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Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais Texto do Filme “12 Anos de Escravidão” O filme “12 Anos de Escravidão”, do diretor Steve McQueen, é baseado na história real de Solomon Northup, um homem negro e livre dos Estados Unidos que lutou durante 12 anos pela sobrevivência e pela liberdade. A história se passa em 1841, no contexto de pré-Guerra Civil (1861- 1865), período que antecede a abolição da escravatura no país. O país não era unificado devido as divergências dos interesses políticos e econômicos e se segmentava em norte e sul dos Estados Unidos. O filme retrata cenas fortes de violência de forma explícita e realista, como enforcamento, estupro e chibatadas. Há momentos em flashback em que a vida de Solomon é apresentada entre o antes e o depois da escravidão e a sua relação com os outros negros que eram escravos. O diretor também utiliza de cenas longas com o objetivo de incomodar o telespectador ao assistir os atos de torturas físicas e psicológicas, onde ele ocupa uma posição extremamente desconfortável de testemunha e cúmplice da violência extrema imposta sobre Solomon Northup e outros escravos. Nesse sentido, o filme é bem sucedido em mostrar as complexidades do sistema escravista, complexidades essas que também eram visíveis em países como o Brasil. Solomon Northup vivia com sua esposa e seus dois filhos, um menino e uma menina. Ele era um violinista talentoso e esforçado que tentava construir o seu caminho como artista no fim do século XIX nos Estados Unidos, o que era extremamente complicado para um negro devido aos resquícios do preconceito social e racial. Certo dia, ele foi surpreendido por dois homens brancos, Brown e Hamilton, e recebeu uma proposta para trabalhar como violinista em diversos estados, porém, eles o embriagaram em um cordial jantar e levam-no ao um ambiente escuro e sujo, onde ficou acorrentado. Logo em seguida, Solomon foi levado à uma “feira de vendas” juntamente com outros negros e negras para serem “vendidos” aos proprietários de terras. Nesse momento do filme, o protagonista principal tem o seu nome trocado para “Platt” e passa a sobreviver superando violências físicas e emocionais. É perceptível nas cenas retratadas, como os escravos eram tratados como mercadorias e objetos de venda e troca. Platt passa por dois senhores durante o período em que foi subordinado ao trabalho escravo, o primeiro, foi o senhor Ford. No moinho de Ford, ele se destacou devido ao seu conhecimento diverso e sua inteligência, o que aumenta a relação que possuía com o seu dono. Ford era um homem Projeto “Cinema e ensino de história” Disciplina: História Turma: 3º ano Administração Aluno(a): Ana Flávia Norberto Umbelino Data de Entrega: 19/04/2020 Professora: Luciane Silva de Almeida flavi Retângulo flavi Retângulo aparentemente bondoso e um senhor de escravos mais acolhedor e menos repressor, pois tratava Platt de forma amigável e não possuía prazer em torturar seus escravos. Entretanto, nos deixa como questionamento o verdadeiro caráter de Ford, se ele realmente fosse uma pessoa bondosa, não possuía escravos como mão de obra e mercadorias. É retratada no filme, uma cena em que Solomon Northup se revolta contra Tibeats, um mestre da fazenda, e como castigo ele é pendurado em uma árvore por uma corda no pescoço e lá permanece por vários minutos, que parecem uma eternidade. Essa cena reforça a ideia de como os castigos eram expostos para o resto do escravos virem e aprenderem como lição, uma vez que o escravo pendurado ocupa o primeiro plano, enquanto homens, mulheres e crianças escravizados continuam a executar normalmente suas atividades cotidianas. A forma como o mundo acontece em torno daquele escravo em situação deplorável é tão impactante quanto a própria violência, fazendo o espectador testemunhar o momento de tortura sem poder fazer nada, até que, enfim, o senhor de Solomon corta a corda. O segundo dono de Solomon foi Epps, fazendeiro de uma plantação de algodão que trata seus escravos de uma forma muito mais violenta que o antigo dono. Nessa propriedade, o escravo que não conseguisse atingir a meta de recolha na plantação de algodão era punido de forma desumana. A negra escrava Patsey era a maior colhedora de algodão da fazenda e o objeto de desejo do senhor Epps. A escrava era também motivo de ciúmes da esposa do fazendeiro e vítima de momentos de violência da obra. Como na cena no qual o patrão embriagado coloca todos os escravos para dançar e Patsey se destaca na dança, a senhora Epps com ciúmes, achando que a escrava se insinuava para o marido, lança uma garrafa de uísque em seu rosto quase cegando-a. Ao longo do filme, podemos ver a violência imposta sobre as mulheres escravizadas. Patsey sofria mais do que qualquer outro escravo na plantação, não por deixar de fazer seu trabalho ou por se rebelar de alguma forma, mas por causa da violência sexual imposta por seu senhor e pelo decorrente ciúme de sua senhora. Uma cena triste e forte, é o momento em que Patsey é chicoteada nua em um tronco de forma cruel por Epps como punição por ela ter ido à fazenda vizinha buscar um pedaço de sabão para se lavar. O filme retrata a escravidão como tortura e terror, mas também deixa claro que, do ponto de vista do senhor, que Patsey era uma propriedade preciosa, pois além de bonita e inteligente, ela tinha uma tremenda habilidade para colher algodão, o que gerava grandes lucros. Essas críticas se referem a opressão em relação a mulher negra que é objetificada e que muitas vezes recebe papéis subalternos e estereotipados. Em uma ocasião, em que os escravos são expostos a venda, o proprietário se refere a filha de Eliza, uma negra escravizada que sofreu durante todo o período do filme com a separação de seus dois filhos, a uma menina que daria muitos lucros à ele devido a sua pele ser mais clara, ou seja, ele a colocou em um nível “superior” em relação aos outros escravos por se aproximar da branquitude. Diante-uma praga na fazenda, o senhor Epps aluga seus escravos para outra fazenda. E no retorno, um homem branco e pobre vai para a plantação do fazendeiro trabalhar e capturar os negros fujões, conhecido no Brasil como Capitão do Mato. Ao Solomon contar ao homem que escreveria uma carta relatando sua situação, ele o deleta ao seu dono, traindo a sua confiança. Ao observarmos o trabalho escravo na região norte e sul dos Estados Unidos percebemos uma diferença em relação ao tratamento que os escravizados recebiam. A diferença entre nortistas e sulistas tem origem no modelo de colonização e no processo de desenvolvimento de cada uma destas regiões. A região norte sofreu uma colonização de povoamento com as seguintes características: mão- de-obra livre, economia baseada no comércio, pequenas propriedades e produção para o consumo do mercado interno. A região sul foi uma colônia de exploração, baseada no latifúndio, mão-de-obra escrava, produção de matéria-prima para a Europa e monocultura. Todavia, em relação a todas essas características divergentes, a questão mais polêmica era em relação ao fim da escravidão nos Estados Unidos. Os industriários do norte, apoiavam o fim da escravidão com a possibilidade do surgimento de uma ampla camada de trabalhadores assalariados que poderiam ampliar o mercado consumidor dos produtos manufaturados. Em contrapartida, os fazendeiros do sul acreditavam que essa mudança prejudicava o desenvolvimento de suas lavouras, que dependiam exclusivamente da mão de obra escrava. Portanto, pode-se concluir que a exploração do trabalho escravo na região sul dos Estados Unidos era de forma muito mais cruel, desumana e racista em relação ao norte. Uma característica importante retratada no filme, é o papel fundamental da música como uma válvula de escape dos negros escravizados. A musicalidade é um elemento cultural de formação da identidade africana e foi um dosmais importantes instrumentos de resistência à escravidão. Nas plantações de algodão dos Estados Unidos, nas lavouras de cana-de-açúcar do nordeste brasileiro ou nas minas subterrâneas do sudeste do Brasil as músicas cantavam planos de fuga, estratégias de sobrevivência de Quilombos e sonhos de volta à liberdade. Como a cena, apresentada no filme, do velório de um velho escravo que traz um hino religioso quando Platts adora a Deus de sua crença pedindo misericórdia pela sua situação de vida, retratando a fé do protagonista perante o seu sofrimento. Atualmente, a sociedade racista ainda tenta impedir que a musicalidade continue sendo o maior veículo de resistência da cultura africana através do massacre e da criminalização da cultura negra, com o objetivo de silenciar as suas vozes. Essa interpretação justifica o ataque cotidiano da polícia às comunidades e aos bailes funk. O samba e a capoeira, por exemplo, já foram considerados crime, e infelizmente, o negro ainda é associado à imagem de violência e a segregação espacial urbana, uma vez que afrodescendentes ainda possuem acesso limitado e precário ao ensino e melhores condições sociais. Prosseguindo a narrativa do filme, Solomon encontra com Bass, um abolicionista que leva uma carta avisando aos familiares do escravo que ele foi capturado e vendido. Dessa forma, concluindo a trama da obra, o protagonista após 12 anos de escravidão retorna a sua casa onde encontra sua esposa e seus dois filhos já adultos. É um final muito emocionante e de encher os olhos de lágrimas, principalmente após Solomon ser homenageado ao neto receber o seu mesmo nome. Sabemos que a abolição foi fruto de uma constante luta travada por grupos abolicionistas integrados por jornalistas, políticos, nobres, advogados e diversos outros. Porém durante muito tempo, o papel dos abolicionistas negros foi esquecido propositalmente. Nessa perspectiva, o filme nos faz refletir que o fim da escravidão é resultado da insatisfação e da luta dos próprios negros escravizados e de seus descendentes. A escravidão perdurou por muitos anos em todo o mundo e teve seu fim apenas em 1888 devido a promulgação da lei Áurea. Porém, é incontestável que a abolição da escravatura deixou os negros à margem da sociedade e esses três séculos estereotiparam os negros, que sofrem, ainda hoje, com o legado da escravidão, como a baixa escolaridade, o racismo, a exclusão social e a desigualdade econômica e social atrelada à questão étnico-racial. As desigualdades raciais persistentes também se refletem nas condições de moradia. O Brasil, por exemplo, tem quase três vezes mais negros do que brancos vivendo com ao menos uma restrição de acesso ao saneamento básico. Devido à situação de pobreza em que a população negra está majoritariamente inserida, grande parte sofre com problemas de saúde pública, saneamento básico e qualidade de vida. Tal conjuntura é ainda intensificada pela discriminação no mercado de trabalho, a qual muitas empresas não contratam ou seu número de funcionários negros é bem inferior ao índice esperado, uma vez que a superioridade do homem branco ainda se encontra presente. Segundo dados dos indicadores sociais do IBGE, enquanto a violência contra pessoas brancas se mantém estável, a taxa de homicídio de pretos e pardos aumentou em todas as faixas etárias. O filme traz a escravidão de forma bem realista e violenta e faz uma reflexão de um momento histórico, político e cultural do passado, que tem a função social de tocar e afetar os telespectadores. Entretanto, neste caso em especial tal papel é ainda mais evidente e importante, pois traz para a realidade um questionamento sobre o preconceito enraizado em uma sociedade em que os negros sofrem com as consequências desse processo de escravização e submissão entre grupos populacionais. Além de todas as atrocidades retratadas, a identificação com o personagem que nasce livre faz o espectador sentir aflito ao ver a liberdade perdida e não ter mais controle sobre sua própria vida.
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