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2 0 2 0 . 2 J Ú L I A M O R A I S 1 4 3 ( 2 0 1 9 . 2 ) | 1 MICROBIOLOGIA AULA 18 Infecções Urinárias CONCEITOS • Colonização: Proliferação bacteriana na mucosa do trato urinário, sem invasão. • Infecção: Proliferação bacteriana na mucosa do trato urinário, penetrando em tecido mais profundo. → A proliferação é caracterizada pela ocorrência de uma reação inflamatória. → Laboratorialmente é marcada pela piúria, que é a contagem de células fagocitárias acumuladas na secreção purulenta. Caso o valor seja ≥ 8 piócitos/mm3, é considerada invasão do tecido. → No caso de uma infecção, temos bacteriúria significativa, medida por unidades formadoras de colônia (UFC) por mL de urina (UFC/mL). PRINCIPAIS AGENTES • A grande maioria são microrganismos da microbiota intestinal. • Escherichia coli uropatogênica (UPEC): Principal bactéria facultativa da microbiota intestinal. É responsável por 80% dos casos de ITU. • Bastonetes gram negativos: Klebsiella, proteus e pseudomonas. • Cocos gram positivos: Enterococcus faecalis, S. epidermidis e S. sprophyticcus. COMUNITÁRIA x HOSPITALAR • Apresentam os mesmos agentes, mas variam em sua importância dependendo do tipo de infecção. • A E. coli é a predominante em ambos os tipos de infecção. • Nas hospitalares outros bastonetes gram negativos apresentam uma alta quantidade de casos. VIAS DE INFECÇÃO • Ascendente: Bactérias da microbiota intestinal colonizam a mucosa urogenital, penetram pela uretra e proliferam na bexiga, podendo chegar aos rins. → Facilitada pela estrutura anatômica das mulheres; → Fatores de risco: ▪ Perda de lactobacillus pós-menopausa, devido a redução do estrogênio; ▪ Uso de antibióticos; ▪ Uso de espermicidas. • Hematogênica: Bactéria oriunda de uma infecção em outra região, chega até o trato urinário pelo sangue. Afeta diretamente o trato urinário alto. • Extensão direta: Presença de fístulas entero- vesicais, uma comunicação anormal entre dois sítios anatômicos. Nesse caso, podemos ter, por exemplo, a comunicação entre uma alça intestinal com a bexiga. PATOGENIA 1. Aderência: Conexão da bactéria com a célula do epitélio, colonizando o tecido. 2. Invasão: Bactéria entra na região mais profundo do tecido, caracterizando uma infecção. 3. Reação inflamatória: Resposta do corpo devido a entrada da bactéria, que é responsável pelos sintomas. FATORES PREDISPONENTES • Estrutura anatômica das mulheres. → Uretra mais curta e mais larga; → Proximidade dos orifícios uretral e anal. • Fatores que alterem a passagem normal da urina pelo trato urinário. → Gravidez; → Cálculos no trato urinário; → Tumores de próstata. • Traumatismos. → Introdução de cateter vesical; → Relação sexual. • Anomalias anatômicas. → Estenose de meato urinário, estreitando a região terminal da uretra e causando acúmulo de urina; → Divertículo peri-uretral (bolsas); → Refluxo vesiculo-ureteral, causando o retorno da urina, revertendo o fluxo unidirecional. 2 0 2 0 . 2 J Ú L I A M O R A I S 1 4 3 ( 2 0 1 9 . 2 ) | 2 • Irritação da mucosa por sabões ou agentes espermicidas. • Distúrbios neurológicos que dificultem o esvaziamento da bexiga. FATORES DE VIRULÊNCIA • Pili: Capacidade de aderência às células epiteliais do trato urinário. → Ex: Pili tipo 1 ou Dr (E. coli) e Pili P (E. coli e Proteus). • Cápsula (antígeno K): Possui atividade anti- fagocitária. → Ex: E. coli e Klebsiella pneumoniae. • Produção de urease: Alcaliniza o pH da urina. → Ex: Proteus. • Siderófos: Mecanismos de aquisição de ferro, importante para o metabolismo das bactérias. • Produção de hemolisina: Lisa células do hospedeiro e promove aderência ao epitélio do trato urinário. • Produção de Fator Citotóxico Necrotizante (CNF): Lesa o tecido do trato urinário, intensificando a reação inflamatória. MECANISMOS DE DEFESA DO HOSPEDEIRO IMUNIDADE NATURAL • Urina. → Fluxo unidirecional; → pH. • Fator anti-aderente (mucopolissacarídeo) presente na mucosa da bexiga. → Ocupa os receptores das bactérias, impedindo a aderência dela ao tecido; → É eliminado pela urina junto com a bactéria. • Defensinas. → Peptídeos produzidos por células de mamíferos, que tem ação antimicrobiana; → Aumenta a imunidade inata através da estimulação da produção de IL-8, que faz quimiotaxia de neutrófilos e degranulação de mastócitos. • LPS. → PAMP característico de bactérias gram negativas. → Estimula a imunidade natural através da interação com receptor do tipo Toll 4 (TLR-4), presentes nas células apresentados de antígenos. Com isso, ocorre a liberação de citocinas pró-inflamatórias (TNF-α, IL-1, IL-8 e INF-γ), ativação do sistema complemento por via alternada e da cascata de coagulação. IMUNIDADE ESPECÍFICA • Produção de anticorpos IgA: Dificultam a aderência da bactéria nas mucosas. • Infiltrados de células T: Presente ao longo do trato urinário, responsáveis pela imunidade celular. EPIDEMIOLOGIA FORMAS CLÍNICAS BACTERIÚIA ASSINTOMÁTICA • Aumento significativo da bacteriúria ( ≥ 100.000 UFC/mL). • Sem sintomas. • Com ou sem piúria. • Frequente em grávidas. GRAVIDEZ E INFECÇÃO URINÁRIA Cerca de 4 a 7% das grávidas apresentam episódio de infecção urinária. Isso ocorre, devido a compressão da bexiga de acordo com o crescimento do feto, que atrapalha o fluxo urinário e o encurtamento e alargamento da uretra durante esse período. A urina fica impedida de fazer seu trajeto normal no trato urinário, o que é importante para eliminação de determinadas bactérias. Além disso, parte dela permanece acumulada na bexiga, formando um ambiente propicio para a proliferação de bactérias. A prevenção contra a infecção é realizada durante o pré-natal, através do monitoramento pela urocultura mensal para detectar bacteriúria assintomática. Receptor celular da Pili P é o antígeno do grupo sanguíneo P, expresso nas hemácias e nas células epiteliais do trato urinário. O número de incidência de infecções urinárias quase igual em idosos do sexo feminino e masculino, se deve ao aumento proporcional dos casos em idosos do sexo masculino, devido ao aumento da próstata e outras causas. 2 0 2 0 . 2 J Ú L I A M O R A I S 1 4 3 ( 2 0 1 9 . 2 ) | 3 • Tratamento com antimicrobianos indicado em grávidas, diabéticos e imunossuprimidos. INFECÇÃO URINÁRIA BAIXA • Ocorre na uretra e bexiga. • Uretrite e cistite. → A uretrite pode ser causada por bactérias sexualmente transmissíveis na presença de IST. • Sintomas: → Disúria (dor ao urinar); → Polaciúria (urina pequenos volumes de urina); → Piúria; → Bacteriúria significativa. INFECÇÃO URINÁRIA ALTA • Pielonefrite aguda: Sintomas indicam reação inflamatória sistêmica. → Sintomas: Febre, mal-estar e do lombar. → Pode ser precedida dos sintomas de uma infecção urinária baixa, quando ocorre pela via ascendente. • Pielonefrite crônica → Comprometimento da função renal, representado pela alteração da ureia e creatinina. SÍNDROME URETRAL AGUDA • Bacteriúria < 102 UFC/mL. • Com sintomas. • Com piúria (≥ 8 leucócitos/mm3). • Pode ocorrer devido a bactérias de crescimento difícil, que não crescem nos métodos comuns de diagnóstico de infecção urinária. → Neisseria gonorrhoeae;→ Chlamydia trachomatis; → Gardnerella vaginalis; → Ureaplasma urealyticum. • Também pode ser de origem não infecciosa. ITU NÃO COMPLICADA • Não apresenta alteração estrutural ou funcional do trato genito-urinário. • Ocorre geralmente em mulheres jovens, saudáveis, não gestantes, com anatomia normal do trato urinário. • Associada a atividade sexual e determinantes genéticos. • Mais ou menos 50% de todas as mulheres terão pelo menos um episódio de ITU durante toda a sua vida. • Pode ser feito tratamento empírico em mulheres jovens sem fatores (sem TSA) • Droga de 1ª escolha: Fosfomicina (dose única). ITU COMPLICADA • Ocorre em indivíduos com algum fator predisponente. → Fatores que alterem o fluxo da micção; → Traumatismos ou procedimentos invasivos; → Anomalias anatômicas; → Doenças debilitantes ou comorbidade; → Pacientes nos extremos da faixa etária (RN e idosos); → Pacientes com disfunção imunológica; → Relacionada à assistência à saúde (IRAS). DIAGNÓSTICO • Métodos de coleta de urina: → Micção espontânea (pode vir contaminada com bactérias da genitália externa); → Por cateter vesical (paciente já com cateter); → Punção supra-púbica (casos complicados). • Cuidados: → Utilizar frasco estéril; → Coletar a primeira urina da amanhã ou com intervalo de 4 horas (conseguir amostra significativa); → Fazer higiene prévia da genitália externa com água e sabão; → Coletar o jato médio da urina; → Manter a baixa temperatura até chegar ao laboratório; → Levar ao laboratório em até 4 horas. • Procedimentos laboratoriais: → Sumário de urina (EAS): INFECÇÕES RECORRENTES Seja qual for a forma, mas principalmente, a infecção urinária baixa por via ascendente, podem apresentar quadro recorrente. Geralmente, estão relacionadas a fatores genéticos ou ao uso de agentes espermicidas. Elas podem ser casos de reinfecção (80% dos casos) ou recidiva devido a falha no tratamento. 2 0 2 0 . 2 J Ú L I A M O R A I S 1 4 3 ( 2 0 1 9 . 2 ) | 4 ▪ Exame químico: Cor, aspecto, densidade, pH, elemento químicos (glicose, proteína, cetona, bilirrubina, nitrito, hemoglobina, leucócitos e urobilinogênio). ▪ Teste do nitrito: Bactérias da família Enterobacteriaceae produzem nitrato- redutase, responsável pela quebra do nitrato em nitrito. ▪ Microscopia do sedimento: Piúria, hemácias, bactérias, cristais. → Urocultura ▪ Quantitativa: Bacteriúria significativa. ▪ Mulheres com cistite não complicada: 102 UFC/mL. ▪ Mulheres com pielonefrite não complicada ou homens: igual ou maior que 104 UFC/mL. ▪ Mulheres com ITU complicada: igual ou maior que 105 UFC/mL. ▪ Qualitativa: Identificação da bactéria pela coloração de gram. Os bastonetes gram negativos são os mais frequentemente empregados. → Teste de sensibilidade a antimicrobianos (TSA): Necessário para definição do antibiótico utilizado para tramento. TRATAMENTO • Pode ser feito tratamento empírico em casos de infecção urinária não complicada em mulheres. A droga de escolha para esses casos, atualmente, é a fosfomicina em dose única. • Nos outros casos, o tratamento deve ser orientado pelo resultado do TSA. → As mais utilizadas são as fluoroquinolonas, nitrofurantoína e cefalosporinas. PREVENÇÃO CONTRA CASOS RECORRENTES • Uso profilático de antimicrobianos em dose baixa e longa duração ou apenas após atividade sexual. • Cuidados de higiene após evacuação. • Uso de suco ou cápsulas de cranberries, pois contém frutose, um composto polimérico anti-aderente, potencializando a função antiaderente. • Probióticos na forma de óvulos vaginais, reintrodução de Lactobacillus acidophilus. Importante em mulher na menopausa. • Suplemento de estrogênio tópico na forma de creme ou óvulo vaginal para mulheres na menopausa.
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