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TRANSTORNOS RELACIONADOS À COCAÍNA A cocaína é uma das drogas ilícitas mais aditivas e perigosas, atualmente consumida por 0,3% da população mundial. A prevalência entre os homens é duas vezes maior do que entre as mulheres, com variações relacionadas à idade, sendo mais comum nos adultos jovens. É derivada das folhas de coca (Erytrhoxylon coca) e posteriormente transformada em vários subprodutos: crack, merla e produto refinado (“pó”). O consumo da substância pode se dar por qualquer via de administração, com rápida e eficaz absorção pelas mucosas oral, nasal e pulmonar. O mecanismo de ação se dá principalmente pela inibição da recaptação de dopamina, mas há também bloqueio da recaptação da noradrenalina e da serotonina. A euforia desencadeada reforça e motiva, na maioria dos indivíduos, o desejo por um novo episódio de consumo. Quanto mais rápido o início da ação, quanto maior a sua intensidade e quanto menor a duração, maior a chance de o indivíduo evoluir para situações de uso nocivo e dependência. Desse modo, a via de administração é um importante fator de risco para este comportamento prejudicial; as vias endovenosas e pulmonar (crack) parecem ser as vias de maior risco. Metabólitos podem ser detectados na urina em até dez dias após o consumo DIAGNÓSTICO E CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS Deve-se suspeitar de uso de cocaína em indivíduos que apresentem mudanças em seu comportamento habitual, tais como irritabilidade, capacidade comprometida para concentrar-se, comportamento compulsivo, insônia severa e perda de peso. Os colegas de trabalho e a família podem perceber uma incapacidade para executar tarefas esperadas associadas com o trabalho e a vida familiar. Os critérios para dependência de cocaína são semelhantes àqueles para as outras substâncias (desejo compulsivo de consumo, tolerância, abstinência, abandono progressivo de outras atividades, persistência do uso a despeito de prejuízo etc.). Seu uso está associado a complicações agudas e crônicas MANIFESTAÇÕES AGUDAS A cocaína possui múltiplas ações periféricas e centrais, ligadas ao seu efeito estimulante. Os efeitos agudos produzem sinais e sintomas psíquicos e físicos. Geralmente ocorre euforia, aumento do estado de vigília, aumento da autoestima, melhor desempenho em atividades físicas e psíquicas. Pode haver delírios persecutórios e alucinações, os quais melhoram depois de cessado o efeito da droga. Os efeitos físicos estão ligados à hiperatividade autonômica: taquicardia, hipertensão arterial, taquipneia, hipertermia, sudorese, tremor leve de extremidades, tiques, midríase, espasmos musculares (língua e mandíbula), vasoconstricção. Há também efeito anestésico. INTOXICAÇÕES AGUDAS E OVERDOSE Doses maiores estão associadas a irritabilidade, sintomas maníacos, agitação, comportamento sexual compulsivo. Estas doses também estão associadas a complicações clínicas, ligadas à ação simpaticomimética. A overdose pode ser definida como a falência de um ou mais órgãos decorrentes do uso agudo da substância e é uma emergência clínica que requer atenção imediata. Os principais sistemas afetados costumam ser o cardiovascular e o sistema nervoso central ABSTINÊNCIA Após a cessação do uso de cocaína ou após a intoxicação aguda, a depressão pós-intoxicação (“aterrisagem”) caracteriza-se por disforia, anedonia, ansiedade, irritabilidade, fadiga, hipersonolência e, ocasionalmente, agitação. Pode haver também ideação suicida. Com o uso de cocaína leve a moderado, esses sintomas de abstinência costumam melhorar em até vinte e quatro horas; porém, com o uso pesado, podem durar até uma semana. No estado de abstinência, a avidez por cocaína pode ser poderosa e intensa, pois o indivíduo sabe que o consumo de cocaína pode aliviar estes sintomas. SISTEMA CARDIOVASCULAR As complicações cardiovasculares decorrentes do uso de cocaína são as mais frequentes entre as complicações não psiquiátricas. A angina pectoris é a queixa mais recorrente e não há diferença clínica entre esta e a angina ocasiona da em outras situações. O infarto do miocárdio também foi relatado como uma complicação, geralmente em indivíduos coronariopatas e tabagistas. Pode haver, ainda, arritmias induzidas pela cocaína SISTEMA NERVOSO CENTRAL As complicações do uso de cocaína neste sistema têm como substrato principalmente a vasoconstricção, que causa principalmente eventos vasculares cerebrais isquêmicos (ataques isquêmicos transitórios, infartos cerebrais isquêmicos). Pode haver também infartos hemorrágicos cerebrais e medulares. Além disso, há relatos de convulsões tônico-clônicas em 3 a 8% dos atendimentos relacionados à cocaína nas salas de emergência. A cocaína é a substância de abuso mais ligada a esta complicação; a segunda é a anfetamina MORTE Altas doses de cocaína estão associadas a convulsões, depressão respiratória, doenças cerebrovasculares e infarto do miocárdio, que podem levar à morte. GRAVIDEZ O consumo de cocaína durante a gravidez está associado a complicações, tais como: baixo peso ao nascer, abortos espontâneos e déficits cognitivos ao recém-nascido COMPLICAÇÕES PSIQUIÁTRICAS AGUDAS As complicações psiquiátricas são o principal motivo de busca por atenção médica entre os usuários de cocaína, podem decorrer tanto de episódios de intoxicação quanto da síndrome de abstinência. Mesmo quando os sintomas psiquiátricos são evidentes, podem decorrer de condições clínicas, tais como hipoglicemia e distúrbios metabólicos. Desse modo, uma avaliação clínica é sempre desejável. Pode haver transtornos de humor relacionados à cocaína, sendo que os sintomas maníacos frequentemente ocorrem na intoxicação, enquanto que sintomas depressivos estão mais associados à abstinência. A presença de sintomas psicóticos que ocasionalmente ocorrem na intoxicação por cocaína, tais como delírios persecutórios; alucinações podem desaparecer espontaneamente após algumas horas, ao final da ação da cocaína. Agitações extremas, decorrentes destes sinto mas, podem necessitar de abordagem farmacológica, com benzodiazepínicos ou antipsicóticos. Deve-se evitar o uso de antipsicóticos de baixa potência, como clorpromazina, pelo fato desta medicação provocar redução no limiar convulsivo. TRATAMENTO O maior obstáculo a ser superado no tratamento dos transtornos relacionados à cocaína é a intensa avidez do paciente pela droga. No entanto, até o momento, nenhum medicamento mostrou-se eficaz para proporcionar alívio aos sintomas de abstinência. Desse modo, os reforçadores negativos, como problemas no trabalho e na família, se colocam como importantes na motivação do paciente pelo tratamento. Intervenções psicológicas em grupo, familiares ou individuais, e grupos de apoio, como os Narcóticos Anônimos (NA) podem ajudar.
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