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UNIESP FIRP – FACULDADES INTEGRADAS DE RIBEIRÃO PIRES EMERSON OLIVEIRA PRADO ITAMARA SANTOS DE OLIVEIRA DE AGUIAR JOSÉ CICERO DA SILVA O CONGRESSO NACIONAL E A DITADURA MILITAR Do recesso ao fechamento RIBEIRÃO PIRES 2016 EMERSON OLIVEIRA PRADO ITAMARA SANTOS DE OLIVEIRA DE AGUIAR JOSÉ CICERO DA SILVA O CONGRESSO NACIONAL E A DITADURA MILITAR Do recesso ao fechamento Projeto apresentado ao Curso de Licenciatura em História da Faculdades Integradas de Ribeirão Pires – FIRP/UNIESP, como requisito parcial para obtenção do título de licenciado em História. Orientador: Professor Caio da Silveira. RIBEIRÃO PIRES 2016 RESUMO O Golpe de 1964 não foi gestado apenas nos quartéis. Nos primeiros atos, o movimento recebeu apoio considerável da sociedade e de seus representantes políticos. O próprio Congresso, que durante a ditadura teve os poderes limitados, teve papel dos mais importantes até mesmo na deposição do presidente João Goulart. Nos debates em Plenário, o embate duro, radicalizado, permitiria pouco espaço para solucionar as crises políticas. E durante sua luta por permanecer vivo na conciliação de poderes, surgiram nomes que, para o mal ou para o bem, dão a medida da importância do respeito às diferenças políticas e da preservação das instituições democráticas no congresso. Palavras chaves: congresso nacional, ditadura militar, senado, legislativo brasileiro, câmara ABSTRACT The 1964 Coup was not only created in the barracks. In the first acts, the movement received considerable support from society and its political representatives. Congressional representative himself, who during the dictatorship had limited powers, played the most important role even in the deposition of President Joao Goulart. In the Plenary debates, the hard, radicalized clash would allow little room for resolving political crises. And during their struggle to remain alive in the conciliation of powers, names have emerged which, for evil or for good, measure the importance of respect for political differences and the preservation of democratic institutions in Congress. Key words: national congress, military dictatorship, senate, Brazilian legislature, chamber SUMÁRIO 1. OBJETIVO 6 2. METODOLOGIA 7 3. INTRODUÇÃO 8 4. DESENVOLVIMENTO 9 O regime burocrático-autoritário: o caso brasileiro 9 Um legislativo contra o autoritarismo: a perspectiva da oposição 12 Manipulação eleitoral: para se ter eleições é preciso vencê-las. 16 5. CONCLUSÃO 19 Os legislativos e o autoritarismo 19 6. BIBLIOGRAFIA E REFERÊNCIAS DIGITAIS 20 6 1. OBJETIVO O artigo que será desenvolvido tem por objetivo descrever e analisar o papel do Legislativo brasileiro durante o regime militar (1964-85). Ao longo desses 21 anos, o Congresso Nacional esteve fechado em três períodos, sofreu várias intervenções e teve um número grande de cassações. Pretendemos ainda propor uma discussão sobre a situação do congresso nacional após a implementação dos Atos Institucionais durante o período de 1964 a 1969. 7 2. METODOLOGIA Nesta parte do projeto de pesquisa, através de instrumentos materiais como: documentos, livros, artigos e entrevistas realizaremos o levantamento de ações e conflitos existente no decorrer do funcionamento do Congresso Nacional A pesquisa será conduzida através do modelo exploratório, pois se buscarão respostas as questões surgidas referentes ao tema, buscando compreender o porquê dos conflitos que se insurgiram durante o regime militar e que se estenderam para o Congresso Nacional, e por que resultaram na cassação de diversos políticos que eram opositores do governo, e o fechamento do Congresso Nacional diante de todas as manobras políticas organizadas pelo governo federal. 8 3. INTRODUÇÃO Logo no ano de 1964, mais precisamente em 31 de março os reacionários ligados ao reconhecimento internacional (especialmente pelos Estados Unidos) do novo governo, depôs o governo legitimo de João Goulart e romperam com a legalidade constitucional, procurando causar a renúncia da organização dos movimentos sociais e políticos construídos no período, na qual era chamado de democrático, entre 1945 e 1964. Após o golpe de estado os militares que estavam no poder, entraram em um processo de perda de popularidade e até mesmo de legitimidade de governo, oriundas das dificuldades econômicas e políticas, obrigando assim recorrer à força bruta através de Atos Institucionais1. Durante o período de toda a ditadura, o Congresso só foi formalmente fechado em três períodos, com isto impedido a trabalho do legislativo, que na época, possuíam forte influência para se opor ao esquema da opressão. O primeiro começou em 20 de outubro de 1966 e teve ares de escândalo, com o plenário sendo invadido por forças militares do governo Castello Branco dias antes, essa suspensão vigorou até 22 de novembro de 1966. O segundo período ocorreu entre 13 de dezembro de 1968 (após a decretação do AI-5), até 21 de outubro de 1969. A terceira suspensão foi entre 1º e 14 de abril de 1977, para a edição de um pacote de medidas eleitorais que visava garantir a vitória dos candidatos do governo. Para gerir o país de forma arbitrária, os governos militares usaram as cassações e a legislação que era editada sem passar pelo Congresso. A ideia era tentar manter uma fachada democrática. Mesmo aberto, o Congresso funcionava de forma retraída, porque naquela época só havia dois partidos e era somente o governo que legislava, por meio dos decretos-leis e atos institucionais. 1 Normas elaboradas no período de 1964 a 1969, durante o regime militar. Foram editadas pelos Comandantes- em-Chefe do Exército, da Marinha e da Aeronáutica ou pelo Presidente da República, com o respaldo do Conselho de Segurança Nacional. Esses atos não estão mais em vigor. 9 4. DESENVOLVIMENTO O regime burocrático-autoritário: o caso brasileiro Nas décadas de 1960 e 1970, diversas democracias latino-americanas foram derrubadas por intervenções militares. Esses golpes de Estado, entretanto, ocorreram precisamente naqueles países que estavam mais adiantados ao longo da estrada para a modernização. Embora golpes militares também ocorressem nos países mais ou menos desenvolvidos da região, como na América Central e no Caribe, as intervenções militares passaram a ser frequentes em países onde, de acordo com a teoria da modernização, elas não deveriam estar acontecendo. Governos democráticos foram derrubados no Brasil (1964), na Argentina (1966 e outra vez em 1976), no Peru (1968), no Uruguai (num processo longo que começou em 1968, mas que se completou com o fechamento do Congresso em 1973) e no Chile (1973). Essas nações eram precisamente as economias e as sociedades mais avançadas da região. A instabilidade política acontecia onde, de acordo com a teoria da modernização, ela supostamente não deveria estar ocorrendo. Os regimes militares apresentavam como sua justificação a necessidade de estabilidade política e de crescimento econômico, e entre suas características estava o fato de o poder político ser ocupado pelos militares como instituição. Os regimes militares que surgiram nos anos de 1960 e 1970 não eram, na maioria dos casos, centrados em um caudilho particular, a exemplo das ditaduras tradicionais, mas exercidos pelas Forças Armadas como um todo. A exceção à regra do estilo “impessoal” de governo, entre os regimes burocrático-autoritários, foi o Chile. Naquele país, embora houvesse uma forte tendência entre forças Armadas a agirem como uma instituição no controle reivindicado sobre o sistema político, o general Augusto Pinochet permaneceu como presidente de 1973 até 1989 e continuou a atuar como comandante supremo das Forças Armadas por nada menos de oito anos após a transição para o regime civil. A Literatura sobre o autoritarismo não demonstrou interesse pelas instituições legislativas. O principal argumentoera que os militares deixaram o Congresso brasileiro funcionando porque ele era desprovido de poder. O papel de Legislativo era meramente “carimbar” as decisões tomadas pelos militares e pelos tecnocratas. Esse foi o principal argumento apresentado por Packenham (1971) em seu estudo sobre o Legislativo brasileiro nos anos 1960. 10 O Estado tentava controlar as atividades políticas no Brasil, em geral mantendo sob domínio a forma pela qual se organizavam os partidos políticos. Todavia, sob o regime militar, algo de novo aconteceu com a criação efetiva, de um sistema original de partido único, na medida em que somente um partido político passou a ter existência real, não sendo este o partido do governo, mas o partido da oposição, o Movimento Democrático Brasileiro (MDB). A sociedade civil sofreu grandes transformações no Brasil nas últimas décadas, com o crescimento dos movimentos sociais, sindicatos, organizações profissionais, comunidades eclesiais de base, organizações de vizinhança e organizações não-governamentais de modo geral. A sociedade tornou-se diferenciada e organizou-se para articular interesses visando influenciar tanto o Congresso quanto a administração, no processo de formulação de políticas públicas especificas. Esse desenvolvimento, entretanto, parece ter ocorrido à custa da “sociedade política”, aí incluído o Legislativo, entre outras instituições. O Estado e a sociedade aumentaram sua força e organização, embora com pouca ligação institucional entre si. Ao longo da história brasileira, a função legislativa foi realizada com mais frequência pelo Poder Executivo do que pelo Legislativo. Sob o regime autoritário, entre 1964 e 1985, essa tendência estava ainda mais clara. Entretanto, é importante indicar que tal limitação da função de legislar é encontrada também em sistemas políticos democráticos. A expressão Poder Legislativo continuou a ser a referência padrão na legislação constitucional brasileira, mesmo durante o regime autoritário. Entretanto, havia uma compreensão clara de que a maior parcela da produção legislativa era realizada pelo Executivo e pela burocracia permanente. Isso acontecia de várias maneiras diferentes. Os projetos de lei eram encaminhados pelo Poder Executivo, frequentemente em regime de urgência, concedendo um prazo muito pequeno para deliberações no Congresso. Os decretos- leis nas suas diferentes versões eram instrumentos constitucionais por meio dos quais a função legislativa era colocada unicamente nas mãos do Poder Executivo. Tais decretos-leis eram medidas que entravam em vigor imediatamente depois de serem assinadas pelo presidente. Esses estatutos tinham de ser derrubados pelo Congresso, para perderem seu efeito. Diferentemente das medidas provisionais, antes mencionadas, o decreto-lei, durante o regime militar, era válido se o Congresso não o revogasse explicitamente. As provisões constitucionais especificas que permitiam ao Executivo exercer essa função legislativa serão examinadas quando discutirmos as mudanças introduzidas pelos militares no sistema constitucional e legal do pais. Essas alterações foram realizadas, sem consultar o Congresso, por atos institucionais, pela emenda constitucional decretada pela Junta Militar em 1969 e pelo “pacote de abril” decretada em 1977. 11 Após o golpe militar, não havia unanimidade dentro das Forças Armadas a respeito do papel que o Legislativo deveria desempenhar. Os militares estavam claramente divididos em dois grupos nessa questão. As facções diferiam em suas percepções do papel das instituições democráticas e, consequentemente, do papel do Legislativo. A facção “legalista”, preocupada com questões de procedimentos legais, desejava que o Congresso continuasse a operar e que se mantivesse um determinado nível de respeito às liberdades civis. Essa posição, todavia, considerava que era preciso levar em conta um aspecto importante. As liberdades civis deveriam ser respeitadas na medida em que as instituições democráticas não representassem nenhuma ameaça à hegemonia política dos militares. Os legalistas acreditavam que o Legislativo dava ao regime a legitimidade necessária para se apresentar perante a opinião pública como uma intervenção contra a ameaça representada por Goulart à instituição política, e que a existência de um Legislativo em funcionamento daria estabilidade política ao regime militar. Os presidentes Castello Branco, Ernesto Geisel e João Baptista Figueiredo representavam esse ponto de vista. Em 31 de março de 1964, as Forças Armadas intervieram para pôr fim ao regime civil. Logo após, ás 2h40min da madrugada do dia 2 de abril, o senador Auro de Moura Andrade, presidente do Senado Federal, convocou uma sessão extraordinária no Congresso Nacional. Moura Andrade, um participante civil importante da conspiração, leu uma carta do chefe da Casa Civil de João Goulart, Darcy Ribeiro, informando que o presidente havia deixado Brasília e viajando para o Rio Grande do Sul, onde comandaria as tropas leais ao governo. Entre as provisões do Ato Institucional estava à eleição indireta, pelo Congresso Nacional, de um novo presidente e vice-presidente, com poderes extraordinários, como o de decretar o estado de sítio por 30 dias. O ato suspendia por seis meses as garantias constitucionais ou legais de vitaliciedade e estabilidade, e nenhuma das medidas adotadas seria sujeita a revisão judicial. O que era ainda mais importante, os comandantes revolucionários poderiam suspender os direitos políticos pelo prazo de 10 anos e cassar mandatos legislativos federais, estaduais e municipais, excluídas essas ações de qualquer e apreciação judicial. O Congresso permaneceu em recesso até o início de 1970, mas concordou em reunir- se para ratificar a escolha do novo presidente, no dia 25 de outubro de 1969. A instituição ainda permanecia com a função de legitimar a Presidência - papel importante que estava diretamente ligado à questão da legitimidade das instituições políticas. Não somente o Legislativo foi usado pelos militares para legitimar o regime aos olhos da opinião pública 12 nacional e internacional, mas também desempenhava papel fundamental na legitimação do presidente em face do establishmet2 militar. Quando o Congresso se reuniu para eleger o general Emilio Garrastazu Médici, que já havia sido previamente escolhido pelo Alto Comando, o papel que deveria desempenhar era dar à eleição indiretamente uma medida de legitimidade. O próprio Médici exigiu que o Congresso fosse reaberto, de forma a ter seu nome referendado pelo Legislativo, como os seus antecessores, Castello Branco e Costa e Silva. Estava claro que a escolha não seria feita pelo Congresso, na medida em que o nome de Médici fora apresentado ao partido da maioria pelos chefes militares que o tinham escolhido. Ao contrário do desejo de alguns dos oficiais que disputavam a presidência, especialmente o general Albuquerque Lima, não foi ao corpo de oficiais que foi dado o direito de votar. Médici foi escolhido por um acordo entre os oficiais generais das três Armas. Um legislativo contra o autoritarismo: a perspectiva da oposição Mesmo em meio a ditadura militar que acontecia no Brasil, o legislativo continuava “funcionando”, até porque a ditadura precisava disso para que fosse mantido a “legitimidade” daquele governo. E lá dentro do congresso uma luta era travada, mesmo que tímida e não tão densa como precisava, mas, na medida que era possível. Apesar de não ouvirmos muito sobre isso, o congresso também fervia, havia um confronto entre “legalistas” e “duros”. Com a disputa entre as duas facções de oposição, aconteceu a primeira intervenção do regime no sistema político após o golpe de 1964. Ocorria em 1965, quando o presidente Castello Branco assinou o Ato institucional nº 2. (Pagina 105) Foi nesse momento que o multipartidarismo foi extinto,dando lugar ao bipartidarismo que quase virou uni partidarismo em 1972. Foram então criados o MDB e o Arena os dois deveriam ter um caráter democrático aceitável para o regime. O Arena era a favor do governo e tinha a maioria e muito poder no congresso. O MDB era a oposição e logo no início teve muita dificuldade na sua formação, pois, ninguém queria ficar contra o regime, afinal temiam até mesmo por suas próprias vidas. 2 O termo inglês establishment refere-se à ordem ideológica, econômica e política que constitui uma sociedade ou um Estado. 13 Porém isso não se deu por muito tempo, o MDB também foi ganhando forças e na medida do possível lutava contra o autoritarismo do regime, politicamente dentro do Congresso. Mesmo com os militares lá dentro em diversas funções, o Arena possuía olhos para todos os lados, espiões disfarçados e faziam de tudo para manter o controle da situação. Ainda assim, a oposição estava conseguindo se envolver e ganhando poder para decidir sobre o futuro do país e mesmo que pouco no modo que iria evoluir o próprio regime. O MDB estava de mãos atadas, procurando uma forma de exercer seus mandatos, lutar pela volta da democracia e contra o autoritarismo do regime, foi então que perceberam, a melhor forma de lutar seria atacando, de maneira sutil, quase imperceptível, entretanto confiantes de que poderia surgir alguns efeitos bons. Umas dessas maneiras eram as sessões chamadas de “pinga-fogo”, era onde os políticos faziam pequenas manifestações, que até hoje é usada. Os militares não sabiam o que significava. E então o MDB começava a provocar e alfinetar o regime nessas sessões, eles sabiam que uma hora eles entenderiam o recado e encontrariam uma forma de propor a retaliação. A provocação era proposital por mais que houvesse o intuito de não fechar o congresso, a essência desta manifestação era propor esse objetivo. Alguns relatos nos fazem entender que enquanto o congresso estivesse aberto e funcionando dentro dos padrões do regime, só estava servindo para mascarar e legitimar o mesmo. Foi em uma dessas sessões que Marcio Moreira Alves fez o seu discurso convocando o povo a fazer um boicote as paradas militares alusivas à Semana da Pátria3, e pedia para que as jovens brasileiras não namorassem oficiais do exército. Os militares ficaram ofendidos com o discurso e exigiram uma punição para o deputado, o Ministro da Justiça na época enviou à Câmara de Deputados o pedido de autorização para que o deputado Márcio Moreira Alves fosse processado. Assim dizia a Constituição, mesmo com todas as limitações: era preciso obter o consentimento da Câmara de Deputados para processar um membro seu. Márcio Moreira Alves aderiu ao MDB em 1966 e, naquele ano, foi eleito deputado federal pelo antigo estado da Guanabara. Ele também era jornalista e escritor. O Movimento Democrático Brasileiro (MDB) era um partido político brasileiro que abrigou os opositores do Regime Militar de 1964 ante o poderio governista da Aliança Renovadora Nacional (Arena). No início do golpe Marcio foi a favor, mas não demorou muito para que ele entendesse a real 3 O início da semana da pátria ocorre em 1 de setembro e vai até o dia 7 de setembro. Durante essa semana é relembrada a história da independência do Brasil. 14 natureza, que não era uma intervenção como costumavam falar, mas sim uma ditadura militar, tornando assim um dos nomes que faria oposição ardentemente ao regime. O Deputado estava contra tudo que a ditadura representava, ele protestou contra invasões e fechamento de faculdades e foi um dos primeiros a denunciar as torturas e torturadores, não aceitava o silencio imposto pelo medo a ditadura, não se calou diante das atrocidades que estavam acontecendo. Abaixo segue discurso do dia 2 de setembro de 1968: "Senhor presidente, senhores deputados, Todos reconhecem ou dizem reconhecer que a maioria das forças armadas não compactua com a cúpula militarista que perpetra violências e mantém este país sob regime de opressão. Creio ter chegado, após os acontecimentos de Brasília, o grande momento da união pela democracia. Este é também o momento do boicote. As mães brasileiras já se manifestaram. Todas as classes sociais clamam por este repúdio à polícia. No entanto, isto não basta. É preciso que se estabeleça, sobretudo por parte das mulheres, como já começou a se estabelecer nesta Casa, por parte das mulheres parlamentares da Arena, o boicote ao militarismo. Vem aí o 7 de setembro. As cúpulas militaristas procuram explorar o sentimento profundo de patriotismo do povo e pedirão aos colégios que desfilem junto com os algozes dos estudantes. Seria necessário que cada pai, cada mãe, se compenetrasse de que a presença dos seus filhos nesse desfile é o auxílio aos carrascos que os espancam e os metralham nas ruas. Portanto, que cada um boicote esse desfile. Esse boicote pode passar também, sempre falando de mulheres, às moças. Aquelas que dançam com cadetes e namoram jovens oficiais. Seria preciso fazer hoje, no Brasil, que as mulheres de 1968 repetissem as paulistas da Guerra dos Emboabas e recusassem a entrada à porta de sua casa àqueles que as vilipendiam. Silêncio pouco adianta. Necessário se torna agir contra os que abusam das forças armadas, falando e agindo em seu nome. Creia-me senhor presidente, que é possível resolver esta farsa, esta democratura, este falso impedimento pelo boicote. Enquanto não se pronunciarem os silenciosos, todo e qualquer contato entre os civis e militares deve cessar, porque só assim conseguiremos fazer com que este país volte à democracia. Só assim conseguiremos fazer com que os silenciosos que não compactuam com os desmandos de seus chefes, sigam o magnífico exemplo dos 14 oficiais de Crateús 15 que tiveram a coragem e a hombridade de, publicamente se manifestarem contra um ato ilegal e arbitrário dos seus superiores. Com esse discurso, Alves provocou a fúria dos militares, onde pediram a sua cassação contrariando o regime, o congresso votou pela não cassação do deputado, devido a imunidade parlamentar e a natureza secreta dos votos, sem esquecer o fato de não ter nenhuma base constitucional ou legal para o tal processo. Por mais que muitos políticos temessem o governo, eles não poderiam permitir que um membro seu fosse processado por manifestar-se em uma sessão. Isso abriria uma brecha para que o regime tivesse mais poder lá dentro, e pudesse usar desse artifício para começar a processar mais de seus membros. Foi um momento emocionante, em que todo o plenário da Câmara, após a conclusão da votação, levantou-se e cantaram todos o hino nacional. Em represália, e com base no Ato Institucional nº 5 o governo federal determinou o fechamento (recesso) pela segunda vez da Câmara e os deputados tiveram que se retirar atravessando uma ameaçadora e humilhante fileira de soldados. Alves estava obviamente "jurado de morte" e teve que rapidamente exilar- se. Retornou ao Brasil apenas em 1979, após a Lei da Anistia. O AI 5 foi lido, deu-se então o golpe dentro do golpe. O AI nº 5 já estava pronto independente do resultado da votação eles apenas aproveitaram o momento para mais um golpe. Naquele dia o congresso não estava apenas defendendo um colega, mas contrariando o regime e politicamente isso significava muito. Por isso aquele momento foi propicio para o AI nº 5, que deu início a uma nova onda de cassações de mandatos, perda dos direitos políticos e o fechamento do congresso. Ao todo 105 congressistas tiveram seus mandatos cassados após a votação, no outro dia várias prisões foram feitas, o caos estava instaurado, o atentado à democracia estava completo. O "Jornal do Brasil" tenta dar a dimensão dos acontecimentos na sua seção de meteorologia, para driblar a censura: "Previsão do tempo: Tempo negro. Temperatura sufocante. O ar está irrespirável. O país está sendo varrido por fortes ventos. Máx. 38º, em Brasília.Mín.5º, nas Laranjeiras. ” (Publicado no Jornal do Brasil, no dia seguinte à decretação do AI Esse foi o período mais longo em que o congresso esteve fechado, porém, nunca foi violado, a ditadura não retirou documentos e nem manipulou nada lá de dentro. 16 Foi um período negro na história, muitos políticos ficaram sem seus salários e outros com redução, Brasília também sofreu, pois, um dos principais pontos turísticos e fonte de renda para o DF era o congresso e com ele fechado, a fonte secou. No fim do mandato do Castello Branco, em 1967, o novo presidente começou seu mandato sem os poderes concedidos pelos atos institucionais, não era mais permitido cassar mandatos ou fechar o congresso como fora feito. O cenário estava começando a mudar, A ideia era abrandar o regime e permitir algumas pequenas liberdades e posteriormente retirar os militares do governo. Manipulação eleitoral: para se ter eleições é preciso vencê-las. Em meados nos anos 70 o presidente Ernesto Geisel e sua equipe tinham como maior preocupação ganhar as eleições, sendo isso fundamental para o avanço do plano de liberalização. O compromisso com a “descompressão” fora preterido pelo medo de derrotas eleitorais que pudessem enfraquecer a capacidade dos militares de decidirem quando e até que ponto afrouxariam o seu controle. Não poderia haver qualquer tipo de descompressão política, evidentemente, sem a realização de eleições regulares e livres. Aliás, as eleições tinham ocorrido mesmo durante os períodos mais autoritários do regime militar, mas era crescente a dificuldade de o regime vencer eleições livres, enfrentando um clima econômico adverso e uma oposição disposta a pressionar sempre para que atingisse, o mais rápido possível, a democracia plena. As eleições de 1976 seriam um teste importante para o regime, na medida em que seria possível avaliar as possibilidades da oposição nas eleições legislativas programadas para 1978. O governo percebeu que o acesso da oposição ao rádio e à televisão fora fator preponderante no bom resultado obtido pelo MDB nas eleições de 1974. Consequentemente, o presidente Geisel decidiu enviar ao congresso um projeto de lei limitando a propaganda política gratuita durante as eleições municipais. O projeto ficou conhecido na impressa como “Lei Falcão”, devido ao nome do seu autor, o ministro da Justiça Armando Falcão, e se tornou sinônimo de introdução de mudanças nas regras eleitorais unicamente para favorecer o governo. Para evitar uma possível crise política, a direção da Arena, através de seu secretário- geral, deputado Nelson Marchezan, planejou a implantação de um processo não-oficial de tabulação de resultados eleitorais. O partido usou as instalações e os equipamentos do Centro de Processamento de Dados do Senado (Prodasen) para realizar a tarefa de coleta e 17 totalização. A ideia era obter e contar tantas informações quanto possível sobre o resultado da eleição, com a coleta centrada nos municípios do interior. Estes resultados, mais favoráveis, desencorajariam uma possível intervenção militar no processo eleitoral. A manobra teve êxito e não houve nenhuma tentativa de subverter o processo. Podemos afirmar que esse foi realmente um papel de informação para o processo político cumprido com competência pelo Legislativo, assegurando o uso adequado da informática para colaborar com a liberalização. Todavia, os resultados finais, eram um presságio de problemas para o partido oficial, com os números da apuração nas maiores cidades do país fortemente favorecendo a oposição. Os resultados da eleição deixaram claro para o governo que seria necessário fazer algo para evitar uma grande derrotada nas eleições legislativas de 1978, quando dois terços do Senado e a totalidade da Câmara dos Deputados e das assembleias legislativas estadual estariam em disputa, os efeitos de uma derrota desse porte seriam, muito provavelmente, semelhantes ao que ocorrera em 1965. Os militares da linha dura não aceitariam perder o controle sobre o Congresso e provavelmente agiriam para destruir o programa de liberalização implantado pelo presidente da República. A forma de evitar o impasse seria alterar as regras eleitorais, a fim de assegurar que o regime enfrentasse o desafio eleitoral de uma posição melhor. O resultado desse jogo era a certeza de que o governo iria usar os poderes de emergência disponíveis com base no Ato Institucional nº 5 para alterar as regras eleitorais, o que significava mudar tanto a legislação infraconstitucional quanto a própria constituição. O governo decidiu transformar a reforma judiciária em uma “cause celebre”, com seus porta- vozes defendendo o argumento de que a oposição estava bloqueando uma medida necessária para o bem-estar do país e uma reivindicação nacional. Assim, no dia 1º de abril de 1977, o presidente Ernesto Geisel anunciou em cadeia nacional de rádio e televisão, que estava usando os poderes de emergência do Ato Institucional para decretar o recesso do Congresso, a fim de viabilizar a reforma do judiciário. De acordo com a posição oficial do governo enfatizada pelo próprio Geisel em seu pronunciamento, a ação não tinha a ver com eleições, mas as mudanças principais aprovadas pelo presidente tentaram fazer precisamente isto, o que é fácil perceber quando se examina o conteúdo das alterações produzidas durante o recesso. Entre as alterações das regras políticas e eleitorais estava a eleição indireta, pelas assembleias legislativas, de um entre os dois senadores a serem eleitos em cada estado nas eleições do ano seguinte. Esses senadores desde logo se tornaram conhecidos como “biônicos”. Os governadores continuariam a ser escolhidos por eleições indiretas. A propaganda eleitoral na televisão ficaria reduzida à apresentação do nome, número e currículos dos candidatos. 18 Apesar das pressões para se dar um ritmo mais rápido à abertura o processo de liberalização haveria de arrastar-se ainda por mais seis anos. O Congresso Nacional continuaria seu papel muito importante nesse processo e seria, na realidade, o local onde se seguiria evoluindo, durante o governo Figueiredo. 19 5. CONCLUSÃO Os legislativos e o autoritarismo 21 anos de regime ditatorial e de massacre ideológico através do controle absoluto dos grandes meios de comunicação que são a TV e o rádio talvez não tenham impedido que as massas, premidas pela necessidade e pela perda do poder aquisitivo dos seus salários, se tenham deslocado para uma posição mais à esquerda da que tinham durante o período democrático de 1945 a 1964. No entanto, o passar do tempo e esse possível deslocamento não impediram as lideranças políticas e parlamentares de manterem as suas posições altamente conservadoras em relação não só ao modo de produção capitalista como ao tipo de capitalismo selvagem existente no Brasil e à estrutura de classes que ele origina. Uma das mais influentes análises da política e da sociedade brasileira está baseada no conceito de conciliação política. A defesa de políticas conciliatórias era uma postura pragmática, baseada na constatação de que a conciliação era a alternativa lógica, na medida em que não se podia identificar qualquer desafio sério, no nível políticos, ao controle da elite sobre a sociedade brasileira. Na verdade, a opção pela conciliação política ficou mais forte nas posições adotadas pelos líderes políticos, inclusive pelo candidato presidencial da oposição, Tancredo Neves, como neste discurso na Associação Paulista de Medicina, em 17 de outubro de 1984: A conciliação é a mais difícil das atitudes políticas. Somos convocados a vencer os preconceitos partidários e a superar, ainda que temporariamente, nossas posições doutrinárias mais profundas. Só os realmente fortes conseguem vencer esses terríveis obstáculos da alma, que são ressentimento e frustração pessoal, diante da necessidade de apertar a mão do adversário de ontem.A avaliação final da transição brasileira para a democracia deve levar em conta o modo peculiar como o regime militar lidou com as instituições políticas e também o fato de ser impossível para o regime militar encontrar um método alternativo para tratar da questão da legitimidade. As relações entre o Legislativo e o regime se transformaram numa parceria intranquila que levou, sem dúvida alguma, à queda do autoritarismo no Brasil. 6. BIBLIOGRAFIA E REFERÊNCIAS DIGITAIS 20 ABREU, Alzira Alves de. (Coord.). Dicionário histórico-biográfico brasileiro pós- 1930. ed. FGV; CPDOC, 200. ALMEIDA, Maria Fernanda Lopes. Veja sob Censura, Jaboticaba, São Paulo, 2008, pág. 86 ALVES, Márcio Moreira. 68 mudou o mundo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993. ALVES, Maria Helena Moreira. Estado e oposição no Brasil (1964-1984). Bauru/SP: Edusc,2005. Atos Institucionais. Disponível em: <http://www4.planalto.gov.br/legislacao/legislacao-historica/atos-institucionais>. Acesso em 14/06/2016 às 19h33. BORGES, Nilson. ''A Doutrina de Segurança Nacional e os governos militares''. O Brasil Republicano. O tempo da ditadura. Regime militar e movimentos sociais em fins do século XX. Livro 4. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. Democracia representativa. Disponível em: < http://www.portalconscienciapolitica.com.br/ciber-democracia/democracia-representativa/>. Acesso em 10/09/2016 às 18:12. DINIZ, E. "A transição política no Brasil: uma reavaliação da dinâmica da abertura". Dados, n.3, 1985, p.329-46. FIGUEIREDO, A. e LIMONGI, F. "O Congresso e as Medidas Provisórias: abdicação ou delegação?" Novos Estudos CEBRAP. São Paulo, n.47, 1997, p.127-154 Histórico do Congresso Nacional. Disponível em: https://www.congressonacional.leg.br/portal/congresso/historico. Acesso em 10/09/2016 às 19:35. REGO, Antonio Carlos Pojo do. O Congresso Brasileiro e o Regime Militar (1964 - 1985). Rio de Janeiro: Editora FGV, 2008.
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