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1 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza Módulo III: Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Problema 5: Pressão na cabeça Objetivo 1: Descrever a anatomia das meninges. Objetivo 2: Explicar a síndrome meníngea. Objetivo 3: Explicar a produção, circulação e drenagem do liquor. Objetivo 4: Explicar a hidrocefalia. Objetivo 5: Explicar a hipertensão intracraniana. Meninges Anatomia → São membranas conjuntivas que isolam e protegem o SNC; → São 3: DURA-MÁTER Meninge + superficial. Tecido conjuntivo rico em fibras colágenas, vasos e nervos. A dura-máter do encéfalo difere da dura-máter espinhal por ser formada por dois folhetos, externo e interno, dos quais apenas o interno continua com a dura-máter espinhal. O folheto externo adere intimamente aos ossos do crânio e comporta-se como periósteo destes ossos. Ao contrário do periósteo de outras áreas, o folheto externo da dura-máter não tem capacidade osteogênica, o que dificulta a consolidação de fraturas no crânio e toma impossível a regeneração de perdas ósseas na abóbada craniana. Esta peculiaridade, entretanto, é vantajosa, pois a formação de um calo ósseo na superfície interna dos ossos do crânio pode constituir grave fator de irritação do tecido nervoso. Em virtude da aderência da dura-máter aos ossos do crânio, não existe no encéfalo um espaço epidural, como na medula. Em certos traumas ocorre o descolamento do folheto externo da dura-máter da face interna do crânio e a formação de hematomas epidurais. Inerva: nervo trigêmeo V; Irrigada pela artéria meníngea media. Pregas da dura-máter Foice do cérebro: é um septo vertical mediano em forma de foice, que ocupa a fissura longitudinal do cérebro, separando os dois hemisférios cerebrais. Tenda do cerebelo: projeta-se para diante como um septo transversal entre os lobos occipitais e o cerebelo. A tenda do cerebelo separa a fossa posterior da fossa média dia do crânio, dividindo a cavidade craniana em um compartimento superior, ou supratentorial, e outro inferior, ou infratentorial. Foice do cerebelo: pequeno septo vertical mediano, situado abaixo da tenda do cerebelo, entre os dois hemisférios cerebelares. Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce 2 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza Diafragma da sela: pequena lâmina horizontal que fecha superiormente a sela túrcica, deixando apenas um pequeno orifício para a passagem da haste hipofisária. Cavidades da dura-máter Em determinadas áreas, os dois folhetos da dura-máter do encéfalo separam-se, delimitando cavidades. Uma delas é o cavo trigeminal (de Meckel), ou loja do gânglio trigeminal, que contém o gânglio trigeminal. Outras cavidades são revestidas de endotélio e contêm sangue, constituindo os seios da dura-máter, que se dispõem, sobretudo ao longo da inserção das pregas da dura-máter. Seios da dura-máter: São canais venosos revestidos de endotélio e situados entre os dois folhetos que compõem a dura-máter encefálica. O sangue proveniente das veias do encéfalo e do globo ocular é drenado para os seios da dura-máter e destes para as veias jugulares internas. Os seios comunicam-se com veias da superfície externa do crânio através de veias emissárias, que percorrem forames ou canalículos que lhes são próprios, nos ossos do crânio. Os seios dispõem-se, sobretudo ao longo da inserção das pregas da dura-máter, distinguindo-se os seios em relação com a abóbada e com a base do crânio. Seios da abóboda 1. SEIO SAGITAL SUPERIOR: ímpar e mediano percorre a margem de inserção da foice do cérebro. Termina próximo à protuberância occipital interna, na chamada confluência dos seios. 2. SEIO SAGITAL INFERIOR: situa-se na margem livre da foice do cérebro, terminando no seio reto. 3. SEIO RETO: localiza-se ao longo da linha de união entre a foice do cérebro e a tenda do cerebelo. Recebe, em sua extremidade anterior, o seio sagital inferior e a veia cerebral magna, terminando na confluência dos seios. 4. SEIO TRANSVERSO: é par e dispõe-se de cada lado ao longo da inserção da tenda do cerebelo no osso occipital, desde a confluência dos seios até a parte petrosa do osso temporal, onde passa a ser denominado seio sigmoide. 5. SEIO SIGMOIDE: em forma de S, é uma continuação do seio transverso até o forame jugular, onde continua diretamente com a veia jugular interna. O seio sigmoide drena a quase totalidade do sangue venoso da cavidade craniana. 6. SEIO OCCIPTAL: muito pequeno e irregular, dispõese ao longo da margem de inserção da foice do cerebelo. Seios venosos 1. SEIO CAVERNOSO: é um dos mais importantes seios da dura-máter, o seio cavernoso é uma cavidade bastante grande e irregular, situada de cada lado do corpo do esfenoide e da sela túrcica. Recebe o sangue proveniente das veias oftálmica superior e central da retina, além de algumas veias do cérebro. O seio cavernoso é atravessado pela artéria carótida interna, pelo nervo abducente, troclear, oculomotor e pelo ramo oftálmico do nervo trigêmeo. Essa relação é de grande importância clínica, pois aneurismas da carótida interna ao nível do seio cavernoso comprimem o nervo abducente e, em certos casos, os demais nervos que atravessam o seio cavernoso, determinando distúrbios muito típicos dos movimentos do globo ocular. Pode haver perfuração da carótida interna dentro do seio venoso, o que determina a dilatação e aumento da pressão no seio venoso. Isto faz com que se inverta a circulação nas veias que nele desembocam, como as veias oftálmicas, resultando grande protrusão do globo ocular, que pulsa simultaneamente com a carótida (exoftalmia pulsátil). 2. SEIO INTRACAVERNOSO: unem os dois seios cavernosos envolvendo a hipófise. Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce 3 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza 3. SEIO ESFENOPARIETAL: percorre a face interior da pequena asa do esfenoide e desemboca no seio cavernoso. 4. SEIO PETROSO SUPERIOR: dispõe-se de cada lado, ao longo da inserção da tenda do cerebelo, na porção petrosa do osso temporal. Drena o sangue do seio cavernoso para o seio sigmoide. 5. SEIO PETROSO INFERIOR: percorre o sulco petroso inferior entre o seio cavernoso e o forame jugular, onde termina lançando-se na veia jugular interna. 6. PLEXO BASILAR: ímpar, ocupa a porção basilar do occipital. ARACNÓIDE Membrana muito delicada, justaposta à dura-máter, da qual se separa por um espaço virtual, o espaço subdural, contendo pequena quantidade de líquido necessário à lubrificação das superfícies de contato das duas membranas. A aracnoide separa-se da pia-máter pelo espaço subaracnóideo, que contém o líquido cerebroespinhal, ou liquor, havendo ampla comunicação entre o espaço subaracnóideo do encéfalo e da medula. Consideram-se também como pertencendo à aracnoide as delicadas trabéculas que atravessam o espaço para se ligar à pia-máter, e que são denominadas trabéculas aracnóideas Cisternas subaracnóideas 1. Cerebelo-medular/magna: Ocupa o espaço entre a face inferior do cerebelo e a face dorsal do bulbo o teto do IV ventrículo. Continua caudalmente com o espaço subaracnóideo da medula e liga-se ao IV ventrículo através de sua abertura mediana. É a maior de todas e é utilizada para extração de liquor nas punções suboccipitais (da para fazer punção). 2. Lombar: na medula (punção). 3. Pontina:Situada ventral mente à ponte. 4. Interpenduncular: Localizada na fossa interpeduncular. 5. Quiasmática: Situada adiante do quiasma óptico. 6. Superior (veia cerebral magna): Situada dorsalmente ao teto do mesencéfalo, entre o cerebelo e o esplênio do corpo caloso. 7. Fossa lateral do cérebro: Corresponde à depressão formada pelo sulco lateral de cada hemisfério. PIA-MÁTER É a mais interna das meninges, aderindo intimamente à superfície do encéfalo e da medula, cujos relevos e depressões acompanham, descendo até o fundo dos sulcos cerebrais. Sua porção mais profunda recebe numerosos prolongamentos dos astrócitos do tecido nervoso, constituindo assim a membrana pio-glial. A pia-máter dá resistência aos órgãos nervosos, uma vez que o tecido nervoso é de consistência muito mole. A pia-máter acompanha os vasos que penetram no tecido nervoso a Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce 4 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza partir do espaço subaracnóideo, formando a parede externa dos espaços perivasculares. Nestes espaços existem prolongamentos do espaço subaracnóideo, contendo liquor, que forma um manguito protetor em tomo dos vasos, muito importante para amortecer o efeito da pulsação das artérias ou picos de pressão sobre o tecido circunvizinho. O fato de as artérias estarem imersas em liquor no espaço subaracnóideo também reduz o efeito da pulsação. Os espaços perivasculares envolvem os vasos mais calibrosos até uma pequena distância e terminam por fusão da pia com a adventícia do vaso. As arteríolas que penetram no parênquima são envolvidas até alguns milímetros. As pequenas arteríolas são envolvidas até o nível capilar por pés-vasculares dos astrócitos do tecido nervoso. Síndromes Meníngeas A pia-máter e a aracnoide constituem as meninges moles ou leptomeninges e sua inflamação é conhecida como leptomeningite ou simplesmente meningite. As leptominingites são as que originam a série de sintomas ou sinais que integram a síndrome meníngea. A leptomeningite provoca alterações no liquor, determinando hipertensão craniana e modificações em sua estrutura bioquímica. As principais causas da síndrome meníngea são a meningite e a hemorragia subaracnóidea. A meningite é um processo exsudativo da pia-aracnoide, determinado por diferentes espécies de organismos patogênicos. A hemorragia subaracnóidea é consequente à ruptura de aneurisma cerebral (hemorragia subaracnóidea espontânea) ou trauma cranioencefálico (hemorragia subaracnóidea traumática). Quadro clínico geral das síndromes: → Cefaleia: muito intensa. Aliada às contraturas as musculares, constitui o elemento essencial da síndrome meníngea, sendo a manifestação mais constante e mais característica. É geralmente intensa, difusa com predominância frontal e intensificada por movimentos, ruídos, luminosidade. → Vômitos: São frequentes na meningite aguda, podendo ser do tipo neurológico. → Fotofobia: a luz provoca sensação desagradável que obriga o paciente a fechar os olhos. → Contraturas: constituem um dos elementos capitais da síndrome meníngea. Afetam, em geral, certos grupos musculares, causando a contratura dos músculos da nuca e dos membros inferiores. → A contratura dos músculos da nuca determina a rigidez de nuca. → Ao se tentar fletir a cabeça, observa-se grande resistência que impede a flexão passiva e, ao mesmo tempo, ocorre dor. → A rigidez pode ser tão acentuada que o paciente estende a cabeça para trás, dando lugar à atitude de opistótono (fortes espasmos musculares, coluna vertebral e as extremidades se curvam para diante). → A rigidez de nuca é sinal de grande importância e de aparecimento precoce nas meningites agudas e na hemorragia subaracnóidea. → A contratura dos músculos flexores da coxa determina a flexão dos membros inferiores que, junto com o decúbito lateral que o paciente guarda, dar lugar à atitude denominada de "gatilho de espingarda". → Essa contratura dos flexores é com frequência latente e revela-se quando se pesquisam os sinais de Kernig e Brudzinski. MENINGITE É um processo inflamatório das meninges, membranas que envolvem o cérebro e a medula espinhal. Pode ser causada por diversos agentes infecciosos, como bactérias, vírus, parasitas e fungos, ou também por processos não infecciosos. As meningites bacterianas e virais são as mais importantes do ponto de vista da saúde pública, devido sua magnitude, capacidade de ocasionar surtos, e no caso da meningite bacteriana, a gravidade dos casos. Meningite bacteriana É a principal causa de estados confusionais agudos, e seu diagnóstico precoce é crucial para um bom resultado. Condições predisponentes incluem infecção sistêmica (principalmente respiratória) ou infecção parameníngea, traumatismo craniano, defeitos anatômicos meníngeos, neurocirurgia prévia, câncer, alcoolismo e outros estados imunodeficitários. Patologia: As bactérias normalmente conseguem acessar o SNC pela colonização de membranas mucosas da nasofaringe, levando a uma invasão tecidual local, bacteremia e disseminação hematogênica do espaço subaracnoide. A Listeria é uma exceção, pois ela é ingerida. As bactérias também podem se disseminar diretamente para as meninges, por defeitos anatômicos do crânio ou a partir de Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce 5 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza locais parameníngeos, como os seios paranasais ou a orelha média. Cápsulas bacterianas de polissacarídeos, lipopolissacarídeos e outras proteínas de membrana podem contribuir com a invasão bacteriana e a virulência. Os baixos níveis de anticorpos e complemento presentes no LCS são inadequados para conter a infecção. A resposta inflamatória resultante está associada com a liberação de citocinas inflamatórias, que promovem permeabilidade da barreira hematoencefálica, edema cerebral vasogênico, alterações no fluxo sanguíneo cerebral e, talvez, toxicidade neuronal direta. Patologicamente, a meningite bacteriana se caracteriza por infiltração leptomeníngea e perivasculare por um exsudato inflamatório. Quadro clínico Quando da apresentação, a maioria dos pacientes tem sintomas de meningite por 1 a 7 dias. Esses sintomas incluem febre, confusão, vômito, cefaleia e rigidez de nuca, mas a síndrome completa nem sempre está presente. O exame físico pode evidenciar febre e sinais de infecção sistêmica ou parameníngea, como abscesso cutâneo ou otite. Sinais de irritação meníngea (meningismo) são observados em cerca de 80% dos casos, mas frequentemente estão ausentes em pacientes muito jovens e muito idosos, ou em pacientes com comprometimento profundo da consciência. Esses sinais incluem rigidez de nuca à flexão passiva (sinal de Brudzinski) e resistência à extensão passiva do joelho estando o quadril fletido (sinal de Kernig). O nível de consciência, quando alterado, varia de confusão leve a coma. Podem ocorrer sinais neurológicos focais e paralisias de nervos cranianos. O papiledema é raro. Prevenção Existem vacinas disponíveis para três bactérias que podem causar meningite: H. influenza tipo b, N. meningitidis e S. pneumoniae. Lactentes com idades entre 2 e 15 meses devem ser imunizados de rotina contra H. influenzae e S. pneumoniae. Crianças e adolescentes com idades entre 1 e 18 anos e indivíduos mais idosos devem ser vacinados contra S. pneumoniae. Indicações adicionais para vacinação estão listadas na Tabela 4-9. O risco de contrair meningite por H. influenzae ou N. meningitidis pode ser reduzido nos familiares e em outros contatos dos pacientes afetados, pela administração profilática de rifampicina a 20 mg/kg/diapor via oral, em dose diária única, durante quatro dias (H. influenzae) ou em duas doses divididas durante dois dias (N. meningitidis). Tratamento A menos que o exame físico mostre anormalidades neurológicas focais ou papiledema, sugerindo umalesão de massa, a punção lombar deve ser realizada imediatamente; se o LCS não for claro e incolor, o tratamento antibiótico deve ser iniciado sem demora. Quando existem sinais focais ou papiledema, devem ser coletados sangue e urina para cultura, com início de antibioticoterapia e realização de TC cerebral. Se o exame não mostrar lesão focal que possa contraindicar a punção lombar, ela então é realizada. A escolha inicial de antibióticos é empírica, com base na idade do paciente e nos fatores predisponente. A dexametasona, administrada imediatamente antes do início do tratamento antibiótico e mantida por quatro dias, pode melhorar o resultado e reduzir a mortalidade em pacientes imunocompetentes com meningite bacteriana confirmada. 6 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza Meningite tuberculosa A meningite tuberculosa deve ser considerada em pacientes que se apresentam com estado confusional, especialmente se existe uma história de tuberculose pulmonar, alcoolismo, tratamento com corticosteroides, infecção por HIV, ou outras condições associadas com comprometimento das respostas imunológicas. Também deve ser considerada em pacientes de áreas (p. ex., Ásia, África) ou grupos (p. ex., sem teto e usuários de drogas) com uma alta incidência de tuberculose. Patologia O principal achado patológico é um exsudato meníngeo basal contendo, principalmente, células mononucleares. Tubérculos podem ser observados sobre as meninges e a superfície cerebral. Os ventrículos podem estar aumentados em tamanho, um resultado da hidrocefalia, e suas superfícies podem apresentar exsudato ependimário ou ependimite granular. A arterite pode resultar em infarto cerebral, e inflamação e fibrose basal podem comprimir os nervos cranianos. Quadro clínico Os sintomas geralmente estão presentes por menos de quatro semanas no momento da apresentação e incluem cefaleia, febre, rigidez de nuca, vômito e letargia ou confusão. Perda visual, comprometimento visual, diplopia, fraqueza focal e convulsões também podem ocorrer. Uma história de contato com casos conhecidos de tuberculose geralmente está ausente. Febre, sinais de irritação meníngea e um estado confusional são os achados mais comuns ao exame físico, mas podem estar ausentes. Papiledema, paralisias oculares e hemiparesia ou paraparesia eventualmente são observados Complicações incluem hiponatremia, hidrocefalia, edema cerebral, perda visual, paralisias de nervo craniano (especialmente VI), bloqueio subaracnoide medular e acidente vascular cerebral, que costuma afetar a cápsula interna, os núcleos da base ou o tálamo. Diagnóstico O diagnóstico é estabelecido pelo exame do LCS. A pressão do LCS costuma estar aumentada, e o líquido geralmente é claro e incolor. Muitas vezes, é observada uma pleocitose linfocítica e de células mononucleares, de 50 a 500 células/mL, mas pleocitose polimorfonuclear pode ocorrer precocemente e dar uma falsa impressão de meningite bacteriana. A proteína do LCS costuma estar acima de 100 mg/dL, podendo exceder 500 mg/dL, principalmente em pacientes com bloqueio espinal subaracnoide. O nível de glicose costuma estar diminuído e pode ser inferior a 20 mg/dL. O diagnóstico definitivo, muitas vezes, é feito pela cultura do M. tuberculosis a partir do LCS, um processo que geralmente leva várias semanas e requer grande quantidade de LCS para ter um rendimento máximo Tratamento O tratamento deve ser iniciado o mais precocemente possível; não deve ser postergado enquanto se aguardam os resultados da cultura. A decisão de tratamentotem como base os achados do LCS, descritos previamente; pleocitose linfocítica e glicose baixa são particularmente sugestivas, mesmo quando os esfregaços para BAAR são negativos. Meningite sifilítica A meningite sifilítica aguda ou subaguda costuma ocorrer dentro de dois anos após a infecção sifilítica primária. Ela é mais comum em adultos jovens, afeta mais homens do que mulheres, e requer tratamento imediato para evitar manifestações irreversíveis da neurossífilis terciária Achados clínicos Em alguns pacientes, a meningite sifilítica é um distúrbio clínico aparente, agudo ou subagudo. No momento da apresentação, sintomas como cefaleia, náusea e vômito, rigidez de nuca, distúrbios mentais, fraqueza focal, convulsões, surdez e comprometimento visual geralmente estiveram presentes por até 2 meses. O exame físico pode mostrar sinais de irritação meníngea, confusão ou delirium, papiledema, hemiparesia e afasia. Os NCs mais frequentemente afetados são, em ordem, VII, VIII (coclear), III, V, VI e II, mas outros nervos também podem estar envolvidos. Em geral, não há febre. Diagnóstico O diagnóstico é estabelecido pelos achados do LCR. A pressão inicial é normal ou levemente aumentada. A pleocitose é linfocítica ou mononuclear, e a contagem de leucócitos costuma variar de 100-1.000mL. 7 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza A proteína pode estar leve ou moderadamente elevada (<200mg/dL), e a glicose pode estar levemente diminuída. A eletroforese de proteínas do LCR pode mostrar discretas bandas de gama- globulina (bandas oligoclonais) não visíveis no LCR normal. Tratamento A meningite sifilítica aguda, geralmente é um distúrbio autolimitado, sem sequelas ou com sequelas mínimas. Manifestações mais avançadas da neurossífilia, incluindo doença vascular e parenquimatosa (tabes dorsalis, paresia generalizada, neurite óptica, mielite), podem ser prevenidas por meio de tratamento adequado da infecção sifilítica precoce. Meningite e encefalite viral Infecções virais das meninges (meningites) ou do parênquima cerebral (encefalites), frequentemente, se apresentam como estados confusionais agudos. Dados da história que podem sugerir um vírus especifico ou uma família viral incluem época do ano, viagens recentes e contato com insetos ou outros animais, contatos sexuais e imunossupressão. Alguns vírus (p. ex.: os herpes-vírus) podem causar meningite ou encefalite, enquanto outros afetam preferencialmente as meninges (p. ex.: os enterovírus) ou o parênquima cerebral (p. ex.: os arbovírus). Patologia Infecções virais podem afetar o SNC de 3 maneiras: 1. Disseminação hematogênica de uma infecção viral sistêmica (ex: os arbovírus); 2. Disseminação neural do vírus por transporte axonal (ex: o herpes simples, a raiva); 3. Desmielinização pós-infecciosa autoimune (ex: varicela, influenza). As alterações patológicas na meningite viral consistem em uma reação inflamatória mediada por linfócitos. A encefalite se caracteriza por espessamento perivascular, infiltração linfocítica e proliferação microglial, envolvendo principalmente as regiões subcorticais de substância cinzenta. Inclusões intranucleares ou intracitoplasmáticas com frequência são observadas. Achados clínicos Incluem febre, cefaleia, rigidez de nuca, fotofobia, dor à movimentação ocular e leve comprometimento da consciência. Os pacientes em geral não parecem tão doentes quanto aqueles com meningite bacteriana. A infecção viral sistêmica pode causar erupção cutânea, faringite, linfadenopatia, pleurite, cardite, icterícia, organomegalia, diarreia ou orquite, e esses achados podem sugerir um agente etiológico específico. Como a encefalite viral envolve o cérebro diretamente, podem ocorrer alterações mais pronunciadas da consciência, convulsões ou sinais neurológicos focais. Quando sinais de irritação meníngea coexistem com sinais de disfunçãocerebral, a condição é denominada meningoencefalite. Prognóstico Os sintomas da meningite viral geralmente têm resolução espontânea em 2 semanas, independente do agente causal, embora possam ser observados déficits residuais. O resultado da encefalite viral varia com o vírus específico. Taxas de mortalidade de até 20% também foram relatadas na encefalite imunomediada pós infecções de sarampo. Meningite fúngica Em uma pequena parcela dos pacientes com infecções fúngicas sistêmicas (micoses), os fungos invadem o SNC e produzem meningite ou lesões intraparenquimatosas focais. O abuso de drogas intravenosas é uma via potencial para infecção com Candida e Aspergillus. A acidose diabética está fortemente relacionada com mucormicose rinocerebral. As infecções meníngeas por Coccidioides, Blastomyces e Actinomyces, por sua vez, costumam ocorrer em indivíduos previamente sadios. A infecção por Cryptococcus (a causa mais comum de meningite fúngica nos EUA) e a infecção por Histoplasma podem ocorrer em pacientes sadios ou imunossuprimidos. A meningite criptocócica é a infecção fúngica do sistema nervoso mais comum em pacientes com infecção por HIV, mas as infecções por Coccidioides e Histoplasma também podem ocorrer nesse cenário clínico. 8 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza Patologia Os fungos chegam ao SNC por meio de disseminação hematogênica a partir dos pulmões, do coração, do trato gastrintestinal ou geniturinário, a partir da pele ou por extensão direta dos locais parameníngeos, como as órbitas ou os seios paranasais. A invasão das meninges a partir de um foco de infecção contíguo é particularmente comum na mucormicose, mas também pode ocorrer na aspergilose e na actinomicose. Os achados patológicos nas infecções fúngicas do sistema nervoso incluem uma reação primária meníngea exsudativa mononuclear, abscessos focais ou granulomas cerebrais ou no espaço epidural, infarto cerebral relacionado a vasculites e aumento de tamanho ventricular causado pela hidrocefalia comunicante. Quadro clínico A meningite fúngica costuma ser uma doença subaguda e clinicamente lembra a meningite tuberculosa. Náusea e vômito, perda visual, convulsões ou fraqueza focal podem ser notados, enquanto a febre pode estar ausente. Em um paciente diabético com acidose, queixas de dor facial ou ocular, secreção nasal, proptose ou perda visual, o médico deve ficar atento à probabilidade de uma infecção por Mucor. O exame neurológico pode mostrar sinais de irritação meníngea, um estado confusional, papiledema, perda visual, ptose, exoftalmo, paralisia de nervo ocular ou de outros nervos cranianos e anormalidades neurológicas focais, como hemiparesia. Devido a alguns fungos (p. ex., Cryptococcus) poderem causar compressão da medula espinal, pode haver evidência de sensibilidade na coluna, paraparesia, sinais piramidais nas pernas e perda da sensibilidade nas pernas e no tronco. Diagnóstico/Achados laboratoriais Culturas de sangue devem ser coletadas. A glicose sérica e os níveis gasométricos do sangue arterial devem ser determinados em pacientes diabéticos. A urina deve ser examinada para Candida. Raios X de tórax podem mostrar linfadenopatia hilar, infiltrados em manchas ou miliares, cavitação ou derrame pleural. Os exames de TC ou RM podem demonstrar lesões em massa intracerebrais, associadas com Cryptococcus ou outros microrganismos, uma fonte de infecção contígua na órbita ou nos seios paranasais, ou hidrocefalia. A pressão do LCS pode estar normal ou elevada, e o líquido geralmente é claro, mas pode ser viscoso na presença de numerosos criptococos. Uma pleocitose linfocítica de até 1.000 células/mm3 é comum, mas uma contagem celular normal ou uma pleocitose polimorfonuclear podem ser observadas na meningite fúngica recente; contagens de células normais são comuns em pacientes imunossuprimidos. Tratamento Anfotericina B é o tratamento mais comum para a meningite por fungos, mas a nefrotoxicidade é comum e pode estar acompanhada de febre, calafrios, hipocalemia, hipomagnesemia e anemia. Formulações mais recentes, com base em lipídeos, são menos nefrotóxicas. Em pacientes com meningite por Coccidioides ou naqueles que não respondem ao tratamento intravenoso, por vezes é usada anfotericina B intratecal (geralmente, administrada por um reservatório de Ommaya). Flucitosina costuma ser administrada juntamente com anfotericina B para o tratamento da meningite criptocócica. Liquor O liquor ou líquido cerebroespinhal é um fluido aquoso e incolor que ocupa o espaço subaracnóideo e as cavidades ventriculares. A função primordial do liquor é de proteção mecânica do sistema nervoso central, formando um verdadeiro coxim líquido entre este e o estojo ósseo. Qualquer pressão ou choque que se exerça em um ponto deste coxim líquido, em virtude do princípio de Pascal, irá se distribuir igualmente a todos os pontos. Desse modo, o liquor constitui um eficiente mecanismo amortecedor dos choques que frequentemente atingem o sistema nervoso central. Por outro lado, em virtude da disposição do espaço subaracnóideo, que envolve todo o sistema nervoso central, este fica totalmente submerso em líquido e, de acordo com o princípio de Arquimedes, torna-se muito mais leve e, de 1.500 gramas passa ao peso equivalente a 50 gramas flutuando no liquor, o que reduz o risco de traumatismos do encéfalo resultantes do contato com os ossos do crânio. 9 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza Características citológicas e físico-químicas do liquor Através de punções lombares, suboccipitais ou ventriculares, pode-se medir a pressão do liquor, ou colher certa quantidade para estudo de suas características citológicas e físico-químicas. Tais estudos fornecem importantes informações sobre a fisiopatologia do sistema nervoso central e seus envoltórios, permitindo o diagnóstico, às vezes bastante preciso, de muitas afecções que acometem o sistema nervoso central, como hemorragias, infecções etc. O estudo do liquor é especialmente valioso para o diagnóstico dos diversos tipos de meningites. O liquor normal do adulto é límpido e incolor, apresenta de zero a quatro leucócitos por mm3 e uma pressão de 5 cm a 20 cm de água, obtida na região lombar com paciente em decúbito lateral. Embora o liquor tenha mais cloretos que o sangue, a quantidade de proteínas é muito menor do que a existente no plasma. O volume total do liquor é de 100 mL a 150 mL, renovando-se completamente a cada oito horas. Os plexos corioides produzem cerca de 500 mL por dia através de filtração seletiva do plasma e da secreção de elementos específicos. Existem tabelas muito minuciosas com as características do liquor normal e suas variações patológicas, permitindo a caracterização das diversas síndromes liquórica. Formação, circulação e absorção do liquor Durante muito tempo acreditou-se que o liquor seria formado somente pelos plexos corioides, estrutura enovelada formada por dobras de pia-máter, vasos sanguíneos e células ependimárias modificadas. Estudos mais modernos, entretanto, mostraram que o liquor é produzido mesmo na ausência de plexos corioides, sendo o epêndima das paredes ventriculares responsável por 400% do total do liquor formado. Acreditou-se também que o liquor resultaria apenas de um processo de filtração do plasma pelos plexos corioides. Entretanto, sabe-se hoje que ele é ativamente secretado pelo epitélio ependimário, sobretudo dos plexos corioides, e sua composição é determinada por mecanismos de transporte específicos. Sua formação envolve transporte ativo de Na+Cl-, através das células ependimárias dos plexos corioides, acompanhado de certa quantidade de água, necessária à manutenção do equilíbrio osmótico. Entende-se, assim, porque acomposição do liquor é diferente da do plasma. Como já foi exposto anteriormente, existem plexos corioides nos ventrículos laterais (como inferior e parte central) e no teto do III e IV ventrículos. Destes, sem dúvida, os ventrículos laterais contribuem com o maior contingente liquórico, que passa ao III ventrículo pelos forames interventriculares e daí ao IV ventrículo através do aqueduto cerebral. Por meio das aberturas mediana e laterais do IV ventrículo, o liquor formado no interior dos ventrículos ganha o espaço subaracnóideo, sendo reabsorvido, sobretudo através das granulações aracnóideas que se projetam no interior dos seios da dura-máter, pelas quais chega à circulação geral sistêmica. Como essas granulações predominam no seio sagital superior, a circulação do liquor no espaço subaracnóideo se faz de baixo para cima, devendo, pois, atravessar o espaço entre a incisura da tenda e o mesencéfalo. No espaço subaracnóideo da medula, o liquor desce em direção caudal, mas apenas uma parte volta, pois há reabsorção liquórica nas pequenas granulações aracnóideas existentes nos prolongamentos da dura-máter que acompanham as raízes dos nervos espinhais. A circulação do liquor é extremamente lenta e são ainda discutidos os fatores que a determinam. Sem dúvida, a produção do liquor em uma extremidade e a sua absorção em outra já são suficientes para causar sua movimentação. Outro fator é a pulsação das artérias intracranianas que, a cada sístole, aumenta a pressão liquórica, contribuindo para empurrar o liquor através das granulações aracnóideas. Além de sua função de proteção mecânica do encéfalo, em tomo do qual forma um coxim líquido, o liquor tem as seguintes funções: a) Manutenção de um meio químico estável no sistema ventricular, por meio de troca de componentes químicos com os espaços intersticiais, permanecendo estável a composição química do liquor, mesmo quando ocorrem grandes alterações na composição química do plasma. b) Excreção de produtos tóxicos do metabolismo das células do tecido nervoso que passam aos espaços intersticiais de onde são lançados no liquor e deste para o sangue. Pesquisas recentes mostraram que o volume dos espaços intersticiais aumenta 60% durante o sono facilitando a eliminação de metabólitos tóxicos acumulados durante a vigília. c) Veículo de comunicação entre diferentes áreas do SNC. Por exemplo, hormônios produzidos no hipotálamo são liberados no sangue, mas também no liquor podendo agir sobre regiões distantes do sistema ventricular. 10 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza Ressonância magnética. Corte horizontal mostrando a dilatação dos ventrículos em um paciente com hidrocefalia por obstrução das aberturas mediana e laterais do IV ventrículo. Hidrocefalia Existem processos patológicos que interferem na produção, circulação e absorção do liquor, causando as chamadas hidrocefalias. Estas se caracterizam por aumento da quantidade e da pressão do liquor, levando à dilatação dos ventrículos e compressão do tecido nervoso de encontro ao estojo ósseo, com consequências muito graves. Por vezes, a hidrocefalia ocorre durante a vida fetal, geralmente em decorrência de anomalias congênitas do sistema ventricular. Nesses casos, assim como em lactentes jovens, já que os ossos do crânio ainda não estão soldados, há grande dilatação da cabeça da criança, o que confere alguma proteção ao encéfalo. No adulto, como o crânio não se expande, a pressão intracraniana se eleva rapidamente, com compressão das estruturas e sintomas típicos de cefaleia e vômitos, evoluindo para herniação, coma e óbito, caso não ocorra tratamento de urgência. Classificação Ainda que todos os tipos de hidrocefalia sejam obstrutivos em alguma medida, a localização anatômica e o grau de resistência ao fluxo anterógrado normal do LCS podem variar. O termo hidrocefalia obstrutiva é usado para descrever as condições que acarretam bloqueio praticamente completo do fluxo de LCS dentro do sistema ventricular. A expressão hidrocefalia comunicante refere-se às condições na quais os ventrículos estão dilatados, apesar do sistema de circulação desimpedida dentro dos ventrículos até as cisternas basais e na superfície das convexidades cerebrais. Walter Dandy foi o primeiro a descrever a hidrocefalia comunicante em 1914. Ele injetou um corante marcador dentro de um dos ventrículos laterais. Se o corante aparecesse no LCS retirado por punção lombar, a hidrocefalia era descrita como comunicante; se o corante não aparecesse no LCS lombar, a hidrocefalia era classificada como não comunicante. O termo hidrocefalia não comunicante aplica- se apenas à que é causada por obstrução dentro do sistema ventricular. A expressão hidrocefalia comunicante pressupõe obstrução do fluxo de LCS em consequência de alguma lesão do sistema absortivo depois de sair dos ventrículos. A hidrocefalia pode ser aguda ou crônica. A hidrocefalia aguda pode acarretar risco imediato à vida quando se desenvolve rapidamente em algumas horas e causa hipertensão intracraniana e herniação inferior da região central do encéfalo. Outra classificação da hidrocefalia inclui as formas congênitas versus adquiridas. A 11 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza hidrocefalia congênita está presente desde o nascimento. A hidrocefalia adquirida pode desenvolver-se em qualquer época depois do nascimento. Epidemiologia As estatísticas populacionais relativas à hidrocefalia são difíceis de obter, considerando as diferentes faixas etárias de início e as diversas causas. A hidrocefalia congênita tem incidência entre 0,5 e 1,8 por 1.000 nascimentos ao ano e pode ter causas genéticas ou não genéticas. A hidrocefalia pós-hemorrágica tem incidência entre 25 e 70%, dependendo da gravidade da hemorragia. Cerca de 10% dos bebês com hemorragia intraventricular (HIVe) precisam colocar um shunt. A incidência da hidrocefalia aguda adquirida não está definida. Estudos populacionais recentes estimaram a prevalência da HNT (hidrocefalia normotensiva) em cerca de 0,5% dos adultos com mais de 65 anos, com incidência de cerca de 5,5 casos por 100.000 habitantes/ano. Esse índice está de acordo com os estudos que demonstraram que, embora a HNT ocorra nos homens e nas mulheres de qualquer idade, ela é mais comum na população idosa, geralmente com pico de incidência entre a sexta e sétima décadas. Fisiopatologia Hidrocefalia obstrutiva Com a hidrocefalia obstrutiva intraventricular, a obstrução causa dilatação proximal dos ventrículos, mas preserva as dimensões normais dos ventrículos distais. A obstrução pode ocorrer no forame de Monro, terceiro ventrículo, aqueduto de Sylvius, quarto ventrículo ou forames de drenagem do quarto ventrículo (forames de Magendie e Luschka). A hidrocefalia obstrutiva pode ser causada por malformações congênitas, anomalias do desenvolvimento, lesões expansivas ou obstruções ventriculares pós hemorrágicos. Malformações congênitas e anomalias do desenvolvimento: As causas não genéticas comuns são hemorragia intracraniana (HIC) secundária a um traumatismo obstétrico ou à prematuridade e meningite como causa de hidrocefalia congênita. Quanto às causas genéticas, estudos com modelos animais e seres humanos identificaram ao menos 43 mutantes/loci relacionados com a hidrocefalia hereditária. Em algumas delas, a estenose aquedutal foi demonstrada por ressonância magnética (RM) ou necropsia. Ainda não está claro se as lesões do aqueduto cerebral (ex: gliose ou fibrose) estão relacionadas com o desenvolvimento ou são sequelas de uma doença inflamatória viral contraída durante a vida intrauterina ou nos primeiros meses de vida. Lesões expansivas: As neoplasias intracranianas podem causarhidrocefalia obstrutiva. Os tumores aglomerados ao redor do terceiro ou quarto ventrículo ou do aqueduto de Sylvius, inclusive tumores pineais, cistos coloides, gliomas, ependimomas e metástases, estão implicados comumente na hidrocefalia obstrutiva intraventricular. Outras lesões expansivas como uma hemorragia cerebral intraparenquimatosa e infarto ou hemorragia cerebelar, que transmitem pressão local aos ventrículos, podem causar hidrocefalia aguda. Dilatações das artérias basilares e outras anomalias vasculares (ex: malformação da veia de Galeno) também foram associadas à hidrocefalia. Obstrução ventricular pós-hemorrágica: Nos adultos, a hemorragia intracerebral complicada por HIC também causa hidrocefalia. Em alguns casos, a obstrução do fluxo de LCS é transitória, por esta razão, a pressão intracraniana (PIC) aumenta e o paciente desenvolve hidrocefalia, mas depois regride espontaneamente. Outros pacientes têm hidrocefalia progressiva. Hidrocefalia comunicante Quando não é possível demonstrar obstrução intraventricular ou extraventricular, três outros mecanismos podem causar hidrocefalia: produção excessiva de LCS, insuficiência venosa e absorção reduzida de LCS pelas vilosidades aracnóideas. A capacidade absortiva do espaço subaracnóideo é cerca de três vezes maior que a taxa de produção normal de LCS de 0,35 mℓ/min (20 mℓ/h ou 500 mℓ/dia). As taxas de produção acima de 1,0 mℓ/min podem causar hidrocefalia. Clinicamente, os papilomas do plexo coroide são a única causa conhecida de hidrocefalia por secreção excessiva de LCS. Hidrocefalia pós-hemorrágica: Nos bebês de baixo peso ao nascer, hidrocefalia pós-hemorrágica é uma complicação importante da HIVe cerebral. A hidrocefalia ocorre quando um trombo localizado dentro do sistema ventricular obstrui o fluxo de LCS por um processo de aracnoidite basilar obstrutiva ou de aracnoidite cortical. A hidrocefalia também ocorre nos adultos que têm hemorragia subaracnóidea causada por traumatismo craniano ou ruptura de aneurisma. Depois de uma hemorragia subaracnóidea, a distensão das vilosidades aracnóideas pelas hemácias 12 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza aglomeradas sugere uma falha de absorção como mecanismo patogenético da hidrocefalia. Hidrocefalia pós-infecciosa: Entre as doenças infecciosas, as meningites bacterianas, fúngicas, tuberculosa ou sifilítica podem causar hidrocefalia crônica secundária à aracnoidite basal. Entre as infecções parasitárias, a neurocisticercose pode causar hidrocefalias comunicante e não comunicante. Hidrocefalia pós-otite: A hidrocefalia pós-otite ocorre nas crianças que têm otite média ou mastoidite crônica com trombose do seio lateral. Agenesia congênita das vilosidades aracnóideas: A hidrocefalia comunicante foi atribuída à agenesia congênita das vilosidades aracnóideas com limitação subsequente da absorção do LCS. Como o estudo detalhado da quantidade de vilosidades e das suas características estruturais é difícil e raramente é realizado, essa anomalia pode ser mais comum que as estatísticas indicam. Do mesmo modo, não é fácil avaliar disfunção das vilosidades aracnóideas sem obstrução da circulação basilar ou transcortical do LCS. Hiperproteinorraquia: Também existem casos descritos de hidrocefalia quando a concentração de proteínas no LCS obtido por punção lombar está acima de 500 mg/dℓ (ex: polineurite ou tumor da medula espinal). As proteínas podem interferir com a absorção do LCS. O ependimoma (tumor medular associado mais comumente à hidrocefalia) pode causar disseminação do tumor para as vilosidades aracnóideas. Hidrocefalia normotensiva: A HNT é um tipo de hidrocefalia comunicante crônica com obstrução parcial da circulação normal do LCS. Na maioria dos casos, a HNT é causada por um padrão de aumentos sequenciais da resistência ao fluxo normal do LCS no forame de Monro, aqueduto de Sylvius, tratos de drenagem do quarto ventrículo e granulações aracnóideas. O resultado é um aumento relativo do volume dos ventrículos laterais e do terceiro ventrículo com PIC normal. A HNT comumente é “idiopática” e pode estar relacionada simplesmente com um processo anormal de envelhecimento cerebral, enquanto em outros casos pode ocorrer depois de hemorragia subaracnóidea por traumatismo ou aneurisma, meningite, tumor ou cirurgia. Independentemente da causa subjacente, os ventrículos expandem-se à custa do volume cerebral, causando compressão do encéfalo e anormalidades da substância branca periventricular. Essas alterações parecem ser atribuídas ao edema cerebral causado pelo fluxo transependimal do LCS ou à desmielinização isquêmica causada pela compressão dos tecidos cerebrais. A compressão também pode causar disfunção neuronal. Entretanto, o efeito final é suficientemente crônico ou compensado, de forma que a pressão do LCS é normal. Hidrocefalia de pressão baixa: Pesquisadores descreveram uma condição clínica evidenciada por pressões baixas de LCS e hidrocefalia sintomática aguda em pacientes com derivação liquórica de pressão média e ventriculomegalia. Derivação crônica por shunts, hemorragia subaracnóidea, HIVe e tumores foram associados à hidrocefalia de pressão baixa. Alguns autores sugeriram que a redução da elasticidade cerebral, quando combinada com dilatação ventricular, cause essa síndrome. Existem várias teorias viscoelásticas aplicadas para tentar descrever essa condição fisiopatológica. Por fim, a hidrocefalia de pressão baixa melhora com a drenagem de LCS abaixo de zero. Hidrocefalia externa: A hidrocefalia externa evidencia-se por coleções de líquido subaracnóideo sobre as convexidades cerebrais, com ou sem ventriculomegalia coexistente. Em alguns casos, pode ser difícil determinar se a coleção líquida está realmente no espaço subaracnóideo ou subdural e, em alguns pacientes, ambas podem ocorrer. Os critérios diagnósticos da hidrocefalia externa benigna das crianças incluem aumento rápido da circunferência craniana na tomografia computadorizada (TC), que demonstra dilatação dos espaços subaracnóideos, principalmente nas regiões frontais, assim como dimensões ventriculares normais. A etiologia é desconhecida na maioria dos casos, mas a hidrocefalia externa foi descrita em diversas condições como prematuridade com HIVe, hemorragia subaracnóidea, meningite, tratamento com corticosteroides, quimioterapia, neurocirurgia e traumatismo. A teoria mais comum para explicar a etiologia da hidrocefalia externa infantil é imaturidade das vilosidades aracnóideas. Nos adultos, a hidrocefalia externa pode ocorrer depois de traumatismo ou hemorragia subaracnóidea. Outra causa é hemicraniectomia cirúrgica, quando o osso não é recolocado. Manifestações Clínicas Hidrocefalia congênita ou neonatal As manifestações clínicas da hidrocefalia são determinadas pela idade do paciente. Os bebês desenvolvem hidrocefalia de tensão quando a lesão se instala antes da fusão das suturas cranianas no final do terceiro ano de vida. Isso causa dilatação do crânio e abertura ampla das fontanelas. Quando a hidrocefalia se desenvolve depois do fechamento recente das suturas, elas podem ser separadas pela pressão (diástase das suturas). A face parece relativamente pequena e, com o estiramento 13 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza da pele do couro cabeludo, surgem veias proeminentes. Com a percussão do crânio, observa-se um som de “pote quebrado”, também conhecido como sinal de Macewen. Nessas crianças, a necrose do couro cabeludo pode causar extravasamento de LCS e infecções. Quando não são tratadas, essas crianças não se desenvolvem em razão da dificuldade de alimentar-se e dos vômitos repetidos. A síndrome de Parinaud é causada pela lesão do tegmento mesencefálico. Os sinais e sintomas são paralisia ou espasmo de convergência, nistagmo de convergência- retração, perda da visão e, por fim, atrofia do nervo óptico, pseudopupilasde Argyll Robertson, retração palpebral (sinal de Collier) e déficit do olhar para cima ou desvio forçado dos olhos para baixo (sinal do sol poente). Os sinais de disfunção das vias corticoespinhais são espasticidade, exacerbação dos reflexos tendíneos profundos, sinal de Babinski positivo e atrofia dos músculos do tronco e dos membros. A criança pode ter retardo do desenvolvimento das funções motoras e cognitivas. Com a hidrocefalia pós-otite, a criança pode estar febril e inquieta. Em geral, esses pacientes têm perfuração do tímpano e secreção ótica purulenta. Em muitos casos, também há paralisia do sexto nervo craniano e edema de papila ipsilaterais. Hidrocefalia aguda Com a hidrocefalia aguda, os pacientes inicialmente têm cefaleia e náuseas/vômitos. Em seguida, há depressão do nível de consciência, que pode evoluir ao coma. As manifestações referidas aos tratos corticoespinhais incluem espasticidade dos membros inferiores, reflexos tendíneos profundos exacerbados e sinal de Babinski bilateral. Esse quadro pode evoluir para uma postura em extensão. As pupilas estão normais nos estágios iniciais. Os sinais e sintomas da síndrome de Parinaud também podem desenvolver-se. Quando a hidrocefalia aguda não é tratada, o paciente apresenta midríase e, dependendo da rapidez da evolução, pode ocorrer edema das papilas. Hidrocefalia normotensiva A hidrocefalia normotensiva (HNT) causa um complexo sintomático diferente, porque a hidrocefalia associada é um processo lento e insidioso. Os pacientes apresentam uma tríade de ataxia da marcha, demência e incontinência urinária. Em geral, o distúrbio da marcha é o primeiro sintoma e também o mais frequente. Essa anormalidade pode ser subaguda, flutuante ou mais crônica, mas na maioria dos casos piora ao longo de semanas ou meses. Em muitos casos, o distúrbio da marcha é inconsistente e variável, mas tem manifestações parkinsonianas como andar arrastando os pés, passos curtos, desequilíbrio e comumente lentidão ao iniciar os movimentos. A marcha frequentemente tem base larga (comum na doença de Parkinson), geralmente com rotação externa das pernas. Nos casos clássicos, a marcha é descrita como “magnética” porque o paciente não consegue levantar os pés do chão. Também é descrita como “apraxia” da marcha porque parece que o programa motor necessário a que o paciente comece a movimentar as pernas está comprometido, embora sem limitação evidente da força muscular. Além da dificuldade de iniciar a marcha, o paciente também pode ter dificuldade de mantê-la e pode ocorrer “congelamento” e incapacidade de reiniciar o movimento. Tremor não é comum, mas as quedas são frequentes. Os sintomas urinários também são comuns nos pacientes com HNT e podem passar despercebidos, incluindo apenas urgência ou aumento da frequência miccional. A incontinência urinária propriamente dita é comum. A HNT também causa disfunção cognitiva, que pode ser sutil ou grave, geralmente depois do início dos distúrbios da marcha e da função urinária. As características da demência associada à hidrocefalia são as manifestações “subcorticais”. Os sintomas podem incluir não apenas déficits de memória, mas também lentidão dos processos mentais, inércia, apatia e limitação das funções executivas (ex: tomar decisões e alternar atividades). Diagnóstico Nos lactentes, a hidrocefalia precisa ser diferenciada dos outros tipos de macrocefalia, inclusive hematoma subdural. A ultrassonografia ajuda a avaliar hemorragia subependimal e HIVe nos bebês prematuros de alto risco, assim como para acompanhar os lactentes quanto à possibilidade de desenvolverem hidrocefalia progressiva subsequente. Os resultados correlacionam-se claramente com a TC. Por ser um exame realizado à beira do leito, a ultrassonografia requer manipulação mínima dos bebês em estado crítico. As radiografias simples e as medições do crânio são úteis para acompanhar a evolução da hidrocefalia dos bebês e das crianças. As radiografias do crânio também podem demonstrar erosão da sela túrcica ou adelgaçamento da tábua interna (“crânio de prata batida”). Em geral, a TC e a RM são os melhores recursos para diagnosticar todos os tipos de hidrocefalia. Nos casos de hidrocefalia ligada ao X, os exames laboratoriais para análise e aconselhamento genéticos podem ser úteis. Nos adultos, o primeiro exame a ser realizado nos casos suspeitos de hidrocefalia é TC ou RM. Embora a TC possa praticamente excluir hidrocefalia, a RM é Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce 14 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza necessária à avaliação mais precisa de anormalidades sutis como edema transependimal. A anormalidade típica da hidrocefalia é dilatação ventricular desproporcional à ampliação dos sulcos. Em geral, a atrofia cerebral causada por doença degenerativa ou envelhecimento afeta os espaços “centrais” (ventriculares) e “periféricos” (sulcais). Contudo, pode ser difícil determinar se a dilatação ventricular é desproporcional. Outras alterações estruturais sugestivas de hidrocefalia podem ser “abaulamento” dos cornos frontais dos ventrículos, dilatação acentuada dos cornos temporais e arqueamento e adelgaçamento do corpo caloso. A alteração sequencial rápida pode ser útil para firmar esse diagnóstico, mas nem sempre é possível dispor de vários exames de TC ou RM realizados ao longo de muitos anos. Tratamento O objetivo do tratamento dos pacientes com hidrocefalia é normalizar a hidrodinâmica do LCS. O tratamento de pacientes com hidrocefalia deve ser individualizado. Quando a obstrução ao fluxo está localizada entre o terceiro e quarto ventrículos, pode-se tentar um procedimento de fenestração endoscópica. No caso de um tumor obstruindo a circulação do LCS, a ressecção cirúrgica pode levar à cura. Quando a causa da alteração hidrodinâmica é transitória, a hidrocefalia pode regredir durante o tratamento inicial e a única intervenção necessária pode ser drenagem ventricular externa temporária ou PL repetidas. Contudo, a PL deve ser realizada apenas nos pacientes com hidrocefalia comunicante. Com todos os tipos de hidrocefalia, o tratamento farmacológico tem pouca utilidade. Apesar de tudo isso, a maioria dos pacientes com hidrocefalia sintomática requer derivação do LCS por colocação de um shunt. Os sistemas de shunting estabelecem uma comunicação entre o espaço liquórico (ventricular ou lombar) e uma cavidade para drenagem (cavidade peritoneal, espaço pleural, átrio direito). Hipertensão Intracraniana Conceito Pressão intracraniana (PIC) é aquela encontrada no interior da caixa craniana, tendo como referência a pressão atmosférica. A PIC tem uma variação fisiológica de 5 a 15 mmHg e reflete a relação entre o conteúdo da caixa craniana (cérebro, líquido cefalorraquidiano e sangue) e o volume do crânio, que pode ser considerado constante (Doutrina de Monroe-Kellie). A alteração do volume de um desses conteúdos pode causar a hipertensão intracraniana (HIC). O aumento da pressão no interior do crânio resulta das várias afecções que podem acometer o encéfalo, tais como: traumáticas, tumorais, vasculares, parasitárias, inflamatórias e tóxicas, acarretando, frequentemente, consequências irreparáveis ou mesmo a morte. Doutrina de Monro-Kellie O crânio possui, nos adultos, um compartimento rígido preenchido com 3 componentes: 1. Tecido cerebral 2. Sangue 3. Líquor. De acordo com a doutrina de Monro-Kellie, todos os três componentes estão em um estado de equilíbrio dinâmico. Se o volume de um dos componentes aumenta, o volume de um ou mais dos outros componentes deve diminuir ou a pressão intracraniana irá aumentar. Dentro dos ventrículos, a pressão intracraniana normalmente deveser menor que 15 mmHg. Os principais elementos dentro do crânio são: O encéfalo (80%) O sangue (10-12%) Líquor (8-10%). Como o crânio pode ser visto fisiologicamente como uma caixa rígida cheia de líquido, se o volume de um de seus constituintes aumentar, a pressão dentro do crânio deverá aumentar, a não ser que algum de seus elementos líquidos possa escapar. E este não pode ser o encéfalo, mas o sangue ou o liquor. Se o encéfalo aumenta de volume (tumor, hematoma, edema etc.), alguma quantidade de sangue ou liquor deverá escapar de dentro do crânio para que a Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce Usuário Realce 15 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza pressão não se eleve. Quando isto não puder mais ocorrer, a PIC irá se elevar acima de seu valor normal (5-15 mmHg). 1. Normalmente, a resposta inicial é uma redução no volume de líquor do crânio. O líquor é desviado do crânio para dentro do saco espinhal. Desta forma, a PIC é inicialmente controlada. 2. Se o processo patológico inicial progride com mais aumento de volume, o sangue venoso dos seios e eventualmente mais líquor podem ser forçados a sair do crânio. Quando este mecanismo de compensação é exaurido, qualquer aumento maior de volume intracraniano irá causar um rápido aumento da PIC. Fluxo Sanguíneo Encefálico O volume total de sangue intracraniano é, aproximadamente, 4-4,5 ml/100 g de tecido cerebral, que, normalmente, está distribuído em 60% no lado venoso e 40% no lado arterial. O fluxo sanguíneo cerebral (FSC) é diretamente proporcional à pressão de perfusão cerebral (PPC) e inversamente proporcional à resistência vascular cerebral (RVC). A PPC é igual a pressão arterial média (PAM) menos a pressão venosa. Como, no homem, a pressão nos seios venosos é difícil de ser medida e ela corre paralela à PIC, considera-se a PPC igual à diferença entre a PAM e a PIC. Portanto, o FSC pode ser expresso na seguinte equação: AUTO REGULAÇÃO O FSC normalmente é mantido num nível relativamente constante pela auto regulação da RVC dentro de uma faixa da PAM (60 a 150 mmHg). Elevações da PAM são acompanhadas de vasoconstrição e diminuições da pressão arterial são compensadas com vasodilatação. Então, a RVC mantém o FSC estável, dentro dos seus limites de compensação, protegendo a perfusão cerebral das pequenas e moderadas variações fisiológicas da PAM. Entretanto, a auto regulação da RVC pode se tornar disfuncionante em certos estados patológicos, principalmente no trauma e na doença cerebrovascular. Nestas situações, o cérebro pode se tornar muito sensível mesmo a pequenas variações da PAM e da PPC. Uma outra consideração importante é que os limites da auto regulação podem mudar consideravelmente em pacientes com hipertensão arterial crônica, deslocando-se para a direita. Isto protege o cérebro de hiperperfusão nas situações com aumento sustentado da pressão arterial. Entretanto, torna o cérebro vulnerável à hipoperfusão com quedas agudas da pressão arterial, mesmo dentro dos níveis “normais”. PRESSÃO DE PERFUSÃO CEREBRAL (PPC) Condições associadas com PIC elevada podem estar associadas à redução da PPC. Isto pode resultar em isquemia cerebral focal ou global. Por outro lado, elevação excessiva da PPC pode levar a encefalopatia hipertensiva e edema cerebral, devido à quebra da auto regulação cerebral, principalmente se a PPC se elevar acima de 120-140 mmHg. Níveis maiores de PPC podem ser tolerados nos pacientes com hipertensão crônica. As reduções focais ou globais do FSC são responsáveis por muitas das manifestações clínicas de PIC elevada. RELAÇÃO DA HIC COM O FSC A HIC influi no FSC por meio de vários mecanismos. 1. O primeiro é a ação direta que a HIC exerce sobre os vasos encefálicos, acarretando diminuição dos seus diâmetros e, consequentemente, aumento da RVE. Essa redução do diâmetro vascular ocasiona queda do FSC e tem como resultado a anoxia cerebral. A redução do FSC e a anoxia provocam o acúmulo de CO2 que, por sua vez, funciona como agente Usuário Realce 16 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza vasodilatador. Essa vasodilatação age como mecanismo de defesa para permitir o aumento de afluxo de sangue ao encéfalo; porém, simultaneamente, a vasodilatação e o aumento do volume de sangue agravam a HIC. Resumindo: a ação direta da HIC sobre os vasos encefálicos provoca aumento da RVE e diminuição do FSC; seguem‑se vasodilatação, aumento do FSE e agravamento da HIC. 2. O segundo mecanismo pelo qual a HIC influi no FSC é o da elevação da PA, ou seja, a reação vasopressórica. A isquemia no nível do mesencéfalo ou bulbo, causada pelas hérnias encefálicas, parece ser a responsável pela reação vasopressórica. À medida que essa isquemia se acentua, ocorre o comprometimento dessa reação vasopressórica. A PA, caindo, diminui a diferença entre a PA e a PIC, o que acentua a isquemia cerebral. A falência desse mecanismo vasopressórico causa a morte. Manifestações Clínicas As manifestações clínicas da HIC podem ser divididas em gerais, focais e as síndromes de herniação. Sintomas gerais de HIC incluem: CEFALÉIA: provavelmente mediada por fibras dolorosas do trigêmio na dura- máter e nos vasos sanguíneos; VÔMITOS; DIMINUIÇÃO DO NÍVEL DE CONSCIÊNCIA, por pressão na substância reticular mesencefálica. Sinais de HIC incluem: PAPILEDEMA: por diminuição no transporte axonal do nervo óptico e congestão venosa; PARALISIA DE NERVOS CRANIANOS (principalmente do VI par); E A TRÍADE DE CUSHING: Hipertensão arterial; Bradicardia; Bradpnéia. A presença dessa tríade exige uma intervenção urgente, porque geralmente significa compressão grave do tronco cerebral. Os sinais focais (ou de localização) da HIC podem ser causados pelos efeitos locais de lesões com efeito massa ou pelas síndromes de herniação. As herniações ocorrem quando um gradiente de pressão se desenvolve entre duas regiões intracranianas. As localizações anatômicas mais comumente afetadas pelas hérnias encefálicas incluem as regiões subfalcina, transtentorial uncal, transtentorial central e tonsilar. O não controle imediato de uma HIC pode acarretar herniações progressivas e deterioração rostro-caudal, com sequelas neurológicas grave ou morte do paciente. 17 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza Diagnóstico e Tratamento A melhor terapêutica para diminuição da pressão intracraniana é a remoção de sua causa. O tratamento da HIC se faz a princípio diante da suspeita clínica, podendo então ser monitorado pela introdução de um cateter com um transdutor de pressão nos sistemas ventricular, subdural ou intraparenquimatoso. O cateter introduzido no sistema ventricular é o mais fidedigno por transmitir de modo mais homogêneo a pressão em toda a cavidade entra craniana, além de possibilitar drenagem estra de LCR como forma de tratamento para a HIC. Quando se identificar uma lesão definida (hematomas, tumores, etc), o tratamento mais adequado consiste na remoção dessa anomalia, sendo, nesses casos, todos os demais tipos de tratamento considerados adjuvantes. Entretanto, a identificação da causa da elevação da PIC nem sempre é possível, sendo muitas vezes multifatorial. Nessas circunstâncias, procedimentos clínicos e cirúrgicos para diminuiçãoda PIC devem ser adotados para a manutenção da pressão de perfusão encefálica (PPE). Manobras físicas, como elevação do decúbito e manutenção do pescoço e posição neutra, corroboram para a diminuição da PIC por facilitarem o retorno venoso cerebral, diminuindo a congestão e a quantidade de volume venoso intracraniano. A redução temporária da HIC pode ser obtida pela remoção do LCR por meio de punção lombar. Como a punção para retirada do LCR pode precipitar a ocorrência de hérnias encefálicas, está contraindicada nas HICs secundárias a processos expansivos unilaterais. Esse procedimento pode ser indicado nas hemorragias subaracnóideas, nas meningites e nas hidrocefalias comunicantes. Entretanto, tal conduta é possível somente em pequeno número de casos e o tratamento preferido nas hidrocefalias é a derivação intra ou extracraniana do LCR. Nas derivações intracranianas, o fluxo do LCR é desviado dos ventrículos para o espaço subaracnóideo. As derivações extracranianas são realizadas utilizando-se sistemas de derivação com válvula unidirecional interposta, desviando-se o fluxo do LCR das cavidades ventriculares para o átrio cardíaco ou para a cavidade peritoneal. As derivações extracranianas apresentam complicações frequentes relacionados com a obstrução do sistema e infecções. A derivação do LCR para o exterior também pode ser realizada. Os corticoides são amplamente empregados no tratamento da HIC pela sua propriedade de reduzir intensamente o edema cerebral que acompanha as neoplasias e inflamações, mas sua eficácia nos traumas cranioencefálicos é discutível. O tratamento neurocirúrgico para a PIC engloba, além de procedimentos para correção de hidrocefalia, ou seja, derivação do trânsito do LCR, procedimentos para excisão de processos expansivos e cirurgias para aumento da cavidade intracraniana pela remoção do envoltório ósseo (craniotomia descompressiva). 18 Distúrbios Sensoriais, Motores e Consciência Hanna Briza A cirurgia descompressiva externa consiste na retirada temporária ou permanente de fragmentos (retalhos) da calota craniana mais ou menos extensos. As craniectomias descompressivas extensas estão indicadas nas HICs graves consequências ao aumento difuso do encéfalo, como ocorre nos traumatismos cranioencefálicos (edema inchaço), infartos isquêmicos extensos, notadamente no território da artéria cerebral média, que se acompanham de edema. A cirurgia descompressiva interna consiste na retirada total ou parcial de processo expansivo intracraniano combinada, por vezes, com a remoção deliberada de parênquima nervoso não comprometido. A eventual remoção de parênquima cerebral normal justifica-se pela extrema gravidade Indicações de uma punção lombar A punção lombar tem indicações específicas, tanto como formas de terapêutica como de diagnóstico, suas principais indicações são: Administração de anestesia raquidiana e epidural; Diagnóstico de doenças infecciosas: meningite, encefalite, mielites; Diagnóstico de doenças inflamatórias: esclerose múltipla, Guillain-Barré; Diagnóstico de doenças oncológicas como leucemia; Diagnóstico de doenças metabólicas; Infusão de quimioterápicos e antibióticos. Entretanto, algumas são as contraindicações para a realização desse procedimento: Insuficiência cardíaca congestiva grave (por não tolerar o decúbito); Sinais de herniação cerebral (tomografia computadorizada pode ajudar a descartar o diagnóstico); Aumento da pressão intracraniana com sinais neurológicos focais (como papiledema a fundoscopia); Coagulopatia (risco maior de hematoma espinal, contraindicação relativa); Cirurgia lombar prévia com colocação de próteses/pinos (contraindicação relativa, a análise radiológica permite melhor avaliação da realização do procedimento).
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