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ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Epidemiologia ○ Doença rara, com incidência anual de um a três casos por 100.000 habitantes ○ Geralmente acomete mulheres > 40 anos ○ A AHAI por anticorpos a quente é a segunda citopenia imunológica mais frequente, sendo superada apenas pela púrpura trombocitopênica imunológica ○ Cerca de 30% dos casos de AHAI por anticorpo quente são idiopáticos primários e os outros, secundários a doenças linfoproliferativas, doenças autoimunes, infecções, imunossupressão e uso de certas medicações, entre outros ■ Acomete pacientes de todas as faixas etárias e de ambos os sexos e é mais comum em mulheres adultas, causando anemia variável e esplenomegalia ○ Na AHAI por anticorpo frio, a forma mais comum, no entanto, é a idiopática ou primária, conhecida por síndrome da crioaglutinina, que costuma ocorrer na sexta e na sétima décadas de vida ○ Atualmente, a hemoglobinúria paroxística aguda a frio é rara. ■ Quase todos os caso são transitórios e não há particularidade relacionada à etnia ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Fisiopatologia ○ Caracteriza-se pela destruição precoce das hemácias, devido à presença de autoanticorpos fixados a antígenos de superfície da membrana das hemácias ○ Quando o anticorpo liga-se à hemácia, a natureza do processo hemolítico é determinada pelas classe de anticorpo, densidade e distribuição do antígeno na membrana da mesma ○ A presença de IgG e a precipitação de C3b do complemento na membrana da hemácia são reconhecidas por macrófagos do sistema reticuloendotelial que têm receptores específicos para tais proteínas ○ A destruição das hemácias promovida pelos macrófagos representa o principal mecanismo de hemólise extravascular ○ Quando a ativação do complemento da membrana eritrocitária se estende além do C3b, ocorre uma série de reações que resultam na produção de C5b e no complexo de ataque à membrana, que tem a capacidade de perfurar a membrana da hemácia, provocando o vazamento da hemoglobina e outros componentes do plasma, alterando o equilíbrio osmótico da célula e acarretando a hemólise intravascular ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Classificação ○ A AHAI pode ser classificada com base em sua etiologia ■ idiopática ou primária que não apresenta causa definida; ■ secundária, associada a doenças linfoproliferativas, doenças autoimunes e uso de medicamentos, entre outros. ○ E pode ser classificada de acordo com a temperatura de reatividade dos anticorpos ligados à hemácia ■ Na AHAI por anticorpo quente, os autoanticorpos reagem mais fortemente a temperaturas iguais ou superiores a 37°C. Assim, a hemólise ocorre por meio da destruição das hemácias pelo sistema reticuloendotelial ■ Na AHAI por anticorpo frio, os autoanticorpos ligam-se às hemácias em temperaturas entre 4°C e 18°C, podendo levar à aglutinação das hemácias na circulação sanguínea, e ao ser ativado o sistema complemento, ocorre a hemólise ■ Ocasionalmente, o paciente pode ter uma combinação de autoanticorpos a quente e a frio ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Por anticorpo a quente ○ Corresponde de 60% a 70% das AHAI e é causada por anticorpos eritrocitários da classe IgG que reagem com maior eficácia a 37°C ○ Embora não causem diretamente aglutinação eritrocitária, eles induzem a destruição prematura das hemácias pelo sistema reticuloendotelial fagocitário (hemólise extravascular) ○ A sensibilização da hemácia por IgG leva à fagocitose parcial no baço e, desse modo, a hemácia perde sua forma bicôncava assumindo uma esférica, que resulta no surgimento de esferócitos ○ Dessa forma, a medula óssea responderá à perda das hemácias circulantes elevando a produção de hemácias, detectada pelo aumento de reticulócitos no sangue periférico ○ No hemograma, o sangue periférico apresenta policromasia, anisocitose com RDW elevado e esferócitos, podendo ocorrer eritroblastos circulantes ○ O VCM, em geral, é elevado, em razão da reticulocitose, mas quadro de reticulocitopenia pode ser visto em pacientes com comprometimento medular ou autoanticorpos contra precursores jovens ○ O número de plaquetas e leucócitos é normal ■ Síndrome de Evans: quando há associação entre AHAI e trombocitemia autoimune ■ Linfocitose pode sugerir doença linfoproliferativa ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Por anticorpo a quente ○ O teste da antiglobulina direta (Coombs direto) é positivo, devido à presença de anticorpos da classe IgG ○ O Coombs indireto também é positivo, pois as moléculas de autoanticorpo estão em equilíbrio dinâmico entre o plasma e os eritrócitos ■ Autoanticorpo no plasma interfere na identificação de aloanticorpo, podendo mascarar a presença deste, pois reagem com todas as células do painel de eritrócitos durante a fase de antiglobulina humana ○ Nos testes bioquímicos, pode ocorrer aumento da bilirrubina indireta e do DHL, assim como também diminuição da haptoglobina ● Por anticorpo a frio ○ Os autoanticorpos são crioaglutininas, geralmente da classe IgM, e reagem com maior intensidade a temperaturas baixas. A maior ação no frio faz com que as extremidades do organismo sejam mais acometidas ○ Os sintomas são causados pela aglutinação das hemácias nas extremidades, que levam à redução do fluxo sanguíneo e à diminuição da oferta de oxigênio aos tecidos nas extremidades, ocasionando o aparecimento do fenômeno de Raynaud (aparência cianótica nos dedos, nariz e orelhas) ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Por anticorpo a frio ○ Os anticorpos “frios” costumam ser produzidos em resposta a infecções ou por doenças linfoproliferativas ○ As formas associadas a infecções são de apresentação aguda, mais comuns em pneumonias (por Mycobacterium pneumoniae) e em infecções virais (mononucleose infecciosa causada pelo vírus Epstein-Barr) ○ A hemólise que ocorre nesta doença é principalmente extravascular, devido à habilidade dos anticorpos em ligar e ativar o complemento, principalmente o C3b ○ Embora também talvez haja hemólise intravascular com menor intensidade, podem ocorrer anemia, palidez, fadiga e icterícia ○ No hemograma, a citomorfologia do sangue periférico apresenta as hemácias agrupadas, que são responsáveis por falsas elevações do VCM da amostra, como também por valores irreais de HCM e CHCM ○ Em alguns pacientes, observam-se hemácias em forma de roseta e aumento do RDW e da contagem de reticulócitos ○ Nos testes bioquímicos, as taxas de bilirrubina indireta e DHL estão elevadas ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Por anticorpo a frio ○ Há duas distintas entidades clínicas: doença da aglutinina a frio e hemoglobinúria paroxística a frio ou doença de Donath-Landsteiner ○ DOENÇA DA AGLUTININA A FRIO ■ Representa 10% dos casos de AHAI ■ Afeta ambos os sexos e acontece nas formas primária ou idiopática e secundária ■ A forma primária é relativamente rara, ocorrendo em pacientes com idade > 60 anos ■ A forma secundária é mais comum, podendo surgir, de maneira aguda transitória, após quadro infeccioso, vista em adultos jovens ou, de maneira crônica, associada às doenças linfoproliferativas, em pacientes mais idosos ■ As alterações no hemograma dos pacientes AHAI por anticorpos a frio são semelhantes às encontradas em outras anemias hemolíticas: queda de hemoglobina, VCM elevado, policromasia, reticulocitose e, ocasionalmente, esferocitose ■ O número de plaquetas é normal e a quantidade de leucócitos pode está normal ou discretamente aumentada ■ Coombs direto positivo com reagente poliespecífico e com o monoespecífico contendo C3d, e negativo com o monoespecífico contendo IgG ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Por anticorpo a frio ○ DOENÇA DA AGLUTININA A FRIO ■ Os autoanticorpos são tipicamente IgM, sendo monoclonais na doença primária ou secundária à doença linfoproliferativa e policlonais na secundária aos agentes infecciosos ○ HEMOGLOBINÚRIA PAROXÍSTICA A FRIO ■ Causa incomum de AHAI, com frequência em torno de 2%. ■ Em geral, afeta crianças com idade inferior a cinco anos, de forma aguda e limitada secundária à infecçãoviral ■ Destaca-se a rápida queda da hemoglobina no início do quadro. ■ Apresenta-se clinicamente como uma anemia hemolítica intensa com hemoglobinúria com especificidade anti-P ■ O hemograma revela policromasia, esferocitose e eritrofagocitose; pode haver leucopenia ■ Outros achados laboratoriais comuns secundários à hemólise são: LDH elevada e hiperbilirrubinemia indireta ■ Como resultado da hemólise intravascular têm-se diminuição de haptoglobinas, hemoglobinemia e hemoglobinúria ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Por anticorpo a frio ○ HEMOGLOBINÚRIA PAROXÍSTICA A FRIO ■ A urina de pacientes com hemoglobinúria paroxística a frio pode conter metemoglobina e, se houver evolução com insuficiência renal, aumento dos níveis séricos de ureia e creatinina ■ Coombs direto positivo com reagente poliespecífico e com anti-C3d ■ O auto-anticorpo é uma IgG bifásica, conhecido como anticorpo de Donath-Landsteiner, que fixa complemento em baixas temperaturas, e em temperaturas fisiológicas (37°C) ● Os eritrócitos são lisados pelo término da ativação da cascata da via clássica do complemento, resultando em quadro de hemólise intravascular ● Induzida por drogas ○ As drogas podem ocasionar a formação de anticorpos dirigidos contra antígenos intrínsecos aos eritrócitos ou contra a própria droga ○ 4 mecanismos: ■ Indução de autoimunidade (alfametildopa, procainamida): fármacos podem induzir à formação de autoanticorpos (principalmente IgG) que reagem com antígenos eritrocitários, em geral, relacionados com o grupo Rh ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Induzida por drogas ○ 4 mecanismos: ■ adsorção do fármaco (penicilina): funciona como hapteno e liga-se fortemente às proteínas da membrana eritrocitária. Isso resulta na síntese de anticorpos dirigidos contra o fármaco ligado às hemácias, o que leva a um quadro de hemólise extravascular de instalação insidiosa e raramente grave. Sem ativação do complemento ■ adsorção de imunocomplexos (quinidina, fenacetina, cefalosporina de 3ª geração): os anticorpos reagem com o fármaco, para formar imunocomplexos que são adsorvidos pelos receptores específicos das hemácias, e podem ativar o sistema complemento e desencadear hemólise intravascular ■ adsorção não-imunológica de proteínas (cefalosporinas de 1ª ou 2ª geração): a cefalotina pode ligar-se à membrana dos eritrócitos por meio de mecanismo independente do grupo betalactamato que, então, permanece livre para atrair várias proteínas plasmáticas, como albumina, IgA, IgG, IgM e frações do complemento, que, em seguida, são adsorvidas à superfície dos eritrócitos ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Diagnóstico ○ Baseado na identificação sorológica dos autoanticorpos e na evidência clínica e laboratorial de hemólise ○ Os testes mais utilizados na abordagem das AHAI são os testes de Coombs direto ou teste direto de antiglobulina (TDA) e pesquisa de anticorpos irregulares (PAI) ou Coombs indireto ■ O Coombs direto detecta anticorpos ou componentes do complemento fixado às hemácias ● Fundamenta-se na adição antiglobulina humana ao preparado de hemácias para potencializar e tornar visível as reações de aglutinação entre as hemácias que têm anticorpos ligados às suas superfícies ■ O Coombs indireto pesquisa no soro do paciente a existência de aloanticorpos irregulares voltados contra antígenos clinicamente significantes de importância transfusional e/ou gestacional ● Fundamenta-se na reação entre anticorpos do soro do paciente e de uma preparação de hemácias conhecidas, com antiglobulina humana. Realizado tanto à temperatura ambiente (fase fria), que detecta principalmente a IgM, quanto após a incubação a 37° C (fase quente), que detecta principalmente a IgG ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Diagnóstico ○ Outros exames, como hemograma, contagem de reticulócitos, desidrogenase lática (DHL) e pesquisa de autocriaglutininas, também devem ser realizados para a confirmação ○ Na AHAI induzida por fármaco, o teste de Coombs direto é geralmente positivo, podendo ou não ser acompanhado de anemia normocítica e normocrômica, reticulocitose, esferocitose e eventuais corpúsculos de Howell-Jolly. ○ Se houver hemólise intravascular, podem ocorrer, ainda, hemoglobinemia e hemoglobinúria ○ As bilirrubinas e a DHL também podem estar aumentadas ○ Quando o fármaco corresponde ao principal componente do antígeno, na maioria das vezes, a suspensão do medicamento é suficiente para assegurar o término da hemólise ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Tratamento ○ Por anticorpo a quente ■ Transfusão de concentrado de hemácias não é contraindicada, mas limitada a situações em que há risco de vida ou de eventos cardíacos ou cerebrais devido à anemia ● Quando indicada, deve ser realizada em pequenos volumes (100ml), de forma lenta, com monitoração durante o procedimento ■ O tratamento com prednisona diminui a hemólise em cerca de 70% dos pacientes e o nível de Hb aumenta em 10 a 15 dias, podendo reduzir a dose durante os 2 meses seguintes ■ Em caso de hemólise fulminante, pode ser indicada pulsoterapia com metilprednisolona IV ■ Os pacientes que não apresentam respostas satisfatórias à corticoterapia devem ser submetidos à esplenectomia ■ Em pacientes refratários à esplenectomia, pode ser feito tratamento com drogas que inibem a ação macrofágicas do SRE, como danazol ou gamaglobulina IV, ou drogas imunossupressoras como ciclofosfamida, azatioprina ou ciclosporina ■ Em caso de crise aguda de hemólise muito intensa, faz-se plasmaférese para remoção transitória do anticorpo circulante ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ● Tratamento ○ Por anticorpo a frio ■ Manter o paciente aquecido e, nos casos de hemólise grave, mesmo com resposta fraca ao corticosteroide, deve-se manter o esquema de imunossupressão visando a uma possível hemotransfusão de urgência ● O risco da transfusão pode ser reduzido pelo aquecimento da bolsa e das extremidades do paciente ■ Nos casos primários, os pacientes podem se beneficiar de drogas alquilantes (ciclofosfamida e clorambucil) e anticorpo monoclonal anti-CD20 ■ Os casos secundários à infecção geralmente são autolimitados e quase nunca precisam de terapia imunossupressora ● Porém, se o quadro hemolítico for grave, podemos usar corticosteróide ou plasmaférese ■ Nos casos secundários à doença linfoproliferativa, tratamos a doença de base ■ Como os anticorpos IgM são predominantemente intravasculares, podemos tratar os pacientes com plasmaférese, embora haja risco de aglutinação dentro das bolsas ■ A hemoglobinúria paroxística aguda a frio costuma ser autolimitada e raramente precisa de corticoterapia ou de transfusão REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ● Hematologia : métodos e interpretação / Alexsandro Macedo Silva, Luciane Maria Ribeiro Neto (org.). São Paulo : Roca, 2017 ● Hematologia laboratorial : teoria e procedimentos [recurso eletrônico] / Paulo Henrique da Silva ... [et al.]. - Porto Alegre : Artmed, 2016. ● Laboratório de hematologia: teorias, técnicas e atlas / Márcio Antonio Wanderley de Melo / Cristina Magalhães da Silveira – 1. ed. – Rio de janeiro: Rubio, 2015. ● Fisiopatologia da doença : uma introdução à medicina clínica [recurso eletrônico] / Gary D. Hammer, Stephen J. McPhee ; [tradução: Geraldo de Alencar Serra, Patricia Lydie Voeux ; revisão técnica: Renato Seligman, Beatriz GraeffSantos Seligman. - 7. ed. - Porto Alegre: AMGH, 2016.
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