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HISTÓRIA DO CORPO • Área: Gênero e Sexualidade SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ........................................................................................................................................ 6 INTRODUÇÃO /PROVOCAÇÃO.................................................................................................................. 7 UNIDADE 1 – CORPO - GENERO E SEXUALIDADE. ............................................................................ 9 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................... 9 A PLENITUDE E SUAS CARACTERÍSTICAS DAS VÁRIAS DIMENSÕES. .................................................................. 9 CAPÍTULO 1 – HISTÓRIA DO CORPO. ................................................................................................. 10 A definição de corpo. .......................................................................................................................... 10 A história do corpo.............................................................................................................................. 11 Pré-história: ........................................................................................................................................ 12 CAPÍTULO 2 – CORPO - CONCEPÇÃO AO LONGO DA HISTÓRIA OCIDENTAL. .............................. 15 Antiguidade: Índia e Egito. ................................................................................................................. 15 Período clássico: Grécia .................................................................................................................... 18 Idade Média: as oscilações conceituais de corpo, retraso e avanço das ciências. ........................... 24 Idade Moderna: Segunda metade do século XVII ............................................................................. 27 Pós-modernidade. .............................................................................................................................. 30 UNIDADE 2 - O CORPO COMTEMPORÂNEO ...................................................................................... 37 CAPÍTULO 1 – CORPO, MODERNIDADE E CONTRAMODERNIDADE. .............................................. 37 O corpo moderno................................................................................................................................ 39 A contramodernidade e as novas gestões corporais. ........................................................................ 43 Hibridismo cultural. ............................................................................................................................. 45 Nostalgia do antigo. ............................................................................................................................ 47 Orientalização. .................................................................................................................................... 48 Holismo. .............................................................................................................................................. 49 Autonomia ou automonitoramento. .................................................................................................... 49 CAPÍTULO 2 – O CORPO NA PÓS MODERNIDADE. ..................................................................................... 52 O corpo contemporâneo. .................................................................................................................... 54 Cultura do consumo ........................................................................................................................... 59 O corpo como mercadoria .................................................................................................................. 61 ANEXOS; .................................................................................................. ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO. REFERENCIAS; ....................................................................................... ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO. ÍCONES Apresentamos inicialmente ícones que tem como função pedagógica e objetivam chamar a atenção do(a) aluno(a) para os conteúdos ou ações que o(a) mesmo(a) deverá desenvolver durante seus estudos, através desse material didático. Provocação Apresentamos através desse ícon, textos que levam o(a) aluno(a) a fazer reflexões sobre determinado assunto antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor/conteudista. Para refletir Questões e tópicos inseridos no decorrer do estudo, que tem por objetivos propiciar ao aluno(a) momentos de pausa e reflexão sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões. Sugestão de estudo complementar Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo. Praticando Sugestão de atividades, no decorrer das leituras, com o objetivo didático de fortalecer o processo de aprendizagem do/a aluno/a. Atenção Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a síntese/conclusão do assunto abordado. Saiba mais Informações complementares que contribuem na construção das sínteses/conclusões sobre os conteúdos abordados. Sintetizando Texto que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o entendimento pelo(a) aluno(a) sobre trechos mais complexos. Exercício de fixação Atividades que buscam reforçar a assimilação e fixação dos períodos e conteúdos que o autor/conteudista achar mais relevante em relação a aprendizagem de seu módulo. Avaliação Questionário com 05 questões objetivas e/ou subjetivas, baseadas nos objetivos do curso e nos objetivos da disciplina, que oportunizam a verificação da aprendizagem dos capítulos e das unidades desse material didático. Para não finalizar Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o(a) aluno(a) a continuar a aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado. APRESENTAÇÃO Este é o nosso Caderno de Estudos - HISTÓRIA DO CORPO, material elaborado com o objetivo de contribuir para a realização e o desenvolvimento de seus estudos, assim como para a ampliação de seus conhecimentos a GÊNERO E SEXUALIDADE. Os conteúdos foram organizados em unidades de estudo, subdivididas em capítulos de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, que farão parte das atividades avaliativas do curso; serão indicadas também fontes de consulta para aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares. Desejamos a você um trabalho proveitoso sobre os temas abordados nesta disciplina! Lembre-se de que, apesar de distantes, podemos estar muito próximos. INTRODUÇÃO /PROVOCAÇÃO A história do corpo humano é a história da civilização. “No corpo estão inscritas todas as regras, todas as normas e todos os valores de uma sociedade específica, por ser ele o meio de contacto primário do indivíduo com o ambiente que o cerca” (Daolio, 1995, p. 105) Cada sociedade, cada cultura age sobre o corpo determinando-o, constroem as particularidades do seu corpo, enfatizando determinados e padrões em comparativo a outros, criando seus próprios padrões. Surgem, então, os padrões de beleza, de sensualidade, de saúde, de postura, que dão referências aos indivíduos para se construírem como homens e como mulheres. Ao longo dotempo, esses modelos produziram a história corporal, funcionando como mecanismos codificadores de sentido e produtores da história corporal (Rosário, 2006), percebendo-se que as mudanças que foram acontecendo na noção de corpo foram oriundas das mudanças no discurso. Assiste-se actualmente a uma espécie de reinvenção da cultura onde o cyberespaço e a realidade virtual põem em questão a própria existência do real e do seu sentido. “Podemos viver afetivamente essa perda, mas ter em atenção que o virtual não se opõe ao real, havendo entre eles uma relação entre o actual e o virtual, um modo próprio de ser do real que se associa a um processo de “desterritorialização” e a novos fenómenos espaço-temporais (Tucherman, 2004, p.13).” De fato, perplexidade parece ser o sentimento mais frequente nos nossos dias. Estamos incapazes de, ou mal preparados para, entendermos o que constituía a nossa sensação de realidade, aquilo que éramos e o que somos. Surgem então outras questões. Quem somos nós, humanos? O que é ser um corpo? O que é ter um corpo? O que é hoje a nossa corporeidade? Que possibilidades nos são abertas e que experiências nos são possíveis? Assim, para se conhecer os sentidos construídos para o corpo humano no presente, será necessário fazer uma caminhada, ainda que breve, pela História e observar as diferentes formas de tratar o corpo, a sexualidade, os géneros, baseadas nas disciplinas que estudamos anteriormente. Modificar o ambiente, os aspectos, construídos pela cultura e pela sociedade que tentaremos falar, nesta última disciplina do curso GÊNERO E SEXUALIDADE, sobre do corpo e a sua história, entendendo que o mais importante não será a delimitação de datas e épocas, mas a descrição dos traços que se destacaram em determinados períodos, visando compreender melhor o corpo de hoje. UNIDADE 1 – CORPO - GÊNERO E SEXUALIDADE. INTRODUÇÃO A evolução mostra alguns ensaios, com êxito na definição do termo: corpo. Dois desses destaques por sua amplitude e difusão, nos quais emerge a forma dual de pensar o corpo, basea-se em duas ciências: a Fisiologia e a Psicanálise. O corpo que prioriza a visão dual da mente e ora a materialidade do corpo. Em meio a esse dualismo psicofísico o corpo passa ser definido segundo as duas vertentes teóricas mencionadas anteriormente, a vertente que o sacraliza por sua condição de casa da alma e do espírito, ambos imortais, enquanto de outro lado, a vertente que a negligencia por sua condição material e mortal, o corpo concebido em sua vulnerabilidade e inevitável perecividade. O corpo como vertente Psicanalítica suporte físico da mente, todavia, explica o seu material de: inteligência, emoção e sentimento. A vertente fisiológica é válida e necessária para explicar a base biológica do corpo. A vertente fisiológica ajudou com a investigação psicológica do corpo, porque traz a influência da convivência em sociedade, com cultura e história, o que se aproxima de uma interpretação mais holística. A plenitude e suas características das várias dimensões. • A física (materialidade do corpo em si e por si mesmo). • A fisiológica (a inter-relação de sistema funcionamento). • A social (lócus das interações interpessoais). • A histórica (a relação de espaço-tempo da existência do corpo). • A energética (a sua força motriz). • A cultural (orientações quanto ao modo como o corpo vive, como atua e reage). CAPÍTULO 1 – HISTÓRIA DO CORPO. A definição de corpo. Analisar a história do corpo pela ótica da evolução de sua concepção mostra alguns ensaios, com relativo êxito na definição do termo: corpo. Dois destes ensaios merecem destaque por sua amplitude e difusão, nos quais emergem a forma dual de pensar o corpo, forma esta, embasada em duas ciências, a Fisiologia e a Psicanálise. A visão dual de corpo é aquela que ora prioriza a mente e ora a materialidade do corpo. Em meio a esse dualismo psicofísico o corpo passa ser definido segundo as duas vertentes teóricas mencionadas anteriormente, a vertente que o sacraliza por sua condição de casa da alma e do espírito, ambos imortais, enquanto de outro lado, a vertente que o negligência por sua condição material e mortal, o corpo concebido em sua vulnerabilidade e inevitável perecividade. A vertente Psicanalítica concebe o corpo como suporte físico da mente, todavia, explica o seu aspecto imaterial de: inteligência, emoção e sentimento. A vertente fisiológica é válida e necessária para explicar a base biológica o corpo, sobretudo da expressão corporal. Porém, não suficiente para chegar à plenitude de sua caracterização. Mesmo assim, a vertente fisiológica contribui com investigação psicológica o corpo, porque traz subjacente a influência da convivência em sociedade, com cultura e história, o que maximamente se aproxima de uma interpretação mais holística de corpo. O uso do termo plenitude na referência de corpo se deve à necessidade de caracterizá-lo de forma a dar a ideia da completude percebida em suas várias dimensões: a física (materialidade do corpo em si e por si mesmo); a fisiológica (a inter- relação de sistemas e funcionamento); a social (lócus das interações interpessoais); a histórica (a relação d espaço-tempo da existência do corpo); a energética (a sua força motriz) e a cultural (orientações quanto ao modo como o corpo vive, como atua e reage). Em outras palavras, seria buscar descobrir os atributos que libertam o corpo de sua reclusa condição material, para tanto, o desafio está em unificar tais conceitos em uma única concepção de corpo. A história do corpo. A história do corpo tem mostrado a submissão conceitual ao dualismo psicofísico (o material e o não material) com a tendência de ver as coisas dentro do simplismo do pensamento primitivo, em que o mundo somente poderia ser percebido em duas dimensões, acima e abaixo do olhar (terra e céu). Talvez a concepção psicofísica do corpo seja um mero resquício do pensamento primitivo fortemente tendencioso em simplificar tudo que vê, para também simplificar o entendimento de tudo que está no entorno. Fonte: https://www.google.com.br/search O mesmo que dizer: é preto ou branco (como se não houvesse cinza), sim ou não, alto ou baixo, longe ou perto, enfim, claras tentativas de fugir do meio termo, porque isso significaria complicar o entendimento e favorecer o equívoco. Contudo, o simplismo conceitual, teve seus efeitos danosos, a arbitrária fragmentação da ideia de corpo, banalizou tudo que lhe diz respeito e alijou o corpo da concepção mais completa de si mesmo. Além disso, o homem educado (pelo grupo familiar e escolar, no trabalho e no lazer) sempre pareceu ter dificuldade em perceber claramente e sem preconceitos o próprio corpo, susceptível aos prejuízos que tal dificuldade representa, ou seja, a dupla realidade a que se submete a pessoa, quando sua consciência é separada do corpo. A história do corpo se apresenta sob uma ordem cronológica, em que a intenção é destacar a forma como o corpo é concebido ao longo da história. Pré-história: Por mais contraditório que possa parecer, o homem primitivo talvez seja único e original, no que tange ao modo de viver em um ambiente e se percebe como parte dele (ambiente). Nos desenhos rupestres, objetos de pesquisa em sítios arqueológicos espalhados pelo mundo, oferecem muitas informações acerca da relação próxima do homem com o ambiente. Não se trata de achados de fácil interpretação, para isso é preciso considerar a aurora do pensamento humano, com a inerente dificuldade do homem primitivo, até mesmo a sua inabilidade para compreender as leis dos fenômenos naturais e considerar que tudo parecia estar em seus inícios. O incompreensível era mitificado, um recurso para explicar o inexplicável econduzir a percepção do entorno, que o captava, em conformidade com a compreensão mítica destes mesmos eventos. Os trabalhos rupestres mostram a representação de corpo do homem primitivo, deles emergem a sua relação mítica com o mundo circundante, cheia de medos, de sensações de impotência diante dos mistérios e da agressividade dos eventos naturais que provavelmente colocavam a vida em risco. As posturas e posições corporais, expressadas nos desenhos, dão alguma informação de como os homens primitivos concebiam o corpo. A percepção de si mesmos se sustentava na forma como explicavam um mundo ameaçador, pelo temor que sentiam diante do perigo. Eibel Eibesfeldt (1977, p.109) sugere que o homem é um ser geneticamente pré-programado para enfrentar e superar riscos. Por isso os grupos familiares primitivos se organizavam para protegerem a mulher, a prole, os alimentos, a liderança e o território. A necessidade de proteção reforçou a concepção da vida em grupo, ou em coletividade e não como indivíduos, embora não seja possível afirmar a total ausência da individualidade. Há indícios claros da individualidade no homem primitivo, por exemplo, na ação de enterrar os seus familiares, proteger as crianças e as mulheres, cuidar dos feridos e admirar àqueles que conquistavam posições de liderança, no grupo, por meio de disputas pessoais e, quase sempre, mortais. Uma vez que o posto de liderança fosse constantemente disputado, não é difícil supor que o indivíduo primitivo poderia ter idealizado melhorar a sua posição no grupo, almejar a liderança, ou aliar-se ao líder. Nesta direção, a individuação poderia sustentar o coletivo. Em outras situações, as decisões coletivas sobrepujavam os ideais individuais. Esta afirmação se sustenta em estudos antropológicos que mostram a atitude de um idoso enfermo, em separar-se do grupo para não retardar a jornada pela sobrevivência, dos demais indivíduos. O conceito de coletividade pode aparentemente nublar o conceito de individualidade, é irresistível imaginar um homem primitivo em seu cotidiano, lutando pelo alimento, usando seu corpo para solucionar os problemas diários, tais como: beber água no rio usando as mãos em formato de concha, cavando a terra com as mãos em formato de garras para retirar raízes e se alimentar, enfim, agarrando, pegando, saltando, caminhando, agachando e fazendo todo o tipo de coisas que posteriormente lhes foram fontes de novas ideias e criações. Talvez estas informações permitam vislumbrar a aurora do papel do corpo como mediador entre o homem primitivo e as superações das dificuldades ambientais. O corpo do homem primitivo estava em sintonia e intimidade com o ambiente, com a satisfação das necessidades e a solução dos problemas imediatos do cotidiano, no tempo em que não existiam tantos instrumentos, o corpo, em si, era o instrumento de mediação do homem com o mundo. Vamos aprofundar nosso conhecimento com o video abaixo: http://www.youtube.com/watch?v=llh7cxi9fPc http://www.youtube.com/watch?v=llh7cxi9fPc CAPÍTULO 2 – CORPO - CONCEPÇÃO AO LONGO DA HISTÓRIA Antiguidade: Índia e Egito. Da pré-história para a antiguidade, um enorme salto temporal para encontrar a cultura asiática, uma entre as mais antigas do mundo a conceber o corpo em duas dimensões que se fundem: a espiritualidade e a política. Para os hindus, em especial, a concepção de corpo emerge de cultura milenar, cujo entendimento da materialidade do corpo aceita a sua pluralidade, em camadas sobrepostas e interdependentes, que identificam as dimensões do corpo: a física, a fisiológica, a energética, a social, a psicológica, a filosófica, entre outras.O corpo material se constitui de outros tantos corpos: o mental, emocional, espiritual, e todos formam partes de um só corpo a ser conhecido parte por parte, para definir a sua materialidade, necessidades e desejos de elevação espiritua Fonte: https://www.google.com.br/search A ideologia budista e a bramanista apresentam o consenso de que o espírito deve libertar-se de todo o tipo de dependência do mudo material para que o corpo seja conhecido em sua essência. Os bramanistas conseguem ouvir as batidas do próprio coração, o ruído do sangue a correr pelas artérias e outros sons do corpo, habilidade esta considerada quase impossível para o homem ocidental. A cultura asiática valoriza o domínio do corpo e a liberação do espírito, entende que o corpo aprisiona o espírito com suas necessidades e dependências. Estas, por sua vez, são as causadoras das sensações de incompletude e insatisfação que submetem o corpo a um estado de sofrimento constante. Por isso, o corpo precisa ser dominado, reeducado para não desejar o impossível, somente assim, seria possível aplacar a dor e libertar o espírito do sofrimento. A ideia de libertação do espírito, por si só, implica em supremacia do espírito sobre o corpo, porém é preciso cuidado em tal afirmação. Paradoxalmente a esta ideia, os povos asiáticos também enfeitam magnificamente seus corpos com tintas de cores variadas, tecidos, brilhos, pedras preciosas, semipreciosas e outros realces, cujo efeito leva a crer tratar- se de povos vaidosos. Para Lobsang Rampa (6) “o corpo é a vitrine do espírito” (1959). O homem e a mulher de cultura hindu indicam a sua classe social pelo tipo de vestimenta, tatuagens e jóias que usam, transformando o corpo um objeto de informação social. Todavia, a vaidade comum a todas as castas revela a sua valorização e sugere que entre eles o corpo não está relegado ao espaço da obscuridade, do esquecimento ou do apagamento. Hindus e egípcios têm características culturais comuns, seus corpos trazem as marcas de suas identidades definidas segundo a condição de nascimento, um corpo é nobre porque assim determinaram os deuses, e como tal, devia ter a aparência divina que os destacava dos demais, os não nobres. Mesmo após a morte, a mumificação separou e diferenciou o nobre e o rico, daqueles que, sem recursos, eram condenados ao pó. Tais padrões culturais indicam que o domínio do corpo foi essencial para estes povos e seus desejos de encaminhar o espírito, após a morte, para a conquista da felicidade eterna. Subliminarmente, as culturas, hindu e a egípcia sugerem o corpo como barreira para a evolução do espírito e, por mais que o ornamentem, este permanece um empecilho à própria transcendência. Estas mesmas culturas estimulam a ornamentação do corpo para delimitar as fronteiras socioeconômicas, para marcar as distâncias entre classes sociais, tanto em vida, como após a morte. Os egípcios mumificavam os corpos (dos ricos, cultos e sacerdotes) para que estes servissem de moradia da alma, na eternidade. Em outras culturas, o corpo cremado incandesce com o efeito do fogo (símbolo da purificação e da renovação), vira cinzas e solta fumaça. Os indianos cremam o corpo para liberar o espírito da matéria e alcançar a vida eterna, embalado pela fumaça que sobe aos céus. Em ambas as culturas (hindu e egípcia), o corpo mumificado ou cremado é concebido como condutor da alma, guardião de sua última jornada. A atribuição de tal responsabilidade ao corpo denuncia a sua importância, como condutor, o corpo é transmutado e purificado para acompanha a alma, e provavelmente se transformar nela. CURIOSIDADE No antigo Egito, como já sabemos, era muito importante que depois de morto, o corpo ficasse em perfeito estado para poder viver outra vida. Essa era a crença do povo. Então, eles criaram um processo de mumificação, isto é, preservação do corpo do morto. Se depois que a pessoa morre, o corpo não for preservado, ele se decompõe, deixando apenas os ossos. Assim, os egípcios preservavam o corpo de modo que o morto ficasse bonitinho e com jeito saudável! É importante a gente compreender que, para os egípcios, uma pessoatinha seis partes diferentes: o corpo, o ba ou personalidade; o ka ou espírito da vida; o akh ou a alma imortal; o seu nome e a sua sombra. Se a pessoa perdesse uma dessas coisas, não estava mais completa. Por causa disso, para que a pessoa fosse completa para o outro mundo, eles criaram o processo de mumificação. Período clássico: Grécia Esse processo levava por volta de setenta dias. Todos os órgãos internos eram removidos, menos o coração (que eles acreditavam fosse o mais importante). Os órgãos eram colocados nos vasos cânopos, que eram quatro. Depois secavam o corpo com natrão. Depois de seco, o corpo era enrolado em linho com resina. Eram usados muitos metros de linho, com inscrições religiosas. Além disso, dentro das tiras de linho, os sacerdotes colocavam jóias e enfeites para proteger o morto, que finalmente podia ser sepultado. Fonte: http://pt.wikibooks.org/wiki/Mist%C3%A9rios_do_Egito_Antigo_para_curiosos/As_m%C3%BAmias Então, onde está o mistério? Será que a múmia que estava em um museu que fechou em Niagara Falls, no Canadá, pode ser mesmo a do faraó Ramsés I? Quando o museu fechou, sua coleção de coisas do Egito foi comprada pela Universidade Emory de Atlanta em 2001. Junto foi a múmia, que estava muito bem conservada, apesar da falta de cuidados apropriados. Ela é muitíssima parecida com a de Seti I e a de seu filho Ramsés II. Será que ela é a múmia do pai de Seti, Ramsés I? Na verdade, não há motivos para ninguém se assustar com uma múmia. Pelo contrário, se você fosse uma espécie de Indiana Jones, ia adorar encontrar uma múmia. Já imaginou descobrir coisas novas a respeito de alguém que viveu há milhares de anos atrás? Se você for pesquisar vai descobrir um pouco mais e se perguntar, será que um dente foi a prova de que aquela múmia pertenceu a Hatshepsut, uma grande governante do Egito, que reinou como faraó? De quem serão as múmias que foram encontradas, numa tumba intacta em fevereiro de 2006, no Vale dos Reis? Desde 1907, quando foi descoberta, os estudiosos não chegam a uma conclusão, nem sequer, se é um homem ou uma mulher. Fonte: http://pt.wikibooks.org/wiki/Mist%C3%A9rios_do_Egito_Antigo_para_curiosos/As_m%C3%BAmias http://pt.wikibooks.org/wiki/Mist%C3%A9rios_do_Egito_Antigo_para_curiosos/Gloss%C3%A1rio#Vasos_Canopos http://pt.wikibooks.org/wiki/Mist%C3%A9rios_do_Egito_Antigo_para_curiosos/Gloss%C3%A1rio#Natr.C3.A3o http://pt.wikibooks.org/wiki/Mist%C3%A9rios_do_Egito_Antigo_para_curiosos/Gloss%C3%A1rio#Linho http://pt.wikibooks.org/wiki/Mist%C3%A9rios_do_Egito_Antigo_para_curiosos/Gloss%C3%A1rio#Resina http://pt.wikibooks.org/wiki/Mist%C3%A9rios_do_Egito_Antigo_para_curiosos/As_m%C3%BAmias http://pt.wikibooks.org/wiki/Mist%C3%A9rios_do_Egito_Antigo_para_curiosos/Gloss%C3%A1rio#Niagara_Falls http://pt.wikibooks.org/wiki/Mist%C3%A9rios_do_Egito_Antigo_para_curiosos/Gloss%C3%A1rio#Indiana_Jones http://pt.wikibooks.org/wiki/Mist%C3%A9rios_do_Egito_Antigo_para_curiosos/Gloss%C3%A1rio#Vale_dos_Reis http://pt.wikibooks.org/wiki/Mist%C3%A9rios_do_Egito_Antigo_para_curiosos/Gloss%C3%A1rio#Vale_dos_Reis http://pt.wikibooks.org/wiki/Mist%C3%A9rios_do_Egito_Antigo_para_curiosos/As_m%C3%BAmias A imagem do corpo grego, ainda hoje atraente e considerada uma referência, é bastante revelador da existência e dos ideais estéticos veiculados na altura. Na verdade, este corpo era radicalmente idealizado, treinado, produzido em função do seu aprimoramento, o que nos indica que ele era, contrariamente a uma natureza, qualquer que ela fosse, um artifício a ser criado numa civilização que alguns helenistas chamam de “civilização da vergonha” por oposição à judaico-cristã que será uma “civilização da culpa” (Dodds, 1988, citado por Tucherman, 2004). Assim, a imagem idealizada corresponderia ao conceito de cidadão, que deveria tentar realizá-la, modelando e produzindo o seu corpo a partir de exercícios e meditações. O corpo era visto como elemento de glorificação e de interesse do Estado. O corpo nú é objeto de admiração, a expressão e a exibição de um corpo nu representavam a sua saúde e os Gregos apreciavam a beleza de um corpo saudável e bem proporcionado. O corpo era valorizado pela sua saúde, capacidade atlética e fertilidade. Para os gregos, cada idade tinha a sua própria beleza e o estético, o físico e o intelecto faziam parte de uma busca para a perfeição, sendo que o corpo belo era tão importante quanto uma mente brilhante. A moral quanto ao corpo e ao sexo não era rigidamente organizada e autoritária, apenas estabelecia algumas normas de conduta para evitar os excessos, que significavam a falta de controlo do indivíduo sobre si mesmo, prescrevendo o “bom uso” dos prazeres (bebida, comida, sexo) (Rosário, 2006). Estes, porém, eram considerados apenas para os cidadãos, isto é, para os homens livres, estando excluídos tanto os escravos como as mulheres. A estas cabia cumprir funções como obediência e fidelidade aos seus pais e maridos e a reprodução. Os prazeres eram do domínio masculino, não do feminino. De facto, a civilização grega não incluía as mulheres na sua concepção de corpo perfeito, que era pensado e produzido no masculino. As normas para os homens eram mais soltas, permitindo a bigamia e a homossexualidade como práticas naturais (Rosário, 2006). As leis da cidade aplicavam, inclusive, normas diferentes aos corpos masculinos e femininos, sendo que aos primeiros corresponderiam o andarem nus nos ginásios e o andar na cidade com vestes soltas por serem capazes de absorver calor e manter o equilíbrio térmico, dispensando o uso da protecção das roupas; aos corpos femininos, impunha-se o uso de roupas em casa, considerando-se que estas seriam suficientes e para a saída à rua os seus corpos deviam ser cobertos (Tucherman, 2004). Vemos hoje as figuras humanas expostas no Parténon, nuas, simbolismo de juventude, da perfeição. Cada cidadão era livre de atingir o corpo perfeito, idealizado e, depois, expô-lo. Os corpos eram trabalhados e construídos, como objectos de admiração que começavam a ser “esculpidos” e modelados nos ginásios, fundamentais nas polis gregas, e que acabavam por ser mostrados, muitas vezes, nos Jogos Olímpicos. A saúde, a expressão e exibição de um corpo nu estavam associadas, os Gregos apreciavam a beleza de um corpo saudável e bem proporcionado. O grego desconhecia o pudor físico, o corpo era uma prova da criatividade dos deuses, era para ser exibido, adestrado, treinado, perfumado e referenciado, pronto a arrancar olhares de admiração e inveja dos demais mortais. Mas não se tratava apenas de narcisismo, de paixão desmedida por si mesmo. Os corpos não existiam apenas para mostrar-se, eles eram também instrumentos de combate. Tudo na natureza era luta, era obstáculo a ser transposto, era espaço ou terra a conquistar. A vida, diziam os deuses, não era uma graça, mas sim um dom a ser mantido. As corridas, os saltos, os halteres, os discos, os dardos, os carros, eram as provas que as divindades exigiam deles para que se mostrassem dignos de terem sido premiados. Os deuses pagãos, afinal, não passavam de seres humanos melhorados, eram a excelência do que era possível alcançar. Saliente-se que, através desta forma idealizada de pensar e viver o corpo, se definem também formas de estar na sociedade e princípios filosóficos e sociais que assentam na visão como sentido primordial, no olhar, no espelho, como fundamentais para o funcionamento de uma sociedade (Cunha, 2004). É interessante verificar como esta forma de ler a realidade ainda hoje se mantém, esta primazia do olhar. Segundo Foucault (1994), nos séculos I e II, os filósofos enfatizavam a necessidade dos indivíduos terem cuidado consigo mesmos, pois seria dessa forma que alcançariam uma vida plena. Eles cuidavam tanto do corpo como da alma,recomendando a leitura, as meditações e regimes rigorosos de atividade física e dietas. Sobre o pensamento clássico socrático, caracteriza-se pela importância dada ao espírito inquieto, que busca com a ironia descobrir e interpretar o mundo circundante. “Segundo Sócrates (469-399 a.C), o conhecimento está dentro de cada homem e mulher, e sugere ser suficiente a aplicação do Mundo Circundante Em filosofia, Mundo é tudo aquilo que constitui a realidade. Embora esclarecer o conceito de mundo tenha sempre sido considerada uma das tarefas básicas da filosofia ocidental, este tema parece ter sido levantado explicitamente somente no início do século XX1 e desde então tem estado sujeito a debate contínuo. A questão sobre o que o mundo é ainda não foi respondida. Duas definições surgidas nos anos 1920, todavia, sugerem a gama de opiniões disponíveis. "O mundo é tudo aquilo que é o caso"2 , escreveu Ludwig Wittgenstein em seu influenteTractatus Logico-Philosophicus, publicado originalmente em 1922. Esta definição serviu de base ao positivismo lógico, com seu pressuposto de que há exatamente um mundo, consistindo da totalidade dos fatos, independentemente das interpretações que os indivíduos possam fazer deles. Martin Heidegger, entretanto, argumentou que "o mundo circundante é diferente para cada um de nós, não obstante nos movimentarmos num mundo comum"3 . O mundo, para Heidegger, é aquele no qual fomos "lançados" ao acaso e com o qual, enquanto seres-no-mundo, devemos chegar a um acordo. Sua concepção de "mundanidade do mundo" foi desenvolvida principalmente em sua obra de 1927, Sein und Zeit. Fonte : http://pt.wikipedia.org/wiki/Mundo_(filosofia) http://pt.wikipedia.org/wiki/Filosofia http://pt.wikipedia.org/wiki/Realidade http://pt.wikipedia.org/wiki/Conceito http://pt.wikipedia.org/wiki/Filosofia_ocidental http://pt.wikipedia.org/wiki/Filosofia_ocidental http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A9culo_XX http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A9culo_XX http://pt.wikipedia.org/wiki/Mundo_(filosofia)#cite_note-1 http://pt.wikipedia.org/wiki/D%C3%A9cada_de_1920 http://pt.wikipedia.org/wiki/Mundo_(filosofia)#cite_note-2 http://pt.wikipedia.org/wiki/Ludwig_Wittgenstein http://pt.wikipedia.org/wiki/Tractatus_Logico-Philosophicus http://pt.wikipedia.org/wiki/Positivismo_l%C3%B3gico http://pt.wikipedia.org/wiki/Martin_Heidegger http://pt.wikipedia.org/wiki/Mundo_(filosofia)#cite_note-3 http://pt.wikipedia.org/wiki/Ser_e_Tempo http://pt.wikipedia.org/wiki/Mundo_(filosofia) método indutivo para chegar à elaboração dos conceitos científicos sobre todas as coisas. É difícil encontrar registros claros de como Sócrates tratava as questões relacionadas ao corpo, o que se sabe é que a partir do pensamento socrático foi possível a criação de escolas secundárias de pensadores, a exemplo, os hedonistas. O hedonismo se refere ao modo de vida de determinados grupos de pessoas, cujo único interesse é a satisfação dos desejos do corpo. Sabe-se, pelos registros históricos, da não aceitação da sociedade da época, ao modo de vida de Sócrates, sobretudo ao tipo de relação que este mantinha com os pupilos. Sócrates postulou que para conhecer profundamente as sensações corporais e o prazer, estes deveriam ser explorados na dimensão de seus limites. A conclusão é de que Sócrates destacou o corpo como recurso importante na procura por respostas que levariam ao conhecimento. Platão (428/27-348/47 a.C), quase ao mesmo tempo de Sócrates, discutiu a dialética, a física e a ética, ressaltou a espiritualidade e o divino. Aparentemente, reforçou o dualismo conceitual de seu antecessor. Entretanto, um olhar mais atento descobre que, também à sua maneira, Platão delegou dimensões ao corpo. Em numero de três, estas dimensões retratam o corpo racional, o irracional e o apetitivo. A dimensão racional é superior às demais porque se localiza no cérebro, a irracional no peito e a apetitiva nas entranhas. Por mais estranho que pareça, Platão localiza a imaterialidade do corpo dentro do próprio corpo, por isso ele pode ser o primeiro a deixar uma abertura para a superação das concepções dualistas e corpo, as mesmas que tanto dificultam a sua compreensão. Sem parecer otimismo excessivo, e mesmo ciente de que Platão tenha concebido o corpo uma prisão da alma, o relevante nele é percepção de que o corpo teria funções subjetivas. Platão atribuiu capacidade de subjetividade ao corpo, o retirou da pura e única condição material, com isso, inseriu algo mais a esta discussão. Ao mesmo tempo em que admitiu a existência das funções subjetivas, alertou quanto à necessidade de manter os exercícios físicos, para que a alma sã habitasse um corpo são. Contudo, o pensamento de Platão deixa dúvidas se haveria, ou não, dualidade em seu conceito de corpo. Aristóteles fez importante ingerência na concepção de corpo e o insere no âmbito do pensamento metafísico. Embora a metafísica alije o corpo do mundo sensível, a idéia aristotélica de existência do corpo como algo individual e real, merece destaque. O corpo não é imóvel, tem movimento e por isso produz causa e efeito. Essa ideia permite a ancoragem de outra, também defendida por Aristóteles, a de que o corpo não é um mero objeto material, porque tem poder para transformar as coisas, ao mesmo tempo em que se transforma. Hipócrates (460-377 a.C) acreditou na ideia de que a natureza condiciona a saúde humana, este filósofo se encontra entre os primeiros a atribuir ao corpo qualidades como: frio, úmido, quente e seco. Se ainda fosse vivo, poderia ser considerado um naturalista, devido ao postulado de que os alimentos deveriam combinar com os humores das pessoas, alimentos frios para pessoas frias, quentes para as pessoas quentes e assim por diante. Hipócrates concebeu o corpo não alienado das coisas do seu entorno, e sim sintonizado com a natureza. A cultura grega em geral, difundida nos contextos das cidades-estado, deixa pistas da concepção diferenciada de corpo, um exemplo, Esparta e Atenas. Em Esparta, o perfil de homem predominante na educação dos jovens era o da virilidade, força e coragem, atributos essenciais aos soldados destinados às guerras. Em Atenas o perfil se definia pela formação do jovem, hábil nos jogos individuais e coletivos, versado nas artes na literatura, na oratória e na filosofia, atributos do homem culto. Ambas as cidades cultuaram a beleza do corpo forte ou suave, os contornos e definições do corpo, feminino e masculino, deveriam levá-lo mais próximo possível da perfeição. Idade Média: as oscilações conceituais de corpo, retraso e avanço das ciências. Na Idade Média o corpo serviu, mais uma vez, como instrumento de consolidação das relações sociais. A característica essencialmente agrária da sociedade feudal justificava o poder da presença corporal sobre a vida quotidiana; características físicas como a altura, a cor da pele e peso corporal, associadas ao vínculo que o indivíduo mantinha com a terra, eram determinantes na distribuição das funções sociais. O homem medieval era extremamente contido, a presença da instituição religiosa restringia qualquer manifestação mais criativa. O cristianismo dominou durante a Idade Média, influenciando, portanto, as noções e vivências de corpo da época. A união da Igreja e Monarquia trouxe maior rigidez dos valores morais e uma nova percepção de corpo. A preocupação com o corpo era proibida, começando-se a delinear claramente a concepção de separação de corpo e alma, prevalecendo a força da segunda sobre o primeiro (Rosário, 2006). O corpo, ao estar relacionado com o terreno, o material, seria a prisão da alma. Torna-se culpado, perverso, necessitado de ser dominado e purificado através da punição. Para o cristianismo, o corpo sempre teve uma característica de fé; é o corpo crucificado, glorificado e que é comungado portodos os cristãos. Como sabemos, as técnicas coercitivas sobre o corpo, como os castigos e execuções públicas, as condenações pelo Tribunal do Santo Ofício (a Inquisição – oficializada pelo papa Gregório IX), o autoflagelo marcam a Idade Média. A Inquisição, inicialmente com o intuito de salvar a alma aos hereges, passou a empregar, mais tarde, a tortura e a fogueira como forma de punição, com autorização do Papa Inocêncio IV, em 1254. Estes eram acontecimentos e cerimónias públicas, cujo objectivo era o de expor à população a sentença recebida pelo réu, era um verdadeiro acto festivo assistido não só pela população, mas pelas autoridades religiosas. Uma boa visualização deste período da nossa história pode ser vista no filme e/ou livro O Nome da Rosa de Umberto Eco (Realizado por Jean-Jacques Annaud, 1986). Outro exemplo de percepção do corpo no final da Idade Média (dos sécs. XIV a meados de XVIII) está nos ‘processos de bruxaria’, foram mortas e reprimidas milhares de mulheres. A ideia central da bruxaria era a de que o demónio procurava fazer mal aos homens para se apropriar das suas almas. E isto era feito essencialmente através do corpo e esse domínio seria efectuado através da sexualidade. Pela sexualidade o demónio apropriava-se primeiro do corpo e depois da alma do homem. Como as mulheres estão ligadas essencialmente à sexualidade, e “porque nasceram de uma costela de Adão”, nenhuma mulher poderia ser correcta, elas tornavam-se ‘agentes do demónio’ (feiticeiras). De fato, os processos inquisicionais sobre acusações de bruxaria enfocavam, principalmente, os corpos das bruxas: elas eram despidas, os cabelos e pêlos eram raspados e todo o corpo era examinado à procura de um sinal que as pudesse comprometer. Neste período ainda se mostra não tão inócuo, quanto se pensava. Graças à coragem de muitos, o conhecimento foi produzido, mesmo que sob o obscurantismo da luz das velas, devido às ameaças da Santa da Inquisição europeia. Entre todos os pensadores deste período, se deve justiça a Santo Tomas de Aquino, por romper laços com filosofia aristotélica e unir alma e corpo em um só composto substancial. Para o tomismo, o corpo educado se transforma em santuário da alma, o que revela a supremacia da alma sobre o corpo. Mesmo não tendo superado o dualismo psicofísico entre matéria e mente, Tomas de Aquino colocou o corpo em um patamar mais elevado, quando lhe atribuiu uma valoração mais próxima àquela dada à alma. Ao enfatizar, conceitualmente, que a alma deve a sua existência ao corpo, a visão tomista deu inicio ao entendimento de que existe uma relação de interdependência entre o corpo e a alma. Não obstante a todo obscurantismo da Idade Média, nessa época as concepções clássicas de corpo foram definitivamente superadas, talvez influenciadas pela aproximação dos ares do renascimento. Com o advento da Fisiologia e as descobertas das funções internas que revelaram os sistemas biológicos do corpo, a preocupação com a condição física do indivíduo se centrou nos alimentos, vistos como combustíveis da máquina corporal e garantia de vida saudável. Simultaneamente, surgiu a percepção de que o alto índice de mortes na população europeia e da facilidade com que proliferavam as pragas nocivas á saúde (endemias e pandemias), teria como causas as cidades com seus esgotos a céu aberto e na precária higienização do ambiente e do corpo. Interessante notar que não somente o corpo foi alvo de preocupações, mas também o ambiente ao seu redor. Se o corpo precisa de ossos para a sua sustentação e armadura, a terra tem as pedras para a sua sustentação. Se o homem tem um lago de sangue que se deriva em veias, o corpo da terra possui o mar que se ramifica em diversos rios. O frio, o seco, o quente e o úmido são tanto qualidades da água, do fogo, da terra e do ar quanto dos quatro humores que participam de maneira essencial do funcionamento fisiológico: o sangue, elemento quente que vem do coração, o fleugma o elemento frio que vem secretado pelo cérebro, a bílis amarela, elemento seco que vem do fígado, a bílis negra originada do baço, formavam os quatro humores do homem (Sant`Anna, 2004, p.13).” Por muito tempo, a definição dos quatro humores do corpo, serviu de diretrizes para a medicina ocidental. Da Vinci faz a equivalência entre as energias do corpo e as energias do planeta terra, tal como Heródoto, observou a importância das composições químicas, quando relacionadas às reações de humor do homem. A expressão de tristeza ou alegria, desconfiança ou confiança, seriam reações emocionais e sentimentais advindas tanto do exterior, como do interior do corpo. Assim, o corpo material expresso a sua subjetividade, segundo o contexto vivenciado, influenciado pelas reações químicas ao ambiente. Da Vinci magistralmente explorou as rações humanas e fez e sua habilidade em manipular as cores, a arte de provocar variadas emoções e sentimentos. Idade Moderna: Segunda metade do século XVII No Renascimento, as ações humanas passaram a ser guiadas pelo método científico, começa a haver uma maior preocupação com a liberdade do ser humano e a concepção de corpo é consequência disso. O avanço científico e técnico produziu, nos indivíduos do período moderno, um apreço sobre o uso da razão científica como única forma de conhecimento (Pelegrini, 2006). O corpo, agora sob um olhar “científico”, serviu de objeto de estudos e experiências. Passa-se do teocentrismo ao antropocentrismo. O conhecimento científico, a matemática, enfim, o ideal renascentista: O corpo investigado, descrito e analisado, o corpo anatómico e biomecânico (Gaya, 2005). A redescoberta do corpo, nessa época, aparece principalmente nas obras de arte, como as pinturas de Da Vinci e Michelangelo, valorizando-se, deste modo, o trabalho artesão, juntamente com o pensamento científico e o estudo do corpo (Rosário, 2006). A disciplina e controle corporais eram preceitos básicos. Todas as atividades físicas eram prescritas por um sistema de regras rígidas, visando a saúde corporal. Agora, com o declínio final dos sacerdotes que condenavam a vida na terra, vemos a sua redenção. Um neopaganismo ressurge e a carne intensa, activa, ainda carregando cicatrizes do estigma, volta a ser soberana, quer mostrar-se. A obtenção do corpo sadio dominava o indivíduo: a prática física domava a vontade, contribuindo para tornar o praticante subserviente ao Estado (Pelegrini, 2006). O dualismo corpo-alma norteava a concepção corporal do período, demonstrando a influência das concepções da antiguidade clássica. Na realidade, o filósofo Descartes parece ter instalado definitivamente a divisão corpo-mente; o homem era constituído por duas substâncias: uma pensante, a alma, a razão e outro material, o corpo, como algo completamente distinto da alma. Mesmo se já se pensasse o ser humano como constituído por um corpo físico e uma outra parte subjectiva, a partir de Descartes essa divisão foi realmente instituída e o físico passou a estar ao serviço da razão. De fato, no século XVIII , também os ideais iluministas acabaram por acentuar a depreciação do corpo, dissociando-o da alma, retomando a dicotomia corpo-alma, arquitectada na antiguidade clássica. O pensamento iluminista negou a vivência sensorial e corporal, atribuindo ao corpo um plano inferior. Paralelamente, as necessidades de manipulação e domínio do corpo concorreram para a delimitação do Homem como ser moldável e passível de exploração. O corpo passa a servir a razão. Com o crescimento e aperfeiçoamento da produção agrícola e dos meios de transporte da sociedade feudal, assim como o acréscimo da produtividade agrícola aliado à expansão comercial, promovem-se algumas das condições necessárias para o desenvolvimento da indústria moderna. Estas modificações, aliadas a mudanças sociais, desembocaram no surgimentodo sistema capitalista. A forma de produção do sistema capitalista, a partir do século XVII, causou uma mudança drástica nas relações com os trabalhadores. Com o início da revolução industrial a divisão técnica do trabalho acabou por reduzir o trabalho a uma simples acção fisiológica, desprovida de criatividade (o trabalho em série). Nesta lógica de produção capitalista o corpo mostrou-se tanto oprimido, como manipulável. Era percebido como uma “máquina” de acumulo de capital. Deste modo, os movimentos corporais passaram a ser regidos por uma nova forma de poder: o poder disciplinar. Esta nova forma de poder instalou-se nas principais instituições sociais, como nos refere Foucault na sua obra “Microfísica do Poder” (1979/2002), com o objectivo de submeter o corpo, de exercer um controle sobre ele, actuando de forma coerciva sobre o espaço, o tempo e a articulação dos movimentos corporais. Assim, o movimento mecânico – reacções nervosas e fluxo sanguíneo – deu origem a uma compreensão secular do corpo, contestando a antiga noção de que a fonte de energia era a alma. Com a expansão do capitalismo, no século XIX, propaga-se a forma de produção industrial. A padronização dos gestos e movimentos instaurou-se nas manifestações corporais. As novas tecnologias de produção em massa desencadearam um processo de homogeneização de gestos e hábitos que se estendeu a outras esferas sociais, entre elas a educação do corpo, que passou a identificar-se não só com as técnicas, mas também com os interesses da produção (Hobsbawm, 1996 in Pelegrini, 2006). Assim, o ser humano é colocado ao serviço da economia e da produção, gerando um corpo produtor que, portanto, precisa ter saúde para melhor produzir e precisa adaptar-se aos padrões de beleza para melhor consumir (Rosário, 2006). A evolução da sociedade industrial propiciou um elevado desenvolvimento técnico-científico. As novas possibilidades tecnológicas propiciaram à elite burguesa moderna, um crescimento de técnicas e práticas sobre o corpo. O aumento da expectativa de vida, os novos meios de transporte e comunicação expandiram as formas de interacção e realização de actividades corporais. De fato, o fácil acesso à informação trouxe infinitas possibilidades ao conhecimento. Com efeito, nos séculos XVIII e IX, o saber passa a ocupar um papel de destaque, havendo a preocupação com a formação de indivíduos activos e livres, com ênfase na liberdade do corpo, contrariando as práticas mecanicistas (Paim & Strey, 2004). No entanto, a padronização dos conceitos de beleza, ancorada pela necessidade de consumo criada pelas novas tecnologias e homogeneizada pela lógica da produção, foi responsável por uma diminuição significativa na quantidade e na qualidade das vivências corporais do homem contemporâneo. De facto, com a comunicação de massas, a reprodução do corpo não se reduz agora ao âmbito da pintura ou do desenho, mas pode atingir um vasto número de indivíduos. O corpo pode ser reproduzido em série através da fotografia, do cinema, da televisão. Como refere Tucherman, Chegando ao século XIX, temos uma sociedade anónima, uma vasta população de gente que não se conhece. O trabalho, o lazer, o convívio com a família são actividades separadas, vividas em compartimentos a ela destinados. O homem procura proteger-se do olhar dos outros… (2004, p. 69) Parece surgir uma nova forma de solidão, o sentimento do próprio corpo, um novo isolamento que não é protegido pelo espaço privado, mas posto à prova no meio da multidão, um corpo que deve administrar a ausência de contactos. Esta vivência passiva e defensiva é notória na forma como as pessoas caminham, no modo como se movem e evitam o contacto físico, criandoguetos individuais. Pós-modernidade. A contemporaneidade não seria a mesma sem Michel Foucault, tão pouco as concepções de corpo do passado, porque o seu pensamento as iluminou e, com propriedade, as sintetizou em uma intenção geral sobre a preocupação com o corpo. A constatação de Foucault de que no passado a preocupação com o corpo era a de que este fosse bem alimentado. A partir do século XII, a preocupação se desloca para a sexualidade o corpo, ou suas práticas sexuais. Por conseqüência deste deslocamento conceitual, surgiu a necessidade da formulação de um conjunto de códigos para controlar o corpo social. Consequentemente, as pessoas se submetem aos códigos urbanos em nome da segurança (SANT`ANNA/04ps.13 y 14). O código de conduta foi resultante das transformações nos modos de vida social e estabeleceu poder de controle sobre o corpo sendo muito reforçado pelas posições dogmáticas das igrejas. Para Foucault, o corpo é um objeto controlado socialmente, subjugado por normas e códigos, mesmo assim, a maior contribuição deste pensador esteja em sua concepção de corpo social orgânico, com a capacidade de rebelar-se frente ao controle social, justamente por estar organizado (FOUCAULT, 1994). Na obra “Historia da loucura” (1961), o autor parece desejar libertar o corpo de todas as contradições geradas pelos códigos sociais. Até o momento histórico abordado, o aspecto transcendente do corpo, a alma, espírito, mente sempre foi alvo de maior atenção e valoração, por outro lado, o materialismo naturalista, a exemplo da escola psicológica: o comportamentalismo privilegia o corpo o corpo a ponto de afirmar que a consciência é apenas a exteriorização do comportamento. Já o materialismo dialético veste nas ideias de Karl Marx (1867), (10) define o corpo como objeto e, nas relações mercado-capital, o corpo adquire atributos negociáveis no mercado de trabalho. Com tais atributos lhe é permitida a condição de inserção e competitividade. Porém, afetado pela lei da oferta e da procura, o trabalhador se obriga a vender a sua força de trabalho a quem oferecer valor mais alto, e isto o transforma em mercadoria usada à conveniência do comprador, por isso, a necessidade de se ter criado as leis trabalhista (COSTA, 2005). Merleau Ponty (1941) oferece uma visão alternativa de corpo, diferente da visão marxista de redução do corpo a objeto negociável, no mercado de trabalho (crítica da autora). Ponty concebeu o corpo em duas funções dinamicamente interdependentes, de sujeito e objeto, enquanto sujeito é objeto e enquanto objeto é sujeito. Um objeto que não está dentro do espaço, ele está no espaço e é o espaço, o espaço do corpo, interna e externamente. Completa ainda: “A especialidade do corpo é a o desdobramento do seu ser de corpo, é a maneira pela qual se realiza como corpo. [...] As diferentes partes de meu corpo, seus aspectos visuais, táteis e motores, não estão simplesmente coordenados” (Ponty, 1941, p. 160). Todos os movimentos do corpo estão à disposição, a partir de suas significações comuns. Por isso, nas primeiras tentativas de preensões da criança, ela não olha as mãos, e sim o objeto alvo da preensão. Os diferentes segmentos do corpo não são conhecidos em seu valor funcional e sua coordenação não é aprendida. O indivíduo, sentado à mesa, pode visualizar as partes do corpo que estão escondidas pela mesa, pode também contrair o pé, dentro do sapato, e o ver. Este poder pertence ao indivíduo, mesmo para partes do corpo que nunca viu. O que é reconhecido não é o que frequentemente é visto e sim a representação visual do que, no corpo é invisível para o indivíduo. Ponty parece complexo com a colocação do corpo e suas partes invisíveis, por outro lado, se observar que enquanto o sapato é colocado, o olho visa o sapato e não o pé, a ideia da invisibilidade de partes do corpo parece mais fácil de ser compreendida. Sobretudo quando Ponty comenta: “Cada um de nós se vê por um olho interior, [...] Assim, a conexão dos seguimentos do nosso corpo e a de nossa experiência visual e nossa experiência tátil, não se realiza pouco a pouco e por acumulação.Não reúno as partes do meu corpo, uma a uma: esta tradução e esta reunião são feitas de uma ver por todas em mim, são meu próprio corpo (PONTY, 1941, p. 160 e 161).” A conexão de partes do corpo é antecipação da ação deste (conjunto de movimentos), em função do sentido e função do objeto de interesse e da própria ação. A articulação das partes do corpo, em uma ação única, acontece, não pelo corpo em si, mas pelo valor e valoração que o objeto representa, pela necessidade e o interesse que se tem do objeto da ação. O corpo é sujeito da ação, ao mesmo tempo, o objeto que a realiza, com isso, Ponty sugere a fusão do corpo ao objeto, devido à importância do objeto, alvo da ação que transforma o corpo em objeto do sujeito que a pratica. Exemplifica com o bastão que não separado do braço e sim uma extensão deste. Assim como o garfo é a extensão da mão e do braço na alimentação, ou a caneta extensão do corpo no ato de escrever. Ponty pode não ter a precípua intenção de se contrapor ao dualismo psicofísico presente na concepção de corpo, mas as suas ideias contribuem para a contraposição ao dualismo conceitual de corpo, quando apresenta a síntese do corpo próprio (p. 159 e 163) como sinergia existente entre consciência e corpo, em que a consciência é corpo (sujeito e objeto) se percebendo com tal. Outros autores fazem parte desta seleção, deles foram retirados pressupostos que mostram intimidade com a concepção de corpo, entre eles: Sartre (2003), Lacan (1949), Vygotsky (2005) e Lowen (1982). Seleção esta, realizada com cuidado especial porque, embora sintônicos, os autores são representantes de correntes de pensamento diferentes. No existencialismo de Jean Paul Sartre (2003), tem uma definição fenomenológica de corpo, que se resume na consciência do próprio corpo. Aparentemente a materialidade poderia estar relegada a um segundo plano. O papel de Sartre na seleção ora colocada, a princípio, não se firmaria como parceiro argumentativo, em defesa das concepções holísticas de corpo. Fazê-lo seria reafirmar o dualismo que privilegia a mente em detrimento ao corpo, o que contrapõe à concepção holística. Entretanto, um olhar mais aguçado sobre os pressupostos de Sartre na obra, O SER E O NADA (Ed.2003) revela neste autor, um parceiro de grande peso teórico. Explica o autor que a percepção humana é, em si, um fenômeno (Sartre, 2003, p. 15 e 59), isto porque, por meio da consciência, pode o corpo transcender para fora de si e somente quando o faz para fora, consegue identificar-se enquanto corpo. A força maior que leva o corpo à sua transcendência é a mesma que faz com que os corpos das pessoas necessitem da presença de outras pessoas para manter a existência corporal (SARTRE, 2003, p. 232). O corpo percebe a sua existência no que Sartre chama de as estruturas imediatas do PARA-SI, que envolvem o conceito de EM-SI: [...] o ser da Consciência, na medida em que este ser é Em-si para se nadificar em Para-si, permanece contingente; ou seja, não pertence à consciência o direito de conferir o ser a si mesma, nem o de percebê-lo de outros [...] trata-se de valor e não de fato ... o Em- si é para perder-se em Para-si. O Para-si é o Em-si que se perde como Em-si para fundamentar- -se como consciência (Sartre, 2003, p. 130 e 131). O que parece tão sedutor no pensamento sartreano é a própria percepção não isolada de corpo, a percepção do corpo Em-si somente acontece como resultado da percepção do corpo Para-si, que por sua vez, é o Em-si que se nadifica e transforma em consciência. A formação do Para-si carece do outro (outra pessoa) para formar o Outro (eu), que se pode sintetizar a partir da percepção de outras pessoas sobre aquele que se percebe percebido por elas. Sartre vai além, dialoga com Platão e considera um ponto de vista curioso: o corpo é aquilo que individualiza a alma (p. 393). Consensual a Platão, Sartre completa: “Seria inútil, apenas, supor que a alma possa desgarrar-se desta individualização, separando do corpo pela morte ou pelo pensamento puro, pois a alma é o corpo, na medida em que Para-si é a sua própria individualização” (SARTRE, 2003, p. 393). Nesta direção, Jaques Lacan (1936 e 1949) denomina especular (13) a relação que o indivíduo tem com outros. Também denomina como estádio do espelho, o momento do desenvolvimento infantil, em que o bebe, antes dos seis meses não reconhece a própria imagem no espelho. Ao ser colocado a ver a própria imagem espelhada, procura atrás do espelho, pelo outro bebe que imagina estar ali. Após esta idade, processualmente, com a contribuição dos familiares que se comunicam com ele, por meio de: brincadeiras, carícias táteis, comentários e olhares, o bebê aprende que a imagem no espelho é a sua própria. A relação especular entre pessoas é essencial, embora olhar nos olhos do outro seja uma questão cultural, para algumas culturas a troca de olhares pode ser interpretada como desrespeito, para outras é essencial à comunicação, aumenta o sentido de aceitação social. Apesar das diferenças culturais, o que se destaca no pensamento de Lacan é o pressuposto de “que é no olhar do outro que cada indivíduo se reconhece como tal”, mesmo que se aliene no olhar do outro, distanciando-se do eu desejado (LACAN, 1949, p.163-164). Em Lacan e Sartre, o indivíduo precisa de outros indivíduos para auto identificar e conceber, ambos fundamentam a consciência como ato social, não refém da materialidade do corpo, o indivíduo não se individualiza sem a contribuição de outras pessoas, ou sem projeta-se nelas. Também foi chamado o pensador Lev Semenovich Vygotsky (1986), um autor que traz ao diálogo a ideia de que corpo usa instrumentos e mediação para desenvolver e aprender, aprender sobre si, sobre os outros e sobre o mundo. Vygotsky, em sintonia teórica com Spinoza, elaborou a famosa frase: “Não se sabe o que pode o corpo, ou o que se pode tirar da consideração de sua natureza própria” (14). No tocante aos processos de desenvolvimento e aprendizagem, é difícil estabelecer limites ao corpo. Um indivíduo passa a vida em processos de desenvolvimento e de aprendizagem, processos estes que resultam em novos processos de transformação. Assim, não parece prudente ter a pretensão de predizer a fronteira do potencial do corpo. Em Vygotsky, os signos mentais são incorporações do corpo, integrados à conduta, os indivíduos são o que aprenderam a ser no orgânico social, com a ajuda de outros com maior experiência. O corpo mostra o resultado de sua adaptação aos contextos aos quais se insere. Expressa também o modo como percebe o mundo, com as marcas da emoção e dos sentimentos que afloram, delineando o corpo e lhe proporciona experiências. A vivência é pessoal, um mesmo ambiente, com iguais recursos materiais, oferecidos aos indivíduos não lhes garante um desenvolvimento também igual. Isso porque, cada evento que passa no ambiente é percebido por cada um de maneira diferente e, a reação às mudanças do entorno é pessoal, ou seja, diferente para cada corpo. Alexander Lowen (1982) aborda as sintonias e desajustes de sintonia, da expressão do corpo, que percebe e reage à realidade. A percepção e a reação da realidade podem estar em sintonia, ou em desajuste de sintonia com o real, afetam a emoção e os sentimentos e levam o individuo a criar o sistema de mecanismos de defesa, com o qual enfrenta as dificuldades da vida, com os seus encantos e desencantos. Os estudos de Lowen iluminam a conduta humana em detalhes muito específicos, interpretada por ele a partir de posturas físicas, passando pela posição do corpo, seus movimentos, gestos e pequenas alterações que se expressam como variações importante, capazes de mudar o sentido geral de uma expressão corporal. O autor faz uso da fisiologia e caminha pelo campo das idéias condutistas, sem se deixar contaminar ou dominarpor esta concepção comportamentalista. A conduta humana é fruto da interação da pessoa com o ambiente, da influencia das relações sociais e da cultura, muito valorizada na compreensão da existência das pessoas, porque nas expressões corporais, de cada uma, ele percebe a presença de tais influencias. Lowen é um psiquiatra com larga experiência terapêutica, o foco de sua atenção é dirigido para a conduta corporal de seus pacientes, as palavras são interpretadas a partir da conduta devidamente relacionadas aos seus contextos. Nas terapias loweanas cada palavra parece passar pelo filtro do corpo, a aceitação ou não, da relação dos pacientes com o seu corpo revela detalhes da história de vida dos mesmos. Além disso, Lowen não se limita à presença física de seu paciente, ou ao momento do diálogo com ele. Em cada caso busca a história da família, do trabalho, do lazer, bem como em outras histórias para argumentar em favor do não isolamento do indivíduo. Para ele, ninguém é um indivíduo isolado em si mesmo, as relações sociais estão presentes no sujeito e em suas expressões corporais. Tanto para Vygotsky, como para Lowen, o corpo é a tela das emoções e dos sentimentos de origem externa e interna, emana a própria vivência, o modo como o sujeito/ paciente se percebe percebido por outro do seu entorno. Vamos aprofundar nosso conhecimento com o video abaixo: http://www.youtube.com/watch?v=a05aUYjgKgs http://www.youtube.com/watch?v=a05aUYjgKgs UNIDADE 2 - O CORPO CONTEMPORÂNEO CAPÍTULO 1 – CORPO, MODERNIDADE E CONTRAMODERNIDADE. Já no século passado, em estudos voltados para a saúde física e mental no âmbito do processo de industrialização a relação entre as questões corporais e as questões sociais comparece no cenário acadêmico, primeiramente, pela via da saúde e das conexões entre pobreza e doença. Mas isso não contribuiu para tornar o corpo um objeto de estudo a ser explorado pelas ciências sociais. Na verdade, o corpo não chegou a ser um tema de interesse da Sociologia clássica, como o foram a religião e o conhecimento objetos fundacionais que criaram tradição ao longo da história, tornando-se áreas consagradas dentro da sociologia. No seu artigo “O Objeto das Ciências Sociais,” Nogueira (1979) apresenta e descreve os objetos de estudo de praticamente todas as ciências. Às ciências sociais ele reserva os fenômenos superorgânicos, os quais são resultantes da capacidade humana de simbolização. Os fenômenos orgânicos são destinados às ciências naturais. Certo, o corpo pode e tem sido objeto de simbolizações, como o demonstram os estudos sobre inscrições rituais, estigmas, racismo etc. Apesar disso, não se observou, até recentemente, um interesse sociológico pelas questões corporais. A etnografia e a antropologia talvez tenham sido mais generosas neste sentido, já que suas narrativas podem trazer algumas referências ao corpo. Não chegam essas menções, contudo, a criar uma tradição ou um objeto de estudo específico na antropologia, como aconteceram com as vertentes dessa área voltadas para a política, a economia e a religião. (Poderia alguém, aqui, lembrar da antropologia física. Ela é, porém, inegavelmente uma ciência natural, filha do evolucionismo biológico). Confirma esse panorama o ensaio brilhante de Mauss (1974), “Técnicas Corporais,” que na década de 30 apresenta um inventário de gestos, técnicas e hábitos corporais. Sua tentativa de conceitualizá-los no âmbito das ciências sociais, contudo, revela o caráter introdutório e a ausência de um terreno preparado para essas reflexões. Aliás, o lembra de que o corpo esteve até então relegado à categoria “diversos” nos estudos etnográficos. Um aspecto importante a ser mencionado-e que explica em parte o desinteresse pelo corpo nas ciências sociais É o estatuto das questões corporais no ocidente moderno. Nele, a dimensão corporal se confunde com outra, mais ampla, a natural, que por sua vez expressa um dualismo amplo e abrangente. Nesse sentido, a nossa abordagem das questões corporais se apresenta em um esquema que opõe: Cultura ---------------------------------------------------------------------------- Natureza Homens --------------------------------------------------------------------------- Animais Mente ------------------------------------------------------------------------------ Corpo Razão ------------------------------------------------------------------------------ Emoção Homem ---------------------------------------------------------------------------- Mulher. Motriz Jan-Jun 2001, Vol. 7, n.1, pp. 33-39. Por mais, esse esquema implica em uma hierarquização que confere superioridade aos primeiros elementos dos pares (Howell, 1996 p.127). Assim, a nossa clássica divisão dos conhecimentos científicos em naturais e humanos é mais uma expressão desse dualismo hierárquico. Além de condicionar o nosso olhar sobre nós mesmos, esta perspectiva tem um caráter universalista que condiciona também a nossa apreciação das outras culturas (Howell, 1996, p.127). Desse modo, quando apresentamos o “selvagem” como peludo e feroz, estamos desprezando- o como um ser da natureza. Já quando idealizamos o indígena, afirmando que ele desfruta de uma comunhão com a natureza ou, idilicamente, acreditamos que o “oriental” experimenta a união entre o corpo e a mente, estamos construindo visões terapêuticas de um dualismo atávico à nossa cultura. Os três casos, porém, expressam representações ideológicas do nosso modo particular de inventar o nosso corpo e o dos outros. Mais recentemente, todavia, o corpo deixou de ser exclusividade das ciências naturais e se tornou objeto de estudo de várias disciplinas humanas como a história, a filosofia, a psicanálise e as ciências sociais, certamente inspiradas e desafiadas pelos estudos de Foucault (1977, 1980, 1984). Esta valorização do corpo, contudo, não surgiu no vácuo: os movimentos sociais dos anos 60, como o feminismo, os movimentos pela igualdade racial e a contracultura criaram um contexto propício para novas representações do corpo que possibilitaram o nascimento desse novo objeto de estudo (Porter, 1992). Porém, se esse interesse recoloca o corpo sob o foco de novos olhares, mantém sua fidelidade aos procedimentos da reflexão científica e filosófica ocidentais, marcadamente desencantados. Vale lembrar que a expansão da civilização científica afastou saberes e práticas tradicionais, que não se enquadrassem na sua racionalidade. Esse processo, que Latour (1994) chama de “purificação,” deslegitimou a magia, o conhecimento imemorial, as forças incalculáveis e a dimensão transcendente que conferiam sentido à vida e à morte, até então. Em seu lugar, e em nome da objetividade científica, avançaram o cálculo racional e a técnica. O corpo moderno. Assoar o nariz no barrete ou com a franja da roupa, nada mais chulo. Limpar o nariz no braço ou sobre o cotovelo é próprio de salgadores. Não é bonito também limpar o nariz com as mãos e depois esfregá-las nas vestes. Bem mais decente seria fazer uso do lenço... Não se perdoa a mania de por um ou dois cotovelos sobre a mesa. Isso passa despercebido nos velhos e nos doentes. Cortesãos há refinados que permitem tais posturas. Não dê atenção a eles nem os imite. (A civilidade pueril – Erasmo). As representações corporais que experimentamos hoje, e que têm para nós a força da natureza, foram gestadas apenas há quatro séculos. As transformações que então ocorreram estão exemplarmente documentadas no texto de Erasmo (1530/1975) “A civilidade pueril.” A sua leitura nos mostra que o comportamento ali descrito está disseminado na nossa cultura e, portanto, faz parte da nossa educação. Apesar da familiaridade que experimentamos o texto também nos parece estranho, por algumas razões. Alguns dos seus conselhos provocam asco, já que remetem a funções orgânicase excrementos que se tornaram tabu no discurso cotidiano ao longo da modernidade. Além disso, as recomendações de Erasmo são, para nós, ao mesmo tempo óbvias e espantosas. Óbvias por já terem para nós o estatuto de “naturais” por força da nossa socialização; espantosas exatamente por serem recomendações e saírem assim do âmbito da natureza e mostrarem a sua provisoriedade histórica. Enfim, a civilidade de Erasmo revela aquilo que não queremos ser, a natureza que devemos, modernamente, domesticar ou esconder. Essa obra é uma de pedagogia do comportamento e expressa um movimento na história do ocidente, chamado de processo civilizador, que impôs padrões de comportamento específicos, com conseqüências profundas para o corpo. Como mostrou Elias (1990, 1993), o monopólio e a centralização da força pelo Estado absolutista foram acompanhados de um movimento repressivo geral que se impôs sobre os impulsos emocionais e a força física voltada para o ataque às pessoas. Em seu lugar, desenvolveram-se outras capacidades e qualidades humanas não físicas, como a reflexão, o cálculo e a previsão. Em outras palavras, “a espada foi substituída pela intriga” (Elias, 1993, p.225). A conseqüência desse processo é uma ampliação do mental em detrimento do corporal e o desenvolvimento de um autocontrole que deve moldar pulsões, sentimentos a afetos. Privilegiam-se as faculdades intelectuais e a razão; separada do corpo, a mente deve construir um homem civilizado. Além disso, a disseminação do autocontrole desenvolve uma visão psicologizada voltada a identificar nos hábitos, gestos e condutas corporais, índices de intenções que permitam a previsão do comportamento. Se em comparação com os tempos feudais o confronto físico e as guerras diminuíram, “o campo de batalha foi, em certo sentido, transportado para dentro do indivíduo. Parte das tensões e paixões que antes eram liberadas diretamente na luta de um homem com o outro, terá agora de ser elaborada no interior do ser humano (...); um padrão individualizado de hábitos semiautomáticos se estabeleceu e consolidou (no homem) um “superego” específico que se esforça por controlar, transformar ou suprimirlhe as emoções de conformidade com a estrutura social (Elias, 1993, p. 203).” Enfim, as sensatas palavras de Erasmo têm o seu custo: as ansiedades interiores, as compulsões que o indivíduo exerce sobre si mesmo levam a uma cisão na personalidade moderna que põe, de um lado o corpo como objeto de controle e, de outro, setores controladores, sediados na mente. As aparelhagens corretoras e terapêuticas voltadas para o corpo mostram as muitas faces do processo civilizador ao longo da modernidade. Vigarello (1995) acompanha o desenvolvimento desses artefatos na Europa, relacionando-os aos signos sociais do corpo. No fim do século XVII e durante o século XVIII, os corpos eram envolvidos por espartilhos e aparelhos de sustentação de modo a modelar corpos eretos, contidos e imóveis, conforme os padrões de civilidade da nobreza. O aparelho que corrigia na pedagogia dos séculos XVII e XVIII (...) empenhava- se em fazer do corpo um brazão, símbolo de um pertencimento, efígie feita signo. A nobreza tinha que se mostrar. (...) Obstinadas tornam-se então as iniciativas que trabalham apenas para a sujeição de seus contornos. Da fórmula física à teatralização das atitudes, a razão domina a natureza (Vigarello, 1995, p. 32-3). No século XIX, as manipulações corretivas se transformam com o estabelecimento e o reconhecimento de uma classe que valoriza o trabalho: a burguesia. A razão que domina a natureza desloca-se da imobilidade para o movimento corretor. O corpo com deformidades não se submete mais às pressões dos aparelhos, mas deve se valer de sua força: puxar verticalmente objetos ou se deixar levantar pelas cordas dos sinos, exemplifica Vigarello (1995). Essa tendência ganha contornos cientificistas com o avanço do positivismo, desenvolvendo exercícios cada vez mais meticulosos: “(...) se especializam os aparelhos sobre os quais devem se aplicar as forças previamente medidas, orientadas e contabilizadas.” E ainda, os exercícios se decompõem e se mecanizam com vistas à sua eficácia e utilidades “aplicando sobre o próprio espaço muscular o princípio das eficácias do trabalho.” (Vigarello, 1995, p. 30). Em outras palavras, burguesia e razão positivista imprimem na fisiologia seus projetos sociais. O século XX, por sua vez, assistiu a tantas outras transformações nas representações, nos projetos e nos destinos do corpo, fiéis à dualidade civilizadora, levando ao paroxismo as intervenções racionalizadoras no corpo. Um exemplo eloquente é o body–builder dos anos 90. O fisioculturista se vale de aparelhos, suprimentos nutricionais, próteses e sofisticação eletrônica para esculpir o próprio corpo. A hipertrofia muscular resultante pode ser associada a alguns traços da contemporaneidade, como a sociedade de consumo mas, sobretudo à fragilidade psicológica provocada pelo isolamento dos ambientes urbanos e à redefinição dos papéis dos dois sexos. Neste último caso, o feminino se transforma em ameaça à potência masculina; daí a hipérbole muscular (Courtine, 1995). Se até aqui tratei de algumas faces e fases do projeto civilizador no contexto do ocidente moderno, não se deve ignorar que ele acompanhou e justificou o colonialismo desde a sua origem. Assim, é importante chamar a atenção para este aspecto pouco conhecido da “civilização do comportamento,” quando ela procurou se impor sobre outras culturas, não sem um alto custo. O relato do médico psiquiatra Fanon (1968) é eloqüente: ele identificou na patologia denominada de contratura muscular generalizada, disseminada entre os argelinos, “o acompanhamento postural, a existência nos músculos do colonizado de sua rigidez, de sua resistência, de sua recusa em face da autoridade colonial” (p. 250). Ora, se esse é um exemplo perverso da construção cultural dos corpos, é também uma denúncia contundente da humilhação coletiva promovida por uma sociedade “altamente civilizada,” como se diz da francesa. Enfim, se é possível uma generalização dos exemplos apresentados até agora, ela está no fato de que eles mostram uma confiança inabalável no projeto da modernidade e nos recursos das intervenções científicas. Do ponto de vista da corporeidade, tais exemplos expressam uma representação da natureza que deve ser subjugada através de racionalidades voltadas para este fim. Para o bem ou para o mal.. A contramodernidade e as novas gestões corporais. “A pedra rejeitada pelos construtores tornou-se a pedra angular.” (Jamais fomos modernos – Bruno Latour). Como afirmam Berger, Berger e Kellner (1974), a modernidade sempre teve que lidar com a contramodernidade, isto é, com propostas que procuram subverter o projeto modernizador e escapar de suas imposições. Por exemplo, os arranjos sociais comunitários (em oposição ao contrato social) e as propostas naturalistas (contra o artificialismo industrial e o formalismo da civilização) inspiraram movimentos mais ou menos consequentes e duradouros ao longo da modernidade. Parece que de modo sempre original esses movimentos valorizam os dois temas com os quais a modernidade vem dialogando: a tradição e a natureza. E são esses temas que reaparecem naquele que talvez tenha sido o movimento de contramodernidade mais forte do século XX: a contracultura dos anos 60 (Albuquerque, 1998 e 1999). Através de valores integradores como a vivência PARA REFLETIR !!! Assista o video http://www.youtube.com/watch?v=aXCVHvuk42k http://www.youtube.com/watch?v=aXCVHvuk42k comunitária, a aliança com a natureza e a reconciliação entre o corpo e a mente, a contracultura procurou construir modos de agir, sentir, pensar e curar distantes do dualismo hierárquico que sustenta a modernidade. Assim, esse movimento se expressou, no
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