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José de Alencar: O “Systema Representativo” INTRODUÇÃO José de Alencar foi uma importante figura brasileira do século XIX, famoso escritor, marcado na história brasileira como fundador do gênero literário de romance com temática nacional e também por ser patrono da cadeira da Academia Brasileira de Letras. No ramo da política também tem histórico notável, tendo sido eleito deputado e atuado como Ministro da Justiça. Seu livro “O Systema Representativo” é uma de suas grandes contribuições na área da política brasileira por trazer a importante pauta do sistema representativo proporcional para o Brasil. Sua obra é dividida 3 livros, cada um tratando sobre uma parte crucial das democracias representativas da sociedade moderna. O primeiro livro fala sobre a representação, o segundo sobre o voto, e o terceiro sobre a eleição. Nesse trabalho apresentarei as ideias de Alencar acerca da representação e relacionarei com o modelo atual adotado pela política brasileira. FALSEAMENTO DA REPRESENTAÇÃO José de Alencar critica os sistemas representativos modernos. Para ele, os antigos sistemas de representação direta onde as pessoas tomavam as decisões governamentais por si próprias realmente faziam jus a sua nomenclatura, porém os sistemas de delegação de soberania onde um grupo é eleito para tomar as decisões é equivocadamente chamado de representativo, pois somente a maioria decide quem serão os representantes políticos, enquanto a vontade da minoria é desprezada. Expresso no trecho “o domínio exclusivo da maioria e a annullação completa da minoria; eis portanto o pensamento iniquo e absurdo sobre que repousa actualmente o governo representativo” (ALENCAR, 1868). Por isso, diz o autor, a criação de freios e obstáculos para essa tirania da maioria é extremamente necessário, um exemplo disso seria a divisão do poder em executivo, judiciário e legislativo. (ALENCAR, 1868) Um modelo representativo que demonstra sanar um pouco desse problema seria a monarquia representativa. Onde se teria um pequeno grupo comandando as decisões, porém devido ao fato da oposição ser uma quantidade muito maior de pessoas, a minoria no poder teria que tomar cuidado com suas decisões, por isso o autor diz que mesmo a primeira vista possa parece ser uma tirania pior que o governo representativo de outros países, no final acaba sendo a mesma situação de uma democracia baseada na maioria que possui alguns freios para a tomada de decisões. O autor fala também sobre o tempo de permanência dos representantes escolhidos no poder, pois se eles ficarem durante muito tempo, a antiga maioria vai ter um poder não devido sobre a maioria mais recente, pois esta não teve poder de decidir seus representantes (ALENCAR, 1868). Para ele, o governo representativo atual restringiu as instituições públicas tentando conter o poder da maioria, e que por causa disso as discussões sobre métodos que dão atenção as minorias já se encontram em voga. DEMOCRACIA ORIGINÁRIA José de Alencar define o que ele considera uma sociedade ideal, a qual sociedade seria formada pela união perfeita das duas liberdades: a liberdade política - formada a partir do momento que as pessoas são absorvidas pelo todo social e formam a junção do Estado, formado não pela união de vontades particulares, mas sim pelo trabalho conjunto de cada indivíduo; e a liberdade civil – a qual versa sobre a proteção da individualidade de cada cidadão, onde mesmo todos estando unidos no Estado, permanecem como seres particulares com vontades próprias e ações pessoais. A sociedade ideal só é encontrada quando as duas liberdades são respeitadas igualmente, onde todos tem igual papel na formação do Estado, e nenhum indivíduo é privado minimamente de sua individualidade (ALENCAR, 1868). A real definição de um governo de todos por todos não significa uma vontade homogênea de todos que resultaria na unanimidade. Para ele, uma sociedade que possui como objetivo alcançar a unanimidade está presa na inércia das decisões. É necessário que haja o embate de vontades conflitantes para que a melhor decisão racional possa fluir dessa sociedade. Por isso a vontade coletiva é formada por todos os indivíduos da sociedade, dessa forma todas as diferentes opiniões foram ouvidas e tiveram um resultado melhor para o todo do que se somente parte tivesse sido levada em consideração (ALENCAR, 1868). A partir disso, se origina a crítica a sociedade contemporânea, pois esta é marcada pela vontade da maioria e acaba não expressando a vontade coletiva da sociedade. Mais uma vez José de Alencar se mostra contrário ao sistema majoritário e defende que uma sociedade pautada na vontade da maioria não pode se sustentar, pois a vontade da maioria é um resultado de vontades momentâneas, que não podem ser responsáveis por representar toda uma sociedade exatamente pelo motivo de serem fluidas. Por essa razão é necessário que se busque a vontade coletiva, pois ela é a base correta para a formação de um Estado. DEMOCRACIA REPRESENTATIVA Ao estudar como era a democracia direta ateniense, Alencar conclui que nos tempos atuais tal modalidade seria insustentável devido ao aumento populacional, uma solução seria o sistema representativo, porém como tal sistema foi corrompido e tornou-se um sistema representante das maiorias. Residindo a soberania solidariamente em toda a nação e formando-se da consubstanciação de todas as opiniões que agitão o povo, é evidente que um paiz só estará representado quando seus elementos integrantes o estiverem, na justa proporção das forças e intensidade de cada um (ALENCAR, 1868, p. 36). Nessa passagem o autor faz a defesa de um sistema representativo proporcional, para que todos possam ter a sua vontade representada. O sistema representativo tornou-se um sistema de delegação, onde uma parte da população elege uma pessoa, e tal pessoa deve representar somente as vontades desse grupo, caso desagrade quem o elegeu não será reeleito. Dessa forma, se tem no congresso apenas representantes de maiorias, interessados apenas em agradar seus eleitores. Para o autor, o correto seria que o Congresso fosse formado por representantes dos diversos grupos com diferentes opiniões, para dessa forma, formular decisões mais informadas e debatidas, como aquelas de Atenas. (ALENCAR, 1868). NOVOS SISTEMAS Em sua obra, ele apresenta os sistemas que tentaram resolver o problema da maioria, mas não foram bem sucedidos. Como este: O methodo restrictivo consiste na limitação das chapas. Em um certo numero de representantes o volante só póde eleger nome até dois terços da totalidade de modo que a apuração final apresente um resultado mixtu; duas partes de eleitos da maioria, e uma parle de eleitos da minoria (ALENCAR, 1868, p. 49). À primeira vista parece um bom sistema e que garantiria a representação das minorias, porém, quando analisado profundamente, observa-se que não causará uma representação realmente proporcional a população, pois só abre lugar para a representação de um grupo minoritário (ALENCAR, 1868). O votante de um circulo de tres deputados, tem direito a tres votos; e póde emprega-los, ou distributivamente em candidatos diversos, ou cumulativamente em um só candidato. Calculou o autor da innovação que a minoria, reconhecendo sua impotencia para eleger tres deputados, empregaria todos seus votos em um só candidato e assim obteria para elle um dos logares da lista (ALENCAR, 1868, pp. 51-52). Aqui se vê outra tentativa de resolução, mas também falha. Isso se deve ao fato tanto de ser impraticável quanto ao fato de o tamanho da população e sua divisão em grupos pode levar a resultados muito ruins, como o de a minoria não conseguir eleger nenhum candidato, ou de em um outro cenário a minoria conseguir se tornar maioria (ALENCAR, 1868). Cada ordem de interesses sociaes, teria o direito exclusivo de escolher seu orgãono parlamento. Os commerciantes, os agricultolres, os advogados, e todas as profissões, formarião seus comicios á parte para eleição dos seus deputados (ALENCAR, 1868, p. 53). Aqui está uma ideia análoga a divisão regional da representação e está disposta as mesmas falhas como a do efeito danoso da maioria agora em situações menores. Um outro defeito desse sistema é que seria uma representação escolhida usando somente a base material da sociedade e negligenciando outras áreas (ALENCAR, 1868). Qualquer que seja o numero. dos cargos a preencher, o cidadão só tem um voto. Assim a operação final desenhará não sómente as varias feições da maioria, como as gradações da minoria (ALENCAR, 1868, p. 54). Dessa forma é eleita uma quota mínima que os candidatos devem atingir para serem eleitos, esse sistema possui diversas falhas relativas aos números usados, como por exemplo podem haver muitos candidatos que não alcancem a quota mínima e outros que recebam votos demais que serão desperdiçados. Além disso, esse sistema tem várias limitações em relação ao tamanho da população o que acaba o tornando não aplicável a muitas sociedades (ALENCAR, 1868). Para Alencar o ideal é um governo representativo igualmente proporcional ao que se acha na população, e isso nenhum desses sistemas consegue garantir. O único método que chegaria perto de representar a vontade nacional seria o do voto unificado, que por haver um forte laço entre representante e representado seria uma boa adição a democracia, trazendo uma forte sensação de legitimidade para a escolha, pois o relacionamento direto traz uma identificação dos eleitores. Porém essa característica pode se tornar negativa a partir do momento que o eleito fica à mercê das paixões do povo em prol de se reeleger em vez de só um representante de suas ideias (ALENCAR, 1868). A GENUÍNA REPRESENTAÇÃO José de Alencar sugere agora o sistema de escolha de representantes que ele julga ser o mais adequado e que melhor pode fazer jus a representação política de uma sociedade como um todo. Esse sistema é bastante parecido com o sistema da unidade de voto, porém com uma crucial mudança, a quota mínima somente estabelece uma barreira para escolha de representantes, e não divide os blocos de votos igual o outro sistema fazia. Assim, o problema da fragmentação dos representantes é resolvida e se tem um sistema proporcional que permite a eleição de múltiplos representantes, os quais refletem exatamente a quantidade e divisão de diferentes grupos dentro da sociedade. (ALENCAR, 1868) Esse método tem duas características principais de acordo com Alencar: “1. Autonomia de cada partido ou opinião para escolha de seus representantes; 2. Toda a possivel latitude do voto afim de imprimir-lhe o rnaximo caracter nacional, desvanecendo as divisões locaes” (ALENCAR, 1868, p. 67). Ressaltando a importância de serem votações nacionais, para que a vontade coletiva como um todo possa ser alcançada, eliminando dissenções locais. CONCLUSÃO A crítica veemente de José de Alencar ao sistema exclusivamente majoritário é de suma importância para o debate do contexto representativo nacional. Sua preocupação com a presença das minorias na arena política, para que isso gere um debate mais apurado e que leve a melhores resultados. Vemos o fruto de seu trabalho hoje quando temos eleições majoritárias, mas que dão atenção a partidos minoritários na hora de dividir as sobras das cadeiras do Congresso. Apesar de estarmos distantes do modelo ideal defendido por Alencar, uma importante característica defendida por ele é hoje explicitada no uso de cláusulas de barreira, é o impedimento de grupos insuficientemente grandes representarem uma opinião que seria considerada nacional de entrar no âmbito do parlamento. BIBLIOGRAFIA ALENCAR, José. O Systema Representativo. B. L. Garnier, Edictor. Rio de Janeiro, 1868.
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