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Doença Ulcerosa Péptica - Tratamento

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Amanda Coimbra Pires 
Doença Ulcerosa Péptica 
 TRATAMENTO CLÍNICO 
Dieta: a antiga crença no benefício de dietas pequenas e mais frequentes foi abandonada – é 
desnecessária e pode até ser deletéria! Os pacientes devem fazer as três refeições básicas, de forma 
regular. Hoje está claro que não existe dieta específica para o tratamento da úlcera péptica, sendo a 
única recomendação importante quanto à dieta evitar as comidas que exacerbem os sintomas. 
O fumo: “os pacientes que não fumam apresentam cicatrização melhor e mais rápida do que os 
fumantes”. O fumo prejudica os mecanismos de reparo e proteção mucosa! 
O álcool: o álcool NÃO induz a formação de úlceras, porém, aumenta o risco de hemorragia digestiva em 
portadores de úlcera péptica bem estabelecida e, portanto, deve ser evitado durante o tratamento... 
Além disso, a aspirina e AINEs devem ser suspensos, se possível (o risco benefício deve ser sempre avaliado. 
Muitas vezes é mais vantajoso que um paciente que realizou angioplastias realize o tratamento para úlcera 
péptica sem retirada da aspirina devido ao alto risco cardiovascular destes pacientes, uma vez que a 
interrupção da aspirina se correlaciona com obstrução dos stents. 
E o café, mesmo descafeinado, aumenta a produção de ácido gástrico, resultando em irritação das 
mucosas. O mesmo vale para os refrigerantes, que, além de aumentarem a produção de ácido, são 
gasosos e causam distensão gástrica e dispepsia18. No entanto, é importante levar em conta as tolerâncias 
individuais, com atenção para a existência de equívocos sobre os alimentos e suas ações no corpo. 
TRATAMENTO FARMACOLÓGICO 
O tratamento farmacológico visa à redução da acidez do conteúdo gástrico somada à erradicação do 
Helicobacter pylori, quando a bactéria se encontra presente. 
Antissecretores de primeira linha: 
Inibidores da Bomba de Prótons (IBPs) 
Atuam na H+/K+ATPase, inibindo diretamente o mecanismo de secreção de HCl da célula parietal, sendo 
considerados os antissecretores de primeira escolha para o tratamento da DUP. Após a administração, o 
início de ação dos IBPs é rápido, com o efeito inibitório máximo na secreção ácida ocorrendo dentro de 
duas a seis horas. Esses agentes atuam com maior eficácia quando a bomba de prótons se encontra 
ativada, daí a recomendação de serem administrados em jejum. 
Abaixo temos os principais IBPs disponíveis e suas respectivas doses: 
 
Amanda Coimbra Pires 
Os IBPs fazem parte dos esquemas de erradicação do H. pylori – a recomendação em nosso país é um 
tempo de tratamento de sete dias. Após este período, os antibióticos são suspensos e o IBP é mantido por 
mais três a sete semanas, perfazendo um total de quatro a oito semanas de tratamento da DUP. 
Bloqueadores H2 
Bloqueiam competitivamente os receptores H2 de histamina das células parietais, responsáveis pelo 
estímulo à produção de ácido gástrico. 
Existem diversos BH2 , que diferem em termos de potência, efeitos colaterais etc. Os principais agentes 
disponíveis no mercado, com suas respectivas doses são: 
 
Observações: 
(a) Como os antiácidos interferem com a absorção dos BH2 , eles não devem ser ingeridos 
concomitantemente; 
(b) Como os rins são a principal via de eliminação dos BH2 , deve-se ajustar a dose na insuficiência renal; 
(c) Os BH2 (com exceção da famotidina) mostraram-se inibidores da desidrogenase alcoólica gástrica, 
uma enzima gástrica que tem importante papel no metabolismo do álcool (ou seja, os BH2 tornam as 
pessoas mais sensíveis ao álcool). 
O tempo de tratamento com bloqueadores H2 de histamina varia em função do tamanho da úlcera, 
localização etc. No geral, eles também são prescritos por 4-8 semanas. 
DROGAS DE SEGUNDA LINHA: 
Antiácidos 
Ao reagirem com o HCl, os antiácidos neutralizam diretamente o pH reduzido do estômago. Atualmente 
esta classe de drogas é utilizada apenas para alívio dos sintomas. Os antiácidos mais conhecidos são: 
 
Os hidróxidos de alumínio e magnésio são os mais utilizados e podem ser encontrados em comprimidos ou 
na forma de gel. Como o hidróxido de alumínio é constipante e o de magnésio é laxante, a maioria das 
preparações mistura os dois. 
Se os antiácidos forem tomados com o estômago vazio, eles rapidamente deixam este local, sendo 
eficazes por apenas 10-20min. Quando tomados uma hora após as refeições, momento em que a 
secreção de ácido (reativa) não mais consegue ser tampo nada pela comida no estômago, são 
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geralmente efetivos por duas a três horas. Dessa forma, os antiácidos devem ser tomados uma hora após 
as principais refeições e ao deitar. 
Os antiácidos que contêm alumínio, quando usados em grande quantidade, podem causar depleção de 
fosfato pela formação de precipitados intestinais inabsorvíveis. Isso pode resultar em anorexia, fraqueza 
muscular e doença óssea. 
O uso a longo prazo do carbonato de cálcio, como antiácido, pode levar à síndrome leite-álcali – 
hipercalcemia, hiperfosfatemia e calcinose dos rins, com progressão para insuficiência renal. 
Sucralfato 
considerado uma droga citoprotetora, funciona como um protetor da base da úlcera, formando uma 
película que impede a ação do ácido, da pepsina e dos sais biliares. Além de servir como uma barreira 
físico- -química, a droga estimula ainda a produção de prostaglandinas, bicarbonato e muco. Outra ação 
importante se dá através de seu efeito trófico sobre o epitélio. 
Sendo pouco absorvido sistemicamente, o sucralfato apresenta efeitos colaterais mínimos, como 
constipação intestinal e náuseas. Devido ao alumínio de sua estrutura, deve ser evitado na presença de 
insuficiência renal. A dose habitual é 1 g quatro vezes ao dia. 
Tratamento do Helicobacter pylori 
 
Testes Invasivos 1- Teste rápido da urease do fragmento biopsiado: é o método de escolha na avaliação 
inicial dos pacientes que foram submetidos à endoscopia digestiva alta. O uso recente de antibióticos, 
inibidores da bomba de prótons ou bismuto, diminui a sensibilidade deste exame, que então deve ser feito 
uma semana após a suspensão dos mesmos. 
Sabemos, até o momento, que a melhor terapia para erradicação do H. pylori tem como base uma 
combinação de pelo menos três drogas utilizadas por tempo variável. Em nosso meio, o tratamento inicial 
é feito por sete dias. Nos EUA e na Europa, recomenda-se a terapia por 14 dias. 
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O controle de cura geralmente é determinado por testes não invasivos (TRU- teste respiratório de urease é 
o de eleição). Método sorológico não deve ser utilizado para controle de cura, pois os anticorpos permanecem no organismo 
durante anos. Teste Respiratório da Ureia (TRU): o paciente ingere uma solução de ureia marcada com 
isótopos de carbono (C13 e C14). Sob ação da urease do H. pylori, a ureia é convertida em amônia e 
bicarbonato, o qual é convertido em CO2 (com o C marcado), sendo este último prontamente absorvido 
para a circulação e eliminado na exalação. O paciente então expira em um recipiente onde a presença 
de carbono marcado pode ser detectada por cintilação ou espectrografia. O teste, por ser não invasivo, 
é considerado o método de eleição para o controle de cura, porém, só deve ser realizado após quatro 
semanas do término do tratamento antimicrobiano, e após duas semanas do término do tratamento com 
IBP. Tais precauções são necessárias a fim de evitar resultados falso-positivos e falso-negativos, 
respectivamente. 
 
A falência na erradicação do H. pylori com a terapia tríplice inicial requer o emprego do “tratamento de 
resgate”. No Brasil, os tratamentos de segunda linha atualmente preconizados são: 
(1) IBP (ex.: omeprazol 20 mg 12/12h) + levofloxacino (500 mg/1x dia) + amoxicilina (1 g 12/12h) por 10 
dias; ou 
(2) IBP (ex.: omeprazol 20 mg 12/12h) + levofloxacino (500 mg/1x dia) + furazolidona (200 mg 12/12h) por 7-
10 dias. 
Como “resgate adicional” (terceira linha de tratamento), podemos lançar mãoda terapia quádrupla: 
IBP (ex.: omeprazol 20 mg 12/12h) + sal de bismuto (240 mg 12/12h) + amoxicilina (1 g 12/12h) ou 
doxiciclina (100 mg 12/12h) + furazolidona (200 mg 12/12h) por 10-14 dias. 
ESTAS SÃO AS RECOMENDAÇÕES DO III CONSENSO BRASILEIRO DE H. PYLORI. 
O controle de cura da infecção deve ser realizado no mínimo um mês após o final do tratamento 
(preferencialmente dois a três meses). O teste respiratório com uréia marcada com carbono 13 
ou 14 constitui o método não invasivo ideal para realizar o controle da erradicação. É altamente 
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sensível e específico e de custo moderado. Deve-se evitar o exame em pacientes em uso de 
anti-secretores, especialmente os inibidores de bomba protônica ou antimicrobianos na semana 
precedente ao exame, para se evitar a possibilidade de falso-negativos. A sorologia não é um 
método útil no controle de erradicação do HP. Nos pacientes portadores de úlcera gástrica, 
persiste imprescindível a realização de endoscopia digestiva de controle da lesão ulcerosa e 
coleta de material para estudo histológico confirmando a benignidade da lesão e a situação do 
HP. 
A possibilidade de reinfecção após um tratamento bem sucedido é possível, porém pouco 
frequente. 
Quanto ao seguimento de úlceras pépticas duodenais, habitualmente, não são necessárias 
biópsias da lesão. Ao completar o processo de cicatrização da úlcera duodenal, usualmente se 
observa o aparecimento de traves fibrosas que convergem para o local da lesão, que podem 
diminuir a sua luz e formar entre elas recessos que lembram divertículos, sendo, por essa razão, 
denominadas “pseudodivertículos”. Estima-se que mais de 90% das úlceras duodenais cicatrizam 
após quatro semanas de tratamento com inibidor de bomba de próton, erradicação do H. pylori 
e/ou interrupção do anti-inflamatório não hormonal. Logo, o que vai determinar a necessidade 
da realização de novo exame em casos de sintomas refratários do paciente. 
-No caso de úlceras gástricas, a regra é realizar novo exame endoscópico após 6 a 8 semanas de 
tratamento para avaliar a sua cicatrização e coletar novas biópsias, mesmo quando a histologia 
anterior revelou tratar-se de úlcera benigna. 
-Se o estudo histológico for negativo para malignidade e houver redução significativa do 
tamanho da úlcera, isto é, acima de 50% do tamanho inicial, o prazo de tratamento com a 
mesma droga poderá ser prolongado, seguindo-se nova avaliação ao final dele. Se a redução 
não for significativa, isto é, menor que 50% do tamanho inicial, outro tipo de medicamento ou 
aumento da dose deve ser instituído por mais seis semanas, recomendando-se manter o controle 
endoscópico periódico com biópsias até a cicatrização completa da lesão. O seguimento 
endoscópico deve ser realizado nos pacientes com úlcera que não puderam ser biopsiados no 
primeiro exame, em virtude de hemorragia, coagulopatia ou instabilidade clínica. 
O diagnóstico de úlcera péptica requer a realização de exame complementar, sendo a Endoscopia 
Digestiva Alta (EDA) o padrão-ouro. 
 
A queixa de sintomas dispépticos recentes não necessariamente indica EDA... Este exame é oneroso! Pelo 
Guideline americano, a conduta inicial diante de tal situação deve ser a pesquisa do H. pylori por exames 
não invasivos (teste respiratório da urease, sorologia) e, caso positivo, tratamento empírico com 
erradicação da bactéria (antibióticos + inibidores da bomba de prótons). Caso negativo, um curso empírico 
de quatro semanas com antissecretores (inibidores da bomba de prótons ou bloqueadores H2), é a medida 
sugerida, solicitando-se a EDA apenas nos casos refratários ou recorrentes. O uso de AINE também deve 
ser investigado, e se presente o medicamento deve ser suspenso. Estas são as melhores estratégias em 
termos de custo-benefício. Porém, a EDA está sempre indicada desde o início nos pacientes > 45 anos ou 
naqueles com “sinais de alarme” para uma possível neoplasia gástrica: perda ponderal, anemia, 
sangramento, vômitos recorrentes, disfagia, massa abdominal, adenopatia, história familiar de câncer 
gástrico e gastrectomia parcial prévia. 
Deve-se tomar muito cuidado com as úlceras gástricas! Enquanto as duodenais raramente são malignas 
(ver adiante), as gástricas devem SEMPRE ser investigadas para câncer: se a EDA visualizar uma úlcera 
“péptica” no estômago, várias amostras de material (pelo menos sete) devem ser colhidas por biópsia e 
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exaustivamente investigadas à procura de tecido neoplásico, o que não é necessário de rotina numa úlcera 
duodenal. 
TRATAMENTO CIRÚRGICO 
Existem duas indicações básicas para a realização de um procedimento cirúrgico nos pacientes com 
úlcera: 
1- Intratabilidade clínica; 
2- Presença de complicações (hemorragia, perfuração e obstrução). 
Intratabilidade clínica é definida, como a não cicatrização da úlcera após cerca de 8-12 semanas de 
tratamento, ou sua recidiva após o término da terapia. INCOMUM. 
Para considerarmos uma úlcera como refratária, é necessário que a erradicação do H. pylori seja 
confirmada e o uso de AINEs, afastado. Em úlceras gástricas, é fundamental também descartarmos 
malignidade, com biópsias endoscópicas repetidas. 
COMPLICAÇÕES AGUDAS DA DOENÇA ULCEROSA PÉPTICA 
Hemorragia Digestiva Alta 
É a complicação mais comum da DUP e a causa mais frequente de Hemorragia Digestiva Alta (HDA) na 
população 
De forma geral, a maioria dos doentes tem idade superior a 60 anos e utiliza habitualmente AINEs ou AAS 
em dose baixa. Existe, sobretudo na úlcera gástrica, associação com infecção pelo H. pylori (70% dos 
casos). 
A HDA associada à DUP se manifesta subitamente com hematêmese e melena (casos mais graves) ou 
apenas melena (casos mais leves), exacerbação de uma dor epigástrica ou de qualquer outra 
sintomatologia dispéptica.

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