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As complicações bucais da radioterapia podem ser classificadas como agudas e crônicas. Como exemplos de agudas, temos infecções oportunistas (como candidíase e herpes) e mucosite. Já nas crônicas, observamos diminuição da atividade funcional das glândulas (causando xerostomia e dificuldade de deglutição de alimentos), cárie de radiação, osteorradionecrose e trismo. Importante ressaltar que as manifestações bucais da radioterapia ocorrem somente nos casos de tratamento envolvendo cabeça e pescoço, quando as glândulas salivares e maxilares estão no campo de radiação. Sendo assim, é importante entrar em contato com a equipe médica responsável pela radioterapia para obter mais informações a respeito de como este tratamento está sendo ou foi conduzido. Esta modalidade de tratamento poderá ter vários efeitos colaterais. Como os medicamentos são administrados na circulação sanguínea, seus efeitos são sistêmicos. Dessa forma, as possíveis complicações poderão ser notadas independentemente do local do corpo que apresente a origem primária do câncer. Como complicações agudas, temos hemorragias, infecções oportunistas (como candidíase e herpes), mucosite, xerostomia e perda de paladar. E, como sequelas crônicas, osteonecrose associada ao uso de medicamentos antirreabsortivos e alterações na odontogênese podem ser citadas. PONTO IMPORTANTE Antes de iniciarmos esta etapa e realizarmos qualquer tipo de procedimento, devemos lembrar que a equipe médica do paciente sempre deverá ser contatada, para melhor discussão e planejamento do caso. 1 . CONSULTA ODONTOLÓGICA PREVENTIVA Pelas múltiplas complicações que podem acometer a cavidade bucal, ANTES DE INICIAR O TRATAMENTO radioterápico e/ou quimioterápico, a consulta odontológica preventiva é essencial. Exame clínico e radiográfico. Avaliar doença periodontal, doença cárie e mucosas. Realizar todos tratamentos (exodontias, RAP e RASUB, selamento de cavidades e adaptação de próteses para que as mesmas não gerem úlceras nas mucosas). Abordagem preventiva (orientação de higiene oral e aplicação de flúor). As exodontias devem ser realizadas o mais rápido possível (para que a cicatrização e o reparo ocorram antes do início da terapia oncológica). Um cuidado especial deve ser direcionado ao procedimento, adotando uma técnica cirúrgica o mais atraumática possível e buscando o fechamento da ferida em primeira intenção, sempre que possível. O tempo mínimo ideal de intervalo entre a realização de exodontia e o início do tratamento oncológico é de 3 semanas. Sendo que o reparo ósseo completo só será obtido após 3 meses. 2. DURANTE A TERAPIA ONCOLÓGICA Devemos realizar avaliação odontológica de forma frequente. O controle da higiene bucal, a prevenção de infecções oportunistas e o diagnóstico/tratamento precoce das sequelas bucais são primordiais na abordagem destes pacientes. Além de consultas odontológicas, podemos orientar o paciente a realizar: escovação dental com escova macia e pasta suave, bochechos com clorexidina aquosa 0,12%, uso de nistatina solução oral (3x/dia) e manutenção de lubrificação labial e bucal (beber água frequentemente, mascar chicletes sem açúcar, utilização de saliva artificial e utilização de hidratantes labiais como o dexpantenol). PROTOCOLO DE ATENDIMENTO DURANTE TERAPIA ONCOLÓGICA 1) A equipe médica deverá ser contatada para que seja possível definir quando realizar a abordagem cirúrgica, ou seja, quando o paciente apresentar boa contagem celular (hemograma completo e plaquetas) e níveis desejáveis dos exames laboratoriais; 2) Realizar antibioticoterapia profilática; 3) Cuidado impecável com biossegurança durante a abordagem cirúrgica; 4) Evitar a realização de ostectomia; 5) Ao realizar a sutura da ferida, sempre tentar realizar fechamento por primeira intenção (união dos bordos cirúrgicos). Se possível, realizar sutura com fio mononylon 5-0, para evitar acúmulo de placa bacteriana e estimular melhor cicatrização. 6) Dependendo do trauma cirúrgico (ex: realização de ostectomia ou odontossecção), realizar antibioticoterapia pós-operatória; 7) Prescrição de bochechos de clorexidina aquosa 0,12% de 12/12 horas por 14 dias. Ainda, podemos lançar mão de terapias não invasivas, como: - Coronectomia/sepultamento de raízes (remoção da coroa dentária + endodontia da raiz remanescente) - Exodontia atraumática com uso de elásticos ortodônticos (técnica descrita nos artigos disponíveis em Material Complementar) Algumas terapias adjuvantes auxiliam de forma significativa a cicatrização, reduzindo o risco de complicações. Se disponíveis, elas devem ser recomendadas: - Fotobiomodulação - Oxigenoterapia hiperbárica 3. APÓS O TÉRMINO DO TRATAMENTO ONCOLÓGICO as consultas odontológicas deverão ser realizadas a cada 3 meses, pelo menos no primeiro ano pós- terapia. Nestes atendimentos, deveremos estar atentos ao controle de rotina (o mesmo realizado durante a terapia oncológica) e ao diagnóstico e tratamento das complicações tardias. Em muitos casos, observamos o desenvolvimento de cárie de radiação. Para isto, poderemos lançar mão de fluoretos e de tratamento restaurador. Para evitar que estas lesões evoluam, envolvam a polpa dentária e necessitem de tratamento endodôntico ou exodontia, devemos estar atentos às lesões iniciais e realizar o tratamento adequado das mesmas. Outra complicação bastante comum é o trismo. Neste caso, poderemos recomendar a realização de sessões de fisioterapia e exercícios de abertura bucal. Por fim, a osteonecrose ou a osteorradionecrose podem ocorrer durante ou após a terapia oncológica. Clinicamente, observamos exposição de tecido ósseo avascular, podendo ter secreção purulenta associada. Se ela for diagnosticada, recomenda-se o encaminhamento a um cirurgião buco-maxilo-facial, para que o mesmo possa realizar a abordagem em ambiente hospitalar de referência. Alguns dos tratamentos propostos são: irrigação com clorexidina aquosa 0,12%, antibioticoterapia, fotobiomodulação, oxigenoterapia hiperbárica (inalação de oxigênio puro em uma pressão maior que a pressão atmosférica, dentro de uma câmara hermeticamente fechada) e avaliação da necessidade de remoção dos sequestros ósseos. - A contraindicação da realização de abordagens cirúrgicas se organiza da seguinte forma: Pacientes que realizaram radioterapia de cabeça e pescoço: deverão aguardar pelo menos 5 anos pós-tratamento oncológico para a realização de cirurgias eletivas. Pacientes que realizaram quimioterapia: deverão aguardar a normalização da contagem celular e dos demais exames laboratoriais. Pacientes que realizaram radioterapia de outra parte do corpo (que não cabeça e pescoço): deverão aguardar a normalização dos exames laboratoriais, mas não terão prejuízo na cicatrização dos tecidos moles e no reparo ósseo. Caso seja necessário realizar exodontia de algum elemento dentário no período anterior ao recomendado, deveremos seguir o protocolo de atendimento para paciente em terapia oncológica descrito acima. Além disso, antes de realizarmos qualquer intervenção, é extremamente importante sabermos que a maior incidência de necrose óssea em paciente oncológico ocorre em mandíbula após radioterapia. Portanto, mesmo que os 5 anos pós-tratamento já tenham passado, devemos ter ciência da dose de radiação utilizada, do tempo da terapia e, principalmente, do campo de ação dela. Exemplo: o Caso 1: Paciente realizou 6 sessões de radioterapia em maxila lado direito e apresenta necessidade de realizar exodontia de um dente inferior do lado esquerdo. o Caso 2: Paciente realizou 12 sessões de radioterapia em mandíbula lado esquerdo e apresenta necessidade de realizar exodontia de um dente inferior do lado esquerdo. O paciente do caso 2 apresenta maior risco de desenvolvimento de osteorradionecrose e, por isso, antes de realizarmos qualquer abordagem cirúrgica,mesmo que após 5 anos de período pós- terapia e com todos cuidados mencionados, o paciente e o profissional devem estar cientes do risco. Relembrando ainda que as terapias menos invasivas, como coronectomia e exodontia atraumática com uso de elásticos ortodônticos, também poderão fazer parte do planejamento. As medicações antirreabsortivas que podem induzir osteonecrose (MRONJ) são os bisfosfonatos (ex: alendronato, ibandronato, risedronato, pamidronato e zolendronato), anticorpos monoclonais (ex: denosumab) e antiangiogênicos (ex: bevacizumab). A osteonecrose pode ser originada pela inibição da atividade osteoclástica, inflamação/infecção no local e inibição angiogênese. ESTRATÉGIAS DE MANEJO 1) Paciente prestes a iniciar tratamento endovenoso (EV) para terapia oncológica: minimizar o risco de desenvolver osteonecrose dos maxilares induzida por medicamentos (MRONJ), ou seja, realizar a consulta odontológica preventiva, onde serão realizados todos tratamentos necessários. Assim como já descrito na etapa 1 do tratamento em pacientes oncológicos, se as condições sistêmicas permitirem, o início da terapia deve ser retardado até que a saúde bucal seja otimizada (no caso de exodontias, esperar 21 dias). 2) Paciente prestes a iniciar tratamento para osteoporose: devem ser informados sobre os potenciais riscos do MRONJ, uma vez que a terapêutica antirreabsortiva provavelmente excede 4 anos de tratamento. Também deverão realizar consulta preventiva e acompanhamento odontológico para que a doença cárie e periodontal sejam tratadas em suas fases iniciais. 3) Pacientes sem MRONJ e que fazem a terapia para câncer (medicação endovenosa): como citado na etapa 2 da terapia oncológica, os procedimentos de extração dentária são contraindicados. Apenas poderão ser realizados em caráter de urgência, conforme as recomendações descritas na terapia oncológica. A indicação de cessação medicamentosa antes da exodontia/lesão óssea para pacientes em TRATAMENTO DE CÂNCER possui dados escassos. Se a MRONJ se desenvolver, o oncologista pode considerar a interrupção da terapia antirreabsortiva até que ocorra o fechamento do tecido mole, dependendo do estágio da doença, mas isto deve ser definido pelo médico de referência do paciente. 4) Pacientes sem MRONJ e que fazem a terapia para osteoporose: também possuem risco de desenvolver MRONJ, mas em um grau muito menor do que aqueles tratados de forma endovenosa (como os pacientes que fazem terapia para câncer). Nestes casos, uma opção é a cessação medicamentosa antes da exodontia/lesão óssea para pacientes em TRATAMENTO DE OSTEOPOROSE: 2 meses antes e 3 meses após o procedimento é uma abordagem prudente para os pacientes em risco (história de exposição prolongada, ou seja, em uso da medicação há mais de 4 anos). A decisão por esta abordagem de tratamento deverá ser pactuada com o médico. 5) Desenvolvimento de MRONJ em pacientes que fazem terapia para câncer ou para osteoporose: encaminhamento ao cirurgião buco-maxilo-facial para tratamento em hospital de referência. Por fim, independentemente do tipo de medicação, do tempo e dos demais fatores de risco, devemos estar cientes que o atendimento odontológico preventivo anteriormente ao início da terapia medicamentosa é sempre a melhor recomendação. Outro ponto importante de ser lembrado é o uso de câmara hiperbárica, a ozonioterapia e fotobiomodulação no tratamento destes pacientes. Pelo seu poder bactericida e de indução de reparação tecidual, procedimentos cirúrgicos aliados a estas terapias têm proporcionado resultados satisfatórios nestes pacientes.
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