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Julia Paris Malaco – ambulatório cardiologia Doença arterial coronariana A cardiopatia isquêmica (CI) é definida como doença arterial coronariana (DAC) relacionada à aterosclerose, com obstrução do fluxo sanguíneo, resultando em uma diminuição da distribuição de oxigênio para o miocárdio. Ela pode ser causada também por espasmo coronário, alteração da reserva vasodilatadora coronária ou por trombose e apresenta diferentes espectros de doença de acordo com o grau de obstrução e a natureza aguda ou crônica. A origem da DAC é multifatorial, com componente inflamatório importante, tendo evolução crônica. Esta pode apresentar- se, clinicamente, de várias formas: morte súbita, infarto agudo do miocárdio (IAM), angina estável, angina instável, insuficiência cardíaca, arritmias e isquemia silenciosa (alteração em testes funcionais sem sintomas). Neste capítulo, é abordada a angina estável, uma das formas de apresentação da CI. A angina estável refere-se à síndrome clínica caracterizada por desconforto ou dor no tórax, no epigástrio, na mandíbula, no ombro, no dorso ou nos membros superiores, tipicamente desencadeada por exercícios ou estresse emocional e aliviada por repouso ou com uso de nitratos. A principal causa é o processo aterosclerótico nas artérias coronárias, entretanto outras condições, como a miocardiopatia hipertrófica ou dilatada, a estenose aórtica ou a hipertensão arterial sistêmica não controlada, podem levar à isquemia miocárdica e produzir sintomas semelhantes. O desenvolvimento de placas ateroscleróticas está associado principalmente à presença de fatores de risco, que aumentam a probabilidade do diagnóstico de angina estável: Idade aumentada (homens com idade igual ou superior a 45 anos; mulheres com idade igual ou superior a 55 anos). Sexo masculino. Fatores de risco cardiovascular: hipertensão arterial sistêmica (HAS); dislipidemia; diabetes melito; história de tabagismo; história familiar prematura de DAC (pai ou irmão com IAM definitivo ou morte súbita com idade igual ou inferior a 55 anos; mãe ou irmã com IAM definitivo com idade igual ou inferior a 65 anos); presença de outra doença cardiovascular. Obesidade, hipertentao, sedentarismo A doença arterial coronariana é, na maioria das vezes, provocada pelo depósito gradual de colesterol e outras matérias gordurosas (denominadas placas de ateroma ou placas ateroscleróticas) na parede de uma artéria coronariana. Esse processo é denominado aterosclerose e pode afetar muitas artérias, não apenas as que se encontram no coração. A razão mais comum da redução anormal do fluxo sanguíneo para o coração é Aterosclerose Outras causas de redução anormal do fluxo de sangue para o coração incluem Espasmo de uma artéria coronariana, que pode ocorrer espontaneamente ou como resultado do uso de certas drogas, como a cocaína e a nicotina. Disfunção endotelial, o que significa que um vaso sanguíneo coronariano não se dilata em resposta à necessidade de maior fluxo de sangue (como durante o exercício), resultando em menos fluxo de sangue do que o coração precisa Defeitos congênitos (por exemplo, anormalidades da artéria coronária) Dissecção da artéria coronária (uma ruptura que desce percorrendo o revestimento de uma artéria coronária) Lúpus eritematoso sistêmico (LES ou lúpus) Inflamação das artérias (arterite) Um coágulo de sangue que viajou de uma câmara do coração para uma das artérias coronárias Lesão física (devido a uma lesão ou radioterapia) Quando os ateromas aumentam de tamanho, podem formar uma protuberância nas artérias, estreitando seu interior (lúmen) e bloqueando parcialmente o fluxo de sangue. Com o passar do tempo, há o acúmulo de cálcio no ateroma. À medida que um ateroma vai obstruindo gradativamente uma artéria coronariana, o fornecimento de sangue rico em oxigênio para o músculo cardíaco (miocárdio) pode se tornar inadequado. O fornecimento de sangue tende a não ser suficiente durante o esforço físico, quando o músculo cardíaco necessita de mais sangue. O transporte inadequado de sangue ao músculo cardíaco (devido a qualquer motivo) denomina- se isquemia do miocárdio. Se o coração não receber sangue suficiente, ele pode não https://www.msdmanuals.com/pt-br/casa/dist%C3%BArbios-do-cora%C3%A7%C3%A3o-e-dos-vasos-sangu%C3%ADneos/aterosclerose/aterosclerose https://www.msdmanuals.com/pt-br/casa/problemas-de-sa%C3%BAde-infantil/defeitos-cong%C3%AAnitos-do-cora%C3%A7%C3%A3o/considera%C3%A7%C3%B5es-gerais-sobre-defeitos-card%C3%ADacos https://www.msdmanuals.com/pt-br/casa/dist%C3%BArbios-%C3%B3sseos,-articulares-e-musculares/doen%C3%A7as-autoimunes-do-tecido-conjuntivo/l%C3%BApus-eritematoso-sist%C3%AAmico-les Julia Paris Malaco – ambulatório cardiologia conseguir se contrair nem bombear sangue normalmente. Um ateroma, mesmo um que não esteja bloqueando muito o fluxo sanguíneo, pode se romper repentinamente. Tal ruptura do ateroma desencadeia, em geral, a formação de um coágulo sanguíneo (trombo). O coágulo continua a estreitar a artéria podendo bloqueá-la completamente, causando isquemia do miocárdio aguda. As consequências da isquemia aguda são conhecidas como síndromes coronarianas agudas. Essas síndromes incluem a angina instável e diversos tipos de ataque cardíaco, que variam de acordo com o local e o grau da obstrução. No ataque cardíaco, a área do músculo cardíaco que recebe o fornecimento de sangue da artéria bloqueada morre (evento denominado infarto do miocárdio). Fisiopatologia O processo fisiopatológico responsável pela angina estável é a diminuição crônica da luz da artéria coronária por aterosclerose, que leva a uma diminuição do fluxo sanguíneo. Quando a necessidade de oxigênio pelo miocárdio aumenta, como durante atividade física, a distribuição de sangue pode não ser suficiente, surgindo sintomas de isquemia miocárdica, como a angina. Os sintomas isquêmicos, como dor ou desconforto torácico, costumam surgir quando mais de 70% do diâmetro de um vaso epicárdico ou mais de 50% do tronco da coronária esquerda está comprometido. As oclusões que se desenvolvem lentamente podem estimular, ao longo do tempo, a formação de vasos colaterais. A inflamação tem sido relacionada a diversos estágios de desenvolvimento da placa vulnerável, desde a deposição de conteúdo lipídico até a ruptura de placa e as complicações trombóticas. Isquemia por Aumento da Demanda de O2: Nestes casos, há algum fator desencadeante que leva a um aumento desproporcional do consumo de O2. Este aumento pode ocorrer por aumento da massa miocárdica total, como ocorre nos casos de hipertrofia ventricular esquerda (HVE) ou nos casos de dilatação ventricular importante. Também pode ocorrer aumento da demanda por aumento do trabalho cardíaco, como ocorre nos episódios de taquiarritmias ou de hipertensão arterial sistêmica grave. O aumento do consumo também pode ser secundário a quadro clínico sistêmico de aumento de demanda, como ocorre na tireotoxicose ou na sepse. Isquemia por Diminuição da Oferta de O2: A diminuição da oferta de oxigênio para o miocárdio pode ocorrer por diminuição do fluxo sanguíneo para o miocárdio ou por diminuição na capacidade de transporte de oxigênio pelo sangue. Em situações de hipoxemia e/ou anemia importantes, a quantidade total de oxigênio circulando no sangue encontra-se diminuída e pode levar à isquemia miocárdica. As alterações do fluxo sanguíneo podem ocorrer tanto por obstruções coronarianas fixas, como as que ocorrem na doença arterial coronariana por aterosclerose, quanto por compressão extrínseca, como em algumas cardiopatias congênitas, ou ainda por espasmo coronariano, discutido adiante. Também podem ocorrer alteraçõesmicrovasculares, como na síndrome metabólica. Por fim, alterações de viscosidade sanguínea também podem interferir com o fluxo sanguíneo normal. Síndromes de hiperviscosidade como as crises de falcização da anemia falciforme, poliglobulia e trombocitose podem desencadear angina por diminuição do fluxo sanguíneo. Quadro clinico Angina Estável: É a forma mais comum de apresentação da doença arterial coronariana crônica. A descrição clínica clássica é de desconforto ou dor torácica de caráter opressivo, constritivo, em aperto, em queimação, com irradiação para a face ulnar do membro superior esquerdo, pescoço, mandíbula ou arcada dentária, desencadeada pelos esforços ou estresse emocional e aliviada com repouso ou uso de nitratos. Pacientes idosos, mulheres e diabéticos podem ter sintomas pouco característicos, como cansaço, dispneia, tontura ou síncope. Estes recebem o nome de equivalentes isquêmicos. O episódio típico de angina tem início gradual com o desencadeante físico ou emocional e https://www.msdmanuals.com/pt-br/casa/dist%C3%BArbios-do-cora%C3%A7%C3%A3o-e-dos-vasos-sangu%C3%ADneos/doen%C3%A7a-arterial-coronariana/s%C3%ADndromes-coronarianas-agudas-ataque-card%C3%ADaco-infarto-do-mioc%C3%A1rdio-angina-inst%C3%A1vel https://www.msdmanuals.com/pt-br/casa/dist%C3%BArbios-do-cora%C3%A7%C3%A3o-e-dos-vasos-sangu%C3%ADneos/doen%C3%A7a-arterial-coronariana/s%C3%ADndromes-coronarianas-agudas-ataque-card%C3%ADaco-infarto-do-mioc%C3%A1rdio-angina-inst%C3%A1vel https://www.msdmanuals.com/pt-br/casa/dist%C3%BArbios-do-cora%C3%A7%C3%A3o-e-dos-vasos-sangu%C3%ADneos/doen%C3%A7a-arterial-coronariana/s%C3%ADndromes-coronarianas-agudas-ataque-card%C3%ADaco-infarto-do-mioc%C3%A1rdio-angina-inst%C3%A1vel Julia Paris Malaco – ambulatório cardiologia duração de até 5 a 10 minutos, com melhora após o repouso. A duração de poucos segundos é extremamente incomum. Alguns pacientes apresentam a alimentação ou o frio como desencadeantes dos episódios de angina. Isquemia Silenciosa: A isquemia silenciosa é definida como episódios de isquemia sem qualquer manifestação clínica associada. Mesmo assintomáticos, esses pacientes têm um risco aumentado de eventos. Miocardiopatia Isquêmica: Pacientes com doença arterial coronariana grave, principalmente após evento coronariano agudo, podem evoluir com disfunção ventricular em graus variáveis. Atualmente, a DAC é a principal causa de insuficiência cardíaca nos EUA. O termo miocardiopatia isquêmica é utilizado para descrever pacientes que evoluem com disfunção ventricular secundária à doença arterial coronariana. Além da disfunção ventricular pela DAC, estes pacientes podem apresentar sintomas de insuficiência cardíaca por alteração no remodelamento associada à formação de aneurismas ou pelo desenvolvimento de insuficiência mitral isquêmica. Estes pacientes costumam ter sintomas clínicos predominantes de insuficiência cardíaca esquerda, com dispneia aos esforços, ortopneia e dispneia paroxística noturna. No entanto, não é incomum a sobreposição dos sintomas isquêmicos aos sintomas de insuficiência cardíaca. Além disso, estes pacientes podem ter sintomas de insuficiência cardíaca como manifestação de um equivalente isquêmico Exames Os exames laboratoriais devem fornecer informações sobre possíveis causas de isquemia e diagnosticar fatores de risco associados. Recomenda-se para todos os pacientes a solicitação de creatinina sérica, para avaliação da função renal; hemograma completo, para saber se há anemia, e valor prognóstico da série branca. Caso haja suspeita de doença de tireoide, solicita-se exame para verificação dos hormônios tireóideos, que podem Julia Paris Malaco – ambulatório cardiologia representar a causa da isquemia. Para pesquisa de fatores de risco, indica-se os exames para checagem de glicemia e perfil lipídico, em jejum, que incluem colesterol total, colesterol HDL e triglicerídeos. Eletrocardiograma de Repouso: O eletrocardiograma (ECG) de repouso deve sempre ser realizado. No entanto, mais da metade dos pacientes têm ECG normal. Mesmo pacientes com doença arterial coronariana extensa podem apresentar ECG normal. O restante apresenta apenas alterações discretas ou inespecíficas na maioria dos casos. As alterações mais comumente encontradas são alterações inespecíficas da onda T e segmento ST, sobrecarga ventricular esquerda e onda Q patológica. Eventualmente, o paciente pode apresentar algum tipo de arritmia. O ECG realizado durante o episódio de dor, por outro lado, encontra-se alterado em mais de 50% dos pacientes com ECG de repouso normal. Estas alterações incluem alterações dinâmicas de onda T e do segmento ST. Nestes casos, o ECG tem alto valor preditivo positivo e é extremamente útil no diagnóstico do quadro de angina. Apesar de não ser indicado para a pesquisa de isquemia, o ECG contínuo de 24 horas (Holter) pode ser útil no diagnóstico de angina, pois permite a documentação destas alterações dinâmicas de ECG e sua correlação temporal com os sintomas do paciente. ECG de esforço: Durante muitos anos, o ECG de esforço foi considerado como método diagnóstico inicial para pacientes com angina e probabilidade pré-teste moderada de DAC, com base em gênero, idade e sintomas, por ser de fácil acesso e de baixo custo. Recomendações recentes têm questionado o uso nesse contexto, pois um exame negativo não exclui a doença nesses casos; por isso, exames de imagem funcionais (p. ex., cintilografia miocárdica e ecocardiografia de estresse) são mais indicados, devido à acurácia diagnóstica do teste ser superior. O ECG de esforço está recomendado, então, para avaliação prognóstica nos pacientes com doença definida. Ele não deve ser solicitado, entretanto, para pacientes que não conseguem fazer atividade física ou que apresentem alguma alteração no ECG basal que impossibilite a interpretação do exame, como, por exemplo, bloqueio de ramo esquerdo (BRE). Se for o único método diagnóstico disponível, é importante considerar que apresenta uma baixa sensibilidade (45 a 50%), mas uma alta especificidade (85 a 90%), o que confere ao teste baixo índice de falso- positivo.Um resultado negativo, porém, não exclui a doença, e a investigação diagnóstica deve prosseguir. O Quadro 3.2 traz os achados do ECG de esforço que indicam isquemia miocárdica. A escolha de um teste não invasivo de imagem funcional de isquemia miocárdica vai depender da disponibilidade e da experiência local, da tecnologia, da preferência do paciente e das contraindicações dos métodos. Ecocardiograma de Estresse: A avaliação de doença arterial coronariana com o ecocardiograma de estresse tem a mesma finalidade da avaliação cintilográfica. A correlação é realizada entre a motilidade e o espessamento das miocárdicas durante o repouso e o estresse. Da mesma forma que a cintilografia, no ecocardiograma é realizada a comparação entre cada um dos segmentos miocárdicos, avaliando-se não só a presença da alteração, como também a extensão e a gravidade do defeito. Além disso, o ecocardiograma permite a avaliação da função cardíaca global e outras possíveis alterações anatômicas. Da mesma forma que a cintilografia, o ecocardiograma pode ser realizado com estresse físico ou farmacológico. As principais limitações do ecocardiograma são relacionadas à janela para aquisição do exame e a experiência do examinador. Esse exame possibilita saber a localização e a extensão da isquemia miocárdica durante o esforço. Entretanto, é tecnicamentemais difícil de ser realizado. Ele apresenta boa acurácia para detecção de isquemia miocárdica, sendo indicado para pacientes com probabilidade pré- teste intermediária ou alta. Quando comparado à ergometria, tem mais sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de cardiopatia isquêmica. A ecocardiografia de estresse farmacológico também está indicada para os indivíduos com impossibilidade física de realizar a ergometria e para aqueles com limitação para interpretação da ergometria (p. ex., bloqueio completo do ramo esquerdo, infradesnível do segmento ST maior que 1 mm em repouso, marca- passo, síndromes de pré-excitação). Julia Paris Malaco – ambulatório cardiologia Radiografia de Tórax: A radiografia de tórax posteroanterior está indicada em todos os pacientes em investigação de quadro de angina. A principal utilidade da radiografia de tórax é a avaliação do parênquima pulmonar e da caixa torácica, para o diagnóstico diferencial de dor torácica. Além disso, permite avaliar o grau de congestão pulmonar e cardiomegalia do paciente, se presentes. Tomografia Computadorizada (TC) Cardíaca: A TC cardíaca é um método de imagem novo, que vem sendo muito utilizado em diversas situações para a investigação de doença arterial coronariana em pacientes sintomáticos e assintomáticos. O principal uso da TC cardíaca na doença coronariana é a realização da coronariografia não invasiva para investigação de DAC. A TC de coronária tem alto valor preditivo negativo e é um exame útil em pacientes de probabilidade baixa ou pacientes de probabilidade clínica intermediária que tenham exames funcionais conflitantes. No entanto, devido à alta taxa de falso-positivos, a TC de coronárias não é recomendada para avaliação rotineira de doença arterial coronariana na maior parte dos pacientes. Vale lembrar que esta tecnologia é bastante recente e vem evoluindo de forma rápida. Por isso, vários estudos atualmente em andamento podem mudar esta perspectiva e ampliar as indicações do método Tomografia computadorizada com escore de cálcio: Esse tipo de tomografia deve ser considerada para os pacientes com baixa probabilidade de DAC. Se o escore de cálcio for igual a zero, deve-se procurar outras causas de dor torácica. Pacientes com escore maior do que 400 devem ser posteriormente investigados a partir da realização de teste funcional de imagem ou de angiografia coronária. É importante ressaltar que esses exames não têm um desempenho perfeito para o diagnóstico de cardiopatia isquêmica quando comparados ao ainda considerado padrão-ouro: a cineangiocoronariografia. Portanto, o médico que solicita esses testes funcionais deve ter já estabelecidas a probabilidade pré-teste de presença e a gravidade da isquemia, bem como a interpretação do resultado do teste em relação a essa probabilidade. Para pacientes em que o diagnóstico de angina estável não pode ser confirmado ou excluído clinicamente e que apresentam elevada probabilidade de DAC, considera-se a angiografia coronária como exame diagnóstico. Cintilografia Miocárdica: A cintilografia de perfusão miocárdica pode ser realizada tanto com estresse físico quanto farmacológico; sempre que possível, deve-se preferir o estresse físico. A principal indicação do teste farmacológico é a incapacidade do paciente realizar atividade física de forma adequada. Sua principal indicação da cintilografia miocárdica é a avaliação de pacientes com ECG de repouso alterado, que limita a avaliação pelo TE comum. As alterações eletrocardiográficas que limitam esta avaliação são: hipertrofia de VE importante, BRE, uso de digitálicos, arritmias frequentes, entre outras. A avaliação da cintilografia consiste na comparação da perfusão miocárdica no estresse e no repouso. A comparação é realizada entre cada um dos segmentos miocárdicos e graduada conforme a gravidade do déficit. Desta forma, pode-se não somente diagnosticar a isquemia, como também quantificar a extensão, a gravidade e até mesmo correlacionar os territórios com a anatomia coronariana do paciente. Para a realização do exame, podem-se utilizar diversos radiofármacos. Entre eles, os mais utilizados são o sestamibe (MIBI) e o tálio. Apesar de diferentes, o raciocínio na avaliação da perfusão é o mesmo. Cintilografia miocárdica de esforço (farmacológica ou com exercício): Esse exame é mais eficaz do que o ECG de esforço para o diagnóstico de DAC na identificação de doença de múltiplos vasos e na determinação do tamanho da área isquêmica. Recomenda- se, como avaliação diagnóstica inicial, para pacientes com moderada a alta probabilidade de DAC. A realização do exame está especialmente indicada quando o ECG basal do paciente estiver alterado (p. ex., presença de bloqueio de ramo esquerdo, depressão do segmento ST maior do que 1 mm basal, ritmo de marca-passo), dificultando a interpretação do ECG durante o estresse. Indica-se estresse farmacológico para os pacientes que não conseguem realizar exercício físico. Teste Ergométrico Simples (TE): O TE é a forma de avaliação funcional mais utilizada. É simples, barato e de boa acurácia na maior parte dos pacientes. Na avaliação diagnóstica, sua principal indicação é na avaliação de pacientes com probabilidade intermediária de doença coronariana. No entanto, pode ser utilizado na avaliação da capacidade funcional e na estratificação de todos os pacientes após diagnóstico. Julia Paris Malaco – ambulatório cardiologia Suas principais limitações são a incapacidade do paciente realizar exercício físico e quando o ECG de repouso apresenta alterações que limitam a análise do traçado durante o estresse. No seu uso, deve-se sempre avaliar a capacidade de o paciente realizar esforço (tempo de duração do teste e quantidade de equivalentes metabólicos (MET) percorrida), quadro clínico, evolução eletrocardiográfica e hemodinâmica durante o teste. Cineangiocoronariografia: A coronariografia ainda é o padrão-ouro no diagnóstico de doença arterial coronariana crônica. Não obstante o advento recente da TC de coronárias, a coronariografia é o exame habitual e ideal para investigar a extensão e a gravidade da doença coronariana. Apesar disso, a coronariografia é um exame de risco, que utiliza contraste e radiação, e é de alto custo. Por isso, está indicada para diagnóstico somente nos casos duvidosos em que os exames não invasivos são inconclusivos ou conflitantes. Além disso, está indicada para a estratificação de risco de pacientes com quadro clínico ou exames não invasivos de alto risco. Nestes pacientes, a avaliação da anatomia coronariana, avaliando a extensão anatômica da doença, permite melhor definição do risco e planejamento posterior de intervenção nos casos em que ela se faça necessária. Além da coronariografia simples, novos métodos de avaliação da doença arterial coronariana pelo cateterismo têm sido desenvolvidos recentemente. As principais formas adjuvantes de avaliação de DAC na sala de hemodinâmica são a ultrassonografia intracoronariana (IVUS) e a avaliação da reserva de fluxo coronariano. No IVUS, um transdutor de ultrassom é introduzido na coronária, permitindo a visualização da placa aterosclerótica e a quantificação mais detalhada de sua extensão e gravidade. A reserva de fluxo coronário (FFR) permite a avaliação do significado funcional de uma obstrução coronariana. Este método compara o fluxo coronariano antes e depois de uma lesão, e permite estimar se esta lesão leva à obstrução significativa do fluxo coronário. Tanto o IVUS como a FFR têm como principal indicação a avaliação de lesões intermediárias vistas na coronariografia. Devido a sua pouca disponibilidade, estes métodos não costumam ser utilizados de rotina na maior partedos centros. Estratifiacaçao de risco Tratamento Medidas não farmacológicas Perda de peso: O IMC e a circunferência abdominal devem ser medidos regularmente. O valor de IMC indicado para os cardiopatas é de 18,5 e 24,9 kg/m2; e a medida de circunferência abdominal é de valor igual ou inferior a 89 cm, para mulheres, e de valor igual ou menor do que 102 cm, para os homens. Um programa de atividade física, de dieta hipocalórica e de mudança nos hábitos de vida deve ser encorajado para o alcance das medidas adequadas. Os benefícios relacionados ao alcance dessas medidas são melhora do perfil pressórico e lipídico e da resistência à insulina. Atividade física: O sedentarismo é um dos fatores de risco para a aterosclerose e constitui um problema de saúde pública, devendo ser incentivada a atividade física de acordo com o limiar individual dos sintomas isquêmicos. A prática de atividade física estruturada regular (150 min/ semana) aumenta o HDL-c e diminui o colesterol total, o LDL e os triglicerídeos e, ainda, diminui os índices de hemoglobina glicada em pacientes diabéticos. Observa-se também uma significativa Julia Paris Malaco – ambulatório cardiologia diminuição de pressão sistólica e diastólica e melhora da capacidade cardiorrespiratória. O programa de exercícios deve estar de acordo com a capacidade funcional individual. Para isso, recomenda-se um teste ergométrico de esforço a fim de determinar a frequência cardíaca limiar, na qual o paciente não tenha alterações eletrocardiográficas ou sintomas isquêmicos, como dor torácica. Dieta: Deve-se estimular uma dieta rica em fibras, pobre em sal, rica em potássio e com grande quantidade de frutas, legumes, verduras e produtos lácteos (dieta DASH). É importante encorajar também a redução de ácidos graxos saturados (menos de 7% do total de calorias diárias) e de colesterol (menos de 200 mg/dia). A mudança nos hábitos alimentares é especialmente importante para a hipertrigliceridemia. Uma dieta com redução da quantidade de sal sempre é estimulada para um melhor controle dos níveis pressóricos. O consumo de álcool deve ser moderado. Tabagismo: É recomendada a cessação do tabagismo. Diversas intervenções farmacológicas e não farmacológicas, inclusive o simples aconselhamento para parar de fumar, apresentam benefício comprovado para o efetivo abandono do tabagismo. A farmacoterapia com dispositivos com nicotina ou a bupropiona melhora, de forma clinicamente significativa, a cessação do hábito de fumar. Medidas farmacológicas Prevenção de infarto e redução da mortalidade Antiagregantes plaquetários: São indicados para todos os pacientes com CI. Os benefícios incluem a redução do risco cardiovascular (p. ex., morte súbita, IAM e acidente vascular cerebral [AVC]). Doses maiores não aumentam a efetividade, mas os efeitos adversos, sendo 100 mg a dose diária recomendada. Em caso de intolerância ou contraindicação ao ácido acetilsalicílico, é recomendado clopidogrel ou ticlopidina. Bloqueadores ß-adrenérgicos: Têm efeito anti- isquêmico decorrente da diminuição da frequência cardíaca e da pressão arterial, melhorando a perfusão coronariana pelo aumento do tempo de diástole e redução do consumo de oxigênio, principalmente durante exercício ou em situações de ativação adrenérgica. Em pacientes pós-IAM, há benefício na redução da mortalidade total, da recidiva de infarto e da isquemia e da angina e em uso contínuo e prolongado. A indicação de uso desses fármacos estende-se para os pacientes com angina estável sem IAM prévio, com ou sem disfunção ventricular. Inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECAs): Existem quatro mecanismos determinantes do potencial efeito anti- isquêmico dos IECAs: vasodilatação, aumento da concentração de óxido nítrico e estabilização da placa, redução do consumo de oxigênio pelo miocárdio e aumento do fluxo coronariano (maior perfusão subendocárdica). Os IECAs são recomendados para pacientes com CI e disfunção ventricular, fração de ejeção (FE) reduzida e/ou diabetes. Há evidência clinicamente significativa de que os IECAs reduzem a mortalidade e a incidência de eventos cardiovasculares. Esses benefícios parecem se estender também para indivíduos com menos risco, mas as evidências não são tão consistentes. Antagonistas dos receptores da angiotensina II (ARAII): Foram testados nos estudos clínicos em comparação com captopril em pacientes com IAM e insuficiência cardíaca. Estes não mostraram superioridade da nova classe. Houve, ainda, tendência a aumento dos índices de mortalidade total e morte súbita com esses fármacos ou com sua associação aos IECAs. Os ARA II são indicados para pacientes com intolerância aos IECAs devido aos efeitos adversos. Hipolipemiantes: O uso de estatinas na CI fundamenta-se na redução de mortalidade e prevenção de novos eventos isquêmicos. O efeito não dependente dos níveis basais de colesterol, devendo a prescrição ser considerada para todos os pacientes com DAC. As alternativas às estatinas, quando estas estiverem contraindicadas por eventos adversos, são o ácido nicotínico e a colestiramina. Os fibratos (p. ex., genfibrozila, etofibrato, bezafibrato, ciprofibrato) são usados no tratamento da hipertrigliceridemia, na falha das mudanças do estilo de vida e/ou quando os níveis de triglicerídeos forem muito elevados (maiores do que 500 mg/dL). Redução dos sintomas e da isquemia miocárdica Bloqueadores ß-adrenérgicos: São os fármacos de primeira escolha para o alívio dos sintomas isquêmicos, e também proporcionam benefícios na redução de mortalidade e de infarto. Eles possibilitam a redução do número de crises anginosas, do grau de isquemia e aumentam a tolerância ao exercício. Antagonistas dos canais de cálcio: Diminuem a resistência vascular e aumentam o fluxo Julia Paris Malaco – ambulatório cardiologia sanguíneo coronariano ao promoverem relaxamento da musculatura lisa, especialmente dos leitos arteriais, por meio da inibição dos canais de cálcio. Eles têm também efeitos inotrópicos e cronotrópicos negativos, diminuindo o número de episódios de angina. Constituem-se em mais uma alternativa disponível quando os betabloqueadores são contraindicados. Além disso, a angina de Prinzmetal responde muito bem aos antagonistas dos canais de cálcio. Nitratos: Os efeitos hemodinâmicos e antianginosos desses fármacos ocorrem devido à vasodilatação venosa e coronariana, reduzindo a pré-carga, diminuindo o consumo de oxigênio pelo miocárdio e melhorando o fluxo subendocárdico. Os nitratos de curta ação, administrados via sublingual, são a primeira escolha para o tratamento e a prevenção de crise anginosa. Os nitratos de longa ação, administrados por via oral, são reservados para os pacientes com angina refratária em uso de adrenérgicos e/ou antagonistas dos canais de cálcio. Procedimentos invasivos Revascularização. Os pacientes que se mantêm resistentes ao tratamento medicamentoso otimizado são candidatos à revascularização do miocárdio. As duas abordagens alternativas são angioplastia coronária com a colocação de stent ou cirurgia de revascularização do miocárdio (CRM). As alterações no estilo de vida e a terapia farmacológica não devem ser abandonadas, mas, sim, realizadas simultaneamente. Angioplastia com implante de stent. Algumas das vantagens desse procedimento em relação ao cirúrgico são o fato de ser menos invasivo, necessitar de menos tempo de hospitalização e possibilitar o retorno mais rápido do paciente às atividades habituais. Com o advento dos stents associados à potente terapia antiagregante plaquetária,a taxa de reestenose reduziu de 30 a 40% (com balão) para 15 a 20%, em 6 a 8 meses, sendo essas incidências ainda menores com os stentsrecobertos com rapamicina e paclitaxel (5 a 10%). A angioplastia é indicada para pacientes sintomáticos com lesão uniarterial, mesmo na vigência de tratamento otimizado, ou com uma grande área do miocárdio em risco (área de isquemia evidenciada por cintilografia miocárdica maior do que 15%), com objetivo de redução dos sintomas e melhora da tolerância ao exercício, superando o tratamento clínico. Entretanto, não há impacto nos índices de mortalidade e ocorrência de IAM. Em pacientes sintomáticos com lesões biarteriais com comprometimento da artéria coronariana descendente anterior (DA), com função ventricular normal e não diabéticos, ou sem lesão significativa de DA, mas com uma grande ou moderada área do miocárdio em risco, não há diferença entre CRM e angioplastia quanto à sobrevida. Entretanto, a angioplastia está mais relacionada à necessidade de revascularização subsequente, o que atenua seu custo-efetividade ao longo do tempo. Esse procedimento é indicado também como alternativa à CRM em pacientes triarteriais/multiarteriais com boa função ventricular, quando houver anatomia favorável à angioplastia (escore Syntax). Cirurgia de revascularização miocárdica(CRM). As recomendações dessa cirurgia levam em consideração a sintomatologia do paciente, a anatomia coronariana, a função ventricular e as provas funcionais de isquemia. A CRM objetiva melhorar os sintomas e a tolerância às atividades físicas e, em alguns subgrupos, aumentar a sobrevida e reduzir a taxa de novos eventos cardíacos. O seu efeito benéfico é proporcional à quantidade de miocárdio revascularizado. A cirurgia de revascularização miocárdica é indicada nos seguintes casos: •Estenose maior ou igual a 50% em tronco de coronária esquerda. •Estenoses proximais nos três vasos principais em pacientes com FE menor do que 50%. •Pacientes com doença de múltiplos vasos, incluindo DA com FE menor do que 50% ou diabetes. •Pacientes com acometimento de um ou dois vasos, não incluindo DA, mas com grande área isquêmica. •Angina incapacitante, com qualquer número de artérias envolvidas, esgotadas todas as opções terapêuticas não invasivas, mesmo sendo artéria secundária, e na impossibilidade técnica de tratamento por cateter.
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