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Semiologia | Ana Beatriz Rodrigues e Gleysla Silva 1 Consulta do adolescente INTRODUÇÃO A adolescência pode ser entendida como o processo de passagem da vida infantil para a vida adulta. Para a Organização Mundial de Saúde entende-se por adolescência a faixa etária entre 10 e 19 anos, período da vida caracterizado por intenso crescimento e desenvolvimento, que se manifesta por transformações anatômicas, fisiológicas, psicológicas e sociais. Enquanto que a ECA define a adolescia como o período de 12 a 18 anos incompletos. Na adolescência, a relação paciente-médico deve se estabelecer diretamente com o paciente, mas a família deve ser necessariamente incluída, a não ser nos casos em que o adolescente vive sozinho, sendo responsável por si próprio. Por essa razão, sugere-se que a consulta seja realizada em três tempos: PRIMEIRO MOMENTO – Adolescente + familiar/responsável. Oportunidade para se investigar: • Motivo • História atual e pregressa • Estado vacinal: fase normalmente com grande negligência • Antecedentes gestacional e neonatal • Hábitos alimentares • Rendimento escolar, ambiente violente • História familiar • Sono, lazer, exercício físico *Sono: normalmente relacionado com hábitos inadequados SEGUNDO MOMENTO – Adolescente. Completa-se a consulta no que se refere à anamnese, realiza-se o exame físico, elaboram- se as hipóteses diagnósticas, que são apresentadas e discutidas com ele, bem como o plano terapêutico. • Reabordar motivo da consulta • Percepção corporal e autoestima • Relacionamento com a família, amigos, escola • Situação de risco e vulnerabilidade (drogas) • Comportamentos sexuais, orientação sexual • Submissão a violências • Projeto de vida TERCEIRO MOMENTO – Pais/responsáveis. Aborda os assuntos: • Diagnósticos e o tratamento a ser realizado • Esclarece as dúvidas ainda existentes A realização da consulta medica em três tempos deve ser entendida de maneira flexível e adaptada a cada situação particular. ABORDAGEM ÉTICA NA CONSULTA • Privacidade • Confidencialidade • Autonomia • Evitar julgamentos • Sigilo: o adolescente precisa estar seguro do caráter confidencial da consulta, garantido pelo código de ética médica, mas ficar ciente também das situações nas quais o sigilo poderá ser rompido; isso, no entanto, só ocorrerá com seu conhecimento, sendo transmitido à família apenas o que for absolutamente necessário, como nas situações de risco de vida do paciente e de outras pessoas (gravidez, uso de drogas, risco de suicídio etc Quebra do sigilo Manutenção do sigilo Presença de qualquer tipo de violência Ficar, namorar, iniciação sexual (excluída violência por sedução ou imposição explicita) Uso excessivo de álcool e outras drogas; sinais de dependência química Experimentação de psicoativos (sem sinais de dependência) Autoagressão, ideações suicidas ou de fuga de casa; tendência homicida Orientação sexual, conflitos com identidade de gênero 2 Gravidez; abortamento Prescrição de contraceptivos (para adolescente com maturidade para adesão) Sorologia positiva de HIV (comunicar aos familiares e à parceira sexual) IST (afastada violência sexual e desde que adolescente tenha maturidade para adesão ao tratamento) Não adesão a tratamentos, deixando o adolescente ou terceiros em risco Diagnostico de doenças graves, quadros depressivos e outros transtornos mentais ANAMNESE Além da atenção sempre necessária às moléstias, deve haver especial interesse pelo paciente e pelo contexto familiar e social, indispensável para a compreensão dos problemas apresentados. Na maioria das vezes, o adolescente não procura o médico espontaneamente. É levado pelos pais e, com certa frequência, contra a sua vontade. Assim, é comum se defrontar com um jovem ansioso, inseguro, com medo ou, pelo contrário, assumindo uma atitude de enfrentamento, de alheamento e do mais absoluto silêncio. A maior parte da anamnese é realizada no segundo tempo da consulta com o adolescente. Nas situações em que o jovem vem ao médico por estar ou porque teme estar com uma doença, o esquema semiológico clássico é um bom instrumento. Contudo, se o motivo da consulta não é uma doença orgânica, buscam- se formas de desenvolver a entrevista, a qual pode se desenrolar com flexibilidade, abordando diversas necessidades do paciente e da família ou percebidas pelo próprio médico. De qualquer modo, a anamnese não pode deixar de procurar alguma queixa, qual o motivo da consulta e qual a demanda que traz aquele paciente a um atendimento médico. A história da moléstia atual deve ser coletada com o adolescente, mesmo que existam informações prévias do acompanhante, podendo coincidir ou não com a referida pelo familiar. Na parte da anamnese realizada com a família, pode ser útil a investigação cuidadosa dos antecedentes pessoais fisiológicos e patológicos, pois muitos dos problemas que eclodem na adolescência tiveram sua origem na infância, sobretudo no que se refere aos problemas psicossociais. Nos espaços permitidos pela anamnese é necessário abordar os aspectos gerais: vida familiar, escolar, afetiva e social, trabalho e aspectos da sexualidade, incluindo educação e vida sexual, e experimentações de substâncias, se pertinentes. A compreensão do laço social é muito importante para a avaliação das questões psíquicas. EXAME FÍSICO Deve sempre ser perguntado ao adolescente se deseja ou não um acompanhante durante o exame, até os 16 anos de idade recomenda-se ter uma terceira pessoa. O exame físico deve ser realizado no segundo tempo da consulta, isto é, quase sempre sem a presença do familiar, o que costuma constranger o adolescente. O exame deve ser completo e detalhado. O roteiro é o clássico, incluindo aspecto geral, peso, altura, IMC, temperatura, pressão arterial e avaliação dos diversos aparelhos. Deve ser feito o estadiamento puberal, seguindo os critérios de Tanner. A observação da velocidade de crescimento e da progressão dos estágios de Tanner é fundamental para a compreensão da puberdade. Esse momento também possibilita o aprofundamento sobre aspectos mais íntimos, desde que se crie um clima de segurança e confiança. Alguns aspectos devem ser levados em consideração pelo profissional, incluindo a compreensão sobre o significado do corpo e da imagem corporal para o adolescente, o respeito ao pudor, o esclarecimento sobre os procedimentos a serem realizados e a importância do exame. Semiologia | Ana Beatriz Rodrigues e Gleysla Silva 3 ECTOSCOPIA E EXAME GERAL O peso e a estatura são fundamentais para a análise do crescimento, que é um aspecto muito importante dessa fase. O exame da pele, especialmente a da face, deve ser cuidadoso, considerando-se a alta frequência de acne, uma patologia própria desse período e que, na maioria das vezes, não é trazida como queixa, a não ser em suas formas graves. EXAME DOS ÓRGÃOS E SISTEMAS O exame dos genitais é obrigatório nos adolescentes, mesmo quando não há queixas, com o objetivo de determinar a maturação sexual, o que deve ser explicado ao paciente para facilitar sua aceitação. A realização desse exame nem sempre é possível em uma primeira consulta, devendo ser completado, no entanto, em outro atendimento. Na puberdade observa-se um período de aceleração da velocidade de crescimento, denominado estirão puberal. Durante a puberdade, há ganho de aproximadamente 50% do peso e 20% da altura do adulto. O estirão coincide com os estágios 2 a 3 de Tanner no sexo feminino e 3 a 4 no masculino. A amplitude do estirão é maior nos meninos, os quais crescem até aproximadamente 18 a 20 anos, dependendo da idade de início do processo. O estirão compreende o crescimento do esqueleto e dos órgãos internos, com alteração das proporções corporais. Nessemomento ocorre o pico de aquisição da massa óssea, responsável, em parte, pela aquisição de 45% da massa óssea total. Há aumento da gordura, especialmente nas meninas, e dos músculos, especialmente nos meninos. O desenvolvimento dos sistemas circulatório e respiratório resulta no aumento de força e resistência. Na adolescente, o exame ginecológico completo será obrigatório nas seguintes circunstâncias: • Adolescentes com atividade sexual. • Adolescentes com vulvovaginites rebeldes aos tratamentos de rotina. • Adolescentes, nos 2 primeiros anos após a menarca, com amenorreia superior a 6 meses. • Adolescentes, com mais de 2 anos após a menarca, com amenorreia superior a 4 meses. • Adolescentes com amenorreia de qualquer duração, apresentando hirsutismo ou galactorreia. • Adolescentes com dismenorreia importante, rebelde aos tratamentos de rotina. • Adolescentes que não apresentarem menarca até os 16 anos. • Adolescentes com dor abdominal ou dor pélvica importante. O exame ginecológico deve ser precedido de ampla explicação para que a paciente possa se submeter a ele com tranquilidade. Se houver recusa peremptória, deve-se adiá-lo para uma próxima consulta. Após o exame físico (orientações) • Uso de preservativo (masculino e feminino) • Uso dos contraceptivos para a prevenção de gravidez e infecções sexualmente transmissíveis • Para adolescentes que já iniciaram atividades sexuais, ou apresentaram algum problema geniturinário, ressaltar a higiene, o autocuidado e a prevenção de IST e gravidez RESUMO Avaliação da puberdade - Maturação sexual (sexos masculino e feminino): tabelas de Tanner, varicocele etc. - Crescimento físico: gráficos de crescimento, IMC Avaliação da adolescência (passagem da família para o laço social) - Vínculos familiares: pai, mãe, irmãos (um a um) - Socialização: amigos, amigas, vida social (conversar livre, mas detalhadamente) - Vacinas (antecedentes, atualização) - Atividade física (esporte e lazer: tipo, intensidade, excessos) - Estudo e trabalho: interesse, rendimento, escolha de profissão, tipo e relação no trabalho 4 - Nutrição e hábitos alimentares (monotonia alimentar, ferro e cálcio, relação com o corpo e o alimento, manias, tendência obsessiva) - Hábitos de vida: sono, cigarro, bebidas alcoólicas, experimentações, transgressões etc. Sexualidade: interesses, namoro, vida sexual, contracepção, DST/AIDS, abusos - Ambiente social, violência MATURAÇÃO SEXUAL – CRITÉRIOS DE TANNER A maturação sexual foi estudada por Marshall e Tanner, que a classificaram de acordo com sequencia cronológica de modificações (condições nomais) em cinco estágios, levando em conta, no sexo feminino, o desenvolvimento mamário (telarca) e a quantidade e distribuição de pelos pubianos (pubarca) e, no sexo masculino, o aspecto dos órgãos genitais (aumento testicular e crescimento do pênis) e também a quantidade e a distribuição de pelos pubianos FEMININA MASCULINA Semiologia | Ana Beatriz Rodrigues e Gleysla Silva 5
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