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Lara Torres Pinto Brito - NEFROLOGIA {SINDROME^NEFRÓTICA} CASO CLÍNICO: JSM, sexo masculino, 74 anos, casado, natural e procedente de Feira de Santana, católico, topógrafo aposentado. QP: inchaço há 1 mês. HMA: portador de HAS há 15 anos, em uso de valsartan e metoprolol, com insuficiência venosa crônica, vinha com edema de MMII, em acompanhamento com angiologista. Há 1 mês da admissão evoluiu com edema progressivo até anasarca, fez uso de fórmula contendo meloxican, com piora progressiva. Avaliado por nefrologista, solicitado exames. EXAME FÍSICO: admitido via emergência vigil, LOTE, em anasarca, corado, FR = 32ipm, PA = 150x90mmHg, MV diminuídos em bases, sem RA, RCR em 2T sem sopro, com ascite. ANTECEDENTES: malária tratada há 30 anos, anti-HCV (+), com PCR (-) para RNA do vírus C em 2012. EXAMES LABORATORIAIS: Cr = 1,5 / U = 95 / Hb = 11,9 / Albumina = 1,5 / Globulina = 1,7 / Colesterol = 368 / EAS = proteinúria +++ ; hemácias 4/campo / proteinúria de 24h = 5,6g / FAN (-) / Anti-DNA (-) / ANCA (-) / C3 e C4 normais / ASLO (-) / PSA = 9. Trata-se de um quadro edematoso e, portanto, devemos inicialmente pensar na origem dele: cardíaco, renal, hepático? Nas doenças hepáticas, o edema tende a se concentrar no abdome e MMII, o que estaria afastado nesse caso; quanto as doenças cardíacas, é possível que cursem com anasarca, mas não é compatível com o resultado dos exames devido aos achados como proteinúria; causa renal é a mais provável. Dentre as doenças renais, pensa-se em Síndrome Nefrótica: edema, proteinúria (>3g) e hipoalbuminemia (<3,5); pode acontecer hipercolesterolemia e HAS de forma associada. Nesse caso, a hematúria é mais discreta. DEFINIÇÃO: Proteinúria + Hipoalbuminemia + Edema, se estiverem juntas, indicam a existência de uma Síndrome Nefrótica. CONSEQUÊNCIAS: dislipidemia, desnutrição, hipovolemia, IRS (pode ocorrer, mas não é característico, está mais associado ao uso de diuréticos em alta dose), tromboses e infecções. A síndrome nefrótica ocorre em decorrência da perda da função de barreira da membrana basal glomerular (MBG), permitindo o extravasamento de proteínas de forma maciça. Existem dois tipos de barreira: 1. Barreira de Carga – proteínas da fenda podocitária têm carga negativa e vão repelir outras proteínas que também possuam carga negativa. 2. Barreira de Tamanho – seleciona as proteínas de maior tamanho, impedindo sua passagem. De acordo com a doença glomerular do paciente, vai haver perda da barreira de carga, da barreira de tamanho ou de ambas. Quando há perda somente da barreira de carga, a barreira de tamanho continua funcionante e somente as proteínas menores (de baixo peso molecular) – como a albumina – passarão, sendo chamada de Proteinúria Seletiva. Obs: a quantidade de perda proteica é variável em cada doença, mas para ser classificada como síndrome nefrótica, a perda tem que ser suficiente para causar Hipoalbuminemia. A dislipidemia ocorre porque a Hipoalbuminemia estimula a síntese proteica hepática, incluindo as lipoproteínas (VLDL, LDL, etc), o que contribui para o quadro de alteração de lípides; Do mesmo modo ocorre para o tromboembolismo em que o fígado passa a produzir, também, as proteínas pró-trombóticas, predispondo às tromboses venosas profundas; A desnutrição decorre das perdas proteicas intensas pela urina; As infecções estão relacionadas com a perda das imunoglobulinas (importantes para o sistema imunológico) tornando-os suscetíveis à injúria. Obs: quanto maior a proteinúria, maior chance de aparecimento das complicações associadas. Porém, tanto a dislipidemia quanto o edema, aparecem com níveis menores. Proteinú ria Hipoalbu minemia Edema Consequência Proteinúria Maciça Hipoalbuminemia Anasarca; Dislipidemia; Tromboembolismo; Desnutrição; Infecções Lara Brito | 5º SEMESTRE 2/3 das causas O EDEMA NA SÍNDROME NEFRÓTICA Com o aumento da permeabilidade para as proteínas, há perda de albumina de forma associada, gerando uma hipoalbuminemia. Como consequência, vai haver perda da função oncótica da proteína e extravasamento de fluido para o espaço intersticial. A partir disso, essa perda para o 3º espaço gera uma tendência à hipovolemia (diminuição do voluma extracelular) e, quando isso é percebido pelos rins que ficam hipoperfundidos, é ativado o sistema Renina- Angiotenisa para reter sódio e água, perpetuando o edema. Em alguns casos, pode haver edema mesmo em casos que não estão hipovolêmicos. Nessas situações, a fisiopatologia ocorre em decorrência da retenção tubular de sódio e água, expandindo o volume plasmático. Essa expansão aumenta a pressão hidrostática capilar, possibilitando o extravasamento para o espaço intersticial e causando edema. ETIOLOGIA Em crianças < de 10 anos, a síndrome nefrótica ocorre em 90% dos casos como decorrência da Doença de Lesões Mínimas (DLM); 50% se > 10 anos porque vão surgindo outras doenças glomerulares que também podem cursar como síndrome nefrótica. Em adultos, a distribuição é mais ampla: 30% secundária as doenças como: DM, LES e amiloidose 70% decorrente de glomerulopatias primárias: - 33% Glomeruloesclerose Segmentar Focal (GESF) - 33% Nefropatia membranosa - DLM (apesar de mais comum em crianças) - Glomerulonefrite Membranoproliferativa (GNMP) - Nefropatia por IgA Doença de Lesões Mínimas Doença em que ocorre perda da função de barreira de carga, com proteinúria seletiva, perdendo apenas aquelas de baixo peso molecular. É chamada de lesões mínimas porque na histologia, microscopia óptica normal e na imunofluorescência, não aparece muitas alterações. Apenas é possível detectar na microscopia eletrônica a fusão dos podócitos. Prevalência: maior em crianças e jovens, mas pode acometer adultos Quadro clínico: síndrome nefrótica (edema generalizado c/ cacifo, proteinúria e hipoalbuminemia) EAS: proteinúria seletiva isolada Histologia: MO e IF normais / ME detecta fusão de podócitos, mas sem depósito de Ig Biópsia renal: sempre indicada para adultos (proteinúria > 1g), mas NÃO em crianças (visto que em 90% dos casos é DLM) Tratamento: corticoesteroides Obs: se o paciente não respondeu ao tratamento ou se há hematúria associada, é preciso pensar em outras glomerulopatias e a Bx renal está indicada. Glomeruloesclerose Segmentar Focal (GESF) É uma doença em que há esclerose em um segmento de alguns glomérulos. Sendo chamado de segmentar – por acometer um segmento do glomérulo – e focal – por acometer alguns glomérulos e outros não. É uma doença progressiva porque os nefrons remanescentes vão fazendo hiperfiltração e, com o tempo, vão esclerosar também até o ponto de chegar ao nível de esclerose global e difusa, instalando-se a DRC. Na microscopia ótica é possível observar áreas afetas e áreas normais. Na imunofluorescência é possível detectar possível deposição de IgM nas áreas de esclerose. Em suma: é uma lesão glomerular caracterizada por colapso vascular e esclerose mesangial sem envolver o glomérulo como um todo (segmentar) e apenas uma parte dos glomérulos existente (focal). Lara Brito | 5º SEMESTRE Prevalência: principal causa em adultos, responsável por cerca de 32 – 40% dos casos biopsiados Perfil Epidemiológico: homens, negros e idade entre 25 – 35 anos Quadro Clínico: síndrome nefrótica, podendo apareces HAS associada e alterações na TFG EAS: proteinúria (nefrótica ou não), acompanhada por hematúria leve (cerca de 5hem/campo) Biópsia Renal: se proteinúria > 1g Tratamento: corticoide por 16 semanas, a partir disso investiga-se a resistência ou dependência Necessário investigar causas secundárias Infecções por HIV manifestando como GESF, drogas (comoheroína) fazem uma lesão colapsante, causas de adaptação funcional (massa renal reduzida progride para DRC através de GESF por hiperfiltração e esclerose), anemia falciforme e traço falcêmico, doenças neoplásicas podem manifestar de forma paraneoplasica como glomerulopatia, obesidade, dentre outros. ☞ Lembrar sempre que 70% dos casos é de origem primária, mediada por imunoglobulina (IgM no caso da GESF), mas existem causas secundárias que precisam ser investigadas. Glomerulonefrite/Nefropatia Membranosa Consiste em uma importante causa de síndrome nefrótica em adultos. É caracterizada pelo espessamento difuso da MBG por depósitos de imunocomplexos de IgG e C3 por baixo do epitélio – no espaço subepitelial. Por ser um depósito imune de forma insidiosa no glomérulo, a membrana basal reage tentando englobar esses depósitos. Assim, na microscopia óptica é percebido como espessamento da MB e, as vezes, há presença de grânulos que sugerem que está havendo esse englobamento. A imunofluorescência permite visualizar IgG e C3, além de estar negativo para as demais. Prevalência: 5ª e 6ª décadas de vida Quadro Clínico: síndrome nefrótica com TFG preservada EAS: proteinúria sem hematúria Histologia: espessamento da MBG, presença de grânulos na MBG, depósitos subepiteliais de IgG e C3 na IF e ME Tratamento: se for de causa primária usa corticoide + CFM (Ponticcelli) -> não responde a corticoide puro, sendo necessário o resultado da biópsia Sempre investigar causas secundárias Obs: a nefropatia membranosa pode ser a manifestação paraneoplásica de uma neoplasia. Glomerulopatia Membranoproliferativa (“Mesangiocapilar”) Doença que frequentemente está associada às doenças infecciosas (especialmente hepatite C), acometendo tanto os adultos jovens, quanto as crianças. Cursa com depósito imune no espaço subendotelial – por baixo do endotélio, dentro na MBG. Por estar mais próximo da luz do capilar, é uma doença mais agressiva, cursando com mais hematúria e proliferação celular (intrínsecas do rim e infiltrado extrínseco). Na MO observa-se expansão do glomérulo com proliferação às custas de células intrínsecas do glomérulo ou extrínsecas a ele. Duplicação da MBG por depósito imune que confere impressão de dupla camada de membrana basal. Prevalência: adultos jovens (35 anos) Quadro Clínico: síndrome nefrítico-nefrótica (mista), alteração da TFG, HAS Lara Brito | 5º SEMESTRE Complemento: consumo de C3 ou C4 (baixos níveis) – por ativação das vias clássica ou alternativa EAS: proteinúria e hematúria (15 – 20 hem/campo, cilindros hemáticos Histologia: duplicação da MBG, proliferação celular, fibrose (doença mais agressiva e tende a se apresentar já com algum grau de DRC), depósitos subendoteliais de IgG e C3 Tratamento: inespecífico porque, dependendo do estágio, não é reversível Investigar causas secundárias MECANISMOS DE PROGRESSÃO DA LESÃO RENAL Persistência da lesão glomerular Hipertensão glomerular Proteinúria acentuada – quando passa pelos túbulos renais, esses túbulos tentam reabsorvê- las, causando dano túbulo-intersticial Resposta imunológica e mediadores inflamatórios Produção e recrutamento de fibroblastos – levam à formação de fibrose e esclerose Deposição de matriz extracelular – processo inflamatório que leva as lesões crônicas Lesão acelular cicatricial, isquemia, atrofia tubular e fibrose intersticial TRATAMENTO Específico Individualizada para cada patologia, mas em geral responde a corticoide. Exceções: ☞ Membranosa não tem resposta se usar corticoide de forma isolada, sendo necessário associar um CFM. ☞Membranoproliferativa que geralmente não responde a nada. Inespecífico Consiste em controlar os sintomas que surgem em decorrência da glomerulopatia. Dieta com restrição de sódio; dieta para controlar dislipidemia; restrição hídrica se anasarca importante Cessar tabagismo Estatinas – controle da dislipidemia Controle da PA, objetivando o alvo de 130x80mmHg IECA, BRA ou o duplo bloqueio (controlar PA sistema e intraglomerular, diminuindo proteinúria = antiproteinúrico, lentificando a profressão da doença renal) Diuréticos (de alça, poupadores de potássio, tiazídicos) – controle do edema. As vezes necessário associar mais de 1 diurético Evitar drogas nefrotóxicas Lara Brito | 5º SEMESTRE
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