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Morfologia concisa para ensino superior: teoria e prática

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Sumário 
UNIDADE 1: Conceitos iniciais ................................................................................. 4 
o que é morfologia? ................................................................................................... 5 
formas linguísticas ..................................................................................................... 7 
morfema ..................................................................................................................... 8 
alomorfia .................................................................................................................. 13 
morfema zero ........................................................................................................... 15 
classificação dos morfemas ..................................................................................... 16 
raiz ........................................................................................................................... 17 
vogal temática .......................................................................................................... 19 
afixo ......................................................................................................................... 21 
desinência ................................................................................................................ 26 
estrutura nominal ..................................................................................................... 35 
estrutura verbal ........................................................................................................ 36 
base e raiz presa ....................................................................................................... 38 
contrastes ................................................................................................................. 40 
outros tipos de morfe ............................................................................................... 41 
oposições e neutralização ........................................................................................ 42 
modelos de análise mórfica 1 .................................................................................. 44 
exercícios ................................................................................................................. 48 
UNIDADE 2: morfologia e suas interfaces .............................................................. 50 
morfologia e fonologia ............................................................................................ 51 
morfologia e sintaxe ................................................................................................ 58 
morfologia e etimologia ........................................................................................... 60 
morfologia e ortografia ............................................................................................ 61 
morfologia e semântica ............................................................................................ 62 
modelos de análise mórfica 2 .................................................................................. 64 
exercícios ................................................................................................................. 67 
UNIDADE 3: a renovação lexical ............................................................................. 68 
o léxico e o dicionário .............................................................................................. 69 
o nascimento de um vocábulo .................................................................................. 71 
processos de formação de vocábulos ....................................................................... 76 
derivação .................................................................................................................. 78 
o problema da derivação regressiva ......................................................................... 83 
abreviatura ............................................................................................................... 85 
composição .............................................................................................................. 86 
onomatopeia ............................................................................................................. 87 
subprocessos de formação ....................................................................................... 89 
modelos de análise mórfica 3 .................................................................................. 90 
exercícios ................................................................................................................. 93 
UNIDADE 4: a flexão ................................................................................................ 94 
flexão nominal ......................................................................................................... 95 
flexão verbal ............................................................................................................ 99 
a questão do grau ................................................................................................... 103 
modelos de análise mórfica 4 ................................................................................ 104 
exercícios ............................................................................................................... 106 
Respostas dos exercícios .......................................................................................... 107 
Bibliografia ............................................................................................................... 113 
 
 
 
 
 
 
 
 
UNIDADE 1: 
Conceitos iniciais 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 5 
 
O QUE É MORFOLOGIA? 
 
 Na intenção de produzir uma obra clara, concisa e direta, explicarei rapidamente 
o que é a morfologia. 
 Sabemos que a língua é analisada das unidades mais simples às mais complexas. 
Uma lista quase completa dessas estruturas é esta, de modo que o fonema é a mais 
simples e o texto é a mais complexa. 
 
Texto 
Frase 
Oração 
Sintagma 
Vocábulo 
Morfema 
Fonema 
 
CONCEITOS 
 
Talvez você não saiba alguns detalhes dessa lista. Primeiro, veremos mais adiante que 
vocábulo e palavra não são a mesma coisa (na verdade, a palavra é um tipo de 
vocábulo), mas, para todos os efeitos, vocês podem considerar que o sejam por 
enquanto. Além disso, não incluímos período nessa lista, porque entendemos que 
período é um exemplo de frase verbal, portanto ele entra no grupo das frases. 
 
 Alguns autores fornecem definições para a morfologia: “O objeto de estudo da 
morfologia costuma concentrar as atenções do professor e do pesquisador em duas 
‘frentes de trabalho’. De um lado, está a palavra; de outro, estão os seus elementos 
constituintes.” (HENRIQUES, 2014, 1). Perceba-se que a morfologia é, 
simplificadamente, o estudo dos morfemas e dos vocábulos. No Megamanual de 
morfologia do português, encontra-se a seguinte definição: “a morfologia, como área 
de pesquisa, por sua vez, estuda e analisa os vocábulos, desde sua constituição e 
depreensão em unidades menores até a sua classificação em categorias lexicais” 
(GANDULFO, 2021, 5). 
 Ainda devemos ter noção de que os planos gramaticais são abstratos e acessíveis 
somente no plano mental. Existe uma competência morfológica a que todos nós temos 
acesso na nossa língua materna, e essa competência é natural e intuitiva. Por exemplo, 
você pode não saber o que são substantivos, adjetivos, artigos, verbos. Mas você 
percebe que a formação exato > exatamente é correta, mas casa > casamente não. Além 
disso, uma criança pode conjugar erroneamente o verbo fazer como eu fazi, no pretérito 
perfeito; entretanto, essa conjugação, ainda que esteja errada, foi bem pensada: pela 
regra de vend-er > vend-i// cresc-er > cresc-i // entend-er > entend-i // perd-er > perd-
i // prend-er > prend-i, a criança entendeu que a conjugação de faz-er fosse faz-i, 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 6 
 
tratando o verbo como regular. Isso é evidência de um conhecimento morfológico 
internalizado. 
 Mas, Roberto, o que são esses morfemas aí? Vamos chegar lá em breve... 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 7 
 
FORMAS LINGUÍSTICAS 
 
 O conceito de forma linguística é citado em obras gramaticais: “um ou mais 
fonemas providos de significado” (MACAMBIRA, 1987, 17). A classificação dessas 
formas foi estabelecida por Bloomfield e atualizada por Mattoso Câmara – que incluiu 
entre elas as formas dependentes. 
 Acho importante que você, leitor, entenda até que ponto algo é forma ou não. 
Para isso, você precisa entender o que é autonomia fonológica e autonomia 
morfológica. 
 Você pode perceber que as palavras casa, irmã e céu têm uma sílaba tônica: 
/ca/, /mã/ e /céu/, respectivamente. No entanto, a partícula que é átona. Perceba que, na 
frase “Ele sabe que eu posso sair”, a sequência que eu é pronunciada de uma só vez 
(/kew/), porque o que é átono. As formas que possuem sílaba tônica, como as primeiras, 
são fonologicamente autônomas; as que não a possuem, como o que, não são 
fonologicamente autônomas. 
 Além disso, algumas formas nunca vêm separadas no discurso, e aparecem 
obrigatoriamente ligadas a uma outra forma. Quando comparamos fazer com refazer, 
percebemos que a forma [re] significa de novo, novamente; porém, essa forma sempre 
aparece grudada com outra: reescrever, reproduzir, reimprimir. Ela nunca aparece 
isolada no discurso, somente como re–. Outras formas, como casa, aparecem isoladas 
no discurso: aquela casa é linda, comprei uma casa, estou em casa. Essas formas que 
aparecem separadas das demais no discurso são formas morfologicamente autônomas. 
As outras, como re–, não são morfologicamente autônomas. 
 Agora, vamos à classificação das formas. As formas linguísticas podem ser 
presas, dependentes ou livres. Formas presas são aquelas que não têm autonomia 
morfológica, isto é, que sempre vêm “grudadas” em outra forma no discurso. Essas 
formas são os morfemas, que estudaremos mais à frente, e podem ou não ter autonomia 
fonológica. Por exemplo, o prefixo pré– em pré-história, é fonologicamente autônomo, 
porque possui sílaba tônica; já re– em refazer não é fonologicamente autônomo, porque 
é átono. Formas dependentes possuem autonomia morfológica, mas não fonológica. 
É o caso das partículas átonas: conjunções, preposições, artigos, pronomes oblíquos 
átonos. Formas livres são aquelas com autonomias morfológica e fonológica. É o caso 
dos substantivos, dos verbos, dos adjetivos, dos pronomes em geral, dos advérbios em 
geral, dos numerais em geral. 
 Quanto à ideia de vocábulos e palavras, as formas não presas (ou seja, pelas 
dependentes e pelas livres) são vocábulos. As formas livres são palavras. Então, 
dizemos que as formas dependentes são vocábulos sem status de palavra, enquanto as 
formas livres são vocábulos com status de palavra. 
 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 8 
 
MORFEMA 
 
 Para que você, leitor, tenha um mínimo de aporte teórico, vou elencar aqui as 
principais definições de morfema. 
 Para Evanildo Bechara, “Chama-se morfema a unidade mínima significativa 
ou dotado de significado que integra a palavra” (BECHARA, 2019, 360). Para Celso 
Cunha, “A essas unidades significativas mínimas dá-se o nome de morfema” 
(CUNHA, 2016, 90). Para Rocha Lima, “Cada um desses morfemas representa a 
menor unidade de significação que pode figurar numa palavra.” (LIMA, 2019, 241). 
Para Amini Boainain Hauy, “Como componentes formais da palavra, os morfemas são 
elementos estruturais indecomponíveis e unidades mínimas de significação, que não 
admitem, portanto, subdivisão em unidades significativas menores” (HAUY, 2015, 
475). Para Fernando Pestana, Morfema é a menor parte significativa que constitui uma 
palavra” (PESTANA, 2019, 107). Para Napoleão Mendes de Almeida, "Morfema é o 
elemento linguístico que mostra as relações entre as ideias (é o prefixo, o sufixo, a 
desinência, a preposição, a conjunção, o verbo auxiliar, a intonação, a acentuação, a 
ordem dos termos etc.)" (ALMEIDA, 1965, 350). Para Celso Pedro Luft, "Esses 
constituintes estruturadores das palavras são os morfemas: as menores unidades 
significativas, significantes mínimos, indivisíveis" (LUFT, 1974, 90). Para Luiz 
Antonio Sacconi, “Dá-se o nome morfema ao elemento linguístico que, isolado, não 
possui valor, servindo apenas para relacionar semantemas na oração, para definir a 
categoria gramatical (gênero, número, pessoa), etc.” (SACCONI, 1989, 79). Para 
Valter Kehdi, “Entre os morfemas e os fonemas, há uma diferença qualitativa: 
enquanto aqueles são significativos, estes são distintivos” (KEHDI, 2007, 16). Para 
José Lemos Monteiro, “Num conceito restrito, reserva-se o termo morfema aos 
elementos que se opõem ao semantema, e este se refere à parte fundamental ou núcleo 
significativo do vocábulo” (MONTEIRO, 2002, 14). Para Flávia de Barros Carone, 
“A menor unidade significativa, como vimos a propósito do texto de Mário de Andrade, 
é o morfema, que tem a propriedade de articular-se com outras unidades de seu próprio 
nível” (CARONE, 1988, 21). Para Inez Sautchuk, “O morfema constitui um elemento 
estrutural da língua cuja função é nomear os três elementos básicos desse mundo 
[objetos, qualidades e ações] ou relacioná-los” (SAUTCHUK, 2018, 4). Para Maria 
Carlota Rosa, “Cada morfema é um átomo de som e significado – isto é, um signo 
mínimo” (ROSA, 2019, 95). Para Carlos Alexandre Gonçalves, "A rigor, então, o 
morfema é a menor unidade formal de uma língua" (GONÇALVES, 2019, 26). Para 
Bloomfield, morfema é “uma forma recorrente (com significado) que não pode ser 
analisado em formas recorrentes (significativas) menores” (BLOOMFIELD, 1966, 27). 
 No Megamanual de morfologia do português, você encontra a seguinte 
definição: “morfema é a menor unidade linguística dotada de significação própria” 
(GANDULFO, 2021, 21). 
 O estudante deve saber perfeitamente o que é morfema, porque ele é a unidade 
de estudo da morfologia. E ele ainda deve saber diferenciá-lo do morfe. Vamos, então, 
entender esses conceitos. 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 9 
 
 Você deve entender, antes de mais, que o morfema é uma unidade abstrata 
com a qual nós realizamos várias operações gramaticais, para criar palavras novas, por 
exemplo. O nosso cérebro trabalha morfologicamente com morfemas. Além disso, o 
morfema é uma unidade indivisível, portanto você não consegue criar dois morfemas a 
partir de um só. O morfema deve ser, por natureza, indivisível. 
 Outra característica do morfema é a significação. Todo morfema é dotado de 
significação, mas não confunda significação com sentido! Essa significação pode ser 
semântica, lexical (e então, sim, ela tem a ver com sentido), ou pode ser funcional, 
gramatical (e enão não tem conteúdo semântico). Vejamos o seguinte exemplos: 
agronegócio. Nessa palavra, podemos identificar o elemento [agro], que significa 
agrário, na zona rural. Esse morfema tem um papel semântico evidente. No entanto, 
em menina, o [a] é apenas um indicador do gênero feminino; por conseguinte, ele não 
possui valor semântico, mas sim papel gramatical. 
 Então, já entendemos que o morfema é indivisível e significativo. Agora, nós 
temos de ser capazes de identificar um morfema numa palavra. Como fazemos isso? 
 A divisão de um vocábulo em morfemas se chama análise mórfica, e a principal 
técnica de análise mórfica é a comutação. Assim, para encontrar um morfema, você 
deve comparar o vocábulo com outros da mesma espécie até chegar à mínima divisão. 
 Vamos analisar, como exemplo, a palavra orçamento. É possível que troquemos 
o –o final por –ário: orçament-o > orçament-ário. Descobrimos o primeiromorfema: 
orçament[o]. Agora, sabemos que orçamento vem de orçar (orçamento é o ato de 
orçar), então orça-r > orça-ment-o. Descobrimos mais um morfema: orça[ment][o]. 
Se orçamento vem de orçar, há a conjugação eu orço (do verbo orçar), o que comprova 
mais um morfema: orç-o > orç-a-mento. Há agora mais um morfema: orç[a][ment][o]. 
Por fim, sabemos que não existe palavra mais simples para orçar, ou seja, não 
encontramos nenhuma outra palavra que originou orçar. Portanto, assumimos que o 
[orç] seja um morfema também, porque ele não pode ser dividido. Assim, há quatro 
morfemas: [orç][a][ment][o]. 
 Esse é o jogo da análise mórfica. Você vai comparando palavras até chegar à 
análise final. Veja só um exemplo mais simples: como dividimos casa? Ora, simples! 
cas-a gera cas-inha. Então, o [a] é morfema. Como a palavra casa é primitiva, o [cas] 
é indivisível, então ele também é um morfema. A análise de casa é, portanto, [cas][a]. 
 Vamos a um exemplo um pouco mais complicado: descentralização. Quando 
você se deparar com uma palavra assim, muito complexa, tente procurar a mais 
primitiva de onde ela veio? Descentralização vem de centralização, central, centro... 
centro! Exatamente. Descentralização vem de centro. Agora, vamos explicar como 
centro se tornou descentralizar, etapa a etapa. 
 
centro > central > centralizar > descentralizar > descentralização 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 10 
 
 Quando nos habituamos a explicar como a forma primitiva gerou a derivada, 
mais complexa, conseguimos ver mais nitidamente os morfemas. Veja o primeiro 
processo: 
 
centr-o > centr-al 
 
 Já podemos concluir algumas coisas. Por centro ser palavra primitiva, aquele 
[centr] é indivisível e, portanto, é um morfema. Além disso, [o] é um morfema que 
alternou com [al]. 
 
central > central-izar 
 
 Agora devemos tomar cuidado, que [izar] não é um morfema. Por exemplo, com 
centralizar podemos formar eu centralizo (central-iz-ar > centraliz-o). Aqui 
descobrimos que [iz] é um morfema, porque ele fica isolado entre [central] e [o]: 
[centr][al]iz[o]. Além disso, o [r] de centralizar pode alternar com [do]: centraliza-r 
> centraliza-do. Isso mostra que o [r] é um morfema e que o [a] também é um morfema: 
[centr][al][iz][a][r]. 
 
centralizar > descentralizar 
 
 Essa foi fácil! O elemento [des] é um morfema que foi adicionado à palavra 
centralizar. Esse morfema significa fazer o oposto; assim, descentralizar significa fazer 
o oposto de centralizar, ou seja, tirar do centro. 
 
descentraliza-r > descentraliza-ção 
 
 Agora, aquele morfema [r] deu o lugar para [ção], que também é um morfema, 
porque não pode ser dividido. Agora chegamos à análise final: 
[des][centr][al][iz][a][ção]. 
 
* * * * * 
 
 Agora que aprendemos a dividir morfemas, vamos aprender a diferença entre 
morfe e morfema. 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 11 
 
 Já sabemos que morfema é a m[inima unidade abstrata linguística significativa. 
O morfe é, então, a estrutura fonológica que preenche esse morfema. Como assim? 
 Para explicar esse conceito, eu costumo usar algo que chamo de analogia das 
caixas. Imagine você uma caixa que contém um monte de sons. Bem, nessa ideia, o 
morfema é a caixa, e o morfe é o conteúdo da caixa. Por exemplo, na palavra centro, 
vimos que [centr] é um morfema, e ele é um morfema porque ele tem uma função na 
palavra e uma posição para preencher. Porém, esse morfema é preenchido pelos sons 
/s’ẽtru/. Veremos mais à frente que os morfemas são classificados quanto à função e 
quanto à posição, mas o morfema é apenas a unidade, o espaço a ser preenchido; o 
morfe é o que preenche o morfema, é o som. Essa divisão é importante para 
entendermos o que é o morfema zero e a alomorfia mais à frente. 
 
* * * * * 
 
 Antes de passarmos ao próximo tópico, acho interessante tratar da visão de 
Andrew Spencer sobre os morfemas. Ele, na obra Morphological Theory, explica o 
mapeamento de morfemas, e afirma que existem duas metáforas que os linguistas 
utilizam para elucidá-lo: 
 
“One is to regard morphemes as things which combine with each other to 
produce words. In this metaphor, a morpheme is a bit like a word, only 
smaller, and the morphology component of a grammar is a bit like syntax in 
that its primary function is to stick the morphemes together. The other 
metaphor regards morphemes as the end product of a process or rule or 
operation. Here, it is not the existence of the morphemes that counts but 
rather the system of relations or contrasts that morphemes create” 
(SPENCER, 1991, 12). Tradução: Uma diz respeito aos morfemas como 
coisas que se combinam para produzir vocábulos. Nessa metáfora, um 
morfema se assemelha a um vocábulo, mas menor, e o componente 
morfológico de uma gramática se parece com a sintaxe, cuja função 
principal é unir os morfemas. A outra metáfora se refere aos morfemas no 
produto final de um processo, de uma regra ou de uma operação. Aqui, não 
é a existência do morfema que vale, mas o sistema de relações ou contrastes 
que os morfemas criam. 
 
 Spencer, diferentemente dos morfologistas brasileiros, mostra a ideia de que o 
morfema não necessariamente é preenchido por um morfema (ou seja, nem sempre ele 
será uma “coisa” concreta, como avalia no texto), mas sim pode ser uma regra. Os 
morfologistas brasileiros não apresentam essa ideia explicitamente porque o morfema 
como regra não é muito frequente no português, embora ocorra em alguns casos. Veja-
se, por exemplo, o caso de avô-avó. O feminino de avô não é realizado por nenhum 
morfe concreto: na verdade, a passagem de avô para avó é resultado de uma metafonia, 
de uma regra que forçou a mudança de timbre da vogal (de fechado para aberto). Nesse 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 12 
 
caso, o morfema que indica o gênero não pode ser identificado estruturalmente na 
palavra; ele é uma regra que provocou uma mudança fonológica na palavra. 
 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 13 
 
ALOMORFIA 
 
 Aprendemos há pouco que o morfema é uma unidade abstrata e que o morfe é 
a estrutura fonológica que o preenche. Bem, a alomorfia é, então, definida como a 
variação de morfe para o mesmo morfema. 
 Acontece que, em virtude de fenômenos etimológicos ou fonológicos diversos, 
um morfe se altera sem que o morfema perca sua função ou seu papel. Por exemplo, na 
palavra pedra é primitiva e, por comparação com pedr-inha, sabemos que ela possui 
dois morfemas: [pedr][a]. No entanto, pedra gera a palavra petrificar, que pode ser 
dividida da seguinte forma [petr][ific][a][r]1. Perceba-se que os morfemas [pedr], de 
pedra, e [petr], de petrificar, têm exatamente a mesma função. É comum que algumas 
palavras busquem raízes etimologicamente mais antigas para executar algumas 
derivações. É o caso de pedra-petrificar, vida-vital e outros. 
 Dizemos, então, que aquele morfema sofreu alomorfia, ou seja, mudou de 
forma, mas continua sendo o mesmo morfema, porque não perdeu sua significação nem 
seu papel. A alomorfia não pode ser pormenorizada por enquanto, contudo, à medida 
que virmos os tipos de morfema, estudaremos mais profundamente o fenômeno da 
alomorfia. 
 O problema todo é que fica difícil analisar uma palavra se a forma do morfema 
mudou, certo? Como fazemos a análise mórfica, então? 
 Vamos tomar por exemplo a palavra legal (no sentido de estar dentro da lei). É 
evidente que legal vem de lei, certo? Afinal, percebemos uma relação semântica e 
morfológica entre ambas. No entanto, um estudante desatento pode pensar que, 
comparando-se ambas as formas, a divisão de legal seja le-i > le-gal. Essa divisão, 
porém, está incorreta, porque sabemos que o sufixo formador de adjetivos relativos a 
um substantivo é [al]: pesso-a > pesso-al, indústri-a > industri-al. A única variação 
desse sufixo é [ar], quando ele se associa a uma palavra com –l em geral: sol > solar, 
escola > escolar, anel > anelar.Não há a variação [gal]. Logo, por conhecer o elemento 
[al] (que mais à frente veremos que é um sufixo), sei que legal se divide como [leg][al], 
de modo que os morfemas [leg] e [le], de lei, são alomórficos. 
 Por mais que alguns professores sejam contrários a essa ideia, uma parte do 
entendimento teórico da morfologia está associada à habilidade de memorização. É 
importante decorar os prefixos e os sufixos da língua porque, assim, a análise mórfica 
fica mais apurada. Por saber e decorar o sufixo [al], analisei mais corretamente legal. 
 
* * * * * 
 
 
1 A demonstração dessa análise fica a cargo do leitor. 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 14 
 
 A última coisa que eu acho importante ressaltar neste capítulo é a ideia de que 
morfe é som. Aprendemos isso no tópico anterior: morfe é a estrutura fonológica 
(entenda-se sonora) que preenche o morfema. Agora, atente a este exemplo: feliz > 
felicidade. Algum principiante pode pensar que houve alomorfia nesse caso, porque o 
z de [feliz] se tornou c em [felic][idad][e]2. Na verdade, isso é um erro, porque o z de 
feliz e o c de felicidade têm exatamente o mesmo som. 
 A letra c antes de e ou i assume o fonema /s/, e a letra z em fim de sílaba também 
representa o fonema /s/. Portanto, tanto o z quanto o c assumem o mesmo fonema, o 
mesmo som. Se se trata do mesmo som, então não houve alomorfia simplesmente 
porque a forma (o som) não mudou. Nós apenas escrevemos de maneira diferente, mas 
os morfemas [feliz] e [felic] têm exatamente o mesmo som. Não houve alomorfia. 
 
 
 
2 O sufixo é [dade], que pode variar para [idade] e [edade]: leal-dade, real-idade, 
honest-idade, seri-edade, comun-idade. 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 15 
 
MORFEMA ZERO 
 
 Agora vamos entender um pouco sobre o morfema zero. Se o morfe é a estrutura 
fonológica que preenche o morfema, um morfema zero é aquele que não é preenchido 
por nenhum morfe. 
 Por enquanto ainda é complicado explicar o morfema zero com exemplos 
concretos, porque ainda não estudamos os tipos de morfema. No entanto, existe uma 
regra que determina que toda mudança de classe é mediada por uma derivação, ou seja, 
se uma palavra de uma classe quer ser empregada em outra, deve obrigatoriamente 
ocorrer uma derivação (prefixal, sufixal, parassintética, conversiva... estudaremos isso 
mais adiante). E a derivação, no mais das vezes, é realizada por afixos (que são 
morfemas). Então, veja um exemplo: flor é substantivo, mas quero empregá-lo como 
verbo. Posso realizar uma derivação sufixal e formar flor-esc-er, com a adição dos 
morfemas [esc], [e] e [r], ou floriscar, com os morfemas [isc], [a] e [r]. Agora, o que 
acontece com florar? Nas formações florescer e floriscar, adicionaram-se três 
morfemas: o primeiro ([esc] e [isc]) é o afixo que mediou a derivação, os outros dois 
([e] e [a] e [r]) são típicos da terminação dos verbos infinitivos. No caso de florar, não 
podemos dividir simplesmente como flor-a-r, porque falta à estrutura o afixo que 
mediou a derivação: flor-Ø-a-r. É daí que surge a ideia do morfema zero: o contraste 
entre estruturas semelhantes evidencia a existência desse morfema. 
 Vamos a mais um exemplo. Os nomes variáveis em gênero têm uma projeção 
do gênero por um morfema (chamado desinência de gênero). No caso de professor-a, o 
[a] é uma desinência de gênero feminino, porém, em professor-Ø, a palavra é 
masculina, mas aquele morfema que indica o gênero está vazio. 
 Mas por que não podemos simplesmente supor que esse morfema não está lá? 
 Porque esse nome varia em gênero, então existe um morfema que indica essa 
variação. O fato de esse morfema não ser preenchido é um indicador de que ele está no 
masculino: professor[Ø] > professor[a]. 
 Nós estudaremos melhor os casos de alomorfia e de morfema zero em cada tipo 
de morfema. 
 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 16 
 
CLASSIFICAÇÃO DOS MORFEMAS 
 
 No português, conhecemos quatro tipos de morfema: raiz, vogal temática, 
afixo e desinência. Neste tópico, vamos introduzir o assunto para compreender essa 
classificação que será pormenorizada posteriormente. 
 Primeiro, devemos entender que todo vocábulo, por mais simples que seja, 
possui um morfema básico, que lhe concede o sentido inicial. Então, conhecemos 
vocábulos constituídos de um só morfema (ignorando-se os zeros), como flor e mar. A 
partir de flor, podemos gerar floricultura, florescer, florar, florzinha, floreio. Todas 
essas palavras fazem parte da mesma “família”, porque possuem o mesmo sentido 
básico, que foi modificado por outros elementos periféricos. Então, há um morfema, 
em todas essas palavras, responsável por indicar o sentido inicial de todos os vocábulos, 
e há outros para modificar esse sentido inicial. 
 Por exemplo, fazer possui um morfema que indica o sentido inicial: [faz]. 
Podemos acrescer a esse vocábulo morfemas periféricos responsáveis pela modificação 
do sentido. No caso de refazer, o elemento [re] altera o sentido, de modo que refazer 
significa fazer de novo. 
 Agora, em outra via, conhecemos o verbo cant[a]r e vend[e]r. Esse morfema 
destacado tem alguma função, porque, quando conjugamos cantar no pretérito perfeito, 
obtemos cant-ar > cant-ei, mas, com vender, formamos vend-er > vend-i (e não vend-
ei). Aparentemente, essa vogal antes do r em verbos infinitivos indica como deve ser 
efetuada a conjugação; portanto, esse morfema não tem valor semântico, mas sim 
gramatical. 
 Isso mostra que esses morfemas têm funções diferentes e são classificados 
diferentemente. 
 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 17 
 
RAIZ 
 
 Aquele morfema que vimos que está presente em todas as palavras de uma 
mesma “família” se chama raiz (ou morfema lexical, ou morfema nuclear). A raiz (R) 
é o morfema responsável por designar o sentido e a classe iniciais do vocábulo: flu-ir, 
in-flu-ir, flu-ência, in-flu-ente, in-flu-enciar. 
 Quando duas palavras possuem a mesma raiz, dizemos que elas são cognatas. 
O conjunto formado por todas as palavras cognatas a uma primeira é chamado de grupo 
lexical (ou família de palavras para alguns gramáticos). Por exemplo, a partir de pedr-
a, podemos encontrar vários cognatos: pedr-inha, petr-ificar, pétr-eo, pedr-eiro, em-
pedr-ar, a-pedr-ejar. O conjunto constituído por pedra e por todos os seus cognatos 
forma um grupo lexical: {pedra, pedrinha, petrificar, pétreo, pedreiro, empedrar, 
apedrejar...}. 
 Vamos aos exemplos. Ocorre alomorfia na raiz? Sim! Os exemplos são vários: 
 
árvore > arborizado ([arvor]~[arbor]) 
cão > canil ([cã]~[can]) 
estado > estatal ([estad]~[estat]) 
estômago > estomacal ([estomag]~[estomac]) 
fruta > frugal ([frut]~[frug]) 
ler > legível ([l]~[leg]) 
lei > legal ([le]~[leg]) 
nariz > narigudo ([nariz]~[narig]) 
ordem > ordinário ([ordem]~[ordin]) 
pedra > petrificar ([pedr]~[petr]) 
poder > possível ([pod]~[poss]) 
touro > taurino ([tour]~[taur]) 
vida > vital ([vid]~[vit]) 
ouro > áureo ([our]~[aur]) 
nadar > natação ([nad]~[nat]) 
 
 Além disso, a raiz pode ser zero? Nos artigos definidos, a raiz é zero. Esse é o único 
caso em que a raiz é zero. Perceba que, quando se passa o para o feminino, a, nenhuma parte 
da palavra é mantida, por isso a raiz é zero: Ø-o > Ø-a, Ø-os, Ø-as. 
 
O VERBO IR 
 
Sobre o verbo ir, há a seguinte referência: “a vogal temática de ir é zero, em 
consequência de crase” (MONTEIRO, 2002, 127). Como veremos a seguir, essa 
afirmação implica entender que a raiz de ir é [i]. Portanto, o verbo ir tem um morfema 
zero, que é a vogal temática, e não a raiz: [i][Ø][r]. 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 18 
 
* * * * * 
 
 Agora, vamos discutir a noção de radical. A maioria dos gramáticos 
normativos, na verdade, distinguem radical e raiz de maneira diferente daquela como 
os morfologistas fazem.Para a gramática normativa, o radical é o morfema nuclear ou lexical (que 
chamamos aqui de raiz), e a raiz é, na verdade, um resquício etimológico que conecta 
palavras com um antigo vínculo etimológico (no latim, por exemplo). Então, a raiz é 
um conceito etimológico, diacrônico, e não sincrônico. 
 Para os morfologistas em geral, a raiz é o morfema lexical ou nuclear, e o nome 
radical significa, basicamente, o conjunto formado pela raiz e pelos afixos da palavra 
(estudaremos os afixos mais à frente). Por exemplo, descentralizar, que vimos 
anteriormente, tem [centr] como raiz e [descentraliz] como radical (porque [a] e [r] não 
são nem raízes, nem afixos). Alguns autores, ainda, falam sobre a progressão do 
radical, da seguinte forma: 
 
[centr]o (radical primário) 
[central] (radical secundário) 
[centraliz]ar (radical terciário) 
[descentraliz]ar (radical quarternário) 
[descentralizaçã]o (radical quinário) 
 
 Portanto, alguns autores, como José Lemos Monteiro, também entendem que outra 
definição para raiz é radical primário, uma vez que o radical primário sempre será a própria 
raiz. 
 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 19 
 
VOGAL TEMÁTICA 
 
 A ideia da vogal temática (VT) é confusa entre os morfologistas, porque há 
várias controvérsias quanto às suas explicações. De todo modo, a noção geral é que as 
vogais temáticas são morfemas sem valor semântico; elas só têm valor gramatical. A 
vogal temática é aquele morfema que nós vimos nos verbos cant[a]r e vend[e]r. 
 No caso dos verbos, a vogal temática é responsável por indicar a conjugação 
(primeira, segunda ou terceira). Nesse caso, só existem três vogais temáticas verbais: a, 
e e i, para as terminações verbais: cant-a-r, am-a-r, vend-e-r, perd-e-r, part-i-r, ped-i-
r. No caso dos nomes, a vogal temática serve para a manutenção da eufonia (do bom 
som): em sac-o, o [o] é uma vogal temática nominal; sem ela, a pronúncia não ficaria 
agradável ao sistema fonológico da língua: *sac. 
 Todas as vogais podem ser temáticas? Nos verbos, somente a, e e i: cant-a-r, 
vend-e-r, part-i-r. Nos nomes, todas podem ser temáticas: cam-a, lent-e, med-o, táx-i, 
ma-u. Além disso, as vogais temáticas nominais são obrigatoriamente átonas. Quando 
um nome termina em vogal tônica ou em consoante, a vogal temática é zero: café-Ø, 
mar-Ø. 
 Existe vogal temática zero? Os nomes terminados em vogal tônica ou em 
consoante têm vogal temática zero. Para os verbos, depende do caso. Veja a tabela 
abaixo: 
 
ZERO NA VOGAL TEMÁTICA 
Conjugação Tempo e modo Número e pessoa Exemplo 
Qualquer uma 
Presente do 
indicativo 
1.ª pessoa do 
singular 
cant-Ø-o 
vend-Ø-o 
part-Ø-o 
Qualquer uma 
Presente do 
subjuntivo 
Todas 
cant-Ø-emos 
vend-Ø-amos 
part-Ø-amos 
2.ª e 3.ª 
Pretérito perfeito 
do indicativo 
1.ª pessoa do 
singular 
vend-Ø-i 
part-Ø-i 
 
 Ocorre alomorfia na vogal temática? Nos nomes, não. Nos verbos, sim, e com 
bastante frequência. Antes de analisarmos a tabela abaixo, já adianto uma informação 
importante: nos verbos, qualquer caso de vogal temática zero é considerado uma 
alomorfia. Por exemplo, em cant-a-r e cant-Ø-o, entende-se que há alomorfia em 
[a]~[Ø]3. 
 Agora, sim, partamos à análise dos casos de alomorfia regular na vogal temática 
verbal. 
 
3 Essa é a notação que indica que dois morfemas são alomórficos: [A]~[B]. 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 20 
 
 
ALOMORFIA NA VOGAL TEMÁTICA 
Conjugação 
Tempo e 
modo 
Número e 
pessoa 
Alomorfia Exemplo 
Qualquer 
uma 
Presente do 
indicativo 
1.ª pessoa do 
singular 
[a]~[Ø] 
[e]~[Ø] 
[i]~[Ø] 
cant-Ø-o 
vend-Ø-o 
part-Ø-o 
Qualquer 
uma 
Presente do 
subjuntivo 
Todas 
[a]~[Ø] 
[e]~[Ø] 
[i]~[Ø] 
cant-Ø-emos 
vend-Ø-amos 
part-Ø-amos 
2.ª e 3.ª 
Pretérito 
perfeito do 
indicativo 
1.ª pessoa do 
singular 
[e]~[Ø] 
[i]~[Ø] 
vend-Ø-i 
part-Ø-i 
1.ª 
Pretérito 
perfeito do 
indicativo 
1.ª pessoa do 
singular 
[a]~[e] cant-e-i 
1.ª 
Pretérito 
perfeito do 
indicativo 
3.ª pessoa do 
singular 
[a]~[o] cant-o-u 
2.ª 
Pretérito 
imperfeito do 
indicativo 
Todas [e]~[i] 
vend-i-a 
vend-í-amos 
vend-i-am 
2.ª Particípio – [e]~[i] vend-i-do 
3.ª 
Presente do 
indicativo 
2.ª pessoa do 
singular 
[i]~[e] part-e-s 
3.ª 
Presente do 
indicativo 
3.ª pessoa do 
singular 
[i]~[e] part-e 
3.ª 
Presente do 
indicativo 
3.ª pessoa do 
plural 
[i]~[e] part-e-m 
 
 Existe divergência na doutrina quanto ao caso dos verbos de 2.ª conjugação 
empregados no pretérito imperfeito do indicativo, como vendíamos. Alguns autores 
entendem que a vogal temática é [i], como eu expus na tabela (vend-í-amos); outros, 
porém, entendem que a vogal temática é zero (vend-Ø-íamos). Você entenderá isso 
melhor quando estudarmos as desinências verbais. No entanto, de qualquer maneira, 
ocorre alomorfia (ou [e]~[i], ou [e]~[Ø]). 
 
* * * * * 
 
 Agora é interessante discutir a noção de tema. Para a maioria dos pesquisadores, 
tema é o conjunto formado pela raiz e pela vogal temática. Portanto, em casa, o tema é 
[casa]; em cantar, o tema é [canta]. Quando a vogal temática é zero, dizemos que o 
vocábulo é atemático. Quando ele tem vogal temática, é temático, e tem tema em a, 
em e, em i... dependendo de sua vogal temática. 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 21 
 
AFIXO 
 
 Para entender o conceito de afixo, devemos relembrar a noção de raiz. Se a raiz 
fornece o sentido e a classe iniciais do vocábulo, os afixos são justamente modificadores 
do sentido ou da classe da base. 
 Afixos são, então, morfemas que se associam a bases (vocábulos ou raízes) para 
modificar seu sentido ou sua classe. Já estudamos, então, a análise e a formação de 
descentralização: 
 
centr-o > centr-al > central-iz-a-r > des-centr-al-iz-a-r > des-centr-al-iz-a-ção 
 
 A raiz é [centr], porque esse é o radical primário, isto é, a raiz da forma 
primitiva, que é mantida ao longo de toda a formação. Os elementos periféricos que 
foram adicionados alteraram o sentido e a classe da base várias vezes: [al], [iz], [des], 
[ção]. Perceba as alterações: 
 
[al]: centro (substantivo) > central (adjetivo; que se refere ao centro) 
[iz]: central (adjetivo) > centralizar (verbo; pôr no centro) 
[des]: centralizar > descentralizar (tirar do centro) 
[ção]: descentralizar (verbo) > descentralização (substantivo) 
 
 Podemos notar que alguns elementos aparecem antes de base (como o [des]) e 
outros aparecem depois dela. Os afixos que aparecem antes da base são os prefixos (P); 
os que vêm depois dela, sufixos (S). 
 Podemos estabelecer algumas distinções essenciais entre os prefixos e os 
sufixos além da posição. 
 Os prefixos são majoritariamente modificadores semânticos. Eles não alteram 
a classe do vocábulo e modificam mais significativamente o sentido do vocábulo: fazer 
> refazer (fazer de novo), viver > conviver (viver junto). Há alguns poucos casos em 
que o prefixo muda a classe do vocábulo. Esses podem ser mais recentes, 
principalmente com [anti], [extra], [pré], [pró] e [pós], ou mais antigos. Todos 
geralmente envolvem uma mudança de substantivo para adjetivo. Entre os exemplos 
mais recentes, podemos encontrar esquadrão antibomba (bomba > antibomba), 
políticas extra-acordo (acordo > extra-acordo), discurso pré-eleição (eleição > pré-
eleição), movimento pós-Independência (independência > pós-independência), anos 
pós-colonização (colonicação > pós-colonização). Entre os exemplos mais antigos, 
encontramos demente (de+mente), inglório (in+glória), imberbe (im+barba), inúmero 
(i+número). 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 22 
 
 Os sufixos são majoritariamente modificadores categoriais, porque atuam 
mais significativamente na mudança de classe, e não na mudança de sentido. Os sufixos 
em geral tendem a ser mais seletivos em relação à categoria das bases a que se ligam. 
Vejam só alguns exemplos de mudanças que os sufixospodem provocar. 
 
VALOR DO SUFIXO 
Mudança de classe Alguns sufixos Exemplos 
De substantivo para 
adjetivo 
[aco] 
[ado] 
[al]/[ar] 
[âneo] 
[eno] 
(...) 
demônio > demoníaco 
vermelho > avermelhado 
pessoa > pessoal 
momento > momentâneo 
Chile > chileno 
(...) 
De substantivo para verbo 
[(ar)] 
[iscar] 
[ear]/[ejar] 
[ecer]/[escer] 
[izar] 
 (...) 
arma > armar 
flor > floriscar 
corte > cortejar 
noite > anoitecer 
cloro > clorizar 
(...) 
De adjetivo para 
substantivo 
[dade]/[idade]/[edade] 
[ez]/[eza] 
[ia] 
[ice] 
[ície] 
(...) 
real > realidade 
belo > beleza 
alegre > alegria 
velho > velhice 
calvo > calvície 
(...) 
De adjetivo para verbo 
[(ar)] 
[iscar] 
[ear]/[ejar] 
[ecer]/[escer] 
[izar] 
 (...) 
alegre > alegrar 
verde > verdejar 
escuro > escurejar 
pálido > empalidecer 
mortal > mortalizar 
(...) 
De adjetivo para advérbio [mente] rápido > rapidamente 
De verbo para substantivo 
[(a)] 
[(e)] 
[(o)] 
[ção] 
[mento] 
(...) 
quebrar > quebra 
embarcar > embarque 
custar > custo 
colocar > colocação 
receber > recebimento 
(...) 
De verbo para adjetivo 
[vel] 
[dor] 
[ão] 
[or] 
[nte] 
(...) 
vender > vendível 
amar > amador 
cagar > cagão 
cantar > cantor 
pedir > pedinte 
(...) 
 
 No entanto, existem, sim, sufixos não alteram a classe da base a que se associam. 
Nós vamos dividi-los em dois grupos: os que indicam grau e os que não indicam grau. 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 23 
 
Os que não indicam grau são estes: [ista], [eiro], [ada], [aria]/[eria], [al]4, [agem], [itar], 
[icar]. 
 
VALOR DO SUFIXO 
Classe Alguns sufixos Exemplos 
Substantivo 
[ista] 
[ismo] 
[eiro] 
[ada] 
[aria]/[eria] 
[al] 
[agem] 
flauta > flautista 
capital > capitalismo 
limão > limoeiro 
faca > facada 
sorvete > sorveteria 
cipó > cipoal 
picareta > picaretagem 
Adjetivo [ista] clássico > classicista 
Verbo 
[icar] 
[itar] 
beber > bebericar 
saltar > saltitar 
 
 Os que indicam grau associam-se a várias classes distintas (inclusive aos 
advérbios), sem mudá-las. Os sufixos que indicam grau são inicialmente [inho], [zinho], 
[ão], [zão], [íssimo], [érrimo], [imo], mas alguns outros se podem enquadrar nessa lista: 
[udo], [aço], [aréu], [uço], [eto], [eco], [ola], etc. 
 
VALOR DO SUFIXO 
Classe Alguns sufixos Exemplos 
Substantivo 
[inho]/[zinho] 
[ão]/[zão] 
[uço] 
[eco] 
[aréu] 
(...) 
menino > menininho 
garoto > garotão 
dente > dentuço 
jornal > jornaleco 
fogo > fogaréu 
(...) 
Adjetivo 
[inho] 
[ão]/[ão] 
clássico > classicista 
Verbo 
[icar] 
[itar] 
beber > bebericar 
saltar > saltitar 
 
 Agora vamos às perguntas padrão... 
 Existe prefixo zero? Não. 
 Existe alomorfia no prefixo? Sim. Alguns prefixos sofrem alomorfia. Vejam-se 
alguns exemplos na tabela abaixo. 
 
4 Esse sufixo [al] é diferente daquele [al] que citamos anteriormente, que aparece em 
central. O [al] de central indica referência (o que se refere ao centro); o [al] de areal, 
por exemplo, indica zona de grande extensão (grande extensão de areia, nesse caso). 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 24 
 
 
PREFIXOS 
Alomorfes Exemplos 
[i] 
[im] 
[in] 
irreal 
impossível 
inapto 
[intra] 
[intro] 
intracelular 
introvertido 
[co] 
[com], [con] 
correlação 
conviver 
[sobre] 
[super] 
sobreviver 
superfino 
 
 Existe sufixo zero? Sim, existe. Quando um nome5 se torna verbo por meio da 
adição da terminação –ar, há um sufixo zero que medeia essa derivação. 
 
arm-a > arm-Ø-a-r 
 
 Ainda há os casos como quebrar-quebra, em que alguns autores, como Luiz 
Carlos de Assis Rocha, preveem tratar-se de sufixação (e não derivação regressiva, 
como a maioria analisa). Mas esse caso será mais bem analisado posteriormente. 
 Existe alomorfia no sufixo? Sim, alguns sufixos sofrem alomorfia. Veja alguns 
exemplos na tabela abaixo: 
 
SUFIXOS 
Alomorfes Exemplos 
[dade] 
[edade] 
[idade] 
leal > lealdade 
sério > seriedade 
honesto > honestidade 
[ção] 
[cion] 
inflar > inflação 
inflação > inflacionar 
[al] 
[ar] 
pessoa > pessoal 
sol > solar 
[ear] 
[ejar] 
claro > clarear 
festa > festejar 
 
* * * * * 
 
 
5 Substantivo ou adjetivo 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 25 
 
 Outra dúvida muito comum entre os recém-estudiosos é esta. Existem palavras 
com mais de um prefixo? Bem, é verdade que não é tão comum a adjunção de vários 
prefixos quanto a de vários sufixos, mas, sim, existem várias palavras com mais de um 
prefixo. Veja-se: 
 
pôr > compor > decompor > decomponível > indecomponível 
 
 Exatamente, três prefixos! Perceba: [pôr] > [com[por]] > [de[com[por]]] > 
[[de[com[poní]]]vel] > [in[[de[com[poní]]]vel]]. 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 26 
 
DESINÊNCIA 
 
 Agora estudaremos as desinências. As desinências, no português, são os 
morfemas que designam as flexões dos verbos e dos nomes. O emprego das 
desinências está relacionado à concordância, na sintaxe. Vejam-se estas sentenças: 
 
O menino é lindo 
A menina é linda 
 
 Inicialmente, já ouso enfatizar a diferença entre a vogal temática e a desinência. 
A vogal temática não indica gênero e não está relacionada à concordância; a desinência 
está intimamente ligada à concordância. 
 Existem dois grupos de desinências: as verbais e as nominais. Começaremos 
pelas nominais, que julgo serem mais simples, porque só existem quatro. As desinências 
nominais são divididas em desinência de gênero (DG) e desinência de número (DN). 
Há divergências na análise de ambas, então estudaremos cada uma separadamente. 
 
* * * * * 
 
 No português, só existem dois gêneros: o masculino e o feminino. Os autores 
divergem no critério que utilizam para diferenciar os gêneros: enquanto uns lidam com 
a ideia de contraste, outros tratam da ideia de marca. 
 Os autores que falam em contraste comparam o masculino e o feminino para 
chegar às desinências. Por exemplo, para eles, menin-o se opõe a menin-a; portanto, o 
[o] é desinência de gênero masculino, e o [a] é desinência de gênero feminino. Já em 
professor-Ø e professor-a, o [Ø] é desinência de gênero masculino e o [a] é desinência 
de gênero feminino. 
 Um argumento a favor do [o] como desinência de gênero é o de que, 
intuitivamente, acreditamos que essa terminação leva as palavras a serem masculinas. 
Por exemplo, a gramática normativa entende que gênio é uma palavra estritamente 
masculina, portanto o correto seria sempre empregá-la no masculino: “Ele é um gênio”, 
“Ela é um gênio”. No entanto, no português não monitorado, muito vemos “Ela é uma 
gênia”. Nós tendemos a flexionar gênio por acreditar que a trminação –o leve a palavra 
a ser masculina. 
 Um detalhe importante! A palavra policial varia em gênero, mas essa variação 
não é expressa morfologicamente. Existem o masculino o policial e o feminino a 
policial. Nesse caso, dizemos que o gênero é marcado por dois morfemas zero 
diferentes: o policial-Ø e a policial-Ø, de modo que o primeiro [Ø] é desinência de 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 27 
 
gênero masculino, e o segundo [Ø] é desinência de gênero feminino, alomórfica àquele 
[a] de menina. 
 Logo, os autores que lidam com a ideia de contraste entendem que o sistema de 
desinência de gênero seja este: 
 
DESINÊNCIAS DE GÊNERO 
Masculino Feminino 
[Ø]~[o] [a]~[Ø] 
 
 Os autores que preferem adotar a ideia de marcas entendem que, para cada 
parâmetro gramatical, existe uma forma básica (não marcada) e outra complexa 
(marcada). Nesse caso, o masculino, devido a seu emprego genérico, é tomado por 
forma básica, isto é, não marcada; se é não marcada, não tem marca. Assim, a 
desinência de masculino sempre será [Ø]. Em menino, por exemplo, o [o] é visto como 
vogal temática, e não desinência de gênero. 
 Outro argumento para o zero masculino é a ausência de terminação própria parao masculino: menino (termina em /u/), mestre (termina em /i/), professor (termina em 
/R/), um (termina em /ũ/), oficial (termina em /aw/), judeu (termina em /ew/). Porém, a 
maioria absoluta dos nomes variáveis em gênero terminam em –a quando estão no 
feminino: menina, professora, uma, oficiala, judia. Há alguns poucos casos 
excepcionais, como os nomes comuns de dois gêneros (por exemplo, policial e 
estudante) , avó, que faz feminino somente por metafonia6, e ré. 
 Nessa visão, aquela ideia de que os nomes comuns de dois gêneros têm 
desinência de gênero [Ø] no masculino e no feminino ainda persiste. Portanto, para 
esses autores, o sistema de desinências de gênero é assim: 
 
DESINÊNCIAS DE GÊNERO 
Masculino Feminino 
[Ø] [a]~[Ø] 
 
* * * * * 
 
 Agora, vamos tratar da desinência de número. Aqui há a mesma ideia de 
contraste e de marca, com visões diferentes. Os autores que trabalham com a ideia de 
contraste comparam o singular com o plural e chegam a uma conclusão quanto ao 
morfema que indica plural. Fato é que não existe marca para o singular: todo nome no 
singular tem desinência de número [Ø]. No plural, porém, a conclusão muda. Quando 
comparamos formas distintas, percebemos que o mecanismo mais frequente de 
 
6 Vamos estudar a metafonia mais adiante. 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 28 
 
pluralização é a adição do morfema [s]: festa-Ø > festa-s, mesa-Ø > mesa-s, medo-Ø 
> medo-s, menino-Ø > menino-s. 
 No entanto, com alguns substantivos com terminações específicas, ocorre a 
adição do elemento [es] (ou [is], de mesmo som): professor-Ø > professor-es, canal-Ø 
> cana-is, réptil-Ø > répte-is, mês-Ø > mes-es, país-Ø > país-es. Esses morfologistas 
afirmam, então, que há outro morfema [es] (ou [is]), alomorfe a [s], que também indica 
o plural. 
 Um detalhe importante! Assim como vimos no gênero, existem os nomes 
comuns de dois números, que asumem a mesma forma no singular e no plural: o pires 
> os pires, o tórax > os tórax. Nesses casos, acontece o mesmo: aparece um morfema 
zero no singular e outro no plural para indicar a oposição: o pires-Ø > os pires-Ø. Então, 
além de [s] e [es], ainda há o alomorfe [Ø] para a desinência de número. 
 Então, o sistema de desinências de número é este: 
 
DESINÊNCIAS DE NÚMERO 
Singular Plural 
[Ø] [s]~[es]/[is]~[Ø] 
 
 Os autores que trabalham com a ideia de marca, porém, costumam fazer uma 
análise diacrônica (histórica): antigamente, palavras como amor se grafavam amore, 
com esse –e final. Por isso, o plural de amor é amores. Daí surge a ideia de que somente 
o [s] é desinência de número, e o [e] é, na verdade, uma vogal temática. 
 Ainda existe um outro argumento, sincrônico (referente ao estágio atual da 
língua), que favorece a ideia de que não existe o alomorfe [es] para a desinência de 
número. Quando se passa amores, no plural, para o diminutivo, obtém-se 
frequentemente amorezinhos. Perceba-se que o e de amores permaneceu próximo à 
base, enquanto o s indicador de plural passou para o fim do vocábulo: amore-s > amore-
zinho-s. Isso indica que o [es] não é um morfema sozinho, e sim dois morfemas 
distintos: o [s] é a verdadeira desinência de número, e o [e] é uma vogal temática 
arcaica, que só se expressa no plural. 
 Esses autores, então, entendem que o sistema de desinências de número é este: 
 
DESINÊNCIAS DE NÚMERO 
Singular Plural 
[Ø] [s]~[Ø] 
 
* * * * * 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 29 
 
 Agora vamos estudar as desinências verbais. Elas também se dividem em três 
grupos: as modo-temporais (DMT), as número-pessoais (DNP) e as verbo-nominais (de 
infinitivo, Dinf, de gerúndio, Dger, e de particípio, Dpart). 
 Vamos começar com as desinências modo-temporais. Todo verbo possui um 
morfema que indique seu tempo e seu modo. Existem dois modos no português: o 
indicativo e o subjuntivo7. O indicativo contempla estes tempos: presente, pretérito 
perfeito, pretérito imperfeito, pretérito mais-que-perfeito, futuro do presente e futuro do 
pretérito. O subjuntivo contempla estes tempos: presente, pretérito imperfeito e futuro. 
Cada um desses nove tempos terá uma DMT diferente. 
 Além disso, é importante salientar que essas desinências terão alomorfes a 
depender da conjugação. Então, todos os verbos são divididos em três conjugações, de 
acordo com a forma do infinitivo: a primeira (dos verbos terminados em –ar, como 
cantar), a segunda (dos verbos terminados em –er, como vender) e a terceira (dos 
verbos terminados em –ir, como partir)8. Detalhe: os verbos pôr e derivados (repor, 
compor, supor, etc.) são de segunda conjugação, porque apresentam a VT [e] em 
algumas conjugações: põ-e-s, põ-e-m. 
 Vejamos o sistema de desinências modo-temporais do português: 
 
DESINÊNCIAS MODO-TEMPORAIS 
Modo Tempo Morfemas Restrição Exemplo 
In
di
ca
ti
vo
 
Presente [Ø] É sempre assim. 
cant-Ø-as 
vend-Ø-es 
part-Ø-es 
Pretérito 
perfeito 
[Ø] É sempre assim. 
cant-Ø-ou 
vend-Ø-eu 
part-Ø-iu 
Pretérito 
imperfeito 
[va]~[ve]~[a]~[e] 
Na segunda pessoa do 
plural, usa-se [ve]; nas 
demais, [va]. Essa forma só 
é usada com verbos de 
primeira conjugação. 
canta-va-s 
cantá-ve-is 
vendi-a-s 
vendí-e-is 
parti-a-s 
partí-e-is 
 
Na segunda pessoa do 
plural, usa-se [e]; nas 
demais, [a]. Essa forma só é 
usada com verbos de 
segunda ou de terceira 
conjugação. 
 
7 Entendemos, aqui, que o imperativo é apenas um empréstimo do presente do 
indicativo e do do subjuntivo, com emprego discursivo especializado, e não um modo 
separado dos outros. 
8 Uma curiosidade. A maioria dos verbos pertence à primeira conjugação (cerca de 
16.000). A soma das quantidades de verbos de segunda e de terceira conjugação não 
supera nem sequer 12% da quantidade de verbos de primeira conjugação. 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 30 
 
Pretérito 
mais-que-
perfeito 
[ra]~[re] 
Na segunda pessoa do 
plural, usa-se [re]; nas 
demais, [ra]. 
canta-ra-s 
cantá-re-is 
vende-ra-s 
vendê-re-is 
parti-ra-s 
partí-re-is 
Futuro do 
presente 
[ra]~[re] 
Na primeira pessoa do 
singular e do plural e na 
segunda pessoa do plural, 
usa-se [re]; nas demais, usa-
se [ra]. 
canta-re-i 
canta-rá-s 
vende-re-i 
vende-rá-s 
parti-re-i 
parti-rá-s 
Futuro do 
pretérito 
[ria]~[rie] 
Na segunda pessoa do 
plural, usa-se [rie]; nas 
demais, [ria]. 
canta-ria-s 
canta-ríe-is 
vende-ria-s 
vende-ríe-is 
parti-ria-s 
parti-ríe-is 
S
ub
ju
nt
iv
o 
Presente [e]~[a] 
Nos verbos de primeira 
conjugação, usa-se [e]; nos 
de segunda ou terceira, usa-
se [a]. 
cant-e-s 
vend-a-s 
part-a-s 
Pretérito 
imperfeito 
[sse] É sempre assim. 
canta-sse-s 
vende-sse-s 
parti-sse-s 
Futuro [r] É sempre assim. 
canta-r-es 
vende-r-es 
parti-r-es 
 
 Comentamos, no capítulo de vogal temática, que a doutrina diverge quanto à 
DMT do pretérito imperfeito do indicativo de verbos de 2.ª ou de 3.ª conjugação. Alguns 
autores entendem que o [i] é vogal temática, e o [a] ou [e] é DMT, como eu expus na 
tabela: vendIa = vend[i]VT[a]DMT. Outros, porém, entendem que a vogal temática, 
nesses casos, é zero, e que a DMT é [ia] ou [ie]: vendia = vend[Ø]VT[ia]DMT. 
 
* * * * * 
 
 Agora vamos ver as desinências número-pessoais. Elas sempre vêm logo após 
as desinências modo-temporais nos verbos, e indicam, obviamente, o número e a 
pessoa. Existem dois números (singular e plural) e três pessoas gramaticais (primeira, 
segunda e terceira). Há, então, seis combinações de pessoa e número. O problema é que 
as desinências que indicam essas pessoas sofrem alomorfia a depender do tempo e do 
modo. 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 31 
 
 Podemos dizer, então, que há um conjunto padrão de DNPs, que é o do 
presente do subjuntivo9: 
 
PADRÃO GERAL DE DNP 
Número e pessoa Morfema Exemplo 
1.ª pessoa do singular [Ø] 
cante-Ø 
venda-Ø 
parta-Ø 
2.ª pessoado singular [s] 
cante-s 
venda-s 
parta-s 
3.ª pessoa do singular [Ø] 
cante-Ø 
venda-Ø 
parta-Ø 
1.ª pessoa do plural [mos] 
cante-mos 
venda-mos 
parta-mos 
2.ª pessoa do plural [is] 
cante-is 
venda-is 
parta-is 
3.ª pessoa do plural [m] 
cante-m 
venda-m 
parta-m 
 
 Esse padrão engloba cinco dos tempos que estudamos. Então, existem quatro 
padrões especiais: o do presente do indicativo, o do pretérito perfeito do indicativo, o 
do futuro do presente e o do futuro do subjuntivo10. 
 
PADRÃO DO PRESENTE DO INDICATIVO 
Número e pessoa Morfema Exemplo 
1.ª pessoa do singular [o] 
cant-o 
vend-o 
part-o 
2.ª pessoa do singular [s] 
canta-s 
vende-s 
parte-s 
3.ª pessoa do singular [Ø] 
canta-Ø 
vende-Ø 
parte-Ø 
1.ª pessoa do plural [mos] canta-mos 
 
9 Esse padrão aparece em todos os tempos e modos, exceto no presente do indicativo, 
no pretérito perfeito do indicativo, no futuro do presente do indicativo e no futuro do 
subjuntivo. 
10 Esse também vale para o infinitivo flexionado. 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 32 
 
vende-mos 
parti-mos 
2.ª pessoa do plural [is] 
canta-is 
vende-is 
part(i)-is 
3.ª pessoa do plural [m] 
canta-m 
vende-m 
parte-m 
 
PADRÃO DO PRETÉRITO PERFEITO DO INDICATIVO 
Número e pessoa Morfema Exemplo 
1.ª pessoa do singular [i] 
cante-i 
vend-i 
part-i 
2.ª pessoa do singular [ste] 
canta-ste 
vende-ste 
parte-ste 
3.ª pessoa do singular [u] 
canto-u 
vende-u 
parti-u 
1.ª pessoa do plural [mos] 
canta-mos 
vende-mos 
parti-mos 
2.ª pessoa do plural [stes] 
canta-stes 
vende-stes 
parti-stes 
3.ª pessoa do plural [ram] 
canta-ram 
vende-ram 
parte-ram 
 
PADRÃO DO FUTURO DO PRESENTE DO INDICATIVO 
Número e pessoa Morfema Exemplo 
1.ª pessoa do singular [i] 
cantare-i 
vendere-i 
partire-i 
2.ª pessoa do singular [s] 
cantará-s 
venderá-s 
partirá-s 
3.ª pessoa do singular [Ø] 
cantará-Ø 
venderá-Ø 
partirá-Ø 
1.ª pessoa do plural [mos] 
cantare-mos 
vendere-mos 
partire-mos 
2.ª pessoa do plural [is] 
cantare-is 
vendere-is 
partire-is 
3.ª pessoa do plural [o] cantarã-o 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 33 
 
venderã-o 
partirã-o 
 
PADRÃO DO FUTURO DO SUBJUNTIVO 
Número e pessoa Morfema Exemplo 
1.ª pessoa do singular [Ø] 
cantar-Ø 
vender-Ø 
partir-Ø 
2.ª pessoa do singular [es] 
cantar-es 
vender-es 
partir-es 
3.ª pessoa do singular [Ø] 
cantar-Ø 
vender-Ø 
partir-Ø 
1.ª pessoa do plural [mos] 
cantar-mos 
vender-mos 
partir-mos 
2.ª pessoa do plural [des] 
cantar-des 
vender-des 
partir-des 
3.ª pessoa do plural [em] 
cantar-em 
vender-em 
partir-em 
 
 Portanto, este é o quadro final de DNPs do português: 
 
DESINÊNCIAS NÚMERO-PESSOAIS 
Número e pessoa Morfemas 
1.ª pessoa do singular [Ø]~[o]~[i] 
2.ª pessoa do singular [s]~[ste]~[es] 
3.ª pessoa do singular [Ø]~[u] 
1.ª pessoa do plural [mos] 
2.ª pessoa do plural [is]~[stes]~[des] 
3.ª pessoa do plural [m]/[o]~[ram]~[em] 
 
 Como você bem pode perceber, a DNP da 1.ª pessoa do plural é a única que 
nunca se altera. 
 
* * * * * 
 
 Por fim, vamos falar das desinências verbo-nominais. Todo verbo possui três 
formas nominais: o infinitivo (terminado em –r), o gerúndio (terminado em –ndo) e o 
particípio (terminado em –do). Essas desinências são mais simples: 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 34 
 
 
DESINÊNCIAS VERBO-NOMINAIS 
Forma Morfemas 
Infinitivo [r] 
Gerúndio [ndo] 
Particípio [d] 
 
 Há dois detalhes importantes. O primeiro é que um morfologista atenta para o 
fato de que a desinência de gerúndio não deveria ser [ndo], mas sim somente [do], 
porque esse “n” ortográfico apenas indica a nasalização da vogal temática: partindo = 
/part’ĩdu/. 
 O segundo é que a desinência do particípio é somente o [d], porque o que vem 
depois são terminações tipicamente nominais. Por exemplo, amado tem a desinência de 
particípio [d] e a vogal temática (ou desinência de gênero, a depender da doutrina) [o], 
porque essa se alterna com o [a] feminino: amada. 
 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 35 
 
ESTRUTURA NOMINAL 
 
 Agora nós vamos aprender as estruturas dos verbos e dos nomes portugueses. 
Nós dividimos os nomes em dois grupos: os que variam em gênero e os que não variam 
em gênero. 
 Os nomes não variáveis em gênero seguem esta estrutura: 
 
RX+VT+DN 
 
 Antes de mais: o que é RX? RX é o conjunto de tudo que vem antes da vogal 
temática; isso pode englobar só a raiz, a raiz e alguns sufixos, mais de uma raiz, etc. 
Por exemplo, “agronegócio” tem duas raízes, “casa” só tem uma raiz, “convivência” 
tem uma raiz e dois afixos. Mas todos eles terminam em VT+ DN. 
 
[agro]R[negóci]R[o]VT[Ø]DN 
[cas]R[a]VT[Ø]DN 
[con]P[viv]R[ênci]S[a]VT[Ø]DN 
 
 Os nomes variáveis em gênero seguem esta estrutura: 
 
RX+VT+DG+DN 
 
 Todos os nomes que variam em gênero projetam uma desinência de gênero além 
dos outros elementos. Então, “menina”, “subgerentes” e “gostoso” se analisam assim: 
 
[menin]R[Ø]VT[a]DG[Ø]DN 
[sub]P[ger]R[ent]S[e]VT[Ø]DG[s]DN 
[gost]R[os]S[o]VT[Ø]DG[Ø]DN 
 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 36 
 
ESTRUTURA VERBAL 
 
 Agora estudaremos especificamente a estrutura dos verbos. Sabemos que os 
verbos possuem dois grupos de formas: as formas conjugadas e as formas nominais. 
 Primeiro, conheçamos a fórmula geral das formas conjugadas: 
 
RX+VT+DMT+DNP 
 
 Quaisquer formas conjugadas possuem esse padrão. 
 
cantamos = [cant]R[a]VT[Ø]DMT[mos]DNP 
vendessem = [vend]R[e]VT[sse]DMT[m]DNP 
partais = [part]R[Ø]VT[a]DMT[is]DNP 
convivia = [con]P[viv]R[i]VT[a]DMT[Ø]DNP 
 
 As formas nominais do português são o infinitivo, o gerúndio e o particípio. No 
entanto, o infinitivo pode ser pessoal ou impessoal. O infinitivo impessoal segue esta 
estrutura: 
 
RX+VT+DINF 
 
 Lembre que a DINF é [r]. 
 
cantar = [cant]R[a]VT[r]Dinf 
vender = [vend]R[e]VT[r]Dinf 
partir = [part]R[i]VT[r]Dinf 
 
 O infinitivo pessoal pode ser flexionado em número e pessoa, portanto ele 
recebe uma DNP. 
 
RX+VT+DINF+DNP 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 37 
 
 
 As DNPs empregadas nesse caso são as mesmas do futuro do subjuntivo. 
 
cantar = [cant][a][r][Ø] 
vendermos = [vend][e][r][mos] 
partirdes = [part][i][r][des] 
cantarem = [cant][a][r][em] 
 
 O gerúndio segue a seguinte estrutura: 
 
RX+VT+DGER 
 
 E a DGER é [ndo]. 
 
cantando = [cant]R[a]VT[ndo]Dger 
vendendo = [vend]R[e]VT[ndo]Dger 
partindo = [part]R[i]VT[ndo]Dger 
 
 Por fim, esta é a estrutura do particípio: 
 
RX+VTV+DPART+VTN+DG+DN 
 
 Como eu sinalizei, o particípio possui duas VTs: a primeira é verbal, a segunda 
é nominal. Além disso, a DPART é [d]. 
 
cantado = [cant]R[a]VT[d]Dpart[o]VT[Ø]DG[Ø]DN 
vendida = [vend]R[I]VT[d]Dpart[Ø]VT[a]DG[Ø]DN 
partidos = [part]R[a]VT[d]Dpart[o]VT[Ø]DG[s]DN 
 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 38 
 
BASE E RAIZ PRESA 
 
 Agora vamos estudar os conceitos de base e raiz presa. Base é o vocábulo ou a 
raiz presa que deu origem ao vocábulo que se está analisando. Aqui, já percebemos 
que vocábulos primitivos não têm base, porque eles não vieram de nenhum outro. 
 Quando analisamos a palavra descentralização, vimos a seguinte sequência. 
 
centro > central > centralizar > descentralizar > descentralização 
 
 Bem, aqui a ideia é simples: centro é a base de central, central é a base de 
centralizar e assim sucessivamente. 
 
* * * * * 
 
 Mas o que são raízes presas? As raízes são divididas em raízes livres e raízes 
presas. Raiz livre é aquela que consegue gerar um nome ou um verbo sem o auxílio de 
afixos, ou seja, o nome só pode ter R, VT, DG e DN, e o verbo só pode ter R, VT e 
DINF. 
 
R+VT+DN = [mar], [cas]a, [mes]a, [pedr]a 
R+VT+DG+DN = [filh]o, [menin]o, [garot]o 
R+VT+DINF = [cant]ar, [vend]er, [ped]ir 
 
 Todas as raízes acima elencadas são livres. É evidenteque elas podem gerar 
palavras com afixos: marítimo, casinha, mesona, padreiro, cantor. No entanto, existem 
raízes que só conseguem constituir palavras quando estão ligadas a outra raiz ou a um 
afixo: 
 
[agr(o)] = [agr]ário, [agro]negócio, [agro]indústria 
[terr]11 = [terr]or, [terr]ível, a[terr]orizar 
 
 
11 Esse [terr] é diferente do [terr] de terra, porque eles têm sentidos e origens diferentes. 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 39 
 
 Essas raízes são presas. 
 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 40 
 
CONTRASTES 
 
 Neste tópico e no próximo, vamos estudar outras classificações de morfes. 
Primeiro, vários autores distinguem os morfes pelas oposições. Assim, os morfes 
podem ser divididos em quatro grupos: aditivos, subtrativos, contrastivos e 
suprassegmentais. 
 Os morfes aditivos são aqueles que provocam somente a adição de segmentos 
fonológicos à palavra. 
 
cantor > cantora 
fazer > desfazer 
 
 Os morfes subtrativos provocam somente a subtração de fonemas: 
 
irmão > irmã 
mau > má 
 
 Os morfes comutativos efetuam a troca de um grupo de segmentos fonológicos 
por outro. 
 
agitar > agitação 
menino > menina 
 
 Os morfes suprassegmentais provocam a metafonia, isto é, a mudança de 
timbre de uma vogal. 
 
avô > avó 
famoso (ô) > famosa (ó) 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 41 
 
OUTROS TIPOS DE MORFE 
 
 Existem, ainda, outros tipos de morfe descritos pelos morfologistas. Vou tentar 
reunir aqui todas as classificações que podem ser encontradas nesses livros. 
 O morfe cumulativo é aquele que acumula os papéis de outro que se ausentou 
(ou seja, que realiza um morfema zero). Por exemplo, sabemos que passei está no 
pretérito perfeito por causa da DNP [i], já que a DMT é zero. Então, dizemos que a 
DNP [i] acumula as funções da DMT e, assim, o morfe “i” é cumulativo. 
 O morfe relacional é aquele cuja função é relacionar outras estruturas 
morfológicas. Para os morfologistas que citam esse tipo de morfe, os relacionais são as 
preposições e as conjunções portuguesas: com, de, para, e, mas. 
 O morfe redundante é aquele que aparece para reforçar uma característica que 
já é indicada por outro. Por exemplo, na passagem de famoso a famosa, o morfe [a] já 
indica o feminino; porém, há um morfe suprassegmental que altera o timbre da vogal o 
de fechada para aberta. Assim, esse morfe suprassegmental é redundante, porque 
reforça uma carcterística que já é indicada pelo [a]. 
 Os morfes homônimos são aqueles que se pronunciam da mesma forma, mas 
têm origens e significados diferentes. Há dois exemplos que já vimos neste manual: o 
sufixo [al] de pessoal e o de areal. Eles são diferentes: o primeiro indica relação, o 
segundo indica área de grande extensão. O outro é a raiz [terr] de terra e a de terror. 
Elas são evidentemente diferentes, porque têm sentidos diferentes e origens diferentes 
também, apesar de serem pronunciadas igualmente. 
 O morfema latente é o morfema zero que se opõe a outro morfema zero. É o 
caso dos nomes comuns de dois gêneros e os comuns de dois números, como já vimos 
anteriormente. Há dois morfemas zero para cada distinção (masculino e feminino ou 
singular e plural), e eles são opostos por esse parâmetro. Então, o morfema zero de 
estudante (para o gênero) e o de tórax (para o número) é latente. 
 O morfema interno é aquele que vem acoplado a um sufixo, mas não faz parte 
dele propriamente. Já relatamos neste manual casos de morfema interno, mas sem nos 
referirmos diretamente a ele. Por exemplo, sabemos que o sufixo [iz] vem acompanhado 
da VT [a] e da desinência [r]: concreto > concretizar, real > realizar. Sabemos disso 
porque, se [izar] fosse um só morfema, ele não poderia ser dividido em outros três 
morfemas: [iz], [a] e [r]. Porém, isso é, sim, possível. Contudo, vários autores afirmam 
que [izar] é o sufixo por uma questão meramente didática, uma vez que os morfemas 
[a] e [r] são internos ao sufixo [iz]. Portanto, temos duas opções de nomenclatura: 
chamar o [izar] de sufixo em sentido lato (ou somente sufixo lato) ou o [iz] de sufixo 
em sentido estrito (ou somente sufixo estrito). 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 42 
 
OPOSIÇÕES E NEUTRALIZAÇÃO 
 
 Nós vimos anteriormente, com as desinências, a noção de marca. Nessa noção, 
para cada parâmetro morfológico (número, gênero, tempo, modo, etc.) existe uma 
forma básica, não marcada (com morfema zero) e uma complexa, marcada. Estas são 
as formas básicas: 
 
AS FORMAS BÁSICAS 
Gênero Masculino 
Número Singular 
Tempo e modo Presente do indicativo 
Número e pessoa 3.ª pessoa do singular 
 
 Todas as outras formas são, consequente e obrigatoriamente, complexas. Então, 
o que dizemos aqui é que todas as formas partem do estágio básico ao complexo. É 
por isso que dizemos que irmão gerou irmã, e não o inverso, por mais que pareça. 
Acontece que a mudança de gênero ocorre sempre do masculino para o femino e, assim, 
irmão passou a irmã pela exclusão do o final. 
 Nesse sentido, existem dois tipos de oposição entre formas do mesmo 
parâmetro. 
 A oposição privativa (ou contraditória) é a oposição que se faz entre uma forma 
não marcada e uma forma marcada. 
 
festa-Ø ≠ festa-s 
menino-Ø ≠ menin-a 
canta-Ø-s ≠ canta-rá-s 
cantará-Ø ≠ cantará-s 
 
 A oposição polar (ou equipolente) é a oposição que se faz entre duas formas 
marcadas. 
 
canta-rá-s ≠ canta-sse-s 
cantare-i ≠ cantare-mos 
 
* * * * * 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 43 
 
 
 Agora vamos falar do conceito de neutralização. Bem, voltemos à ideia das 
formas marcadas e não marcadas. A existência de formas não marcadas favorece a 
economia mórfica, porque não somos obrigados a decorar várias marcas, mas sim 
somente as marcas das formas marcadas, porque as formas não marcadas não têm 
marca. 
 No entanto, se fôssemos pensar num “ideal de língua”, o normal seria que as 
formas marcadas se opusessem às formas não marcadas sempre, para que a distinção 
entre a marca e a não marca fosse clara, mas, também devido à economia mórfica, isso 
nem sempre acontece, e acaba ocasionando a neutralização. 
 A definição técnica vem a seguir. Neutralização é a perda da marca que 
deveria opor uma forma complexa a uma básica. Então, vamos começar com um 
exemplo simples: a forma cantava está na 3.ª pessoa do singular, mas também pode 
estar na 1.ª pessoa do singular: eu cantava, ele cantava. Naturalmente, a primeira pessoa 
do singular é uma forma complexa, então ela deveria se opor à forma da terceira pessoa 
do singular, no entanto essas formas são iguais. 
 Outro exemplo é do verbo fazer: existe a forma ele fez, com DNP zero. Contudo, 
existe a forma eu fiz, também com DNP zero. Isso é uma neutralização, porque a DNP 
da 1.ª pessoa do singular não deveria ser zero. Por quê? 
 Bem, fato é que a neutralização é um fenômeno comum em todos os planos 
gramaticais, e a língua dispõe de mecanismos que possibilitam evitá-la. Por exemplo, 
no caso de fez-fiz, é evidente que a diferença de vogais e e i é suficiente para evitar a 
neutralização, isto é, por mais que a forma fiz seja morfologicamente neutra, o falante 
sabe distinguir claramente fez de fiz. Já no caso de cantava, a sintaxe consegue dirimir 
as formas, ou seja, a exposição do sujeito resolve o problema da neutralização: eu 
cantava (1.ª pessoa), meu amigo cantava (3.ª pessoa). 
 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 44 
 
MODELOS DE ANÁLISE MÓRFICA 1 
 
 Os modelos abaixo abordarão somente os tópicos que nós estudamos. Mais à 
frente, veremos análises mais aprofundadas. 
 
1) Ansiosamente 
 
 Essa palavra vem de ânsia. 
 
ânsia > ansiosa > ansiosamente 
 
 Na forma primitiva, ânsia, há a estrutura básica dos nomes invariáveis em 
gênero: [ânsi]R[a]VT[Ø]DN. Depois se acrescentaram os sufixos [oso] e [mente] (que só 
aparecena forma feminina). 
 
[ânsi]R[a]VT[Ø]DN > [ansi]R[os]S[Ø]VT[a]DG[Ø]DN > [ansi]R[os]S[a]DG[ment]S[e]VT 
 
 Vale ressaltar que, após o sufixo [mente], não há DG nem DN, porque 
“ansiosamente” é um advérbio, e os advérbios são invariáveis. 
 
2) Anoitecer 
 
 Essa palavra vem de noite. 
 
noite > anoitecer 
 
 A forma noite se divide assim: [noit]R[e]VT[Ø]DN. Acrescentaram-se o prefixo 
[a] e o sufixo [ec], acompanhado da terminação verbal –er, de segunda conjugação. 
 
[noit]R[e]VT[Ø]DN > [a]P[noit]R[ec]S[e]VT[r]Dinf 
 
3) Infelizmente 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 45 
 
 
 Essa palavra vem de feliz. 
 
feliz > infeliz > infelizmente 
 
 A forma primitiva só tem preenchida a raiz: [feliz]R[Ø]VT[Ø]DG[Ø]DN. Foram 
adicionados os afixos [in] e [mente] (na forma feminina). 
 
[feliz]R[Ø]VT[Ø]DG[Ø]DN > [in]P[feliz]R[Ø]VT[Ø]DG[Ø]DN > 
[in]P[feliz]R[Ø]DG[ment]S[e]VT 
 
4) Comunidades 
 
 Essa palavra vem de comum. 
 
comum > comunidade > comunidades 
 
 A forma simples só tem raiz: [comum]R[Ø]VT[Ø]DG[Ø]DN. Foi adicionado o 
sufixo [idade] e a desinência de número foi trocada para [s]. 
 
[comum]R[Ø]VT[Ø]DG[Ø]DN > [comun]R[idad]S[e]VT[s]DN 
 
5) Estável 
 
 Essa palavra vem de estar. 
 
estar > estável 
 
 O verbo possui R, VT e desinência: [est]R[a]VT[r]Dinf. Foi adicionado o sufixo 
[vel]. 
 
[est]R[a]VT[r]Dinf > [est]R[a]VT[vel]S[Ø]VT[Ø]DG[Ø]DN 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 46 
 
 
6) Amores 
 
 Essa palavra vem de amar. 
 
amar > amor > amores 
 
 O verbo primitivo contém R, VT e desinência: [am]R[a]VT[r]Dinf. Adicionou-se 
o sufixo [or] e a palavra foi passada ao plural, que, nesse caso, pode ser interpretado de 
duas formas, como já estudamos. 
 
[am]R[a]VT[r]Dinf > [am]R[or]S[Ø]VT[Ø]DN > [am]R[or]S[e]VT[s]DN 
[am]R[a]VT[r]Dinf > [am]R[or]S[Ø]VT[Ø]DN > [am]R[or]S[Ø]VT[es]DN 
 
7) Embarcação 
 
 Essa palavra vem de barco. 
 
barco > embarcar > embarcação 
 
 A forma primitiva tem R e VT: [barc]R[o]VT[Ø]DN. Adicionou-se o prefixo [em], 
um sufixo zero (acompanhado da terminação verbal –ar) e o sufixo [ção]. 
 
[barc]R[o]VT[Ø]DN > [em]P[barc]R[Ø]S[a]VT[r]Dinf > 
[em]P[barc]R[Ø]S[a]VT[ção]S[Ø]VT[Ø]DN 
 
8) Vice-diretora 
 
 Esta análise é um pouco mais complexa, porque somos obrigados a enxergar a 
alomorfia na raiz. A palavra, evidentemente, vem de diretora, feminino de diretor, mas 
sabemos que diretor é aquele que dirige (uma escola, um projeto, etc.). Então, diretor 
vem de dirigir, com adição do sufixo [or] e alomorfia na raiz. 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 47 
 
dirigir > diretor > diretora > vice-diretora 
 
 Primeiro, dirigir: [dirig]R[i]VT[r]Dinf. Essa palavra deu origem a diretor: 
[diret]R[or]S[Ø]VT[Ø]DG[Ø]DN. Por sua vez, essa palavra passou ao feminino, depois 
recebeu o prefixo [vice]. 
 
[dirig]R[i]VT[r]Dinf > [diret]R[or]S[Ø]VT[Ø]DG[Ø]DN > [diret]R[or]S[Ø]VT[a]DG[Ø]DN 
> [vice]P[diret]R[or]S[Ø]VT[a]DG[Ø]DN 
 
9) Repartamos 
 
 Sabemos que repartamos é conjugação de repartir, que deriva de partir. 
 
partir > repartir > repartamos 
 
 A forma partir é primitiva: [part]R[i]VT[r]Dinf. Adicionou-se o prefixo [re] e, 
depois, conjugou-se o verbo na 1.ª pessoa do plural do presente do subjuntivo. 
 
[part]R[i]VT[r]Dinf > [re]P[part]R[i]VT[r]Dinf > [re]P[part]R[Ø]VT[a]DMT[mos]DNP 
 
10) Concretizei 
 
 Essa palavra vem de concreto. 
 
concreto > concretizar > concretizei 
 
 Semelhantemente ao exemplo anterior, concreto é a forma simples: 
[concret]R[o]VT[Ø]DN. Ela gerou o verbo concretizar pela adição do sufixo [iz(ar)], que 
foi conjugado na 1.ª pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo. 
 
[concret]R[o]VT[Ø]DN > [concret]R[iz]S[a]VT[r]Dinf > [concret]R[iz]S[e]VT[Ø]DMT[i]DNP 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 48 
 
EXERCÍCIOS 
 
1) Identifique, nas sentenças abaixo, as formas livres, as dependentes e as livres. 
a. Comprei uma blusa. 
b. Ele olha as árvores. 
c. A pessoa com dor entra o hospital. 
2) Indique, nas comparações abaixo, em que morfema(s) ocorreu alomorfia. 
a. caber, caibo 
b. amável, amabilidade 
c. industrial, escolar 
d. ilegível, inútil 
e. ama, amei 
f. perderei, perderá 
g. garota, (a) jovem 
h. entregásseis, entregardes 
i. olhos, (os) tórax 
3) Indique, nos vocábulos a seguir, se há algum morfema zero. Se o houver, 
indique, também, como esse morfema é classificado. 
a. cantássemos 
b. teclarei 
c. gatinhos 
d. amores 
e. mesas 
f. sol 
g. amado 
4) As análises mórficas abaixo estão incorretas. Justifique suas incoerências. 
Lembre-se de que todos os morfemas zero devem ser analisados. 
a. mato = [mat]R[o]VT 
b. mesa = [mes]R[a]DG[Ø]VT 
c. mestre = [mestr]R[Ø]VT[e]DG[Ø]DN 
d. cantei = [cant]R[Ø]VT[e]DMT[i]DNP 
e. encaixar = [encaix]R[Ø]S[a]VT[r]Dinf 
f. quadro = [quadr]R[o]VT[Ø]DG[Ø]DN 
g. quiseres = [quis]R[e]VT[r]Dinf[es]DNP 
5) Realize a análise mórfica dos vocábulos abaixo. Justifique suas análises. 
Lembre-se de que todos os morfemas zero devem ser analisados. 
a. enquadramento 
b. amado 
c. renovar 
d. subterrâneo 
e. ricaço 
f. nervosinha 
g. empedrar 
6) Nos vocábulos abaixo, identifique se a raiz destacada é livre ou presa. 
a. psicologia 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 49 
 
b. contrário 
c. rústico 
d. marceneiro 
e. aerodinâmica 
7) Para a forma curcular, existem duas entradas correspondentes: o verbo circular, 
que significa mover-se em círculo, e o adjetivo circular, que significa que tem 
forma de círculo. Realize a análise mórfica desses dois vocábulos, evidenciando 
suas diferenças. 
8) Para a forma pata, existem duas entradas correspondentes: o substantivo pata, 
que significa membros ou extremidades dos animais, e o outro substantivo pata, 
que significa fêmea do pato. Realize a análise mórfica desses dois vocábulos, 
evidenciando suas diferenças. 
9) Aprendemos, nesta unidade, que a maioria dos sufixos é responsável pela 
mudança categorial, isto é, pela mudança de classe. No entanto, existem 
algumas formações irregulares: o nome correpondente à pessoa que cuida de 
fazenda é fazendeiro, mas o nome correspondente à pessoa que cuida de unhas 
é manicure, e não *unheiro. Agora reflita. Por que, para a morfologia, o 
mecanismo de criação de fazendeiro é preferível ao de manicure? 
10) Vamos supor que você esteja conversando com uma pessoa que não conhece 
profundamente a metalinguagem da língua portuguesa, embora seja nativa dessa 
língua. Mostre um teste pelo qual você poderia comprovar que ela tem um 
conhecimento morfológico internalizado. 
 
 
 
 
 
 
 
UNIDADE 2: 
Morfologia e suas interfaces 
 
Morfologia concisa para ensino superior Roberto Gandulfo 51 
 
MORFOLOGIA E FONOLOGIA 
 
 Martinet, linguista estruturalista, dividiu a a linguagem em duas articulações: a 
primeira e a segunda. A primeira articulação é a morfologia, em que se articulam 
estruturas mínimas significantes. A segunda é a fonologia, em que se articulam 
estruturas mínimas não significantes. 
 É por isso que as nomenclaturas de ambas as áreas são próximas: fonema e 
morfema, fone e morfe, alofonia e alomorfia. 
 
* * * * * 
 
 Um ponto de contato entre a morfologia e a fonologia está no plano estrutural, 
uma vez que, em alguns casos, ocorrem fenômenos fonológicos que alteram a estrutura 
interna dos morfemas. Essas alterações, em geral, são aleatórias. Essas modificações 
fonológicas são denominadas metaplasmos. 
 Existem vários metaplasmos, ocasionados por diversas situações. Neste tópico, 
não vamos tratar de todos, mas somente de alguns que são mais frequentes em 
português. 
 O primeiro é a prótese. Prótese é a adição de fonemas no início do vocábulo. 
Não é frequente em português, mas existem alguns resquícios: em palavras como estar 
e escrever, o e é expletivo, e some quando se realizam algumas derivações. 
 
[ob]+estar > obstar 
estar+[vel] > [in]+estável > instável 
[in]+escrever

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