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Elany Portela [introdução] A cirrose hepática é o estágio terminal de um processo crônico de agressão ao fígado, após a morte celular ocorre fibrose do parênquima hepático, o fígado perde sua arquitetura lobular passando a apresentar nódulos regenerativos. O fígado diminui de tamanho, sua superfície fica irregular e sua consistência fica aumentada. Seu fluxo sanguíneo é alterado causando hipertensão portal. Todas as suas funções são diminuídas, ocorrem complicações como ascite, feminilização (ginecomastia e perda de pelos, por causa da baixa de testosterona), hipertensão portal, circulação colateral, alterações de coagulação, icterícia entre outros. [||Caso|clínico||] Identificação: homem, 59 anos, natural de Paracatu-MG, comerciante. Queixa principal: “dor abdominal há 3 meses” História da moléstia atual: paciente refere aumento do volume abdominal há aproximadamente 4 meses. Relata também dor abdominal associada e 1 episódio de hemoptise e astenia progressiva. Nega febre e outros sintomas dignos de nota. História pregressa pessoal: paciente alcoolista há mais de 35 anos com cerca de 6 doses de pinga por dia e aumento considerável do consumo aos fins de semana. Nega tabagismo. Apresenta como doença crônica hipertensão arterial sistêmica utilizando de forma regular hidroclorotiazida 25mg (1-0-0) e nifedipina (1-0-1) História familiar: Pai e mãe com hipertensão arterial sistêmica. Esposa e filhos hígidos. Exame físico: - Aparência mais velha que sua idade - Icterícia (+++/++++) - Emagrecimento - Telangiectasia - Ascite - Ginecomastia - Varizes esofágicas - Rarefação de pelos - Abdome globoso, com circulação colateral visível (cabeça de medusa). Onda líquida detectável, Elany Portela macicez móvel e baço aumentado. - Leve edema depressível nos pés Avaliação laboratorial: anemia, trombocitopenia e tempo de protrombina elevado Ultrassonografia: fígado diminuído e heterogêneo [|||||||fígado||||||] O fígado possui múltiplas funções, é responsável por mais de 60 atividades: atua metabolismo de glicose, amônia, colesterol, hormônios masculinos, proteínas, atua na formação da bile e no armazenamento e formação do ferro, entre outras. O fígado é um órgão sólido com 40-60 cm e peso de 2-3 Kg (depende do tamanho e peso do paciente e da presença de patologias). Circulação do Fígado: O fígado consegue se auto regenerar, é possível fazer uma ressecção segura em caso de tumores. Esse órgão é um dos principais sítios de metástase (fígado, pulmão e cérebro são os principais). A unidade funcional do fígado é o lóbulo hepático (espaço porta, sinusoides, hepatócitos e veia centrolobular), por onde passa o sangue proveniente da circulação porta e sistêmica. A histologia do fígado lembra um hexágono, onde cada ponta tem um espaço porta e no meio tem-se os hepatócitos A tríade portal é composta por ramos da veia porta, artéria hepática e ducto biliar. Elany Portela Os ramos da artéria hepática terminam em sinusoides hepáticos. Entre o sinusoide e o hepatócito há um espaço chamado de Espaço Peri-sinusoidal de DISSE, nesse local encontram-se as células estreladas ou células de Ito. Núcleo grande com nucléolo evidente significa que a célula possui alta taxa de atividade, o que deixa o citoplasma róseo é a mitocôndria. Quando ocorre lesão no fígado ele responde de duas formas: fibrose e inflamação. As principais causas de cirrose são: hepatite (principalmente C) e alcoolismo. O álcool gera uma fibrose, que ocorre de dentro do espaço porta para fora. A fibrose sempre aumenta em direção ao próximo espaço porta, fazendo tramas fibróticas. Os espaços portas vão se ligando um ao outro, formando nódulos que se coalescem entre si através de uma trave fibrótica, o que resulta em cirrose. [|||etiologia|||] As causas da cirrose são: 1. Doenças metabólicas: galactosemia, esteato-hepatite não alcoólica, doença de Wilson, tirosinema, entre outros. 2. Vírus hepatotrópicos: hepatites virais, principalmente hepatite C 3. Etilismo 4. Fármacos e toxinas 5. Autoimune 6. Biliar: atresia congênita das vias biliares extra-hepáticas e estenoses adquiridas (colangite esclerosante primária, cirrose biliar primária e estenose cicatricial das vias biliares. 7. Cirrose criptogênica: de etiologia indefinida 8. Obstrução do fluxo venoso hepático: síndrome de Budd-Chiari e doença hepática veno-oclusiva, por exemplo. [|fisiopatologia|] As três principais características da cirrose são: comprometimento de grande parte do fígado, formação de pontes de septos fibrosos e presença de nódulos parenquimatosos, com um misto de hepatócitos senescentes e replicativos. No fígado hígido a matriz extracelular (MEC), formada por fibras colagenosas intersticiais, está presente somente na capsula hepática e ao redor das veias centrais. Os hepatócitos não possuem membrana basal, mas contêm uma delicada trama com colágeno tipo IV e outras proteínas que ocupam o espaço de DISSE. Na cirrose os componentes da MEC serão depositados nesse espaço de DISSE. Acredita-se que as células de Kupffer ativadas (tipo de macrófago do fígado) ou hepatócitos lesionados e células Elany Portela endoteliais sinusoidais produzem fatores inflamatórios. As células de Kupffer são ativadas ao sofrerem injúria de substâncias tóxicas (álcool, drogas, medicamentos, entre outros). Os fatores inflamatórios, como espécies reativas de oxigênio (ROS), fatores de crescimento e citocinas (TNF e IL-1), ativam as células estreladas perissinusoidais, que se transformam em miofibroblastos e produzem MEC (principalmente colágenos tipos I e III). As células estreladas estimuladas possuem a capacidade de se auto estimular através de citocinas e quimiocinas produzidas por ela mesma, como o fator de transformação do crescimento b (TGF-b). Os sinusoides normais têm células endoteliais fenestradas que permitem a livre troca de solutos entre o plasma e os hepatócitos. Com a deposição de colágeno no espaço de Disse, ocorre a perda de fenestrações dos sinusoides, levando ao espessamento da membrana basal e a uma alta pressão sinusoidal, além de reduzir a troca natural de solutos por esses espaços. Com o aumento da pressão intrasinusoidal, ocorre o desenvolvimento de shunts vasculares entre veia porta-veia hepática e artéria hepática-veia porta. Isso gera uma pressão anormal dentro do fígado e contribui para a disfunção hepática e a hipertensão portal. No decorrer da lesão hepática, ocorre síntese, deposição e reabsorção de componentes da MEC e com isso, é possível até a restauração da função hepática. No entanto, quando ocorre um remodelamento significativo e progressivo fígado perde sua capacidade regenerativa, levando a um quadro irreversível. As células hepáticas normais, são substituídos por nódulos parenquimatosos derivados de hepatócitos sobreviventes e de novos hepatócitos gerados. As células hepáticas regenerativas formam septos fibrosos ao redor dos nódulos. O sangue que circula dentro dos sinusoides não consegue entrar em contato com os hepatócitos e ter seus componentes metabolizados de forma eficiente. Vamos dividir, didaticamente, as alterações da cirrose em três classificações: vascular, endócrino e metabólico. Vascular O fígado recebe suprimento sanguíneo da veia porta, na cirrose há uma dificuldade de colocar o sangue para o fígado, porque a fibrose gera esse represamento de sangue de forma retrógrada (o sangue volta). A partir disso ocorre a hipertensão portal: aumento da pressão sanguínea na chegada do fígado devido à dificuldade do sangue portal em chegar ao parênquima hepático.Por causa disso o organismo responde com neoangiogenese, aparece a circulação colateral. As principais circulações colaterais são: periumbilical (cabeça de medusa), esofágica (varizes esofágicas) e hemorroidas. Cada uma dessas complicações tem um tratamento diferente. O paciente com varizes esofágica tem uma parede muito adelgaçada e muito fácil de estourar, principalmente em pico hipertensivo, podendo levar ao óbito. As varizes esofágicas são um dos principais motivos de óbitos em pacientes com cirrose. Outra complicação da hipertensão portal é a ascite, o sangue fica represado na Elany Portela veia porta e através da pressão osmótica ele começa a jogar linfa para o retroperitônio (TERCEIRO ESPAÇO). A linfa é um conteúdo líquido com menos soluto. Na ascite ocorre aumento abdominal intensa, a barriga é móvel (líquido). No piparote ocorre a propagação da onda, além disso ocorre macicez móvel. Pela macicez móvel é possível dizer quanto de líquido que está presente no abdome, o líquido pode ser retirado por paracentese. A hipertensão porta também causa edema, o líquido passa a extravasar para o subcutâneo, é gravitacional, ou seja, vai para os membros inferiores. Ocorre visceromegalia, o sangue “foge” do fígado e infiltra em outros órgãos, principalmente no baço, ocorrendo esplenomegalia. Endócrino É responsável pela metabolização do colesterol (precursor da testosterona), o paciente cirrótico produz menos testosterona, pois ele tem pouco colesterol. A diminuição da testosterona provoca feminilização: ginecomastia e perda de pelo. O metabolismo da bilirrubina também é afetado, ocorre acúmulo de bilirrubina na circulação, causando icterícia. O fígado também é responsável pela metabolização da amônia (relacionada ao metabolismo de proteínas). No paciente com cirrose há acúmulo de amônia no corpo, inclusive no cérebro, causando uma encefalopatia hepática (demência hepática). Além disso o metabolismo de proteínas fica deficitário, o paciente fica desnutrido. A cascata de coagulação está intimamente relacionada ao fígado, dessa forma a coagulação está afetada na cirrose, ou seja, se alguma das varizes esofágica se romper o paciente vai sangrar e não conseguirá coagular corretamente. Metabólico Com a desnutrição o paciente não consegue metabolizar praticamente nada relacionado ao alimento. O fígado possui estreita relação com o metabolismo de vitaminas, principalmente a cobalamina, que se relaciona com o metabolismo da vitamina D e B12. O paciente começa a ter anemia megaloblástica Principais causas de óbito: rompimento de varizes esofágicas, acúmulo de NH4 no cérebro (gerando coma) e anemia. Esses pacientes também possuem duas síndromes importantes: síndrome hepatorrenal e síndrome hepatopulmonar. Elany Portela
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