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ENDOCARDITE INFECCIOSA SBCMC III - 2021.1 Cirurgia Cardíaca Dr. Ricardo Mustafá INTRODUÇÃO Inicialmente, eram chamadas de endocardites bacterianas, porém, como podem ser causadas por outros patógenos que não bactérias, passaram a ser chamadas de infecciosas. Vale ressaltar que existem endocardites de causas não infecciosas, por exemplo, por febre reumática e de origem reumatóide, as quais decorrem de reações imunológicas. Endocardite é a inflamação do endotélio cardíaco (endocárdio) → válvulas e câmaras. A de origem infecciosa provém inicialmente de uma bacteremia associada a presença de um sítio favorável no endocárdio (uma lesão de endocárdio) O sítio/substrato endocárdico que favorece a proliferação das bactérias é o que chamamos de filme biológico, e é formado pela presença de coágulos, trombos, comunicações interventriculares, lesões no geral, que facilitam a deposição e o crescimento de culturas bacterianas. DEFINIÇÃO Doença decorrente da infecção do endotélio de: válvulas cardíacas, câmaras cardíacas, próteses valvares e grandes vasos. ● Incidência: 1,9 a 6,2 casos/100 mil hab/ano PARTICULARIDADES ● Mais comum à esquerda (90%) ○ Mitral > Aórtica ● À direita ocorrem 10% dos casos, sendo mais comum na tricúspide ● Quando há próteses, a aórtica é a mais acometida ● Agentes etiológicos mais comuns: saber que tratam-se de cocos G+ na maioria dos casos, vai auxiliar no tratamento (penicilinas, na dúvida associada um aminoglicosídeo) ○ Em valva nativa → Streptococcus viridans. ○ Em próteses → Stafilococcus epidermidis. ○ Associado a neoplasia de cólon → Streptococcus bovis. ○ À direita (tricúspide e pulmonar) → Stafilococcus aureus. ■ Pacientes que usam cateter e drogas ilícitas injetáveis ETIOLOGIA ● Streptococcus viridans - 35%. ● Enterococcus faecium e faecalis - 7%. ● Streptococcus - 6%. ● Stafilococcus aureus - 2%. ● Stafilococcus epidermidis - 5%. ● Bactérias G (HACEK) - 6% ○ Haemophilus species, Aggregatibacter species, Cardiobacterium hominis, Eikenella corrodens, e Kingella species. ● Fungos 2%. FISIOPATOGENIA Tem início com a formação de um trombo de fibrina asséptico (é o produto da reparação do endotélio), que vai servir para deposição e colonização por microrganismos patológicos (bacteremia), determinando um filme biológico, que vai permitir o início do processo infeccioso - aumenta a adesão plaquetária, a deposição de fibrina, eritrócitos e células inflamatórias com aumento da vegetação. Conforme a vegetação vai crescendo, pode ocorrer um deslocamento da mesma, levando a perfuração de cavidades, o que constitui uma complicação gravíssima. VEGETAÇÃO É a lesão anatomopatológica típica da endocardite ● A vegetação é um conglomerado de bactérias, de fibrina, de plaquetas, é desprovida de vasos e se encontra em ambiente de agranulocitose relativa. ● Ela pode induzir alterações anatômicas sobre a estrutura valvar, como ruptura e perfuração e estender-se à estruturas contíguas, determinando complicações importantes da endocardite infecciosa. ● Eventualmente pode fragmentar-se, desprender-se e provocar embolia arterial - pode ser à nível central ou periférico. ○ Dificilmente o ecocardiograma detecta a natureza desse êmbolo como coágulo ou vegetação, isoladamente, somente com o eco. A história e a predisposição do paciente são importantes nessa etapa do diagnóstico. ● Em portadores de bioprótese, a infecção se apresenta como tecido gelatinoso, cobrindo a prótese. PATOGENIA ● Ocorre mais frequentemente na existência de lesões cardíaca prévias: ○ 40% tem valva nativa com patologia. ○ 12% têm cardiopatia congênita. ○ 23% tem próteses valvares. ○ 23% não possuem evidências de lesões - ex: paciente renal crônico fazendo uso de catéter venoso central em hemodiálise. ● Comumente a endocardite acomete folhetos, possui menor frequência no endocárdio do músculo e nos vasos. ● As vegetações nas infecções fúngicas são maiores (3-4 cm) - a clínica é silenciosa a princípio, então conseguem evoluir/crescer por mais tempo, já que o diagnóstico é mais tardio quando comparado às infecções bacterianas.. ● Podem ocorrer perfurações valvulares e/ou ruptura de cordoalhas. CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA DE EICHORST (1883) !!! Aguda: também chamada de endocardite séptica ● Diagnóstico em até 06 semanas ● Em 50 a 60% dos casos, não há lesão vascular prévia ● Agentes etiológicos mais virulentos: ○ Staphylococcus aureus ○ Streptococcus pneumoniae ○ Neisseria ○ Streptococcus pyogenes ○ Haemophylos Subaguda: também é chamada de endocardite verrucosa ● Diagnóstico em mais de 06 semanas, porque tem evolução mais lentificada ● É causada por agentes biológicos menos virulentos: ○ Streptococcus viridans ○ Streptococcus epidermidis MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS As manifestações decorrem de: ● Processo infeccioso prévio ● Repercussão anatômica cardíaca ● Embolias resultantes das vegetações ● Do estímulo antigênico prolongado Endocardite Subaguda: ● Os sintomas surgem até 02 semanas após o procedimento que causou bacteremia: ○ Febre baixa ○ Fadiga ○ Palidez ○ Anorexia e emagrecimento ● Ou surgem como complicações da doença: ○ Embolia arterial: cerebral, renal, coronariana, pulmonar, baço… ○ Complicações da função cardíaca: ICC, Insuficiência valvar, sopro novo ■ Sopro novo: é considerado sopro novo, o sopro que apresenta piora na classificação de Levine em curto espaço de tempo. ■ Classificação de Levine: sopro fraco, forte sopro médio, sopro forte e sopro que origina frêmito. ● Lesões características - estigmas periféricos: ○ Petéquias. ○ Hemorragia subungueal → são lineares, também chamadas de splinters ○ Nódulos de Osler → são áreas inflamatórias (eritematosas, sensíveis e dolorosas) em mãos e pés (não patognomônicos mas bastante frequentes) ○ Lesões de Janeway → são lesões hemorrágicas, geralmente de formatos irregulares e indolores, decorrem da formação de abscessos em capilares ○ Manchas de Roth → pequenas lesões vermelhas com interior branco na retina observáveis no exame de fundo de olho ● Outras Manifestações: ○ Baqueteamento digital ○ Petéquias na conjuntiva ○ Hepatoesplenomegalia ○ ICC ○ Hematúria (secundária à glomerulonefrite imunológica e infarto renal por êmbolos) ○ Ausência de sopro em até 10% dos casos ■ Nenhum sopro é inocente na presença de febre → realizar ECO Endocardite Aguda: ● Sinais de infecção grave (sepse), podendo iniciar rapidamente sinais de ICC, alterações neurológicas, petéquias e febre alta com calafrios ● Ou sintomas como complicações da doença: ○ Insuficiência valvar (sopro novo) ○ ICC refratária (é a maior causa de óbitos) por comprometimento aórtico e mitral ○ Cardiopatia congênita FATORES PREDISPONENTES ● Cirrose ● Neoplasias ● Hemodiálise ● Marcapasso ● Drogadição injetável ● Cardiopatias subjacentes PORTAS DE ENTRADA Muitas vezes estão relacionadas com procedimentos médicos ● Extração dentária e limpezas (lesões de gengiva) ● Tonsiloadectomia ● Broncoscopia ● Intubação nasotraqueal ● Operações nasais ● Enema, colonoscopia ● Cistoscopia, prostatectomia e vasectomia ● Laparoscopia CARDIOPATIAS SUBJACENTES ● Valvopatias reumáticas - 40 a 60% ● Cardiopatias congênitas - 6 a 16% ● Hipertrofia septal assimétrico subaórtica - 10% ● Prolapso com insuficiência mitral ● Prótese valvar ● IAM - em decorrência da alteração da capacidade de contratilidade pode ocorrer a formação de trombos e aneurismas que podem infectar EXAMES LABORATORIAIS ● VHS e PCR aumentado. ● Anemia - decorrente do consumo de células hemáticas. ● Leucocitose discreta na endocardite subaguda e importante leucopenia na aguda. ● Proteinúria, hematúria. ● Eleva TGO e TGP (ALT/AST). ● Uremia. ● Hemoculturas – é obrigatório para a correta interpretação do quadro clínico infeccioso. EXAMES COMPLEMENTARES ● ECG: ○ O ECG evidencia a possibilidade da ocorrência de abscesso valvar: quando uma válvula é acometida, principalmente a válvula aórtica, a endocardite pode provocar um abscesso do septo e, caso isso ocorra, ele pode atingir as fibras de Hiss e Purkinje, provocando bloqueios atrioventricularese intraventriculares, respectivamente. ○ Vale ressaltar que um ECG normal não descarta a hipótese de endocardite infecciosa. ○ Sempre suspeitar de EI em caso de BAV de 1º grau novo, em presença de quadro infeccioso. ● Raio-X de tórax: ○ Não vai mostrar nada específico da endocardite, mas pode nos mostrar as complicações dessa endocardite, por exemplo uma congestão pulmonar ○ Importante para diagnóstico diferencial de outras doenças infecciosas. ● Ecocardiograma: ○ É o exame padrão-ouro ○ O transtorácico detecta a EI em 80% dos casos, o transesofágico é mais sensível ○ Vale ressaltar que a ausência de vegetação não exclui o diagnóstico de EI - às vezes não houve tempo de formação da vegetação ou ela já se formou e embolizou para outra região. DIAGNÓSTICO ● História de fatores predisponentes (não é obrigatório), associado a evidências de bacteremia. ● Quadro clínico infeccioso atual ● Hemocultura – é um exame indispensável, sempre que possível deve-se aguardar o resultado para iniciar o tratamento. ● Achados do ecocardiograma: vegetação Obs: o diagnóstico de EI é difícil, chamamos de diagnóstico de presunção. O diagnóstico de certeza só é dado diante de autópsia, caso o paciente evolua para óbito, ou biópsia, em caso de remoção cirúrgica. CRITÉRIOS DE PRESUNÇÃO CLÍNICA (DUKE) !!! É considerado endocardite: ➢ 02 critérios maiores ➢ 01 maior e 03 menores ➢ 05 menores Critérios Maiores: ● Hemoculturas positivas para agentes típicos. ● Ecocardiograma que evidencie vegetações ou as complicações: abscessos, fístulas, aneurismas, novas deiscências. ● Nova regurgitação valvar. ○ Uma regurgitação preexistente não é um critério maior de Duke, mas é importante pois tem valor como um critério de fator predisponente. Critérios Menores: ● Hemoculturas positivas para agentes atípicos. ● Ecocardiograma duvidoso – imagens não são conclusivas e mostram imagem de espessamento. ● Febre maior que 38°C. ● Presença de fenômenos vasculares (embolia arterial, embolia séptica pulmonar ou cerebral, infarto pulmonar, aneurisma micótico, hemorragia conjuntival e lesões de Janeway). ● Presença de fenômenos imunológicos positivos (glomerulonefrite por disposição de imunocomplexos, nódulos de Osler, manchas de Roth e fator reumatóide). ● Predisposição. COM RELAÇÃO AO DIAGNÓSTICO Endocardite Infecciosa Definida: ● Por critérios anatomopatológicos: ○ Microorganismos demonstrados por cultura ou histologia em vegetação in situ ou embolizada, ou em abscesso intracardíaco ○ Presença de vegetação ativa ou abscesso intracardíaco confirmado por histologia. ● Por critérios clínicos: critérios de Duke ○ 02 critérios maiores ○ 01 critério maior e 3 menores ○ 05 critérios menores Endocardite Infecciosa Possível: as evidências encontradas não são suficientes para completar critérios de uma El definida, mas também não preenchem critérios para considerar El rejeitada. Endocardite Infecciosa Rejeitada: ● Claro diagnóstico alternativo para os achados ● Resolução do quadro clínico após 4 dias ou menos da introdução do antibiótico ● Ausência de evidências de El por cirurgia ou anatomia patológica obtidas após 4 dias ou menos da introdução do antibiótico. COMPLICAÇÕES ● Decorrentes do tratamento ● Embolias ● Aneurismas micóticos - na verdade são pseudoaneurismas, porque se constituem de um hematoma peri-vascular, sem parede arterial e não implica em etiologia fúngica (é bacteriana) PROFILAXIA PARA PACIENTES COM CARDIOPATIA SUBMETIDOS À PROCEDIMENTOS O objetivo é suprimir a bacteremia. Intervenção odontológica e do trato respiratório: ● Amoxacilina 2g 1h antes do procedimento e 1,5g 6h após a dose inicial, ou ● Ampicilina 2g 1h antes e 1g 6h após, ou ● Azitromicina ou Claritromicina 500mg 1h antes e 1g 6h após para pacientes alérgicos à penicilina. ○ Ainda há a opção de usar Clindamicina. Intervenção do trato geniturinário e digestivo: ● Ampicilina 2g EV 1h antes do procedimento e 1g 6h após a primeira dose associado a Garamicina 1,5 mg/kg 1h antes do procedimento e 8h após a primeira dose. ● Para alérgicos: trocar a ampilicina pela Vancomicina 1g EV TRATAMENTO (ele falou bem rapidinho, acho que não é o foco) Medicamentoso: ● Estreptococus viridans: penicilina cristalina 18-24 milhões de unidades 24/h por 4 semanas + gentamicina 1,5mg/kg 8/8h (até 240mg/24h) por 2 semanas OU ceftriaxona 2g 12/12h por 4 semanas. ● Enterococos: penicilina cristalina 18-24 milhões unidade 24/h por 4 a 6 semanas + gentamicina 1,5mg/kg 8/8h por 4 a 6 semanas. ● Stafilococos meticilino sensível: oxacilina 12 a 18 g /24h por 4 a 6 semanas + gentamicina 1,5mg/kg. ● Stafilococos meticilino resistente: vancomicina 2g/24h por 4 a 6 semanas. ● Infecção em próteses (2 meses de cirurgia): vancomicina 2 g /24h por > de 6 semanas + amicacina 500 mg 12/12h por 2 semanas. Cirúrgico - indicações: ● Endocardite fúngica ● ICC refrataria ● Embolias de repetição ● Resposta inadequada a terapêutica antimicrobiana ● Infecção complicadas em próteses ● Abscessos, fístulas Observações: com relação ao tratamento medicamentoso, é difícil para o clínico geral detectar qual é o patógeno para determinar a antibioticoterapia, então a gente vai avaliar o histórico do paciente, levando em consideração as infecções recentes. ● Germes de IVAS → penicilinas e cefalosporinas → endocardite por um abcesso dentário ● Stafilos e Streptococcus → penicilinas → endocardite secundária a uma infecção de pele ● Germes de TGU → gram negativo → antibióticos de grande espectro → secundário a ITU
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