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AULA 12 – CALMON DE PASSOS Título: O futuro do Estado e do Direito do Estado - Democracia, Globalização e Neonacionalismo Autor: J. J. Calmon de Passos Na introdução, Calmon de Passos afirma que não há nenhum termo tão abrangente e ao mesmo tempo tão inespecífico quanto “globalização”. Dessa forma, o autor considera que globalização trata-se, simultaneamente, de um fato, tendo sido instrumentalizado como ideologia mas também encerra uma energia utópica que poderá promover transformações significativas no futuro. Em síntese, globalização é um fato, uma ideologia e uma utopia. Em primeiro plano, globalização seria um fato tendo em vista as mudanças significativas ocorridas ao longo da história e tão evidentes nos dias atuais. O aperfeiçoamento dos meios de telecomunicação e transporte, cada vez mais, proporcionam a superação de fronteiras – o que contribui para uma mais célere circulação de pessoas, mercadorias e informações. Ademais, a nova divisão internacional do trabalho tem contribuído para acentuar a rede de transferências de parte das operações de produção de um país para o outro – evidenciado também na expansão das multinacionais. Essa velocidade de circulação e a consolidação de uma mentalidade voltada para a obtenção de lucro acaba proporcionando, segundo o autor, uma fragilidade de instituições como os sindicatos. O Estado, portanto, estaria perdendo o seu papel. A globalização estaria inerente também a uma ideologia tecnocrática, que é a de nossos tempos, compartilhando com as demais ideologias a característica de tentar impedir a problematização do poder existente, mas se distingue radicalmente de todas as ideologias do passado por ser a única que busca esse resultado não mediante a legitimação de normas, mas através de sua supressão. O poder não é legítimo por obedecer a normas legítimas, como se pensava antes, sim por obedecer a regras técnicas, das quais não se exige que sejam justas, sim que sejam eficazes. A globalização seria ideologia também pelo fato de que esse processo vem se consolidando de forma heterogênea – nem todos os povos compartilham das mesmas condições e são inseridos igualmente nesse mundo globalizado – mas essas contradições sociais são camufladas. Em síntese, a globalização seria uma forma de manipular os homens em virtude do mercado. O autor afirma que nenhuma ideologia se consolida se não criar os seus mitos e no caso da conjuntura capitalista vigente o mito protagonista seria a economia de mercado mundializada, apontando para uma prosperidade geral e crescente, a par da progressiva consolidação e generalização da democracia, com o consectário da tutela da dignidade humana e de seus desdobramentos. Nesse sentido, o mito seria baseado na crença de que vivemos em uma sociedade de prosperidade, de que tudo está normalizado – camuflando as contradições sociais existentes. Calmon de Passos, em seguida, detalha acerca do mito da prosperidade geral e crescente. Através da exposição de dados e analisando questões relevantes – a participação dos países periféricos no comércio mundial e o quadro de fome mundial – refuta a existência de uma prosperidade geral e crescente. “Em termos de participação no comércio mundial, ao invés de ganhos, o que também tem ocorrido são perdas. A CEPAL, numa publicação intitulada Globalização e Desenvolvimento, registra dados que mostram ter havido declínio e não avanço na participação dos países periféricos em termos de comércio internacional. Os dados disponíveis são ainda mais alarmantes quando, apesar dos ganhos tecnológicos terem contribuído para o aumento da produção de alimentos, há no mundo, segundo dados da ONU, um número crescente de pessoas que passam fome. Assim, pode-se chegar a conclusão de que o problema não consiste na oferta mas, principalmente, na má distribuição de recursos, muitas vezes concentrados nas mãos de uma parcela privilegiada. O crescimento é, portanto, heterogêneo. No que diz respeito ao Estado Democrático de Direito, Calmon de Passos convoca a autoridade Atílio A. Boron, o qual afirma que a democracia se orienta tendencialmente para a integração de todos, conferindo aos membros da sociedade o status de cidadão, enquanto o mercado opera sob a base da competição e da “sobrevivência dos mais aptos”. Destarte, percebe-se que a lógica do mercado capitalista, baseada em um pressuposto de desigualdade, encontra-se distante de atender ao conceito de democracia. Ao longo das páginas 10 e 12, Calmon de Passos realiza um recorte histórico para retratar a consolidação do modelo de Estado que presenciamos nos dias atuais. Desse modo, ocorre uma recapitulação do rompimento do capitalismo com o sistema feudal e as desavenças entre monarquia e burguesia – quando essa segunda almeja a exercer, além do poder econômico, o poder político – culminando na destituição ou assassinato de reis. Ademais, a partir do século XIX, torna-se cada vez mais evidente o poderio da burguesia, que se sobrepôs a uma outra classe antagônica – o proletariado, acentuando os pressupostos de desigualdade. Apesar de criticar com veemência o cenário atual, Calmon de Passos considera inviável qualquer mudança em termos de sistema político-jurídico. De acordo com o professor, “pode-se falar em reformas e ajustamentos, com vistas à eficácia do modelo, jamais sendo possível cogitar-se de sua mudança ou superação”. Além disso, o autor concorda com a importância de um órgão institucionalizado – afastando-se, por conseguinte de ideais marxistas – “Se os ganhos tecnológicos, que podem ser expressos sinteticamente em termos de consequências, com o que se denominou da compressão tempo/espaço, possibilitam ao capitalismo avançar em sua vocação expansionista, levando-o a pensar na ‘planetarização do mercado’, isso o compele a também porfiar pela indispensável institucionalização de um centro de poder político, que gerencie esses novos interesses, monopolizando a produção e aplicação do direito bem como o uso legítimo de força”. Em seguida, Calmon de Passos afirma que a globalização não se trata de um fenômeno recente – evidenciado na extensão territorial expressiva dos impérios persa, macedônico e romano. Segundo o autor “a globalização é o nome novo com que se batiza esse velho encombrimento, quer das relações econômicas, quer dos empreendedores, quer da própria dominação econômica”. Pode-se inferir, além disso, que Calmon de Passos critica a atuação do Estado, considerando que a democracia possuía apenas uma existência formal. O Estado como conhecemos hoje estaria a serviço das classes dominantes - a crise de nossos tempos é uma crise de dimensão intelectual, moral e espiritual numa escala e numa premência sem precedentes na história da humanidade. A globalização política, no estágio atual dos acontecimentos, é uma perversa forma de dominação de poucos e detrimento de quase todos. Partindo desse pressuposto, “permanecemos, em que pese o discurso vigente, desiguais e divididos, diria mesmo que progressivamente mais desiguais, num mundo onde se tornou impossível estar sozinho e estar distante”, conclui o autor. Globalização e transnacionalização, em si mesmas, não são nem um bem nem um mal necessários, dependendo do modelo econômico que vier a ser institucionalizado e do processo político por meio do qual for institucionalizado. A tecnologia permitiu que o poder econômico e o poder político atuassem eficazmente num espaço maior e num tempo menor. O direito, enquanto processo, no espaço do mundo globalizado, será aquele que se revelar instrumentalmente adequado para otimizar o modelo econômico que for institucionalizado pela decisão política. É invocado também outro argumento de autoridade, o de Castoriadis, o qual afirma que o homem (como indivíduo) não pode fazer senão a sociedade que o faz. Nesse sentido, vale dizer: a sociedade será sempre o resultado dasoma de vontades humanas lúcidas e críticas, que tanto podem ser as vontades hegemônicas dos dominadores como a dos que construírem a vontade hegemônica de libertação. O saber produzido pelo Iluminismo não favoreceu o projeto emancipatório, engendrando, antes, a técnica e a ciência modernas, que mantêm com o seu objeto uma relação ditatorial. A razão que hoje se manifesta é uma razão instrumental, voltada para o controle totalitário do homem e da natureza, dogmatizando a sua visão da natureza e naturalizando os processos sociais, além de enxergar a história humana a partir de uma perspectiva sistêmica, isto é, regida por leis absolutas e imutáveis. Calmon Passos afirma que o homem estaria dominado, cada vez mais, por um poder impessoal, difuso, sem rosto e sem nome, típico de uma sociedade tecnológica – o homem como refém da tecnologia. Nesse sentido, o direito seria um mecanismo fundamental para a transformação da realidade vigente, mas esse direito não seria dado, mas sim construído. O direito não é dado, o direito é construído, tendo a finalidade de refletir sobre o homem, valorizando também a arte de indagar. O saber é resultante do homem que opera, estando o direito carregado de significado e de intenção. Calmon de Passos conclui afirmando, portanto, que cabe às próximas gerações, cada vez mais engajadas, a reinvenção do espaço público, visando a garantia do projeto emancipatório do homem.
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