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Amanda Coimbra Pires Doença do Refluxo Gastroesofágico TRATAMENTO A maioria dos portadores de DRGE apresenta uma forma mais ou menos branda (e sem complicações) da doença, evoluindo com melhora dos sintomas após o início de medidas gerais antirrefluxo e drogas antissecretoras gástricas. A cirurgia antirrefluxo é essencialmente reservada para os casos refratários ou com complicações. Medidas Antirrefluxo Elas devem ser indicadas de maneira individualizada, conforme as queixas de cada paciente (ex.: a recomendação de evitar certos tipos de alimento só é válida se aqueles alimentos efetivamente provocarem sintomas no paciente). Tratamento Farmacológico As classes de medicamentos empregadas no tratamento da DRGE são: (1) Bloqueadores do receptor H2 de histamina (BH2 ); (2) Inibidores da Bomba de Prótons (IBP); (3) Antiácidos. Os procinéticos (ex.: bromoprida, domperidona, metoclopramida) não são mais indicados de rotina. Antigamente os procinéticos eram sempre prescritos como adjuvantes ao tratamento antissecretor, com o intuito de melhorar o tônus e a motilidade da região esofagogástrica, mas nunca foi demonstrado um benefício consistente para a maioria dos pacientes. Todavia, os procinéticos podem ser prescritos para pacientes que, além dos sintomas típicos de refluxo, apresentam outras queixas dispépticas sugestivas de gastroparesia associada (ex.: náuseas, saciedade precoce, plenitude pós-prandial). Bloqueadores H2 Bloqueiam os receptores H2 de histamina nas células parietais gástricas, inibindo, desse modo, uma das três vias de estímulo neuroendócrino à secreção ácida (as outras duas são mediadas por acetilcolina e gastrina). São comprovadamente menos eficazes do que os IBP, não devendo, por conseguinte, ser prescritos na vigência de esofagite grave ou outras complicações (ex.: esôfago de Barrett). Amanda Coimbra Pires Perceba que os BH2 devem sempre ser tomados 2x ao dia. Inibidores da Bomba de Prótons Inibem a H+/K+ATPase (“bomba de prótons”) bloqueando a via final para a secreção de ácido pelas células parietais do estômago. Constituem as drogas de escolha quando o paciente é muito sintomático, e também quando apresenta esofagite ou outras complicações da DRGE. A melhora da pirose é observada em 80-90% dos pacientes, desaparecendo por completo em cerca de 50%. A resolução da esofagite é esperada em > 80% quando a dose padrão é utilizada (1x ao dia, 30min antes do café da manhã), e quase todo o restante melhora quando a dose é “dobrada” (2x ao dia, 30min antes do café da manhã e 30min antes do jantar). Não parece haver diferenças significativas em termos de eficácia clínica entre as formulações, ficando a escolha mais por conta do potencial de interações medicamentosas e do custo (o omeprazol é o que tem maior número de interações, mas é também o mais barato). Raramente os IBP produzem efeitos adversos... Cefaleia, Diarreia e Dor Abdominal são os paraefeitos AGUDOS mais comuns, e podem ser resolvidos com uma simples troca da medicação (ex.: trocar omeprazol por pantoprazol). Paraefeitos CRÔNICOS, os mais importantes são: (1) maior risco de enterocolite infecciosa, incluindo infecção por Clostridium difficile; (2) maior risco de pneumonia (por enteropatógenos Gram-negativos que passam a colonizar a mucosa gástrica e podem ser aspirados para a via aérea); (3) má absorção intestinal de ferro, cálcio, magnésio e vitamina B12, provocando anemia (ferropriva e/ou megaloblástica), hipomagnesemia e fraturas osteoporóticas, especialmente fraturas de quadril. Antiácidos Os antiácidos (ex.: hidróxido de alumínio e/ou magnésio, como o Mylanta Plus® 10-20 ml VO) neutralizam diretamente a acidez do suco gástrico, sem interferir na secreção cloridropéptica das células parietais. Logo, NÃO são úteis no tratamento prolongado da DRGE, pois seu efeito é de curta duração (cerca de 2h): Amanda Coimbra Pires seriam necessárias muitas tomadas diárias a fim de manter o pH gástrico controlado, uma conduta simplesmente inviável na prática (até porque, durante a noite, o paciente ficaria desprotegido)... Podem ser utilizados como “SOS” para alívio imediato! Seja como for, antiácidos isolados não têm eficácia na cicatrização da esofagite erosiva, tampouco na presença de outras complicações. É importante lembrar que formulações contendo magnésio devem ser evitadas em portadores de doença renal crônica, pelo risco de causar hipermagnesemia. CIRURGIA ANTIRREFLUXO O tratamento cirúrgico, qualquer que seja a técnica empregada, visa restabelecer a competência do EEI, circundando a extremidade inferior do esôfago com um manguito (ou válvula) formado pelo fundo gástrico – a chamada Fundoplicatura. Na presença de complicações da DRGE (esofagite, úlceras esofágicas, estenose péptica e esôfago de Barrett), a maioria dos cirurgiões indica a cirurgia, embora alguns autores clínicos preconizem que, na vigência de controle farmacológico satisfatório, é aceitável optar pela não realização da cirurgia. Grande controvérsia existe em relação aos pacientes que respondem bem ao tratamento clínico, mas se mostram “dependentes” da medicação (isto é, não conseguem suspender os IBP devido ao rápido retorno dos sintomas). Autores cirúrgicos defendem a cirurgia antirrefluxo para estes indivíduos, desde que eles sejam jovens (idade < 49 anos). Os argumentos a favor da cirurgia são: (1) se a resposta ao tratamento clínico é satisfatória, a resposta ao tratamento cirúrgico certamente será excelente; (2) alguns estudos sugeriram que, em longo prazo, para pessoas jovens, talvez seja mais custo-eficaz realizar a cirurgia antirrefluxo de maneira precoce (isto é, após alguns anos, o custo relacionado à cirurgia será mais baixo do que o custo cumulativo do tratamento medicamentoso)... Por outro lado, autores clínicos têm se posicionado contra esta recomendação, com base em estudos que mostraram equivalência entre as abordagens clínica e cirúrgica após cinco anos (remissão da pirose em 85-92% dos pacientes), porém, ao Amanda Coimbra Pires custo de um maior número de efeitos colaterais da cirurgia (acalásia, eructações, flatulência)... Outros autores se posicionam de forma mais ponderada: nestes pacientes, qualquer uma das estratégias seria válida, ficando a cargo do médico e do paciente a escolha por uma delas. Sintomas Leves e Intermitentes Quando os sintomas aparecem com frequência < 1x/semana, podemos optar pelo “tratamento sob demanda”, isto é, os medicamentos são usados apenas conforme a necessidade... As drogas de escolha são os antiácidos ou os BH2 . Os antiácidos promovem alívio quase que imediato da pirose, porém, sua ação dura no máximo 2h. Já os BH2 demoram um pouco mais para começar a agir (cerca de 30min), porém seu efeito é prolongado (cerca de 8h). Quando o paciente é capaz de prever o início dos sintomas (ex.: quando ele sabe que vai comer algum desencadeante de pirose), os BH2 devem ser tomados 30min antes da refeição. Sintomas Mais Graves e Frequentes TRATAMENTO INICIAL. As drogas de escolha são os IBP em dose padrão (1x ao dia), mantidos por 4-8 semanas. Cerca de 10-20% dos pacientes não melhoram com a dose padrão após as primeiras 2-4 semanas, situação que autoriza o médico a “dobrar a dose” empiricamente (2x ao dia). Na ausência de resposta à dose dobrada (5% dos casos), o paciente deve ser submetido a exames complementares. Pacientes virgens de tratamento, que porventura recebem o diagnóstico já com complicações da DRGE (ex.: esofagite erosiva grave, esôfago de Barrett, estenose péptica), podem começar com a dose dobrada. TRATAMENTO DE MANUTENÇÃO. Pacientes que respondem de forma satisfatória ao IBP na dose padrão devem tentar suspender a medicação após o tratamento inicial. Cerca de 80% evoluem com recidiva dos sintomas, geralmente dentro dos primeiros três meses, e para estes indivíduos as seguintes opções são válidas:(1) reintroduzir o IBP na dose padrão e mantê-lo indefinidamente; (2) utilizar o IBP na dose padrão, mas de forma intermitente (cursos alternantes de 2-4 semanas); (3) utilizar o IBP “sob demanda” (isto é, somente para resolver sintomas eventuais). O fato é que a estratégia a ser adotada dependerá da frequência e do impacto dos sintomas na qualidade de vida do paciente, bem como de suas preferências pessoais. Para pacientes que necessitaram de IBP em dose dobrada durante o tratamento inicial, bem como para aqueles diagnosticados com complicações da DRGE, recomenda-se NÃO TENTAR A SUSPENSÃO DA MEDICAÇÃO, devendo o tratamento ser mantido indefinidamente com a menor dose efetiva possível. Helicobacter pylori e DRGE O H. pylori infecta a mucosa gástrica, muitas vezes reduzindo a produção acidopéptica do estômago pela atrofia da mucosa no corpo e fundo gástricos (pangastrite atrófica pelo H. pylori). A gastrite antral pelo H. pylori faz o contrário: hipercloridria. Como a infecção pela bactéria em nosso meio é muito comum, a presença do H. pylori num portador de DRGE é naturalmente esperada. Nos casos de pangastrite atrófica, a redução da secreção ácida abranda as consequências da DRGE e, desse modo, a erradicação do bacilo poderia piorar ou iniciar os sintomas da DRGE (uma vez normalizada a secreção cloridropéptica pela mucosa gástrica)... Seja como for, está claro que o H. pylori NÃO causa Amanda Coimbra Pires diretamente DRGE, e a recomendação atual é tratar esta infecção respeitando suas indicações formais, independente da DRGE. PROCINÉTICOS Os procinéticos são drogas que estimulam a motilidade do aparelho digestivo por ação direta sobre o músculo liso entérico ou por interação com os neurônios do sistema nervoso entérico. Os procinéticos outrora muito utilizados no controle da DRGE, por sua associação com efeitos cardiovasculares e neurológicos, foram abandonados como estratégia terapêutica de rotina. A domperidona, antagonista dopaminérgico periférico, sem efeitos colinérgicos, aumenta o peristaltismo esofagiano, acelera o esvaziamento gástrico com melhora da motilidade antroduodenal. Os efeitos colaterais são raros, entre eles a cólica abdominal. A dose recomendada é de 0,2 a 0,3 mg/kg/dose, três a quatro e três vezes ao dia, 30 minutos antes das refeições e ao deitar. Estudos recentes não mostraram benefícios com uso rotineiro dadomperidona. Atualmente é indicada em casos não responsivos ao tratamento com bloqueadores de bomba de prótons ou com antagonistas de receptores histamínicos-2, sempre em associação. O uso do etilsuccinato de eritromicina, agonista da motilina, vem sendo proposto como terapêutica procinética alternativa, embora ainda existam poucas evidências da sua eficácia em crianças.
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