especialmente a de baixa renda. Dessa forma, a população desprovida de recursos é levada a ocupar irregularmente áreas inadequadas e precárias em termos de infra-estrutura urbana e serviços públicos essenciais, estimuladas pelo aumento das desigualdades sociais na cidade. A atual organização espacial das grandes ci- dades Você já sabe que as grandes cidades são marcadas por profundos contrastes e desigualdades. Portanto, mais do que nunca, as grandes cidades do mundo albergam tanto grandes concentrações de poder e riqueza como desconcertantes si- tuações de desigualdade e pobreza, caracterizando a justapo- sição de vidas e meios de vida. O fenômeno da globalização e a disseminação das tecnolo- gias da informação intensificaram o processo de urbanização, tornando as cidades um lugar de encontro de culturas, línguas e origens. Neste contexto, os impactos da globalização e das transformações econômicas sobre a estrutura das cidades passaram a ocupar destaque na reflexão atual sobre as metrópoles mun- diais, onde estão presentes preocupações com o desenvolvimento, a desigualdade, a segregação e a fragmentação do espaço. O debate contemporâneo em torno das alterações na estrutura das grandes cidades destaca a tese da cidade global, segundo a qual as grandes cidades estariam em processo de reestruturação sob o impacto das transformações da globalização econômica na base produtiva e no mercado de trabalho. Cidade global (Global city) O termo foi elaborado pela socióloga Saskia Sassen em 1991, segundo a qual as cidades globais exercem influência econômica, política e cultural a nível mundial. Outras características fundamentais das cidades globais são as seguintes: ser mundialmente conhe- cidas; ter influência ativa em eventos internacionais como a cidade de Nova Iorque, que sedia a ONU, e de Bruxelas, onde se encontram as sedes da OTAN e da União Euro- peia, além de possuírem uma grande população e um sistema de transporte avançado e eficiente; ter um aeroporto interna- cional de grande porte e uma bolsa de valores com influência na economia mundial; possuir in- fraestrutura de comunica- ções avançada, presença de sedes de grandes companhias transnacio- nais e de uma abun- dante oferta de serviços financeiros, tecnológicos e de consultoria. Assim, cidades como Bruxelas, Chicago, Cingapura, Hong Kong, Londres, Madri, Milão, Moscou, Nova Iorque, Paris, Seul, São Francisco, São Paulo, Shangai, Sydney, Tóquio, Toronto e Washington são consideradas globais. 162 Aula 17 • As cidades e os espaços urbanos A hipótese central da tese da cidade global é a existência de relações estruturais entre as transformações econômicas e a intensificação da dualização da estrutura social. Saskia Sassen (1998) estrutura a tese sobre a dualidade social a partir da idéia de que o processo de reestruturação econômica teria configu- rado, nos países capitalistas centrais, sociedades pós-industriais cuja dinâmica econômica seria determinada pelos serviços finan- ceiros, informacionais e de alta tecnologia. Como consequência, o mercado de trabalho teria se altera- do, evidenciando uma estrutura sócio-ocupacional em cujo topo estariam situadas categorias profissionais superiores, altamente qualificadas e bem remuneradas, em contraste com uma base constituída por categorias profissionais inferiores, compostas por pessoas em empregos formais e informais de baixa remune- ração ou desempregadas. Assim, a estrutura social das grandes cidades tenderia à dualização, ou seja, ao aumento da distância entre as duas posições sociais, inferiores e superiores, e a con- tração das camadas médias. Figura 18.1: Nova Iorque, exemplo de cidade global. Fonte: http://www.sxc.hu/photo/793764 Módulo 4 • Turismo e Sociedade 163 Segregação espacial O termo é usado para indicar a divisão ou a separação espacial de distintos grupos de população e refere-se à tendência de concen- tração de um grupo ou classe social no espaço urbano, sendo, portanto, a materialização espacial da desigualdade social. Para Roberto Lobato Cor- rêa (1969), o processo de segregação origina uma organização espacial, marcada por áreas de forte homogeneidade social interna e de forte disparidade social entre elas. A segregação social é um fenômeno impor- tante no estudo sobre as cidades, pois as regras que organizam o espaço urbano são estruturadas basicamente por padrões de diferenciação social que indicam, sobretudo, como os grupos sociais se inter-relacionam no espaço da cidade. Assim, a segregação é um processo fundamental para a compreensão da estrutura espacial intraur- bana, enquanto elemento de diferenciação social, constituindo-se em um problema que suscita discussões e análises sistemáticas. Dessa for- ma, a explicação da seg- regação urbana pode ser buscada nos mecanismos desiguais e excludentes inerentes à sociedade de classes. Por sua vez, o impacto espacial da dualização social con- figuraria áreas demarcadas por padrões sociais diferenciados que levariam, de um lado, à apropriação exclusiva dos espaços mais valorizados e, de outro, à configuração de espaços exclusivos da pobreza. A idéia de dualidade estaria baseada, portanto, na di- ferenciação social e espacial entre as áreas centrais prósperas, onde se localizam os grupos sociais mais abastados, e os enclaves, próximos geograficamente, onde haveria concentração de pobreza. Nesse contexto, constata-se a expansão de novas formas de produção dos espaços urbanos, indicando mudanças na organização e no padrão de ocupação em áreas das grandes cidades, marcadas pelas novas formas de segregação espacial, tanto em áreas centrais quanto em áreas periféricas. De acor- do com estudos recentes sobre as principais cidades latino- americanas, essas novas formas de segregação urbana estariam sendo estimuladas pelo aumento das desigualdades sociais e corresponderiam a uma diminuição da distância física entre ricos e pobres. Tal fenômeno tornaria os mecanismos de se- paração social mais evidentes, causando novos problemas ou possibilidades inéditas de interação social. O aumento da pobreza pode não ter acarretado uma so- ciedade dualizada, como defende Sassen (1998), porém a con- vivência espacial entre diferentes segmentos da estrutura social alimenta formas de produção do espaço que modificam as práticas cotidianas na cidade. Os habitantes da cidade formal, preocupados com a violência e com a proximidade física dos pobres, utilizam mecanismos de apartação social, como muros, grades e guaritas, além de equipamentos de controle e de segurança, que se espalham nos grandes centros urbanos. Os espaços públicos passam a ser substituídos por com- plexos fechados e bairros controlados pela vigilância ele- trônica, verdadeiras “cidadelas” que garantem que os mais pobres fiquem de fora da vizinhança. Com isso, observa-se a expansão de espaços residenciais e comerciais exclusivos, com a privatização de espaços públicos, já que há o fechamento 164 Aula 17 • As cidades e os espaços urbanos de ruas e de praças para garantir a segurança de setores da população ameaçados pelas “classes perigosas”. Trata-se do processo de segregação social que se apresenta sob a forma de condomínios residenciais, centros comerciais, resorts, espaços de lazer e entretenimento de alta qualidade, voltados para determinados segmentos sociais. A expansão desses empreendimentos imobiliários vem causando mudanças nos padrões de uso dos espaços urbanos e desdobramentos sobre a sociabilidade nas cidades. É importante ressaltar que, embora os mecanismos de separação social dependam da cidade, de suas especificidades e história locais, da sua mistura de classes e mesmo da vida cotidiana, este cenário vem expressando uma tendência de aumento da segregação urbana