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1 A MICROBIOTA HUMANA Entende-se por microbiota do organismo a presença de micro-organismos que estabelecem residência permanente ou não, sem causar infecções ou nenhum outro dano ao hospedeiro em situações normais. Importante salientar que: a distribuição dos microrganismos pelo seu organismo ocorre de forma heterogênea, ou seja, diferentes partes do seu corpo abrigam diferentes seres. Isso se deve ao fato que cada região do seu corpo possui diferentes faixas de pH, temperatura, disponibilidade de nutrientes, dentre outros fatores que atraem esses seres microscópicos. A microbiota pode ser dividida em: a) transitória ou alóctone: compreendendo os micro-organismos que permanecem por pouco tempo no organismo, sem estabelecer uma colonização significativa. Órgãos como esôfago, estômago e pulmões normalmente abrigam essa população. b) residente ou autóctone: compreendendo os micro-organismos que colonizam o organismo em condições de simbiose com o hospedeiro, por período de tempo indeterminado, em situações normais. Órgãos como boca e intestino grosso são comuns a esse tipo de grupo. Alguns fatores são importantes que afetam essa microbiota são: idade, sexo, estresse, hospitalização, condições socioeconômicas e, principalmente, condições de higiene. A instalação dessa microbiota ainda é um assunto em estudo. Durante a gestação, o ambiente uterino é estéril e o recém-nascido passa a ser colonizado ainda no canal vaginal materno, durante o parto normal. Crianças nascidas de parto cesáreo passam a ser colonizadas logo após o nascimento, por micro-organismos maternos, do ambiente local e da equipe médica que o manipula. Com poucos dias de vida, o recém-nascido já se encontra totalmente colonizado, porém, o tempo que a microbiota residente leva para se estabelecer pode variar, levando até dois anos para se estabilizar, como é o caso da microbiota intestinal. 1.Relembrando conceitos A relação entre a microbiota normal e o hospedeiro é chamada de simbiose, uma relação entre dois organismos na qual pelo menos um é dependente do outro. A simbiose abrange, principalmente, três mecanismos de relação. São eles: mutualismo, comensalismo e parasitismo. 2 1.1.Comensalismo Um dos organismos beneficia-se, enquanto o outro não é afetado. Muitos dos microrganismos que fazem parte da nossa microbiota normalmente são comensais; incluindo Staphylococcus epidermidis, que habita a superfície da pele, as corinebactérias, que habitam a superfície do olho, e determinadas micobactérias saprofíticas, que habitam o ouvido e as genitálias externas. Essas bactérias vivem em secreções e células descamadas e não trazem nenhum benefício ou prejuízo aparente para o hospedeiro. 1.2.Mutualismo É um tipo de simbiose que beneficia ambos os organismos. Por exemplo, o intestino grosso contém bactérias, como a E. coli, que sintetizam vitamina K e algumas vitaminas do complexo B. Essas vitaminas são absorvidas pela corrente sanguínea e distribuídas para uso pelas células do corpo. Em troca, o intestino grosso oferece nutrientes utilizados pelas bactérias, permitindo a sua sobrevivência. 1.3.Parasitismo Um organismo beneficia-se obtendo nutrientes à custa de outro organismo. Muitas bactérias causadoras de doenças são parasitas. 2. Principais microrganismos encontrados pelo organismo 2.1.Pele A microbiota da pele encontra-se aderida à superfície do extrato córneo e no interior do folículo piloso. Uma vez que a microbiota do extrato córneo é removida por processos mecânicos ou químicos, a microbiota do folículo piloso é a responsável pela recolonização da pele, e em até 8 horas, a microbiota já está restabelecida. A microbiota normal da pele contem números relativamente altos de bactérias gram-positivas, como os estafilococos e os micrococos. Essas bactérias tendem a ser encontradas sem soluções concentradas de sal ou açúcar. A pele ou epiderme não é um ambiente muito favorável para colonização por diversos fatores, porém possui outras áreas com características favoráveis a proliferação bacteriana. Algumas considerações importantes: 3 • em algumas partes do corpo, como axilas, ouvido, palmas, períneo e região anal, a quantidade de água disponível é suficientemente alta para albergar uma microbiota residente; • o pH (4-6) da pele é levemente ácido, devido a quantidade de ácidos orgânicos produzidos por estafilococos (mutualismo) e secreções oleosas e salinas, pelas glândulas sebáceas e sudoríparas, respectivamente. Esse pH faz com que certos microrganismos não sejam capazes de se instalar. O suor contém cloreto de sódio, fazendo com que a pele se torne hiperosmóstica, acarretando assim um estresse osmótico nas bactérias; • ocorre, na pele, a produção de lisozima (muramidase) pelas glândulas sudoríparas, enzima esta que é capaz de lisar a parede celular de Staphylococus epidermidis; • as glândulas sebáceas secretam lipídeos complexos que podem ser parcialmente degradados por enzimas produzidas por Propionibacterium acne (coco Gram positivo) e transformados em ácidos graxos insaturados que tem atividade microbicida em determinadas espécies de bactérias e fungos. Alguns desses óleos são voláteis e podem causar um certo odor; #detalhe: Os produtos secretados por tais glândulas, também servem de nutrientes (água, uréia, eletrólitos e ácidos graxos), especialmente para S. epidermidis e corinebactérias (comensalismo). Bactérias Gram negativas normalmente são encontradas em locais mais úmidos. Staphylococus epidermidis 4 2.2. Ouvido externo A microbiota normal do ouvido externo é muito semelhante à da pele, com estafilococos coagulase negativa e Corynebacterium, predominantemente. Menos freqüentes estão os Bacillus, Micrococcus e algumas espécies de Neisseria. Alguns bacilos Gram negativos também podem estar presentes, como Proteus, Escherichia e Pseudomonas, ocasionalmente. Alguns fungos também podem ser encontrados nesta aéreacomo os dos gêneros Aspergillus, Alternaria, Penicillum, Candida e Saccharomyces. 2.2.Olho As células epiteliais que cobrem os olhos podem ser consideradas como uma continuação da mucosa ou da pele. Muitos micróbios podem infectar os olhos, principalmente através da conjuntiva, a membrana mucosa que recobre a parte interna das pálpebras e a região branca dos globos oculares. Ela é uma camada transparente de células vivas que substituem a pele. A conjuntiva pode ser estéril ou estar colonizada por ureus, corinebactérias (difteróides) e S. pneumoniae. Culturas da córnea e da conjuntiva também podem apresentar Brahamella catarrhalis, Escherichia, Klebsiella, Proteus, Enterobacter, Neisseria e algumas espécies de Bacillus; poucos anaeróbios estão presentes. 2.3.Vias aéreas Vários microrganismos potencialmente patogênicos fazem parte da microbiota normal do trato respiratório superior. Entretanto, geralmente não causam doença, uma vez que os microrganismos predominantes da microbiota normal suprimem seu crescimento competindo com eles por nutrientes e produzindo substâncias inibidoras- fenômeno que chamamos de antagonismo. Em contrapartida, o trato respiratório inferior é quase estéril– embora a traqueia possa conter algumas bactérias –, devido ao funcionamento geralmente eficaz do elevador ciliar nos brônquios. As fossas nasais são colonizadas predominantemente por Staphylococcus e Corynebacterium. Há indivíduos que após receberem antibióticos β-lactâmicos passam a serem colonizados por Klebsiella pneumoniae, E. coli e P. aeruginosa, devido à supressão ou redução da microbiota da região. Na faringe e traqueia encontramos Streptococcus alfa-hemolíticos e não hemolíticos, Neisseria, Staphylococcus, difteróides, Haemophilus e Mycoplasma. Os bronquíolos e alvéolos são normalmente estéreis. SAIBA MAIS... O gênero Staphylococcus é um dos principaiscolonizadores da pele humana. S. epidermidis está presente como principal componente da microbiota da pele em 90% da população; já S. aureus é encontrado em torno de 10 e 40%. 5 2.4.Trato Geniturinário A urina normal é estéril, porém pode se tornar contaminada com a microbiota da pele próxima ao final de sua passagem pela uretra. Assim, a urina coletada diretamente da bexiga tem um menor número de micróbios contaminantes que a urina eliminada normalmente. Em se tratando das mulheres: quando a menina nasce, o nível de estrogênio materno presente no organismo estimula a proliferação de Lactobacillus, gênero dominante nos primeiros seis meses de vida. A presença de Lactobacillus (mutualismo) em mulheres saudáveis é importante na manutenção do equilíbrio da microbiota, uma vez que as bactérias deste gênero fermentam o glicogênio presente na vagina, diminuindo o valor do pH local, criando, assim, um ambiente desfavorável às bactérias com crescimento em pH neutro. A maior parte dos lactobacilos da vagina produz peróxido de hidrogênio, que também inibe o crescimento de outras bactérias. O estrogênio (hormônio sexual) promove o crescimento dos lactobacilos pelo aumento da produção de glicogênio pelas células do epitélio vaginal. O glicogênio é rapidamente decomposto em glicose, que os lactobacilos metabolizam em ácido láctico. Outras bactérias, como os estreptococos, vários anaeróbios e algumas gram-negativas, também são encontradas na vagina. O fungo leveduriforme Candida albicans é parte da microbiota normal de 10 a 25% das mulheres, mesmo que elas sejam assintomáticas. Durante a pré-menarca e a menopausa, o valor do pH vaginal aumenta e a população de Lactobacillus já não é mais tão abundante, coexistindo com Corynebacterium, Staphylococcus e Escherichia. A gravidez e a menopausa frequentemente são associadas a altas taxas de infecções no trato urinário. A razão é que os níveis de estrogênio são mais baixos, resultando em populações menores de lactobacilos e, portanto, em menor acidez vaginal. A uretra masculina normalmente é estéril, exceto por contaminações microbianas próximas à abertura externa. A microbiota da uretra é composta basicamente por Staphylococcus epidermidis, Corynebacterium, Streptococcus e E. coli. 6 2.5.Trato gastrointestinal É no trato gastrointestinal que temos a maior quantidade e diversidade de espécies da nossa microbiota. A cavidade oral contém microrganismos capazes de resistir a remoção mecânica que acontece na superfície das gengivas e dentes. Aqueles que não são capazes de se aderir acabam sendo removidos durante o movimento da saliva na boca sendo levados ao estômago e destruídos pelo ácido clorídrico. A contínua descamação celular que acontece na superfície do epitélio também contribui para sua remoção. Aqueles microrganismos capazes de colonizar a boca encontram um ambiente bastante propício para crescimento, já que existe água e nutrientes em abundância, pH neutro, temperatura e a presença de outros fatores de ajudam o crescimento. A boca é colonizada horas após o nascimento. Inicialmente é composta por Streptococcus, Neisseria, Actinomyces, Veillonella e Lactobacillus. Algumas leveduras também estão presentes. A maioria dos microrganismos da boca são aeróbios e anaeróbios obrigatórios. Quando o primeiro dente nasce, os anaeróbios (Porphyromonas, Prevotella e Fusobacterium) tornam-se predominantes devido ao ambiente anaeróbio criado no espaço entre os dentes e gengivas. Quando os dentes começam a crescer, Streptococcus sanguis e S. mutans aderem a sua superfície; S. salivarius (mutualismo) adere à superfície epitelial da boca e da gengiva e coloniza a saliva. Esses estreptococos produzem glicocálix e outros fatores de aderência que contribuem para sua adesão as superfícies da cavidade oral. A presença dessas bactérias contribui para a formação de biofilme, cáries, gengivite e doença periodontal. Alguns microrganismos da boca desembocam no estômago, onde o pH é bastante baixo, chegando a valores entre 2 e 3, o que acarreta a morte de tais microrganismos. Por esta razão o estômago contém menos de 10 bactérias viáveis por milímetro de fluido 7 gástrico. As mais frequentes são as dos gêneros Sarcina, Streptococcus, Staphylococcus, Lactobacillus, Peptostreptococcus e algumas leveduras como Candida. Caso ultrapassem rapidamente o estômago, ou sejam ingeridos com a comida, alguns microrganismos podem até resistir ao baixo pH, como é o caso das micobactérias. O duodeno contém poucos microrganismos porque recebe o suco gástrico, a ação da bile e a secreção pancreática. Cocos e bastonetes Gram positivos, Enterococcus faecalis, Lactobacillus, difteróides e leveduras (Candida albicans) estão normalmente presente no jejuno. Na porção distal do íleo, a microbiota torna-se mais parecida com a do cólon. É no íleo que o pH se torna mais alcalino. Com isso bactérias anaeróbias Gram negativas e membros da família Enterobacteriaceae começam a se estabelecer. O intestino grosso ou cólon apresenta a maior comunidade microbiana no corpo. O cólon pode ser visto como um local onde ocorre uma enorme fermentação e a microbiota consiste basicamente de anaeróbios, Gram negativos, não formadores esporos, e bastonetes Gram positivos formadores de esporos e não formadores de esporos. Não apenas a maioria dos microrganismos é de anaeróbios, mas várias espécies estão presentes e em grande número. Devido a presença de produtos ácidos, originados de processos fermentativos, o valor do pH luminal é, aproximadamente, 5,5. Este ambiente levemente acidificado permite a competição entre as bactérias produtoras de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), e bactérias que utilizam carboidratos, como Bacteroides spp., além de estimular a produção de butirato. A diminuição desse valor do pH, dificulta a permanência de bactérias do gênero Eubacterium, utilizadoras de lactato, e com isso, permitem acúmulo de ácido láctico. 8 A presença de butirato no cólon intestinal é responsável por modificações da microbiota. Os substratos butirogênicos levam a modulação da população microbiana colônica, induzindo a multiplicação de espécies produtoras de butirato e permitindo um equilíbrio entre a presença de Eubacterium spp. e Bifidobacterium spp. Bactérias produtoras de butirato são capazes de fermentar produtos do metabolismo de oligossacarídeos produzidos por bifidobactérias. Produtos intermediários de processos fermentativos de bifidobactérias da microbiota, como lactato, por exemplo, são encontrados em baixas concentrações em indivíduos saudáveis, pois são metabolizados por Eubacterium spp. O equilíbrio da diversidade na microbiota intestinal é mediado por interações bacterianas que modulam a composição da microbiota controlando a densidade celular. Essas interações são observadas tanto na produção de AGCC como visto acima, como também no controle de expressão gênica por “quorum sensing”. Bactérias benéficas controlam via “quorum sensing” a densidade polulacional de bactérias patogênicas presentes na microbiota, como Clostridium, por exemplo. A mucosa intestinal humana é a principal interface entre o sistema imunológico e o ambiente externo. O intestino é considerado o maior órgão imunológico do corpo humano, abrigando cerca de 80% das células imunológicas e é responsável pela produção de um terço de anticorpos, necessários ao Sistema Imunológico Inato e Adaptativo, além de modular as funções digestivas, imunológicas, metabólicas, endócrinas e o tropismo intestinal. O padrão de produção de anticorpos pelos linfócitos B intestinais é diferente do sistema imunológico sistêmico, de maneira que o isótipo de imunoglobulina produzido preferencialmente é a IgA, que possui várias funções importantes na proteção das superfícies mucosas. São produzidos dímerosde IgA ligadas a um componente secretório, sendo o complexo molecular chamado IgA secretória, diferente daquela encontrada no sangue. Esta IgA secretória alcança o lúmen intestinal e reage com antígenos específicos, impedindo a interação física dos agentes nocivos com a superfície da mucosa. 3.A microbiota da criança até o adulto As bactérias anaeróbias facultativas como E. coli, Enterococos faecalis e E. faecium são as primeiras bactérias a colonizarem o TGI do recém-nascido, devido ao elevado teor de oxigênio que existe inicialmente. À medida que estas bactérias consomem o oxigênio, o meio se torna mais adequado para as bactérias anaeróbias restritas, como Bifidobacterium, Bacteriodes e Clostridium. Depois disso, pouco se conhece sobre quem são e como e quando se dá a entrada dos outros componentes do ecossistema digestivo. A microbiota da criança que nasce por parto vaginal é derivada inicialmente da microbiota fecal materna que contamina o canal de parto. Mais tarde a criança adquire bactérias presentes nos alimentos e no meio ambiente. Na criança que nasce por meio de parto cesáreo, não há participação da microbiota fecal materna, e o estabelecimento da microbiota intestinal normal é mais tardio. 9 As crianças amamentadas com leite materno têm mais bifidobactérias e estafilococos na microbiota intestinal, em relação às que tomam mamadeira que têm maior número de enterococos e clostrídeos. O leite materno favorece o crescimento de alguns grupos bacterianos de importância para a saúde do hospedeiro como as bifidobacterias cujo crescimento é favorecido pelos fatores bifidi. A baixa capacidade tamponante do leite humano permite também uma melhor atuação das bactérias produtoras de ácido lático pela redução do valor do pH intestinal desfavorável ao crescimento de vários micro-organismos patogênicos. As crianças amamentadas ao seio, quando comparadas com as alimentadas artificialmente, são menos colonizadas por enterobactérias, como E. coli e Klebsiella, sendo ainda menor o número de sorotipos de E. coli enteropatogênicos. Quando o desmame inicia, as crianças são expostas, pela primeira vez, a muitos carboidratos, diferentes e complexos. Uma quantidade significativa destes carboidratos vai escapar da digestão no intestino delgado e chegar ao cólon, assim como toda fonte de fibra dietética. Sabe-se que esses produtos servem de substratos alimentares para as bactérias colônicas e, possivelmente, influenciariam sa composição da microbiota intestinal das crianças neste período de vida. Segundo estudos experimentais, o impacto da introdução de alimentos não lácteos, provavelmente persistirá até a vida adulta. O uso de antibiótico pode afetar o padrão de colonização do TGI na criança. Os agentes antimicrobianos têm efeitos específicos em componentes individuais da microbiota ao invés de uma supressão geral e não específica e o perfil microbiano resultante influencia a população que emerge após a parada do tratamento. Algumas características fazem com que determinadas bactérias sejam consideradas benéficas para os seres humanos. As bifidobactérias e os lactobacilos talvez sejam os principais representantes entre as bactérias benéficas. São micro-organismos que não apresentam nenhum fator de patogenicidade para o homem e nunca foram envolvidas em episódios infecciosos no trato gastrointestinal. Alguns fatores favorecem a implantação destas bactérias no TGI dos recém- nascidos como o “fator bífido”, nutriente presente no leite materno que favorece especificamente a instalação e atuação destas bactérias, além de características próprias deste gênero bacteriano com uma alta capacidade de adaptação destas ao trato gastrointestinal humano. A otimização da microbiota intestinal pelo uso de pré e probióticos durante o período de colonização intestinal tem sido sugerida, entretanto, ressalta-se a importância de se conhecer mais profundamente como ocorre a instalação da microbiota e quais as consequências, em longo prazo, de possíveis intervenções neste processo. 4. Probióticos Os probióticos são definidos como organismos vivos que proveem benefícios ao hospedeiro, quando inoculadas em quantidades adequadas. Os probióticos devem possuir pré-requisitos básicos para serem utilizados no ser humano, incluindo: ausência de 10 propriedade virulenta, capacidade de sobreviver no ambiente gastrointestinal, capacidade de aderir às superfícies mucosas e células epiteliais e ação inibidora de patógenos. Alguns exemplos incluem, alimentos à base de leite fermentado, assim como aqueles que contém bactéria liofilizada. Os microrganismos comumente utilizados nestes produtos são lactobacilos e bifidobactérias. Alguns estudos já relataram que a espécie Lactobacilus acidophilus, quando utilizada como suplemento em crianças, foi capaz de causar aumento no peso. Em outros estudos, a administração de L. casei em crianças com diarréia aguda, causada por rotavírus, proporcionou uma melhora acentuada. Além disso, quando a vacina contra rotavírus foi administrada com L. casei, pode ser observado um aumento nas células secretoras de IgM específica, causando uma soro conversão de IgA anti-rotavírus. Estudos indicam que o uso de probióticos pode aumentar a expressão de genes envolvidos na sinalização de proteínas das junções firmes, prevenindo a ruptura da barreira intestinal e também favorecendo sua recuperação após dano. Além disso, a capacidade de adesão tem sido uma das principais características buscada nos novos probióticos. Essa propriedade é importante para que interajam com as células epiteliais e células imunes do hospedeiro, e também para que estes atuem como antagonistas da adesão de patógenos. Algumas cepas de probióticos, como Lactobacillus reuteri, Lactobacillus plantarum, Bifidobacterium lactis, Bifidobacterium bifidum e Bifidobacterium longum produzem e secretam proteínas adesinas de muco, denominadas MUB (mucus-binding protein) que ficam ancoradas na parede celular, permitindo a adesão a estruturas específicas da mucosa intestinal humana. Alguns probióticos são capazes de sintetizar ácidos orgânicos e substâncias antibacterianas denominadas bacteriocinas. Os ácidos orgânicos, particularmente o ácido acético e o ácido lático, têm um forte efeito inibitório sobre bactérias Gram-negativas, e têm sido considerados os principais compostos antibacterianos responsáveis pela atividade inibitória dos probióticos sobre patógenos. Quando penetram a célula bacteriana, eles causam a redução do valor do pH intracelular ou o acúmulo de ácidos orgânicos ionizados, levando a morte bacteriana pela formação de poros e/ou inibição da síntese da parede celular. Foi demonstrado que determinados lactobacilos e bifidobacterias probióticas são capazes de matar diretamente a Salmonella typhimurium, in vitro. Além disto, alguns probióticos, principalmente lactobacilos, seriam capazes de produzir substancias inibidoras do crescimento de fungos. Bactérias probióticas têm demonstrado aumentar os níveis de IgA total e específica contra patógenos em vigência de infecção, sem induzir a produção de IgA contra o próprio probiótico. Micro-organismos simbiontes e probióticos podem induzir um estado de tolerância imunológica mediado pela ativação dos receptores do tipo Toll (TLR) na superfície das células dendríticas. Após ativação pelas bactérias probióticas, as células dendríticas iniciam uma resposta apropriada, induzindo a diferenciação do linfócito Tho em Treg, que tem um efeito inibitório sobre a resposta inflamatória Th1, Th2 e Th17. Lactobacillus induzem a diferentes perfis de secreção de citocinas pró e anti- inflamatória. 11 5. Prebióticos Os prebióticos são substâncias não digeríveis, presentes nos alimentos, que estimulam seletivamente o crescimento e atividade de bactérias no cólon, trazendo efeitos benéficosao hospedeiro. Inulina e oligofrutose (ou fruto-oligossacarídeos - FOS), galacto-oligossacarídeos (GOS) e lactose, são os principais compostos prebióticos. Estes compostos estão presentes naturalmente em alimentos como a cebola, o alho, chicória e o leite. Estes compostos, quando fermentados pelas bactérias colônicas, levam a produção de AGCC, principalmente o acetato, o propionato e o butirato (efeito butirogênico). A maioria dos AGCC é absorvida pelo organismo humano sob a forma de energia. O butirato é oxidado e utilizado pelo próprio epitélio colônico e é considerado o AGCC com maior impacto sobre saúde epitélio intestinal. Ele cria um ambiente mais ácido, que protege contra a colonização por patógenos, possui efeito trófico no epitélio, favorece a diferenciação do enterócito, inibindo a proliferação (efeito anticarcinogênico) e possui atividade anti-inflamatória. Se, como alguns autores já demonstraram, bifidobactéria é o gênero predominante durante na alimentação com o leite materno em bebês, então já se pode pensar em fórmulas para uso infantil deste prebiótico.
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