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FACULDADE DA REGIÃO SERRANA - FARESE PÓS GRADUAÇÃO EM LIBRAS GRACIELE DE AZEVEDO MENDONÇA CAMARGO A EVOLUÇÃO DA LIBRAS E SUA IMPORTÂNCIA NA EDUCAÇÃO DOS SURDOS SÃO PAULO 2020 A EVOLUÇÃO DA LIBRAS E SUA IMPORTÂNCIA NA EDUCAÇÃO DOS SURDOS gracieleamc@gmail.com1 Declaro que sou autor(a)¹ deste Trabalho de Conclusão de Curso. Declaro também que o mesmo foi por mim elaborado e integralmente redigido, não tendo sido copiado ou extraído, seja parcial ou integralmente, de forma ilícita de nenhuma fonte além daquelas públicas consultadas e corretamente referenciadas ao longo do trabalho ou daqueles cujos dados resultaram de investigações empíricas por mim realizadas para fins de produção deste trabalho. Assim, declaro, demonstrando minha plena consciência dos seus efeitos civis, penais e administrativos, e assumindo total responsabilidade caso se configure o crime de plágio ou violação aos direitos autorais. (Consulte a 3ª Cláusula, § 4º, do Contrato de Prestação de Serviços). RESUMO - O artigo apresenta breve resumo da evolução da língua de sinais ao longo da história, abordando aspectos filosóficos, sociais, culturais e educacionais, norteado por pontos de vista de diversos, nos quais educadores, filósofos, estudiosos e integrantes da comunidade surda, discorrem sobre a educação e inclusão social. A educação do aluno surdo esteve, desde sua origem, atrelada às práticas medicinais, ao assistencialismo e à filantropia. As práticas pedagógicas, incapazes de atender aos anseios e necessidades do educando não ouvinte, mostravam-se segregativas, infrutíferas e inábeis na tentativa de oportunizar uma aprendizagem significativa. Desde sua introdução em salas de aula, em finais da década de 1980, muito foi discutido sobre a necessidade da aprendizagem da LIBRAS, seu ensino e a utilização da educação bilíngue, para a inclusão do surdo na educação formal e sua inserção no mercado de trabalho. Todavia, há que se observar a necessidade de capacitação e comprometimento de educadores para que atuem junto às pessoas com deficiências auditivas. Atualmente, a LIBRAS é reconhecidamente uma língua, uma forma legal e regulamentada, com normas que permitem uma adequada comunicação e a expressão, seja para aqueles que a adquirem como língua materna, ou os que a tem como segunda língua. A comunidade conquistou o direito de fazer uso de uma língua que lhe possibilita não só a comunicação entre pessoas surdas e ouvintes, mas também a construção de uma identidade e a efetiva participação na sociedade. PALAVRAS-CHAVE: Língua Brasileira de Sinais. Libras. Surdez. Educação Inclusiva. 1 E-mail do autor 1 INTRODUÇÃO Embora se tenha registro de experiências de sucesso, a comunicação entre pessoas surdas foi renegada durante décadas, não sendo aceita como um sistema linguístico válido. O presente artigo buscará abordar, de maneira bastante concisa, o processo histórico de construção identitária dessa linguagem, atualmente reconhecida como uma forma de comunicação e expressão das comunidades de pessoas surdas no Brasil. As línguas de sinais são naturais, surgem de forma espontânea e constroem-se progressivamente, formando um sistema linguístico legítimo e eficaz. A Língua Brasileira de Sinais, ou Libras, como a conhecemos, é a língua materna da comunidade surda. Historicamente, os mestres de surdos destacam-se com frequência, pois seus métodos foram registrados e citados como exemplos a serem seguidos, na medida em que apresentavam resultados promissores. O processo de educação das pessoas com necessidades especiais, para além daqueles que eram apenas surdos, passou por inúmeras compreensões científicas, abordagens e denominações. Mesmo após a inclusão destes no sistema regular de ensino, as intervenções mostram-se escassas quando não nulas, as práticas pedagógicas, limitadas e ineficientes, e os alunos surdos, em sua maioria chegam ao final do ciclo sem terem se apropriado da leitura e da escrita como competências e sem o domínio dos conteúdos previstos. Evidenciada a incapacidade das práticas pedagógicas convencionais de conduzir o aluno surdo a uma aprendizagem significativa, surge no cenário brasileiro, o bilinguismo, com o entendimento de que este aluno necessita ter suas especificidades atendidas, para ser então alfabetizado. Seu pressuposto é que o surdo seja bilingue, tendo como língua materna, a língua de sinais e o idioma português, como sua segunda língua. A Libras torna-se oficial no ano de 2002, por determinação da Lei Federal nº 10.436/2002, sendo regulamentada pelo Decreto Federal nº 5.626/2005. 2 HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS 2.1 ANTIGUIDADE A educação dos surdos sofreu mudanças profundas e expressivas ao longo da história, especialmente com a introdução da língua de sinais no processo de ensino. Os mestres de surdos, por sua vez, tiveram grande visibilidade e reconhecimento, pois seus métodos, desenvolvidos de forma quase autodidata, para o desenvolvimento de seu trabalho, foram registrados e utilizados como exemplo, alguns deles presentes ainda na atualidade. Na Antiguidade, a educação dos surdos oscilava, em suas práticas, conforme a concepção de cada povo. Gregos e Romanos entendiam que os surdos não eram humanos, uma vez que a fala era uma ação decorrente do pensamento. Partindo do pressuposto de que, quem não pensa não é humano, os surdos não tinham direitos de herança, convívio social e, consequentemente, à escolarização, ao casamento e à inserção ao mercado de trabalho. Na Idade Média, em decorrência à ideia religiosa de que o homem fora criado “à imagem de Deus”, a Igreja Católica foi agente principal da discriminação, não só aos surdos, mas a todos aqueles cujas características destoavam, da perfeita imagem, que eram postos à margem da sociedade e considerados como seres não humanos. Nesse tempo, aqueles de origem nobre, em seus castelos, buscavam matrimônio entre os seus, pois preocupavam-se em conservar suas heranças na própria família, resguardando-se da partilha de seus bens e tesouros. Como consequência dessa prática, registravam-se inúmeros nascidos deficientes, entre eles, surdos, mudos e cegos. Incapazes de se confessar diante de um padre, suas almas não eram purificadas e estavam irremediavelmente condenadas. Diante deste grande impasse, surgem as primeiras tentativas de educar os surdos, por meio dos conhecimentos desenvolvidos pelos monges que, reclusos, faziam voto de silêncio, para que não disseminassem entre os impuros, a sabedoria absorvida por meio das sagradas escrituras. Eles desenvolveram um sistema de comunicação gestual, que lhes permitia comunicarem-se entre seus pares e foram então, convidados pela igreja católica, para que instruíssem os surdos, por meio de gestos. A igreja católica detinha o controle social da época, mas dependia integralmente daqueles que possuíam poder econômico, para sustentar-se. Ocupou-se, portanto, em educar os surdos nobres, garantindo a manutenção do fluxo familiar e, por conseguinte, o fluxo de poder econômico e intelectual. Detentores de um sistema de comunicação, eles poderiam se confessar, participar dos ritos e sacramentos, mantendo suas almas imortais e libertando-se da condenação eterna. 2.2 IDADE MODERNA Somente em finais da Idade Média começaram a surgir trabalhos iniciais no sentido de proporcionar educação a crianças surdas, integrando-as à sociedade. Isso se deve especialmente ao fato de que, somente neste período começou-se a ter acesso a dados minimamente organizados em relação à vida do surdo. Estes, bem como os demais deficientes, tornam-se alvos da medicina e da igreja católica, uma interessada em desenvolver pesquisas e outra, em promover ações de caridade e purificação de almas. Ésomente no século XVI que surgem os primeiros educadores de surdos no ocidente. Gerolamo Cardano (1501 – 1576), médico, matemático e astrólogo italiano, foi um deles. Ele acreditava que o surdo podia receber instrução, uma fez que a escrita representava os sons da fala que, por sua vez, reproduziam ideias ou pensamentos, por meio das quais se constrói o conhecimento. Pedro Ponce de Leon (1510 – 1584), era um monge beneditino recluso de um monastério na Espanha e, segundo registros, recebeu dois membros de uma família espanhola, composta por grande quantidade de descendentes surdos, o desenvolvimento de seu trabalho com eles, daria origem à língua de sinais. Ele atuou por anos como tutor de surdos e conseguiu comprovar a capacidade de aprender, das pessoas surdas. Seu trabalho foi reconhecido em toda a Europa, mas, em termos de registros de seu método, pouco ou nada foi conservado, se perdendo no correr da história. Sabe-se, entretanto, que sua técnica tinha início no ensino da escrita, caminhando para o ensino da fala, por meio dos fonemas. Uma grande evolução ocorre no século XVI, quando se compreende que a compreensão da ideia não decorre da audição. Em 1620, Juan Pablo Bonet (1579 – 1633), padre espanhol, filólogo e soldado (serviço secreto do rei) publicou a Redação das Letras e Artes de Ensinar os Mudos a Falar, editada na França, um tratado que de ensino que se iniciava pela escrita sistematizada pelo alfabeto. Foi ele quem concebeu e delineou o primeiro alfabeto manual de que se tem notícia. Jacob Rodrigues Pereira (1715 – 1780), educador de surdos de origem lusitana, fluente na Língua de Sinais, era, contraditoriamente, defensor da oralização dos surdos. Ele ensinou doze alunos, com o domínio da oralidade, mas alguns relatos indicam que tal prática só seria possível com alunos que não fossem totalmente surdos. Johann Conrad Amman (21669 – 1724), médico e educador de surdos suíço, aperfeiçoou a técnica de leitura labial, por meio de espelhos e tato. Seu foco era o oralismo, sendo avesso ao uso da Língua de Sinais, com base na fé que possuía de que a voz continha o sopro da vida. Relatos posteriores à sua morte dão conta de que ele fazia uso do paladar para a aquisição da fala. Thomas Braidwood (1715 – 1806), inglês educador de surdos, fundou no ano de 1760, a primeira escola privada em Edimburgo, na Grã-Bretanha. Seus alunos aprendiam inicialmente as palavras escritas, compreendiam seu significado, praticavam a pronúncia e a leitura orofacial, além do alfabeto digital. Este foi um exemplo do grande interesse dos estudiosos pela educação dos surdos no século XVIII, em decorrência, especialmente, das possibilidades de ganhos financeiros. Charles-Michel de L’Epée (1712 – 1789) foi um abade francês, o “Pai dos Surdos”, educador filantrópico e um dos primeiros a defender o uso da Língua de Sinais, compreendendo-a como base comunicativa essencial entre os surdos e comunicando-se com eles, por meio dela. Fundou a primeira escola pública do mundo, para surdos, o Instituto Nacional para Surdos-Mudos, em Paris, no ano de 1760. Sua obra mais importante, intitulada A Verdadeira Maneira de Instruir os Surdos-Mudos, foi publicada seis anos depois. Muitos estudiosos e historiadores consideram o século XVIII como o período mais próspero para a educação de surdos. Muitas escolas para surdos foram fundadas e, em termos de qualidade, a educação de surdos também obteve grande evolução, uma vez que, por meio da Língua de Sinais, era possível que eles aprendessem e dominassem diversos assuntos, podendo assim, atuar como integrantes efetivos junto à sociedade, por meio de casamentos e do exercício de diversas profissões. 2.3 IDADE CONTEMPORÂNEA Após o ano de 1822, com a morte de Abbé Sicard (1742 – 1822), sucessor de L’Epée na função de diretor do Instituto, o nome de seu discípulo Massieu, um dos primeiros professores surdos no mundo, foi o escolhido para a posição, o que desencadeou uma disputa de poder, que envolvia diversos estudiosos do assunto, da época. Jean-Marc Itard (1775 – 1838), médico-cirurgião francês residente do Instituto Nacional de Surdos-Mudos de Paris, foi aprendiz de Philipe Pinel, o “pai da Psiquiatria”, seguidos dos pensamentos filosóficos de Condillac. Ele concebia que as sensações eram a base para o conhecimento humano e que somente a experiência externa seria capaz de produzir conhecimento verdadeiro e efetivo. Defendia então, a erradicação da surdez para que o acesso ao conhecimento fosse possível. Itard dedicou-se ao estudo das causas da surdez e constatou, inicialmente, que sua causa não era visível. Trabalhou com cadáveres de surdos, realizando diversos experimentos, em busca de resposta em relação, não só às causas, como também à solução do problema. Após dezesseis árduos anos de trabalho incansável para chegar ao método da oralização, finalmente viu-se obrigado a se render ao fato de que o surdo só pode ser efetivamente educado por meio da Língua de Sinais. O barão de Gérando, filósofo, administrador, historiador e filantropo, saiu vitorioso da disputa pelo posto, tendo sido nomeado diretor do Instituto. Ele acreditava na superioridade europeia e equiparava os surdos aos selvagens, devido a sua linguagem precária, que não devia ser utilizada para a educação. Substituiu os professores surdos por ouvintes e tornou a oralização o principal objetivo do instituto, banindo assim, os sinais da educação formal. Todavia, após anos de trabalho, à beira da morte, ele reconheceu a validade da Língua de Sinais. Nos Estados Unidos da América, as dificuldades encontradas foram consideravelmente superiores às enfrentadas na Europa, especialmente porque o acesso às metodologias estrangeiras era-lhes negado. Foi somente ao procurar por L’Epée, Thomas Gallaudet foi aceito como estagiário no Instituto Nacional de Surdos-Mudos de Paris, no qual conheceu o professor Laurent Clerc, com quem posteriormente fundou a Hartford School, primeira escola pública para surdos dos Estados Unidos, inaugurada em abril de 1817, com meio século de atraso, em relação à Europa. Edward Gallaudet, filho de Thomas, foi o fundador da faculdade para surdos na cidade de Washington, no ano de 1864. Entretanto, anos depois e, posteriormente às experiências vivenciadas durante uma grande viagem por diversas instituições de outros países, retornou aos EUA defendendo o Oralismo, seu pai, que sempre defendeu a Língua de Sinais, faleceu no mesmo ano. Edward adotou para a escola a função de oferecer treinamento em articulação e em leitura orofacial para alunos capazes de se beneficiar do treinamento. O Oralismo foi adotado como o principal método de educação de surdos durante as oito décadas seguintes. Outro importante defensor do Oralismo foi Alexander Graham Bell, o inventor do telefone. Filho de surda e casado com Mabel, que perdera a audição ainda jovem, entendia a surdez como um desvio e que os surdos deveriam, portanto, se passar por ouvintes, inteirados no mundo ouvinte e possuir um instrutor surdo seria apena um empecilho a mais ao seu desenvolvimento e integração à comunidade ouvinte. Em sua opinião, o casamento de surdos representava um risco à sociedade, atuava na tentativa de impedir que se unissem, que se casassem, criando congregações. Sua maior invenção, o telefone, surgiu enquanto ele tentava criar um acessório para surdos. No ano de 1878, em Paris, foi realizado o I Congresso Internacional de Surdos- Mudos, objetivando de discorrer sobre o método mais adequado para educar surdos. A conclusão a que se chegou foi de que consistia na articulação da leitura labial com o uso de gestos tão somente nas séries iniciais. Tal determinação, entretanto, teve vida curta, pois o II Congresso Mundial dos Surdos-Mudos ocorreu dois anos depois, em 1880, em Milão e, por meio de uma votaçãocom os participantes do congresso, foi definido o melhor método. Entretanto, dentre os participantes, havia apenas um surdo, o qual não teve direito a voto, tendo sido convidado a retirar-se do evento. Como consequência óbvia do caminho percorrido, a escolha democrática do congresso foi o método Oral Puro, destituindo por completo, o uso da Língua de Sinais na educação dos surdos. A fala foi considerada e declarada incontestavelmente superior aos sinais, devendo ter, portanto, a prioridade na educação dos surdos, fazendo-se uso, é claro, do método oral puro. Tal método foi, consequentemente, adotado por diversos países da Europa. O insucesso foi notado em todo o mundo, enquanto perdurou a proibição do uso de sinais, os surdos passavam todo o período escolar com poucas ou nenhuma aquisição palpável, aqueles que não se adaptavam ao oralismo eram considerados retardados e não se considerava as dificuldades adicionais daqueles que possuíam perdas auditivas mais severas e profundas. O objetivo geral era fazer com que o surdo desenvolvesse a fala, tornando-se “normal”, não havia a compreensão de que, em muitos casos, isso era organicamente inviável. 2.4 EDUCAÇÃO DOS SURDOS NO BRASIL Tratativas relacionadas à questão do ensino dos surdos no Brasil, tiveram início somente durante Segundo Império, como resultado da chegada de Hernest Huet, educador que fora aluno do Instituto de Paris, e trouxera consigo, além da experiência, importantes documentos que versavam sobre o tema, o alfabeto manual francês e a Língua Francesa de Sinais, que influenciariam fortemente, a Língua Brasileira de Sinais. Dom Pedro II, que tinha um neto parcialmente surdo, possuía interesses pessoais em relação à educação de surdos e cedeu um prédio em setembro de 1857, para a fundação do Instituto dos Surdos-Mudos do Rio de Janeiro, atual INES – Instituto Nacional de Educação dos Surdos. A instituição incorporou em sua metodologia, o ensino da Língua de Sinais por um período, mas acabou por adotar o oralismo, no ano de 1911 em decorrência das proposições do II Congresso Internacional de Surdos-Mudos. Dr. Menezes Vieira, diretor do instituto nesse período estava convicto de que alfabetizar surdos em um país de analfabeto seria um desperdício. Dr. Tobias Leite, seu sucessor, tinha foco na profissionalização dos surdos, devido à sua alta capacidade de seguir instruções. Dr. Armando Paiva Lacerda, gestor do instituto entre 1930 e 1947, buscou a homogeneização das salas de aula, conforme a capacidade de oralização dos alunos e instituiu testes para testar esta capacidade. O quase centenário instituto esteve, pela primeira vez em sua história, sob a direção de um educador, no ano de 1951: a professora Ana Rímoli de Faria Dória. No comando da instituição, ela implementou o Curso Normal de Formação de Professores para Surdos, com metodologia ainda voltada para o Oralismo. A filosofia da Comunicação Total chega ao Brasil na década de 1970, com a visita de uma educadora de surdos da Universidade Gallaudet, Ivete Vasconcelos, seguida pelos estudos da linguista Lucinda Ferreira Brito sobre a Língua Brasileira de Sinais e da professora Eulalia Fernandes, o Bilinguismo passou a ser difundido. Estas três filosofias educacionais permanecem presentes na educação brasileira. Ao longo da história, outros institutos foram fundamentais para a difusão da educação dos surdos no Brasil. O Instituto Santa Teresinha foi fundado no ano de 1929, na cidade de Campinas, transferido para a capital do estado, quatro anos depois e abrigou, no formato de internado, meninas surdas até o ano de 1970. Hoje, é uma escola de ensino fundamental particular. A Escola Municipal de Educação Espacial Helen Keller foi fundada pelo Dr. Armando de Arruda Pereira, prefeito da capital, no ano de 1951 e permanece ativa. O Instituto Educacional São Paulo, por sua vez, iniciou suas atividades no ano de 1954, tendo sido doado para a Pontifícia Universidade Católica – PUC, em 1969 e, sob sua chancela, segue como referência em pesquisas e estudos no campo da deficiência auditiva. Houveram outras instituições, ao longo do tempo, que se dedicaram ao tema e, atualmente, tão preocupação se intensifica, à medida em que compreendemos a importância da definitiva eliminação da barreira comunicativa existente entre ouvintes e não ouvintes, a qual vai muito além do simples ato de compreender o que é falado. 3 A LÍNGUA DE SINAIS COMO ELEMENTO DEFINIÇÃO DO SURDO ENQUANTO SUJEITO Comunicar-se é uma necessidade humana de ordem primária. A linguagem, natural do ser humano, é meio através do qual o indivíduo estrutura seu pensamento, interpreta seus sentimentos, registra e constrói seus conhecimentos, comunica, produz sentido e significação. Eulália Fernandes (2003) define linguagem como um sistema de comunicação que pode ser natural ou artificial. Segundo Saussure (1987), linguagem e língua não podem ser confundidas, pois a segunda, é apenas uma parcela primeira, um sistema de articulações necessárias, adotadas por um corpo social, na forma de regras gramaticais abstratas. Vygotsky (1979) afirma ainda, que a linguagem independe de meio material, mas implica no uso efetivo dos signos, de qualquer forma representativa de fala. Em consonância com ele, Goldfeld (1997) ressalta que ela não se limita à comunicação, estando ativa no indivíduo até mesmo enquanto este não está comunicando, é por meio dela que o sujeito se constitui, como percebe a si mesmo e ao mundo. Fica evidente, diante de tais afirmações, que os deficientes auditivos não são deficientes no campo linguístico-comunicativo, sendo perfeitamente capazes de constituírem uma identidade social. Podem, entretanto, tornar-se deficientes à medida em que as condições pelas quais interagem com o meio e com o outro, os limitam, incapacitando-os de externar de forma compreensível, suas intenções comunicativas. No auge das quase duas décadas de reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais (Libras) como língua oficial, persistem ainda inúmeras questões polêmicas em meio aos debates entre profissionais que atuam com surdos e surdos oralizados, pois muitos percebem que eles acabam por não se identificar como indivíduos integrantes de uma comunidade surda. A língua de sinais natural aos surdos desde a sua mais tenra idade, gerada e produzida como consequência de sua busca por compreenderem e fazerem-se compreendidos por aqueles que os rodeiam, desenvolve-se com aporte dos recursos a eles disponíveis em seu meio, como possibilidades comunicacionais alternativas, sem padronização ou normatização, não sendo, exatamente por esta razão, elevada ao status de língua. Skliar (1999) constata em seu livro sobre a atualidade da educação bilingue para surdos, que o oralismo configura-se como uma imposição social de uma maioria linguística sobre uma minoria. Afirmação que encontra eco na visão de muitos estudiosos, segundo ele próprio. A consequência natural deste posicionamento, é que o indivíduo não ouvinte se vê sumariamente excluído do processo de interação social, em detrimento da premissa oralista como única forma de integração do surdo à comunidade ouvinte. Isso, porque tal visão não pode ser concretizada na prática, sendo o ouvinte incapaz de compreender o surdo, silencia-o. Koslowisky (1997) ressalta e reconhece os grandes avanços tecnológicos e seus benefícios à comunidade surda, implante coclear multicanal, próteses auditivas digitais, além de softwares que vêm de encontro às suas necessidades comunicativas. Todavia, a compreensão de que nenhuma dessas tecnologias disponíveis é garantia de acesso à comunidade surda, urge, especialmente se considerarmos a realidade social, cultural e econômica. E, ainda que acessível, ela não possibilita o desenvolvimento linguístico, cultural, social e identitáriodo indivíduo surdo. A discussão bilinguismo x oralismo está presente desde os primórdios da educação de surdos, não apenas no Brasil, mas em países com sistemas educacionais muito mais avançados. O que é imprescindível, entretanto, a uma sociedade verdadeiramente acessível, é a compreensão de que as diferenças comunicacionais existentes entre os indivíduos não constituem inferioridade e qualquer trabalho neste sentido, deve ter foco no desenvolvimento da linguagem. 4 CONCLUSÃO Arcabouçada em todos os referenciais teóricos pesquisados, tem-se clara a expansão do pensamento de que o bilinguismo de fato proporciona ao aluno surdo condições mais favoráveis à aprendizagem e ao desenvolvimento de uma autonomia linguística. Claramente, muitas foram as vitórias alcançadas até o momento, mas há muito ainda o que alcançarmos, para que possamos oferecer a eles e a todos, acesse equitativo ao conhecimento e à cultura. O dia 24 de abril é comemorado como o Dia Nacional da Libras, pois foi a data e, que ela foi reconhecida oficialmente como meio legal de comunicação e expressa. Desde então, temos caminhado progressivamente, com a sua inclusão enquanto disciplinas nos cursos de licenciatura, a regulamentação da profissão de tradutor e de intérprete de libras, entre outras vitórias. Entretanto, estamos ainda distantes de um ambiente ideal, em que nós, aqueles que falamos e ouvimos, sejamos capazes de nos comunicar plenamente com surdos. Este não é um sonho irreal, mas está ao alcance das futuras gerações, desde que prossigamos na luta pela expansão da libras, sua disseminação e ensino a crianças falantes, desde a mais tenra idade. Ainda que sucinto, limitado e completamente teórico, o presente artigo, em seu intento de compilar a evolução da língua de sinais ao longo da história, com foco claro no fato de que é este o único caminho viável para o fazer pedagógico de excelência. Devemos paramentar aqueles considerados “dentro do padrão” para que sejam capazes de alcançar os demais, de outra forma, seremos nós, os “normais” os verdadeiros “deficientes” no sentido mais amplo do termo. 4.1 REFERÊNCIAS FERNANDES, Eulália. Linguagem e Surdez. Rio de Janeiro: Artmed, 2003. FERNANDES, Eulália. Problemas Linguísticos e Cognitivos do Surdo. Rio de Janeiro: Agir, 1990. GOLDFELD, M. A criança surda: linguagem e cognição numa perspectiva sociointeracionista. São Paulo: Plexus, 1997. HONORA, M.; FRIZANCO, M. L. E. Livro Ilustrado de Língua Brasileira de Sinais: Desvendando a comunicação usada pelas pessoas com surdez. São Paulo: Ciranda Cultural, 2009. KOSLOWISKY, L. Implantes cocleares. Carapicuíba, SP: Pró Fono, 1997. MOURA, M.C. de. O Surdo: Caminhos para uma Nova Identidade. Rio de Janeiro: Revinter, 2000. QUADROS, R.M. Educação de surdos: a aquisição da linguagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 1991. SKLIAR, C. Atualidade da educação bilingue para surdos. Porto Alegre: Mediação, 1999. VYGOSTSKY, Lev S. Pensamento e Linguagem. Rio de Janeiro: Antidoto Portugal, 1979.
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