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Mariana Costa Teixeira Afecções Testiculares TUMORES TESTICULARES Neoplasia maligna de testículo é doença rara, com prevalência global de 1 a 2%. É a neoplasia mais comum em homens jovens (15 a 35 anos de idade) e associa-se a elevadas taxas de cura com tratamento multimodal, atingindo até 96% de sucesso. A incidência de câncer de testículo tem aumentado nos últimos 40 anos, principalmente em nações industrializadas com elevada densidade populacional. O tumor de testículo tem três tipos principais: a) tumores de células germinativas; b) tumores de células não germinativas; c) tumores extragonadais. Epidemiologia Incidência de câncer de testículo varia de acordo com a região estudada. Nos países desenvolvidos são diagnosticados cerca de três a seis novos casos por 100.000 homens por ano. No Brasil estima-se uma incidência anual de 2,2/100.000 habitantes. Além da variabilidade geográfica a raça branca (caucasiana) tem maior risco de desenvolver esse tipo de câncer. Tumores de células germinativas correspondem a 95% das neoplasias testiculares, sendo subdivididos em seminomatosos e não seminomatosos de acordo com suas características histopatológicas. Seminomas são mais frequentes, totalizando 50% das neoplasias de células germinativas. Idade média no diagnóstico é de 34 anos, sendo que 76% dos casos ocorrem dos 20 aos 44 anos. A maioria dos tumores seminomatosos são diagnosticados dos 30 a 40 anos, enquanto que os não-seminomatosos, entre 20 a 30 anos de idade. O número de homens com diagnóstico de câncer testicular com menos de 50 anos de idade tem aumentado nos últimos 30 anos. Ocorrência de tumores testiculares em crianças e adolescentes é rara (0,5 a 2/100 mil), principalmente antes dos 13 anos de idade. Em crianças, tumores de saco vitelino e teratomas são os subtipos mais comumente encontrados, mas lesões benignas (principalmente císticas) podem corresponder a até 77% dos casos. Após a puberdade, o índice de tumores benignos decresce para 38% e o carcinoma embrionário torna-se o subtipo mais comum. Nos idosos, os tumores de células germinativas (principalmente seminomas) correspondem a apenas 20% da totalidade de neoplasias testiculares. Linfoma é o tumor que mais afeta os homens acima de 60 anos, sendo geralmente de alto grau e comportamento agressivo. O restante compreende principalmente sarcomas, mesoteliomas, tumores de cordão espermático e metástases. Etiogenia Embora a causa exata do tumor de testículo não seja conhecida, muitos fatores aumentam o risco do seu aparecimento: criptorquidia, atrofia testicular, síndrome de Klinefelter, infertilidade, história familiar e a presença de tumor testicular contra-lateral e fatores hormonais. Fatores de Risco Fatores de risco para desenvolvimento de câncer de testículo são criptorquidia, antecedente de tumor testicular contralateral, história familiar e infertilidade ou subfertilidade. Outros fatores, como microlitíase testicular, vasectomia, trauma escrotal e/ou testicular, hérnia inguinal e tabagismo são apontados como de risco. No entanto, vários estudos conflitantes não mostraram relação direta entre esses eventos e o risco de neoplasia testicular. - Criptorquidia Criptorquidia é a malformação genital mais comum na infância, em que o testículo não descido pode situar-se em diferentes locais do canal inguinal. Quando o testículo não se encontra no canal inguinal, é denominado de ectópico, sendo que a cavidade abdominal é o principal sítio dessa malformação. Séries antigas relacionavam criptorquidismo a um risco até 40 vezes maior de câncer testicular. Estudos recentes e mais criteriosos confirmaram essa correlação, porém numa razão um pouco menor: 4 a 8 vezes. Esses dados referem-se ao risco de desenvolvimento de tumor no testículo ipsilateral ao criptorquidismo. Há duas teorias que tentam explicar a carcinogênese do criptorquidismo: teoria in útero, que considera testículo não-descendente e neoplasia testicular como produtos da mesma informação genética, e; teoria da posição, em que a má localização testicular predispõe à ação de fatores ambientais, como temperatura inadequada e mecanismos autoimunes, que provocam degeneração carcinomatosa. O mais provável é que ocorra interação desses dois mecanismos na carcinogênese associada ao testículo criptorquídico. O papel da orquidopexia na prevenção do câncer testicular também é controverso. Quanto mais precoce o tratamento cirúrgico, maior a probabilidade de prevenção da neoplasia. Quando se realiza orquidopexia até o início da puberdade (antes dos 11 anos de idade ou no máximo até aos 13), o risco de câncer de testículo é 2,23 vezes mais elevado comparado à população sem criptorquidia. Após os 13 anos, a orquidopexia mostra-se menos eficiente e o risco de aparecimento de câncer alcança 3,5 a 6 vezes o da população geral. - Tumor Testicular Contralateral Antecedente de câncer testicular é fator de risco aceito para desenvolvimento de neoplasia no testículo inicialmente sem doença. Quanto mais precoce o surgimento de câncer testicular, maior a probabilidade de acometimento de testículo contralateral. Pacientes portadores de seminoma e diagnosticados com menos de 30 anos, tiveram 2,4 a 4,8 vezes maior incidência de tumor testicular contralateral na comparação com aqueles em quem a doença manifestou-se após os 30 anos. - História Familiar Avaliação familiar de portadores de câncer de testículo evidencia a concordância da transmissão genético- hereditária da neoplasia. Filhos de pais com diagnóstico de tumor testicular têm risco quatro vezes mais alto de desenvolverem a doença. Quando analisamos irmãos de portadores de câncer de testículo, essa proporção sobe para oito vezes. Estudos também mostram que indivíduos naturais de regiões com elevada prevalência de câncer testicular não perdem esse potencial carcinogênico quando migram para áreas de baixa prevalência. O contrário também é verdadeiro: homens suecos que migraram para a Dinamarca (país com uma das maiores taxas de neoplasia testicular) mantiveram o mesmo risco relativo de ocorrência de câncer de testículo registrado em seu país de origem. - Infertilidade Paralelamente ao aumento na incidência de câncer de testículo, observa-se aumento nas taxas de infertilidade e de subfertilidade nos países ocidentais. Alguns autores relatam que homens inférteis com espermogramas alterados tem cerca de 20 vezes mais possibilidades de desenvolverem tumor testicular do que indivíduos da população geral. Uma das dúvidas dos investigadores é o papel da infertilidade na carcinogênese testicular. A teoria da superexposição estrogênica (in útero) tem sido avaliada com estudos clínicos e seus resultados são controversos, mas há documentação de maior índice de neoplasia testicular em filhos de mães expostas a estrogenioterapia na gestação, associada à alterações dos parâmetros do espermograma. Classificação Histopatológica Tumores de testículo apresentam uma diversidade de tipos e de subtipos histopatológicos, fundamentais para definição do tratamento e do seguimento, associados aos estadiamentos clínico e laboratorial. Tumores de células germinativas derivam de células pluripotenciais do epitélio germinativo testicular, podendo originar uma gama de tipos histológicos. Incidência Os tumores seminomatosos incidem entre 20 e 35 anos, apresenta comportamento biológico menos agressivo e são sensíveis a radioterapia. Dentre estes tumores temos o subtipo espermatocítico que acomete homens com mais de 60 anos e com uma evolução extremamente favorável, não necessitando de tratamento complementar além da orquiectomia. Os tumores não-seminomatosos acometem jovens entre 15 e 30 anosde idade, com comportamento biológico mais agressivo, são quimiosensível e pouco radiosensivel. Em ordem decrescente de agressividade desses tumores temos: carcinoma embrionário, córiocarcinoma, teratocarcinoma e teratoma. O carcinoma embrionário representa cerca de 20% dos TGT e ocorre em jovens de 20 a 30 anos, é altamente maligno com crescimento rápido e com metástases precoces. Os teratomas respondem por 8 a 10% desses tumores em jovens adultos e em 40% das crianças. Os tumores que envolvem componentes do seminoma e não-seminoma devem ser tratados pelo componente de pior prognóstico. O desenvolvimento de metástases é 3 vezes mais comum nos tumores não seminomatosos. A principal disseminação é por via linfática, acomete vasos do cordão e rapidamente surge linfoadenopatia periaórtica ao nível dos vasos renais. Do comprometimento ganglionar ao nível dos vasos renais, se dissemina em região dos vasos ilíacos e posteriormente para o mediastino. Quando ocorre disseminação hematogênica, geralmente nos coriocarcinomas, atinge os pulmões inicialmente e depois fígado e cérebro. Quadro Clínico Os Tumores de células Germinativas (os mais incidentes) se caracterizam ao exame físico por: - Aumento testicular; - Dor; - Lesão palpável de consistência endurecida, geralmente unilateral. A hidrocele pode estar presente em 10% dos casos. Alguns referem trauma anterior a esse aumento, daí o uso de antiinflamatórios retardando o tratamento. Em estágios avançados pode-se detectar gânglio supraclavicular, ginecomastia e até uma massa abdominal palpável. Exames Complementares O ultrassom (US) escrotal é o exame radiológico mais adequado, revelando imagem hipoecóica homogênea nos seminomas e heterogênea nos não seminomas. O câncer do testículo tem marcadores tumorais, a alfafetoproteina (AFP) e o beta-HCG, que são glicoproteinas produzidas pelas células totipotentes (trofoblasto e sinciciotrofoblasto, respectivamente) dos TGT. Os seminomas nunca produzem AFP e eventualmente beta HCG em 10% dos casos. Por isso, seminoma com esses marcadores elevados deve ser considerado como não-seminomatoso. O aumento dos níveis de AFP é visto em 70% dos carcinomas embrionários e do beta-HCG em 100% dos coriocarcinomas e em 60 a 80% dos carcinomas embrionários. A maioria dos TGT apresenta elevação de desidrogenase do àcido lático (DHL) a qual está relacionado com o volume tumoral. Serve para monitorar a evolução e tratamento principalmente dos seminomas que normalmente têm AFP e beta-HCG normais. Os outros exames radiológicos empregados no tumor de testículo são: - Tomografia Computadorizada (TC) de Abdômen: Melhor exame para avaliar comprometimento ganglionar. - TC do tórax: Melhor exame para avaliar comprometimento do mediastino e metástase pulmonar. - Rx de tórax: Está indicado quando não se dispõem de TC do tórax. - US abdominal: Quando não é disponível a TC do abdômen. - Ressonância Magnética: Não é recomendada como exame de rotina para os TGT, mas sim nas recidivas, principalmente pulmonares. - TC do cérebro e cintilografia óssea: Apenas quando clinicamente indicadas. O FDG-PET (tomografia com emissão de pósitron), realizado após o tratamento, demonstra grande valor em lesões residuais maiores que 3 cm para diferenciar entre fibrose ou tumor. Diagnóstico O diagnóstico definitivo é sempre estabelecido pelo exame histopatológico após orquiectomia que deve ser realizada sempre por via inguinal e, nunca violando a bolsa escrotal. Estadiamento A extensão do tumor primário é classificada após a orquiectomia radical e por essa razão, deve ser assinalada como estadiamento patológico(pT). Estadiamento de câncer de testículo é realizado através da análise de dados anatomopatológicos da orquiectomia, estudos de imagem (principalmente tomografia computadorizada [TC]) e resultados da dosagem dos marcadores tumorais séricos pósorquiectomia. Na avaliação inicial com métodos de imagem, deve-se realizar TC de tórax, abdome e de pelve. TC de crânio e/ou cintilografia óssea dependem da correlação com dados clínicos sugestivos de metástases no sistema nervoso central e/ou no esqueleto, respectivamente. Dosagem sérica de alfafetoproteína, beta-HCG e de desidrogenase láctica tem importância para avaliação da resposta ao tratamento inicial (orquiectomia), sendo fundamental para estratificação da neoplasia testicular em grupos de risco. Tratamento SEMINOMAS Tratamento de rotina consiste na orquiectomia radical. Linfadenectomia retroperitoneal (LDNRP) não é recomendada para seminomas por causa da elevada incidência de recidiva local. NÃO SEMINOMAS Terapia primária de tumores não seminomatosos também é orquiectomia radical. Relação Anatomopatológico Versus Prognóstico Os itens da patologia relacionados ao prognóstico de metástases são: - Seminomas; - Tamanho do tumor ≥4 cm; - Invasão de rete testis (fator prognóstico importante); - Invasão vascular; - Não seminomas; - Invasão vascular/linfática; - Invasão peritumoral; - Presença de carcinoma embrionário >50%; - Ausência de teratoma maduro; - - Teratoma em <50%; - Ausência de TU de saco vitelínico; - Presença de coriocarcinoma; - Índice de DNA (poliploidia). Diagnóstico Diferencial ESCROTO AGUDO Escroto agudo (EA) é uma síndrome caracterizada por dor escrotal aguda, frequentemente acompanhada por edema escrotal e outros sinais e sintomas locais e sistêmicos. EA pode ser a apresentação inicial de diversas doenças, incluindo torção testicular, orquite, epididimite, torção de hidátide, hérnia inguinal estrangulada e, menos frequentemente, hematoma escrotal e tumor testicular. TORÇÃO TESTICULAR No contexto de serviços de urgência, o examinador deve ser cauteloso quanto à possibilidade de torção testicular. Essa condição consiste na torção do cordão espermático, levando a interrupção de fluxo sanguíneo, com isquemia e finalmente necrose tecidual. Torção testicular está associada a dor intensa, náusea, alteração do reflexo cremastérico e elevação do testículo, sendo essas variáveis identificadas na história e no exame físico. No entanto, a ultrassonografia escrotal com Doppler frequentemente é necessária para complementação diagnóstica. O exame de ultrassom revela redução ou parada do fluxo sanguíneo para o testículo afetado; nesses casos, o tratamento cirúrgico está indicado e deve ser instituído com a maior brevidade possível, já que um atraso superior a 6 horas pode resultar em perda do órgão. A cirurgia consiste em orquidopexia bilateral em caso de testículo viável; nos casos em que o testículo sofre necrose, este deve ser removido, porém o testículo contralateral deve ser fixado para prevenir novos episódios. Um diagnóstico diferencial da torção testicular é a orquiepididimite, que pode ser de etiologia viral na infância e frequentemente bacteriana após o início da atividade sexual. O sinal mais específico para o diagnóstico de orquiepididimite é o alívio da dor com a elevação manual do testículo, conhecido como sinal de Prehn. O tratamento da doença bacteriana requer antibióticos, enquanto os casos de etiologia viral requerem somente sintomáticos. A torção de hidátide, que inclui torção do apêndice testicular ou do apêndice epididimal, pode simular o quadro clínico da torção testicular, porém ao ultrassom com Doppler, o fluxo sanguíneo está preservado e um apêndice torcido frequentemente é encontrado. O tratamento para essa condição requer somente controle sintomático. VARICOCELE Varicocele é a dilatação anormal das veias do plexo pampiniforme testicular. Existe uma associação direta entre varicocele e infertilidade masculina, muitoembora 2/3 dos portadores de varicocele sejam férteis. A varicocele é a causa tratável mais comum de infertilidade masculina. A maioria dos casos de varicocele é assintomática. Alguns pacientes ocasionalmente queixam-se de sensação de peso, dor intermitente ou aumento do volume escrotal. Devido aos poucos sintomas, o diagnóstico baseia-se no exame físico minucioso. A manobra de Valsalva, em geral, facilita a visibilidade e palpação das veias dilatadas. Examina-se, posteriormente, o paciente deitado, no intuito de avaliar outras alterações intraescrotais e o volume dos testículos, observando a eventual assimetria entre os dois lados. Assimetria ou hipotrofia testicular são sugestivas de dano testicular e podem orientar o tratamento cirúrgico, principalmente em adolescentes. De acordo com o grau de desenvolvimento, as varicoceles são classificadas em: Grau I (pequenas): aquelas que são palpáveis apenas com a manobra de valsalva. Grau II (moderadas): palpáveis facilmente sem esta manobra. Grau III (grande): detectadas visualmente e palpadas com facilidade. Análise seminal Anormalidades na concentração e qualidade espermática são frequentes em pacientes inférteis com varicocele, porém não são patognomônicas dela, como se imaginava no passado (padrão de estresse seminal, descrito por MacLeod). Representam apenas anormalidade da função testicular. Testes - Doppler estetoscópio – O "probe" é colocado no cordão espermático, com o paciente em pé. Um ruído característico (refluxo venoso) é auscultado quando solicitada a manobra de Valsalva, nos casos de varicoceles. - Eco-doppler colorido – É um método muitas vezes empregado para confirmação diagnóstica de varicocele. É muito útil no diagnóstico de varicocele subclínica contralateral a varicocele diagnosticada no exame clínico, pois acumulam-se evidências que nestes casos a presença de varicocele subclínica terá importância no planejamento cirúrgico. Vale a pena ressaltar que este exame deve ser feito sempre na posição ortostática, e em mãos habilitadas, o Doppler estetoscópio pode mostrar os mesmos resultados. MASSAS ESCROTAIS NÃO DOLOROSAS Massas extratesticulares: - Císticas • Hidrocele: consiste no acumulo de líquido entre as lâminas visceral e parietal da túnica vaginal. Pode ser congênita ou secundária a outra patologia testicular. • Espermatocele/Cisto de epidídimo: cistos no epidídimo de conteúdo espermático ou seroso, respectivamente. • Hematocele: acúmulo de sangue entre a túnica vaginal e a túnica albugínea. - Sólidas • Hérnia inguinoescrotal • Tumores de epidídimo, cordão espermático e da túnica albugínea: raros, a maioria benignos. Massas intratesticulares: frequentemente correspondem a neoplasias testiculares, em geral, malignas. Tumores benignos são raros, menos de 2% dos tumores.
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