg/dL. 2. Cetonemia A lipólise excessiva, induzida pelos baixos níveis de insulina, promove a formação dos corpos cetônicos. Os principais cetoácidos liberados são o ácido beta-hidroxibutírico, ácido acetoacético e acetona – caracteriza o hálito dos pacientes com esse quadro, ocorrendo produção maior que a capacidade de consumo e de excreção. No plasma, ocorre a dissociação em cetoânions e H+. Uma parte dos ácidos graxos, no fígado, é convertida em triglicerídeos, caracterizando também o quadro de hipertrigliceridemia grave. Produção de 500 a 1.000mEq/dia. 3. Acidemia Consequência do acúmulo de cetoácidos, do tipo ânion-gap aumentado, pelo acúmulo do beta-hidroxibutirato e acetoacetato. No curso da acidose metabólica, também pode ocorrer a com o ânion-gap normal ou acidose lática por hipoperfusão tissular. 4. Distúrbios eletrolíticos A elevação da osmolaridade sérica promove saída de líquidos do compartimento intracelular em direção ao extracelular, carregando eletrólitos como potássio, cloro e fosfato. Em localização intravascular, esses íons sãoeliminados na urina devido à diurese osmótica. O fosfato e o potássio, apesar da perda urinária e da espoliação, mantêm seus valores séricos normais ou aumentados causados pela depleção de insulina (predispõe a saída de potássio e fosfato da célula), pela hiperosmolaridade que induz a saída de água e potássio pela célula e pela acidemia, que promove a entrada de íons H+ em troca da saída de potássio. Déficit estimado de água e eletrólitos na CAD moderada a grave Água 100mL/Kg Sódio 7 a 10 mEq/kG Potássio 5 a 10 mEq/kG Fosfato 1 mmol/Kg Magnésio 1 mmol/Kg Cálcio 1 a 2 mmol/Kg Cloro 5 a 7 mEq/kG 5. Anamnese e exame físico Na maioria das vezes, o fator desencadeante da cetoacidose é infeccioso, sendo pneumonia, ITU, gastroenterite as mais comuns. O abuso de bebidas alcoólicas, uso de drogas, uso de doses inadequadas de insulina e gestação também são causas comuns. Ainda, é importante definir que algumas medicações podem desencadear esse quadro: glicocorticoides, inibidores de protease, tiazídicos, betabloqueadores, agentes simpatomiméticos, entre outros. O paciente refere, principalmente, poliúria, polifagia, polidipsia, perda ponderal. Pode apresentar também náuseas e vômitos, dor abdominal por atrito dos folhetos peritoneais e estase gástrica. O paciente apresenta-se hipo-hidratado, taquicardico, hiperventilado (respiração de Kussmaul). Também há presença do hálito cetônico. Em casos mais graves, ocorre a manifestação de sintomas neurológicos. 6. Laboratório • Leucocitose, entre 10.000 e 25.000/mm3 com ou sem desvio à esquerda, mesmo na ausência de infecção é a regra, devido à intensa atividade cortical adrenérgica. • Normocalemia e hipercalemia • Elevação da ureia e creatinina, por desidratação • Hiponatremia Estima-se que para cada aumento de 100mg/dL nos valores de glicemia, ocorre queda de 1,6 pontos de sódio. Dessa forma, deve haver correção do sódio utilizando a seguinte fórmula: 𝑁𝑎++ 1,6 𝑥 (𝑔𝑙𝑖𝑐𝑜𝑠𝑒 − 100) 100 . Pode haver uma pseudo-hiponatremia devido à condição de hipertrigliceridemia. • Elevação da amilase, transaminases e CKMB 7. Diagnóstico Exige a presença de hiperglicemia, acidose metabólica e cetonemia significativa. O método usual é a reação de nitroprussiato, que detecta a presença de acetoacetato e de cetona, mas não de beta-hidroxibutirato – principal cetoânion produzido, logo a não detecção dos corpos não exclui a presença deles. O exame de urina pode ser repetido adicionando-se peróxido de hidrogênio, que promove a conversão de beta-hidroxibutirato em acetoacetato. Uma forma indireta de calcular é por meio da pesquisa indireta de ânion-gap: 𝑁𝑎+ − (𝐶𝑙− + 𝐻𝐶𝑂3−) = Â𝑛𝑖𝑜𝑛 − 𝑔𝑎𝑝. 𝐶𝑎𝑠𝑜 o valor esteja acima do normal, basta excluir a hiperlactemia (5mM/L). Achados na cetoacidose diabética CAD leve CDA moderada CAD grave Glicemia >250mg/dL >250mg/dL >250mg/dL pH arterial 7,25-7,30 7,00-7,24 <7,00 Bicarbonato 15-18mEq/l 10-15mEq/L <10mEq/L Cetonuria Positiva Positiva Positiva Cetonemia Positiva Positiva Positiva Osmolaridade Variável Variável Variável Ânion-gap >10 >10 >12 Consciência Alerta Alerta/sonolento Torpor/coma 8. Diagnóstico diferencial Cetose de jejum, cetoacidose alcoólica, acidose medicamentosa, aumento do ânion-gap por acidose láctica e insuficiência renal crônica. 9. Tratamento Objetiva o restabelecimento da volemia, queda da glicemia aos níveis aceitáveis, resolução da cetoacidose e correção dos distúrbios eletrolíticos. Os critérios de resolução da CAD são: pH > 7,3, glicemia <200mg/dL, bicarbonato > 18mEq/l. • Reposição volêmica Reposição primária com SF a 0,9% na primeira hora, sendo infundido normalmente 1.000mL, devendo haver monitoramento, principalmente se o paciente for cardiopata. O ringer lactato deve ser usado com cautela porque possui potássio e, em menor concentração, cloro na composição. Os objetivos da reposição volêmica são: reposição do déficit de água, manutenção da pressão arterial, redução dos níveis de glicemia e melhora da perfusão tissular. Após a primeira hora, é importante realizar a dosagem do nível sérico de sódio, que deve ser corrigido pela hiperglicemia. Se o sódio corrigido estiver normal ou aumentado (>150mEq/L), a reposição deve continuar salina a 0,45%, mas se baixo, continua sendo SF a 0,9%, com ajuste de velocidade para 4- 14ml/Kg/h. Em crianças e adolescentes, a velocidade de infusão deve ser de 20mL/Kg. Quando a glicemia atinge 250mg/dL, a reposição de fluidos deve ser feita com soro glicosado a 5% e com NaCl a 0,45% para prevenção de edema cerebral e de hipoglicemia, com infusão entre 150-250mL/h, mantendo a glicemia entre 150- 200mg/dL. • Insulinoterapia Só é eficaz se for precedida pela reposição volêmica, porque pode agravar a hipovolemia e precipitar o choque se administrada antes, já que promove a captação de glicose e entrada de água nas células. Deve ser realizada, inicialmente, uma dose de ataque de insulina regular IV (0,1 a 0,15U/Kg) para sensibilizar os receptores e, em seguida, deve ser realizada uma infusão venosa contínua de 0,1U/Kg/h de insulina regular, objetivando uma queda média de 50-70mg/dL/h de glicemia, devendo ser dobrada a dose em caso de não ocorrência dessa queda. Deve- se evitar quedas superiores a 100mg/dL/h porque oferece mais chances de edema cerebral e de hipoglicemia. A ausência de queda dos valores de glicemia pode indicar presença de processo infeccioso ou hidratação inadequada. A infusão deve continuar até que dure a cetonuria ou, de preferência, até que o pH e o bicarbonato sejam normalizados, passando-se então para administração subcutânea. Na presença de hipocalemia (K<3,3), a insulina não deve ser iniciada até que os valores de potássio sejam restabelecidos!!! Um esquema alternativo ao apresentado anteriormente é a administração de insulina por via IV e SC/IM. A dose de ataque é feita pela administração de 0,4U/Kg de insulina regular, com metade via IV e a outra metade SC/IM. Em seguida, deve ser realizada a administração de 0,1U/Kg de insulina regular DC/IM a cada uma hora, esperando-se a redução de 50-70mg/dL dos valores da glicemia. Caso não haja redução dos valores glicêmicos, deve-se administrar 10U a cada hora até que haja resposta. A glicemia, ao atingir valores iguais ou menores que 250md/dL, deve haver redução da infusão de insulina para 0,02-0,05U/Kg/h ou 10U subcutânea para manter a glicemia entre 150-200mg/dL. Quando são alcançados os critérios de resolução da cetoacidose, os esquemas de insulinização subcutânea conforme os valores de glicemia capilar devem ser iniciados e mantidos a cada 3 ou 4 horas, sendo a infusão continua suspensa após 1-2h da dose de insulina SC. O retorno do uso da insulina deve ser com NPH/Determir/Glargina, com doses menores antes de dormir e na madrugada: ✓ ≥160-200mg/dL: 0,1U/Kg (máximo de 4U) ✓ ≥200-300mg/dL: valores intermediários ✓ ≥300-500mg/dL: valores intermediários ✓ ≥500mg/dL: 0,4U/Kg (máximo de 14U) Em casos não complicados, o uso de ultrarrápidas, pode ser utilizado de hora em hora ou a cada duas horas, com dose iniciado de 0,3U/Kg, seguida de 0,2U/Kg SC, caso não atinja a redução dos valores de glicemia esperados, deve ser dobrada a dose. Quando a glicemia atingir 200mg/dL, a dose é reduzida para 0,1mg/dL a cada duas horas até a resolução da CAD. • Reposição de potássio e fosfato A reposição do potássio deve ser iniciada quando os valores séricos estiverem < 5mEq/L, na presença de fluxo urinário adequado. ✓ Se < 3,3mEq/L: reposição com 40mEq/L de potássio ✓ Se ≥ 3,3 e < 5mEq/L: adicionar 20 a 30 mEq por soro ✓ Se ≥ 5mEq/L: não administrar inicialmente, mas chegar a cada 2 horas A reposição pode ser feita com cloreto de potássio ou fosfato de potássio. Em casode baixos níveis de fosfato também, a administração deve ser de 2/3 em KCl a 10% (1mL = 1,3mEq) e 1/3 na forma de fosfato monopotássico a 20% (1mL = 1,8mEq de K). O fósforo apresenta um falso aumento devido à acidemia, mas na verdade suas reservas estão diminuídas. Em geral, não apresenta manifestações clínicas, mas a valores abaixo de 1 podem acarretar redução dos valores de 2,3 DPG, o que diminui a oferta de oxigênio aos tecidos. A reposição deve ser avaliada em casos como: disfunção cardíaca, anemia, depressão respiratória e nível sérico < 1mg/dL. Quando necessário, deve ser administrado 20-30mEq/L de fosfato de potássio em velocidade não superior a 3-4mEq/h. • Reposição de bicarbonato Ainda é controversa, porque não apresenta benefícios nos pacientes que apresentam o pH entre 6,9 e 7,1. Em pacientes com pH < 6,9, a reposição deve ser feita para evitar os efeitos da acidose. A dose usual é a de 100mEq/L de bicarbonato de sódio diluída em 400mL de água destilada, com 20mEq/L de KCl (se K < 5,3) IV em duas horas. Para pacientes pediátricos, o uso de bicarbonato já indicado quando o pH for < 7,1. O cálculo para descobrir a dose a ser administrada é feito por: 𝐷𝑜𝑠𝑒 𝑜𝑓𝑒𝑟𝑒𝑐𝑖𝑑𝑎 = (𝐻𝐶𝑂3− 𝑑𝑒𝑠𝑒𝑗𝑎𝑑𝑜 − 𝐻𝐶𝑂3− 𝑒𝑛𝑐𝑜𝑛𝑡𝑟𝑎𝑑𝑜) 𝑥 0,3 𝑥 𝑝𝑒𝑠𝑜. O bicarbonato desejado é de 12mEq/L e é diluído em água destilada (1:1), administrado em duas horas. ESTADO HIPERGLICÊMICO HIPEROSMOLAR NÃO CETÓTICO É a descompensação típica do DM tipo 2, com mortalidade mais elevada que a CAD, mais comum em idosos e crianças. Condição que apresenta hiperglicemia e ingesta de líquidos de forma inadequadamente baixa, sendo mais frequentes em idosos porque ocorre a redução da percepção de sede nessa faixa etária. O fator precipitante mais comum é o infeccioso, principalmente de foco pulmonar ou urinário, mas também podem ser precipitantes os fatores não precipitantes (IAM, quadros que cursem com vômitos e diarreia, síndrome de Cushing, acromegalia), assim como algumas drogas, a exemplo dos betabloqueadores, tiazídicos, simpaticomiméticos, entre outros. 1. Patogênese Progressivo aumento da osmolaridade sérica consequente à hiperglicemia e hipernatremia, sem uma elevação da osmolaridade intracelular equivalente. A diurese osmótica provocada pela hiperglicemia promove perda de água em maior proporção que de eletrólitos. Como a maioria dos pacientes é idoso, ainda se acrescenta a disfunção renal prévia, que promove redução da eliminação de glicose. Essa condição só é permitida se os pacientes estiverem numa situação de hipovolemia persistente, porque a reidratação levaria à redução da osmolaridade sérica e ao aumento da eliminação de glicose pelos rins, comprovando que os pacientes com EHNC são os que não apresentam mecanismo da sede perceptível e/ou o acesso aos fluidos está prejudicado. Como no paciente DM tipo 2 ainda há, mesmo que em pequenas concentrações, insulina circulante, já é suficiente para evitar a lipólise e a cetogênese, mas não é suficiente para inibir a gliconeogênse excessiva. 2. Anamnese e exame físico A história pode ser pobre, mas tipicamente há relato de desidratação progressiva, associado à pneumonia ou infecção urinária. Os sinais clínicos de desidratação estão presentes: hipotensão, oligúria. Pode ser visto distensão e dor abdominal, com náuseas e vômitos, devido à gastroparesia. Também podem ser achadas manifestações neurológicas, que podem variar entre déficit motor focal à crise convulsiva generalizada e coma. A hiperosmolaridade se encontra acima de 320- 350mOsm/L. O estado de hemoconcentração e hiperviscosidade predispõe a fenômenos tromboembólicos, evidenciados por empastamento e edema de membros ou, na presença de embolia pulmonar, pela dispneia. 3. Diagnóstico Os critérios que confirmam esse achado são: • Glicose > 600mg/dL • pH arterial > 7,3 • HCO3 > 18 • Osmolaridade efetiva > 320mOsm/L A diferenciação entre EHHCN e cetoacidose varia pela presença de acidemia, além dos níveis de glicemia atingirem maiores valores no primeiro caso, podendo chegar a 2.00mg/dL, assim como sódio e ureia são mais altos. A osmolaridade efetiva deve ser calculado por: 𝑂𝑠𝑚 =2Na + 𝐺𝐼 18 . Acidose metabólica com ânion-gap pode ser achada por acidose láctica ou urêmica. 4. Conduta A avaliação clínica e laboratorial segue os mesmos passos doo tratamento da CAD, mas a insulinoterapia só pode ser iniciada após a reposição hídrica, já que a administração de insulina iria promover a captação de glicose pelas células e, com isso, a água iria migrar para o espaço intracelular e agravar a volemia. • Reposição volêmica Iniciada com solução salina isotônica nas duas primeiras horas, administrando um volume de 1 a 2 litros. Em seguida, deve ser utilizada solução salina hipotônica (salina a 0,45%), com um volume total de 6 a 8 litros nas demais 12 horas. • Insulinoterapia Com o restabelecimento hídrico, inicia-se a administração de insulina, de forma que o retorno da diurese também auxilia na queda dos valores glicêmicos. Nas primeiras 24 horas, a glicemia deve ser mantida acima de 250mg/dL, devido ao risco de edema cerebral, respeitando a velocidade de queda de 50-70mg/dL. • Antibioticoterapia Deve ser iniciada após obtenção de culturas se o quadro for sugestivo de infecção. • Heparina Administração de doses baixas de heparina SC como profilaxia da doença tromboembólica. • Drenagem de conteúdo gástrico Devido à gastroparesia promovida pela hiperosmolaridade deve-se utilizar uma sonda e também enterocinéticos. • Reposição de potássio Esses pacientes estão depletados de potássio, embora a calemia possa estar normal ou aumentada, pelo efeito da hiperosmolaridade. A reposição do potássio deve ser iniciada Figura 1. Esquema da conduta na cetoacidose diabética. quando os valores séricos estiverem < 5mEq/L, na presença de fluxo urinário adequado, pode ser feita com cloreto de potássio ou fosfato de potássio. ✓ Se < 3,3mEq/L: reposição com 40mEq/L de potássio ✓ Se ≥ 3,3 e < 5mEq/L: adicionar 20 a 30 mEq por soro ✓ Se ≥ 5mEq/L: não administrar inicialmente, mas chegar a cada 2 horas Diferenciação laboratorial entre CAD e EHHNC CAD EHHNC Glicemia (mg/dL) > 250 > 600 pH < 7,3 ≥ 7,3 Bicarbonato (mEq/L) < 15 > 18 Cetonúria ≥ +3 ≥ +2 Cetonemia Positiva Negativa Sódio (mEq/L) 130 a 140 145 a 155 Potássio (mEq/L) 5 a 6 4 a 5 Ureia (mg/dL) 38 a 53 43 a 86 Ácidos graxos (nM) 1,6 1,5 CETOACIDOSE ALCOÓLICA Não é uma complicação exclusiva do paciente com diabetes, pode ocorrer também em portadores de desnutrição ou endocrinopatias, como doença de Addison, hipopituitarismo e hipertireoidismo. A ingestão de álcool etílico é o fator desencadeante, de forma que se estiver associado à atividade física intensa, o risco é maior de desenvolver. O acúmulo de álcool leva à depleção de NAD+, molécula fundamental para a gliconeogênese. Com o esgotamento das reservas de glicogênio hepático, ocorre queda da glicemia e da insulina. O desarranjo metabólico apresenta, em caso da não alimentação do paciente, lipólise com produção de ácidos graxos e corpos cetônicos. A cetonemia e o acúmulo de ácido láctico causam acidemia grave, podendo promover danos neurológicos irreversíveis. Geralmente há relato de alimentação inadequada ao longo de dias, seguida por libação alcoólica. O paciente apresenta-se torposo, com hálito característico, sudorese fria, taquipneia. Além de náuseas e vômitos serem frequentes, elevando a chance de broncoaspiração. As manifestações neurológicas decorrem da hipoglicemia e são: déficit motor focal, hiper- reflexia, convulsão ou coma. O diagnóstico é confirmado pela presença de hipoglicemia, acidemia e cetonuria. O tratamento é feito com administração de glicose(50 a 100mL de glicose a 50%) em bolus, seguida de reidratação venosa com cristaloide contendo glicose. Deve- se administrar tiamina (100mg IM ou IV) antes da glicose para encefalopatia de Wernicke.
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