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� Comunicação e Expressão I N O N O M O M EN TO � Comunicação e Expressão I NONO MOMENTO � Comunicação e Expressão I Anotações As Palavras e a Gramática no Texto POR QUE APRENDER Lembra aquela ilustração, utilizada no terceiro Momento, a respeito da adequação da roupa ao ambiente social? Você também deve se recordar do que foi estudado no sexto Momento sobre como o contexto de interação é responsável pela determinação e modelagem do discurso. Pois é. Quando nos comunicamos, em geral, fazemos uma espécie de “cálculo” da situação na qual interagimos. Isso quer dizer que tendemos a levar em consideração que papel desempenhamos (ou imagem representada) em relação ao nosso interlocutor e vice-versa; em que atividade social estamos envolvidos, que conhecimentos partilhamos ou não, quais os interesses em jogo, entre outros. Esses fatores orientam não somente o conteúdo do discurso circulado, mas também o modo como este se constitui, e nisso incluem-se as formas lingüísticas utilizadas em sua codificação. Significa que os componentes lingüísticos do texto (as palavras e suas combinações) são “escolhidos” em função do discurso e de suas características contextuais. Neste Momento, portanto, vamos explicitar melhor essa questão, procurando avançar um pouco mais no conhecimento acerca da importância do uso adequado dos recursos lingüísticos (ou seja, do vocabulário e das estratégias de organização gramatical) às condições de produção textual. Não se trata aqui de oferecer uma “receita” do que colocar ou não no texto, mas de uma reflexão sobre o valor que os elementos lingüísticos desempenham no estabelecimento dos efeitos de sentido, a partir da perspectiva adotada pelo locutor no contexto de interação em que se encontra. Esperamos, com isso, que você perceba o poder que as condições de produção do discurso exercem sobre a linguagem, tornando-se, assim, mais habilidoso(a) em identificar o valor histórico-cultural e ideológico que as palavras têm na constituição do discurso e em fazer o uso apropriado dos recursos lingüísticos na produção textual. O QUE APRENDER Leia atentamente os pequenos textos que se seguem. NONO MOMENTO � Comunicação e Expressão I Anotações Texto 1 Algumas crianças fazem de tudo para chamar a atenção de seus pais. Chegam até a tossir compulsivamente. Já uma criança com Fibrose Cística (FC) tosse constantemente porque não tem um clearance pulmonar adequado. Ela tem traquidispinéia, sibilos e muita tosse. Quando ela faz isso, ela está dando um alerta a você. Estes sintomas são freqüentemente confundidos e diagnosticados como asma, bronquite ou infecções pulmonares de outra etiologia. A FC é uma doença genética grave, que deve ser diagnosticada e tratada o quanto antes, para melhorar o prognóstico de seus portadores. Fique atento aos sintomas típicos da doença, como diarréia crônica, desnutrição e infecções pulmonares de repetição. Ao suspeitar da doença ou diagnosticá-la, encaminhe o paciente para o Centro de Referência mais próximo. O tratamento é gratuito. Fibrose Cística. Saber antes para viver melhor depois. (DIÁLOGO MÉDICO, 2004, p. 65) Texto II Salvador da Bahia Basta um sorriso baiano pra gente entender O porquê do Brasil ter nascido primeiro aqui Nesse lugar... Basta um tempero baiano pra gente Provar o sabor desse povo que ri Da tristeza ao invés de chorar... Capoeira, ganzá, berimbau, vatapá e acarajé... Jorge Amado, Zumbi, Castro Alves, Caetano e Caribé... Do outro lado do mundo vem gente saber Como é que é esse tal de “sorria Você está na Bahia, meu Rei!” Que a Graça de Deus te embale... Que a Água da vida te regue de amor... Que o Santo dos santos te dê Sua paz...Bahia! Que o Mestre Jesus seja o teu Salvador! Basta um sorriso e um tempero baiano pra gente Entender...O que é que a Bahia tem! (ALEXANDRE, 2000) NONO MOMENTO � Comunicação e Expressão I Anotações Texto III Por que o jovem não deve ler Calma, prezado leitor; nem você leu errado nem eu pirei de vez. Este artigo pretende isso mesmo: dar novos motivos para que os moços e moças de nosso Brasil continuem lendo apenas o suficiente para não bombar na escola. E continuem vendo a leitura como algo completamente estapafúrdio, irrelevante, anacrônico, e permaneçam habitando o universo ágrafo dos hedonistas incensados nos reality shows. Epa, acho que exagerei. Afinal, quem não lê muito dificilmente vai conseguir compreender esta última frase. Desculpem aí, manos: eu quis dizer que os carinhas, hoje, precisam de dicionário pra entender gibi da Mônica, na onda dos sarados e popozudas que vêem na telinha, e que vou dar uma força pra essa parada aí, porra. (TAVARES, p. �6) Você percebeu como a escolha do vocabulário utilizado, respectivamente, em cada texto varia de acordo com as características do contexto interativo e com os propósitos para os quais esses discursos foram produzidos? Vamos então observar mais detalhadamente como isso se dá. Veja que o primeiro texto utiliza algumas palavras específicas da área médica. Isso não ocorre apenas porque o texto trata de um determinado problema de saúde (a “Fibrose Cística”), mas, sobretudo, porque se encontra numa revista direcionada aos médicos (apesar de parecer estar falando exclusivamente para os pais). Daí, o porquê do uso de palavras como “clearance pulmonar”, “traquidispinéia”, “diagnosticados”, “etiologia”, entre outras. Além disso, o locutor utilizou o padrão gramatical da norma culta, em virtude de estar, em tese, interagindo com interlocutores que possuem alto grau de formação escolar. Desse modo, o texto manifesta o discurso científico da medicina, com intenção persuasiva, contando com a leitura cooperadora do(s) interlocutor(es). Agora, imaginemos se essas mesmas informações fossem circuladas numa interação entre o médico e um paciente leigo. Com certeza, esse médico teria que empregar um vocabulário mais simples, acessível ao seu cliente, se quisesse ser bem compreendido. Observando-se o segundo texto, podemos facilmente identificar uma série de palavras relacionadas à cultura baiana e ao ideário cristão. Isso tem seu motivo no fato de ser um poema elogioso à cidade de Salvador/BA, com a intenção de construir uma “imagem positiva” do jeito baiano de ser, e, mais ainda, de o locutor pretender divulgar NONO MOMENTO 6 Comunicação e Expressão I Anotações sua mensagem evangelística àquele povo. Podemos verificar isso, por exemplo, na seguinte passagem: “Que a Graça de Deus te embale... Que a Água da vida te regue de amor... Que o Santo dos santos te dê Sua paz...Bahia! Que o Mestre Jesus seja o teu Salvador! Basta um sorriso e um tempero baiano pra gente Entender...O que é que a Bahia tem!” Nessa estrofe, particularmente, o poeta “brinca” tanto com a forma das palavras, como com suas possibilidades de duplo sentido. O que nos lembram a expressão “te embale” e o termo “regue”, por exemplo? Isso mesmo! Dois dos ritmos musicais mais populares na Bahia: a timbalada e o reggae. Temos, ainda, “Água da vida”, provavelmente numa alusão à cerimônia religiosa de lavagem das escadarias da igreja do Senhor do Bonfim; “Santo dos santos”, numa referência indireta à “Bahia de todos os santos”; o emprego do termo “Mestre”, talvez querendo lembrar os guias-mestres espirituais do candomblé e contrastá-los com o “Mestre dos mestres”; e a ambigüidade intencional com que se empregou o vocábulo “Salvador”, não apenas se referindo a Jesus, mas também à capital da Bahia. É interessante notar que, através dessa mesclagem lingüística, expressando, ao mesmo tempo, traços da cultura baiana e da religiosidade cristã, o poeta aponta o sincretismo cultural tão característico dos baianos. Por outro lado, aproveita para mostrar, sutilmente, a superioridade do cristianismo, evidenciado nos apelos feitos nos quatro primeiros versos da estrofe citada. Veja, por exemplo, que todas as referências a Cristo estão em letras maiúsculas (“Graça”, “Água”, “Santo“,“Mestre”), significando que a proposta salvadora de Jesus está acima de todas. Deve-se também assinalar que, por se tratar de um texto poético, cujo discurso é marcado pelo subjetivismo e pela liberdade criadora do eu-lírico quanto ao que enuncia, isso exerce influência tanto na “escolha” das formas lingüísticas, bem como no modo de dispô-las na superfície textual. Há, ainda, o fato de que o discurso literário tem um compromisso estético (ou seja, com o belo artístico), atuando, assim, no âmbito da emotividade e da sensibilização. No terceiro texto, observe que o locutor alternou dois estilos distintos de linguagem: um coloquial e imitativo do padrão lingüístico dos jovens, evidenciado através de “pirei”, “bombar”, “manos”, “onda dos sarados” etc. O outro, especificamente no segundo parágrafo, é mais rebuscado, fingindo maior erudição – “algo completamente estapafúrdio, irrelevante, anacrônico, e permaneçam habitando o universo ágrafo dos hedonistas incensados nos reality shows”. O uso da variante lingüística dos jovens se deve, primeiramente, NONO MOMENTO � Comunicação e Expressão I Anotações por se dirigir a essa faixa etária, através da qual o locutor pretende não só parecer identificar-se com esse público, conquistando-lhe a atenção, mas também se fazer entender. Ao mesmo tempo, valendo-se dessa estratégia, o locutor aproveita para, indiretamente, mostrar as limitações expressivas (ou seja, a deficiência de linguagem) de um jovem que tem pouco convívio com a leitura. Por outro lado, a escolha da variante culta, com um vocabulário mais sofisticado, justifica-se pelo fato de pretender demonstrar a dificuldade que pessoas com baixo nível de leitura sentem no momento de ler um texto com tais características. O VALOR DAS PALAVRAS NO TEXTO Esses exemplos servem para mostrar a importância que as palavras desempenham na formação do discurso. Conforme você já viu no quinto Momento, os vocábulos e expressões lingüísticas não possuem um valor significativo dado previamente e exterior à interação verbal. Também não devemos crer que a linguagem pode ser neutra e absolutamente objetiva. Vamos esclarecer isso um pouco mais: muitos acreditam que as palavras possuem seus respectivos significados já estabelecidos no dicionário e/ou supõem que é possível substituir, indiferentemente, um vocábulo ou expressão por outro(a), sem alterar o que se pretende dizer. É claro que não queremos negar a utilidade que um dicionário tem; tampouco ignoramos o fato de que, dependendo do contexto, pode-se, com muito cuidado, utilizar uma palavra/ expressão em lugar de outra. No entanto, é bom lembrar que as pessoas utilizam a linguagem de modo bastante criativo e que, portanto, o dicionário, mesmo com todo o seu poder de esclarecimento, é insuficiente para dar conta das diversas possibilidades significativas que as formas lingüísticas podem assumir na intercomunicação. Aliás, é justamente no processo comunicativo que as palavras adquirem seu sentido e sua funcionalidade discursiva. É, também, no discurso que elas se revestem de valores socioculturais e históricos, revelando, ao mesmo tempo, traços da subjetividade, em graus variados, daqueles que as utilizam. Em razão do que foi mostrado até aqui, queremos que você atente para o valor que as palavras representam na constituição do discurso. Elas são reveladoras não apenas das características do contexto de interação (incluindo-se aí traços do ambiente de enunciação, o perfil dos interlocutores etc.), como também dos interesses que estão em jogo. Vamos agora ver alguns esclarecimentos sobre o uso dos itens lexicais (isto é, das palavras) e das construções gramaticais no texto com mais detalhes. NONO MOMENTO � Comunicação e Expressão I Anotações Em primeiro lugar, conforme você estudou, a seleção lexical (das palavras) obedece ao tema sobre o qual se fala; além disso, também leva-se em conta características do(s) interlocutor(es) e do ambiente de interação. Em virtude desses fatores, opta-se por um vocabulário técnico, ou regionalista, ou mais rebuscado, ou mais simples, ou contendo gírias, ou com estrangeirismos, ou, ainda, pode-se criar alguma palavra nova (neologismo), visando à obtenção de um determinado efeito de sentido (FIORIN & SAVIOLI, �99�). É por isso que, num texto circulado entre parceiros de uma mesma área de conhecimento ou profissional, é comum serem encontrados muitos termos técnicos (ou jargões) específicos dessa área, uma vez que já pertencem ao repertório cultural dos interlocutores. Aliás, a não utilização dessa linguagem específica seria uma transgressão às normas de conduta nesse contexto e poderia ser alvo de censura. Por exemplo: se no texto � (aquele sobre “Fibrose Cística”, visto anteriormente), o locutor tivesse empregado um vocabulário comum ou ficasse esclarecendo o sentido de cada termo técnico utilizado, certamente causaria estranheza ou irritação no seu público-alvo. Em outro caso, o locutor pode fazer uso de formas lingüísticas que não são propriamente suas, quer dizer, não fazem parte de sua prática comunicativa habitual. Desse modo, ele se apropria do estilo de linguagem de um determinado grupo social ao qual não pertence, fingindo assumir esse uso lingüístico, numa atitude imitativa, a fim de melhor identificar-se com tal grupo e conseguir sua adesão. Uma amostra disso está no texto � (“Por que o jovem não deve ler”), no qual o locutor incorpora um falante “jovem”, procurando reproduzir o estilo de expressão dessa faixa etária, uma vez que está interagindo com esse tipo de público. Em situação semelhante, certamente você já observou que, ao recorrer a uma estratégia como essa, o produtor do texto pretende ou valorizar um determinado estilo de linguagem e o discurso de seus usuários ou depreciá-lo, desqualificando seus falantes através da ironia. Um outro recurso do qual o locutor pode lançar mão é uso da linguagem figurada e/ou do duplo sentido. Você deve se lembrar que, no quinto Momento, foi mostrado que a conotação (metáfora, metonímia, prosopopéia, hipérbole, eufemismo, ironia, entre outras) tem um valor inestimável na constituição do discurso. Isto porque, dependendo do contexto, ela representa uma forma de expressão muito mais apropriada do que os usos literais, exatamente por resultar em determinados efeitos de sentido que as construções lingüísticas comuns não produziriam. Essa estratégia é possível graças ao caráter polissêmico das palavras, isto é, à possibilidade que elas possuem de poder exprimir mais de um sentido. NONO MOMENTO 9 Comunicação e Expressão I Anotações Para confirmar esse ponto de vista, observe o seguinte texto: Na parte não-verbal desse anúncio, havia a ilustração de um fogão a gás com as bocas acesas, como se estivessem sorrindo. Nesse texto, a palavra “bocas” nos remete a dois significados superpostos: um deles refere-se às bocas do fogão (que é uma catacrese, ou seja, designação aplicada a alguma parte dos objetos, com base na semelhança entre esta e membros do corpo dos seres vivos); o outro aponta para a boca dos(as) que lidam com o fogão nas tarefas domésticas do cotidiano, dando a entender a satisfação que sentem ao cozinhar com o gás produzido pela Brasilgás. Aqui, recorreu à metonímia, pois, em vez do termo “brasileiros” utilizou “Brasil”, isto é, o país em lugar de seus habitantes. E ainda há o uso da hipérbole, através do pronome “todas”, num evidente exagero. Desse modo, o locutor não só se valeu da linguagem figurada, como também da ambigüidade intencional. Outro aspecto bastante significativo é o valor que substantivos, adjetivos, verbos e advérbios possuem para a focalização (ou orientação discursiva) do conteúdo textual. Também deve-se considerar a propriedade que essas classes de palavras possuem de poderem ser substituídas por outros termos ou expressões de sentido equivalente (isto é, por sinônimos). É importante lembrar que a possibilidade de haver sinônimosperfeitos é quase inexistente. Pode até ser que uma palavra ou expressão substitua outra num dado contexto com praticamente o mesmo peso significativo. No entanto, é preciso cuidado quanto a isso, visto que toda palavra ou expressão possui um valor cultural e ideológico dependente do contexto em que é utilizada, tendendo, portanto, a adquirir significação específica. Se é assim, não pode ser facilmente permutada por outra nem empregada noutra situação com o mesmo efeito de sentido. Isto porque uma palavra pode ser mais técnica, ou mais subjetiva, ou mais coloquial/ vulgar, ou mais enfática, ou mais conotativa etc. do que outra. Imagine uma reportagem jornalística na qual o redator vai noticiar o desempenho da polícia em relação a um grupo de manifestantes. Se dissesse, por exemplo, que os manifestantes foram “energicamente contidos pela ação policial”, demonstraria uma tendência mais favorável aos policiais. Caso informasse que os manifestantes foram “violentamente” contidos pela ação policial, estaria indicando um posicionamento contrário, isto é, desfavorável para a polícia. O mesmo poderia ocorrer quanto à escolha entre os termos “contidos”, “Todas as bocas do Brasil estão rindo à toa.” (Anúncio comercial da Brasilgás em um outdoor Natal/RN, �00�) NONO MOMENTO �0 Comunicação e Expressão I Anotações Desafio Pesquise em um jornal ou revista uma pequena reportagem sobre algum fato e a transcreva os trechos que você considerar mais significativos. Depois analise os recursos lexicais (as palavras) utilizados, observando a importância que exer- cem no conteúdo do texto. • • “reprimidos” ou “enfrentados”: em cada um, passaria uma idéia diferente sobre o fato, com variadas conseqüências sobre a opinião pública. Também haveria diferença na maneira de “ver” o acontecimento caso fosse retirado o substantivo “ação”, relacionado à polícia, ou substituído por “força”, por exemplo. Ainda outra questão a se considerar refere-se à necessidade de, no texto, conservarem-se as associações semânticas (de sentido) através dos campos lexicais. De acordo com o que já foi visto no �º MOMENTO (sobre a coesão referencial), estes são formados por um conjunto de palavras e expressões que se inter-relacionam pelo fato de pertencerem a um mesmo universo de significados (ou quadro conceitual). Agora é sua vez de pôr em prática o que estudou. A IMPORTÂNCIA DA GRAMÁTICA NA CONSTRUÇÃO DO DISCURSO E quanto à gramática no texto? Bem, em primeiro lugar, deve-se esclarecer que “gramática” aqui não tem muito a ver com aquela idéia de um conjunto de regras para se falar/escrever “corretamente”, quer dizer, não se refere à gramática normativa tradicional, que nós tanto estudamos durante os ensinos fundamental e médio. Relaciona-se, na verdade, ao modo como configuramos as palavras e as encadeamos na estrutura frasal, observando suas propriedades específicas, suas combinações umas com as outras e os respectivos lugares em que aparecem na seqüência dos enunciados, a fim de organizar coerentemente o discurso e se conseguir os efeitos de sentido desejados (TERRA & NICOLA, �00�; TRAVAGLIA, �00�). É importante observar as “decisões” tomadas pelo locutor para selecionar e articular o vocabulário na superfície textual. Disso depende, em parte, o sucesso da construção dos sentidos. Vejamos o exemplo a seguir: Todos os jornais noticiaram o evento. O evento foi noticiado por todos os jornais. • • NONO MOMENTO �� Comunicação e Expressão I Anotações Perceba como as diferentes posições das palavras alteram significativamente a noção de cada uma. No enunciado �, a colocação de “drogas” após o verbo “usa” aponta para o sentido denotativo e mais “concreto” da palavra, dando a idéia de “entorpecentes”. A outra referência, na expressão “droga de amigo” essa mesma palavra possui um valor mais conotativo, servindo como um atributo qualificativo (um adjetivo) a “amigo”. O mesmo se pode dizer do uso e da localização de adjetivos e advérbios na sentença. Apesar de ambos conterem informações similares, do ponto de vista comunicativo, não são a mesma coisa. No primeiro enunciado, a informação tem como referência “todos os jornais”, o “agente” da ação. Ou seja, é a partir desse termo que o falante/escritor organiza o conteúdo. No segundo, o ponto de partida é “o evento”. Desse modo, a informação centra-se no objeto-paciente. Como você pode ver, apesar de possuírem o mesmo conteúdo informacional, as duas sentenças não são exatamente idênticas, uma vez que se organizam a partir de perspectivas diversas. A “opção” por uma ou por outra forma de construção frasal sinaliza propósitos discursivos distintos e, portanto, resultam em diferentes efeitos pragmáticos. Refere-se à situação e à prática intercomunica- tivas, englobando todos os elementos do evento de enunciação (o estatuto dos parceiros envolvidos, as negociações entre estes, os atos de fala realizados, os conhecimentos partilhados, as expectativas em jogo etc.). ConCeito De PragmátiCo “Se o seu amigo usa drogas e você não fala nada, que droga de amigo é você?” (RN Econômico, �99�. p. �.) exemPlo NONO MOMENTO �� Comunicação e Expressão I Anotações Desafio Veja como isso acontece, hipoteticamente, nos seguintes exemplos e tente perceber os diferentes efeitos de sentido. �. Mais vale um cachorro amigo do que um ami- go cachorro. �. a) O pobre homem precisa de ajuda. b) O homem pobre precisa de ajuda. �. a) Você não sabe realmente o que está dizendo. b) Realmente, você não sabe o que está dizendo. �. a) Só eu fui à reunião. b) Eu só fui à reunião. c) Eu fui à reunião só. Observou como não só a escolha das palavras (se substantivo, adjetivo, verbo ou advérbio), mas também suas respectivas posições (ou lugares) na sentença têm conseqüências - positivas ou negativas - para o que se quer dizer? Daí a importância de procurarmos ser mais atentos e criteriosos quanto às nossas leituras e produções textuais. A mesma observação é válida para o uso de prefixos, sufixos e construções gramaticais, os quais podem imprimir ao discurso um tom mais formal/coloquial, mais/menos subjetivo, ou até mesmo revelar traços socioculturais do(s) locutor(es). Veja, por exemplo, as diferenças nos graus de formalismo e de intensificação entre “gente de baixo nível” / ”gentinha” / “gentalha” ou entre “extremamente agitado” / ”superagitado” / “agitado pra caramba” / “agitadésimo” (este último, mais comum na fala coloquial feminina). Observe, ainda, as distinções gramaticais entre “Faça-me um favor” / “Me faz um favor” e “O rapaz de quem lhe falei” / “O rapaz que eu lhe falei”. Veja que as primeiras construções de cada um desses pares são mais comuns e apropriadas em situações comunicativas formais. Outra distinção gramatical importante na construção do discurso tem a ver com o uso ou não do artigo. Por exemplo, há uma enorme diferença significativa entre “A carta ao prefeito foi assinada pelos moradores do bairro” e “A carta ao prefeito foi assinada por moradores do bairro”. No primeiro enunciado, a idéia é que todos os moradores assinaram a carta; no segundo, pressupõe-se que nem todos assinaram a carta. A mesma coisa ocorre com a diferença entre o artigo definido e o indefinido. Suponha que alguém lhe diga, por exemplo: “Eu, meu amigo e seu filhinho fomos à praia. Assim que chegamos lá, o menino lhe pediu dinheiro”. O emprego do artigo definido antes de “menino” levaria você a inferir que se trata do “filhinho” mencionado antes. NONO MOMENTO �� Comunicação e Expressão I Anotações Porém, caso dissesse “... Assim que chegamos lá, um menino lhe pediu dinheiro”, a interpretação é que se trata de outro menino, e não uma segunda referência ao “filhinho”. Ainda com relação a essas questões gramaticais, é importante perceber que, assim como na oralidade o sentido pode ser um ou outro, dependendo do tom de voz dofalante e de uma série de recursos não- verbais, no texto escrito, a expressão de sentido está associada, entre outras coisas, à pontuação. Observe os exemplos hipotéticos que se seguem e analise como a pontuação é importante para o sentido do que se quer comunicar. a- Mentir não dá problema depois. b- Mentir, não; dá problema depois. c- Mentir não dá problema depois? PratiCanDo Note que a sentença sem vírgulas (�.a-) refere-se a qualquer país com essa característica, isto é, a de não tratar a educação como prioridade, tendo como conseqüência o subdesenvolvimento. A segunda (�.b-), com virgulas, tem significação bem diferente da anterior, uma vez que se refere a um país específico (provavelmente já conhecido do interlocutor), o qual, por não priorizar a educação, nunca se desenvolverá. RELEMBRANDO • À “escolha” do vocabulário (substantivos, adjetivos, verbos e advérbios) e à sua importância para a constituição e orientação do discurso; • Ao valor denotativo/conotativo das palavras e às suas possibilidades polissêmicas (poder ter mais de um sentido); 2. a - O país que não trata a educação como prioridade jamais será uma nação desenvolvida. b - O país, que não trata a educação como prioridade, jamais será uma nação desenvolvida. exemPlo NONO MOMENTO �� Comunicação e Expressão I Anotações • Ao uso de “sinônimos”, lembrando que estes são contextuais, não valendo para qualquer situação; • Aos campos lexicais, isto é, às relações associativas entre palavras e expressões de uma mesma área de significados; • Às marcas de sufixo e/ou prefixo nas palavras, pois trazem conteúdo significativo para o discurso; • Às combinações entre as palavras e às suas posições na seqüência da frase; • À pontuação (no texto escrito), pois tem contribuição decisiva no estabelecimento das relações de sentido. Não esquecer que tanto as palavras como sua forma gramatical e as articulações entre si contribuem para revelar aspectos da situação sociocomunicativa, dos interlocutores e de suas intenções discursivas. O QUE FAZER Agora é com você. Leia o texto a seguir e depois tente responder às questões sobre ele. A MOÇA QUE “SASTIFAZ” Luciana Gimenez é um furacão. Nada resiste a ela – nem mesmo o português. A modelo Luciana Gimenez chegou como um furacão à Rede TV!. Em apenas duas semanas à frente do Superpop, que vai ao ar todos os dias a partir das 21h45,... vem sustentando uma guerrilha contra a língua portuguesa. “Estou aqui para entertenir vocês”, disse ela quinze dias atrás, num dos seus freqüentes ataques à inculta e bela. “É que eu morei onze anos fora do país e às vezes me confundo”, justifica-se a “entertenedora”. Além de assassinar o idioma, Luciana faz questão de mostrar o tempo todo sua sintonia com o peculiar universo das amebas. (...) (VALLADARES, 2001. p. 124) NONO MOMENTO �� Comunicação e Expressão I Anotações Observe que o locutor utilizou o vocábulo “furacão” (no resumo e na �ª linha do texto) relacionado a Luciana Gimenez. Justifique essa escolha. O produtor do texto empregou palavras de forte conteúdo negativo em relação aos deslizes lingüísticos de Luciana Gimenez. Cite-os e depois diga que ponto de vista ele expressa com isso. Note que, em vez de dizer “informou” ou “esclareceu”, o locutor preferiu “justifica-se” (na penúltima linha). Esclareça por quê. Por que o locutor referiu-se à apresentadora como “entertenedora”, marcando essa palavra com aspas? A informação “Luciana faz questão de mostrar o tempo todo sua sintonia com o peculiar universo das amebas” (nas duas últimas linhas) deve ser entendida literalmente (denotativamente)? Explique-a, relacionando à provável intenção do locutor. Leia novamente o título do texto e comente a forma da palavra “sastifaz” baseando-se no conteúdo da reportagem. Essa reportagem representa um discurso social com uma perspectiva ideológica sobre o uso da língua. Diga qual. PARA SABER MAIS TERRA, E.; NICOLA, J. de. Práticas de linguagem: leitura e produção de textos. Ensino Médio. São Paulo: Scipione, �00�. Embora seja uma obra voltada para o Ensino Médio, esse livro traz boas orientações sobre leitura e produção de textos, mesmo para alunos que já estão em nível de graduação. Os capítulos ��, �� e �� abordam mais especificamente as questões em torno do uso do vocabulário e da gramática no texto. ONDE ENCONTRAR FIORIN, J. L.; SAVIOLI, F. P. Para entender o texto: leitura e redação. 6. ed. São Paulo: Ática, �99�. TERRA, E.; NICOLA, J. de. Práticas de linguagem: leitura e produção de textos. São Paulo: Scipione, �00�. TRAVAGLIA, L. C. Gramática e interação: uma proposta para o ensino de �º e �º graus. �. ed. São Paulo: Cortez, �00�. �. �. �. �. �. 6. �. NONO MOMENTO �6 Comunicação e Expressão I NONO MOMENTO
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