Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO SER NEGRO NO BRASIL: A LUTA PELA INCLUSÃO ÉTNICA FRENTE O ORDENAMENTO JURÍDICO VIGENTE DAÍRA ANDRÉA DE JESUS Itajaí (SC), 16 de outubro de 2007 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO SER NEGRO NO BRASIL: A LUTA PELA INCLUSÃO ÉTNICA FRENTE O ORDENAMENTO JURÍDICO VIGENTE DAÍRA ANDRÉA DE JESUS Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientadora: Professora Mestra Andrietta Kretz Itajaí (SC), 16 de outubro de 2007 AGRADECIMENTO Primeiramente, agradeço à Deus por permitir que tudo se tornasse realidade. Agradeço ao meu pai Manoel, às minhas irmãs Daiane e Samara e ao meu sobrinho, o pequeno Richard pelo apoio nessa etapa difícil e cheia de surpresas, além de suportarem a minha constante ansiedade. Agradeço também a professora Andrietta pelo incentivo e, principalmente pela tranqüilidade na coordenação da pesquisa jurídica. DEDICATÓRIA Indubitavelmente, dedico este trabalho à minha mãe Mara, pelo exemplo de caráter, luta, força e por uma vida cheia de dedicação e amor. Obrigada por carinhosamente acreditar neste sonho e ser o meu espelho. TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e a Orientadora de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí, 16 de outubro de 2007 Daíra Andréa de Jesus Graduanda PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Daíra Andréa de Jesus sob o título Ser negro no brasil: A luta pela inclusão étnica frente o ordenamento jurídico vigente, foi submetida em 05 de novembro de 2007 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Andrietta Kretz (presidente), Maury Roberto Viviani (examinador), Newton Cesar Pilau (examinador) e aprovada com a nota 10 (dez). Itajaí , 20 de novembro de 2007. Professora Mestra Andrietta Kretz Orientadora e Presidente da Banca Professor Mestre Antonio Augusto Lapa Coordenação da Monografia ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS COEPIR Coordenadoria Especial de Promoção da Igualdade Racial CRFB Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 ROL DE CATEGORIAS Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. Ação afirmativa A ação afirmativa consiste numa série de medidas destinadas a corrigir uma forma específica de desigualdade de oportunidades sociais: aquela que parece estar associada a determinadas características biológicas (como raça e sexo) ou sociológicas (como etnia e religião), que marcam a identidade de certos grupos na sociedade. 1 Constituição Constituição deve ser entendida como a lei fundamental e suprema de um Estado, que contém normas referentes à estruturação do Estado, à formação dos poderes públicos, forma de governo e aquisição do poder de governar, distribuição de competências, direitos, garantias e deveres dos cidadãos.2 Cor A cor corresponde à maior ou menor pigmentação da pele. 3 1 SELL, Sandro César. Ação afirmativa e democracia racial: uma introdução ao debate no Brasil. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2002. p. 15. 2 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 19 ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 2. 3 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria geral da Constituição e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Takano, v. 17, 2001. p. 95. Crime Considera-se crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativamente ou cumulativamente com a pena de multa (...)4 Dignidade da pessoa humana A dignidade da pessoa não consiste apenas no fato de ser ela, diferentemente das coisas, um ser considerado e tratado como um fim em si e nunca como um meio para a consecução de determinado resultado. Ela resulta também do fato de que, pela sua vontade racional, só a pessoa vive em condições de autonomia, isto é, como ser capaz de guiar-se pelas leis que ele próprio edita.5 Direitos fundamentais Direitos fundamentais são direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado Estado.6 Discriminação racial A expressão discriminação racial significará qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseadas em raça, cor, descendência ou origem racial ou étnica que tem por objetivo ou efeito anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício num mesmo plano (em igualdade 4 Artigo 1º, da Lei de Introdução ao Código Penal (Decreto-lei nº 3.914, de 9 de dezembro de 1941). 5SANTORO FILHO, Antonio Carlos. Dignidade humana e Direito penal. Disponível em: <www.ibccrim.org.br>, 18.12.2002. Acesso em 20 jul. 2007. de condição), de direitos humanos e liberdades fundamentais no domínio político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro domínio de sua vida.7 Eficácia Poder de uma norma de produzir, no tempo e no espaço, os efeitos desejados.8 Etnia Pode ser definida basicamente como uma comunidade ligada por laços raciais, lingüísticos, religiosos e culturais. O termo é muito confundido com a palavra raça. Igualdade O princípio da igualdade consagrado pela Constituição opera em dois planos distintos. De uma parte, frente ao legislador ou ao próprio executivo, na edição, respectivamente, de leis, atos normativos e medidas provisórias, impedindo que possa criar tratamentos abusivamente diferenciados a pessoas que se encontram em situações idênticas. Em outro plano, na obrigatoriedade ao intérprete, basicamente, a autoridade pública, de aplicar a lei e atos normativos de maneira igualitária, sem estabelecimento. 9 6 KRETZ, Andrietta. Autonomia da Vontade e Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais. Florianópolis: Momento Atual, 2005, p. 51 apud, SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos Direitos Fundamentais. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 34. 7 Artigo 1º, da Convenção Internacional Sobre Todas as Formas de Eliminação da Discriminação Racial. 8 MELO, Osvaldo Ferreira de. Dicionário de política jurídica. Florianópolis: OAB-SC Editora. 2000, 36. 9 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1° e 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. São Paulo: editora Atlas. 2007. p. 82. Injúria Preconceituosa Será preconceituosa ou discriminatória quando a ofensa à dignidade ou decoro utilizar elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem ou condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência.10 Preconceito Preconceito é uma atitude negativa, desfavorável, para com um grupo, ou seus componentes individuais. É caracterizado por crenças estereotipadas. A atitude resulta de processos internos do portador e não do teste de atributos reais do grupo. Nas Ciências Sociais, o termo preconceito é usado quase exclusivamente em relação aos grupos étnicos. Dentro dessa limitação há o consenso vastamente difundido quanto a alguns elementos da definição do termo: preconceito é uma atitude desfavorável para com um grupo étnico (ou membros individuaisdo grupo). 11 Princípio (...) estruturação de um sistema de idéias, pensamentos ou normas por idéia mestra, por um pensamento chave, por uma baliza normativa, donde todas as demais idéias, pensamentos ou normas derivam, se reconduzem ou se subordinam. 12 Raça A opinião da Biologia é, no presente caso, clara e inequívoca. A concepção moderna de raça, fundada sobre as teorias da 10 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte especial. volume 2. 6 ed. São Paulo: Saravia, 2007. 320. 11 MIRANDA NETO, Antonio Garcia et al. Dicionário de Ciências Sociais. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1986. p. 962. 12 ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 47. hereditariedade, priva de toda justificação a antiga concepção segundo a qual existiram diferenças fixas e absolutas entre raças humanas e, por conseguinte, uma hierarquia de raças superiores e inferiores. Para os sábios atuais, as raças são subdivisões biológicas de uma espécie única, a do Homo Sapiens, dentro da qual as características hereditárias comuns a toda espécie ultrapassam de longe as diferenças relativas e mínimas que separam as subdivisões.13 Racismo O tratamento desigual manifestado pelo agente, em função de raça ou cor de pele, ou qualquer outro ato em que se identifique a desigualdade segundo critérios objetivos.14 Validade É A NORMA CUJA ETICIDADE A COLOCA JURIDICAMENTE PERFEITA DENTRO DE UM SISTEMA POSITIVO.15 13 DUNN, L.C. Raça e Ciência: a origem dos preconceitos. São Paulo: Perspectiva, 1972. p. 8. 14 CENEVIVA, Walter. Direito Constitucional Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 78. 15 MELO, Osvaldo Ferreira de. Dicionário de política jurídica, p. 97. SUMÁRIO RESUMO.........................................................................................XIV INTRODUÇÃO ................................................................................... 1 CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 4 UMA PROJEÇÃO HISTÓRICA DA PRESENÇA DO ELEMENTO NEGRO NO BRASIL COM DESTAQUE PARA A ORIGEM DO PRECONCEITO DE COR................................................................... 4 1.1 A FORMAÇÃO ÉTNICA BRASILEIRA ............................................................4 1.2 A ESCRAVIDÃO...............................................................................................8 1.3 O PROCESSO ABOLICIONISTA.....................................................................9 1.3.1 LEI EUSÉBIO DE QUEIRÓS ...............................................................................11 1.3.2 LEI DO VENTRE LIVRE .....................................................................................12 1.3.3 LEI DOS SEXAGENÁRIOS .................................................................................14 1.3.4 LEI ÁUREA .....................................................................................................14 1.4 DEFINIÇÃO DE PRECONCEITO DE COR ....................................................17 1.4.1 A ORIGEM DO PRECONCEITO DE COR ................................................................18 1.5 DEFINIÇÃO DE RAÇA ...................................................................................20 1.5.1 O QUE É RACISMO?.........................................................................................24 1.5.2 DEFINIÇÃO DE COR .........................................................................................25 1.6 AFINAL, QUEM É NEGRO NO BRASIL? ......................................................26 CAPÍTULO 2 .................................................................................... 28 APARATO NORMATIVO BRASILEIRO EM RELAÇÃO AO PRECONCEITO DE COR E SUA APLICABILIDADE PRÁTICA: A IMPORTÂNCIA DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 ....................................................................... 28 2.1 DIREITOS HUMANOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS.................................28 2.2 OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS CONSTITUCIONAIS..............................31 2.2.1 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ...............................................34 2.2.2 O PRINCÍPIO DA IGUALDADE.............................................................................36 2.3 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO APARATO NORMATIVO BRASILEIRO EM RELAÇÃO AO PRECONCEITO DE COR............................................................39 2.4 DISTINÇÃO DO TIPO INJÚRIA QUALIFICADA NA MODALIDADE PRECONCEITUOSA, DO CRIME DE PRECONCEITO DA LEI 7.716/89............45 2.5 BREVES DESTAQUES HISTÓRICOS ACERCA DO APARATO NORMATIVO INTERNACIONAL EM RELAÇÃO À LIBERDADE E A IGUALDADE.....................................................................................................4848 2.6 REQUISITOS FORMADORES DA NORMA CONSTITUCIONAL: LEGITIMIDADE, VALIDADE E EFICÁCIA...........................................................49 2.6.1 INEFICÁCIA SOCIAL DA LEGISLAÇÃO ANTI-RACISMO ...........................................52 CAPÍTULO 3 .................................................................................... 54 A BUSCA PELA IGUALDADE E INCLUSÃO SOCIAL NO ESTADO DE SANTA CATARINA.................................................................... 54 3.1 AÇÕES AFIRMATIVAS E SUA JURISDICIDADE .........................................54 3.1.1 O SISTEMA DE COTAS RACIAIS .........................................................................58 3.2 A MUDANÇA SÓCIO-RACIAL NO BRASIL ..................................................62 3.3 O RUMO DAS AÇÕES AFIRMATIVAS EM SANTA CATARINA ..................64 3.3.1 AS POLÍTICAS DE INCLUSÃO NO MUNICÍPIO DE ITAJAÍ.........................................68 3.4 A EDUCAÇÃO E A CAPACITAÇÃO DOS JURISTAS NA LUTA CONTRA O PRECONCEITO DE COR.....................................................................................71 3.5 JURISPRUDÊNCIAS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL .......................72 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................77 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 80 ANEXOS........................................................................................... 86 RESUMO A presente pesquisa aborda a existência da discriminação e do preconceito de cor na sociedade brasileira frente a legislação anti-racial em vigor. Denota uma investigação bibliográfica realizada a partir do artigo científico “O preconceito e a discriminação racial latente no contexto social catarinense frente o aparato normativo vigente” elaborado pela pesquisadora, sob a supervisão da sua orientadora. O assunto é polêmico porquanto vive-se num país escondido sob o mito da democracia racial. Faz-se um retrospecto da formação étnica brasileira, do aparato normativo em vigor e da produção internacional pertinente ao tema, enfatizando a distinção das categorias preconceito e discriminação, bem como, do tipo injúria qualificada mediante a utilização de referências a cor, etnia ou origem pelo artigo 140, §3º, do Código Penal do crime tipificado na Lei nº 7.716 de 1989. Dar-se-á ênfase também às ações afirmativas, especialmente, à iniciativa que vem ocorrendo no Estado de Santa Catarina e o longo caminho a ser percorrido para que seja alcançada a igualdade material previamente assegurada pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Para alcançar o objetivo proposto, a pesquisa está dividida em três capítulos, com sub-itens, nos quais fica evidenciada a situação dos negros no Brasil, a luta pela inclusão étnica e a abundante legislação. As providências metodológicas para delinear este trabalho baseiam-se na utilização do método indutivo para o relato, operacionalizado pelas técnicas doreferente, das categorias, do conceito operacional e da pesquisa bibliográfica. INTRODUÇÃO A relação da sociedade brasileira para com o negro é baseada na discriminação mascarada, cujo caráter é de ordem implícito e objetivo. Hodiernamente, atitudes violentas de grupos racistas e a implementação de ações afirmativas colocam reiteradamente na ordem do dia discussões acerca da identidade racial. Diante da atualidade e complexidade do tema, a presente Monografia tem como objeto a temática Ser negro no Brasil: a luta pela inclusão étnica frente o ordenamento jurídico vigente. O objetivo desse estudo é o reconhecimento da existência do preconceito de cor na sociedade brasileira, das inúmeras leis que dispõem acerca da matéria e da necessidade de uma efetiva mudança sócio-econômica e implementação de políticas culturais inclusivas para a eficácia social da norma. Para tanto, principia–se, no Capítulo 1 fazendo uma abordagem acerca da evolução histórica da presença do elemento negro no Brasil, da escravidão, legislações abolicionistas e do legado enraizado na cultura nacional que é o preconceito de cor e em muitos casos a discriminação racial. A partir do retrospecto histórico traçado, da definição e da origem de categorias essenciais, parte-se para a análise de quem é realmente negro no Brasil, afinal, país auto-intitulado como multi-racial. No Capítulo 2, trata-se dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da igualdade, das leis federais, estaduais e municipais relacionadas ao assunto ora discutido, com ênfase ao disposto na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diferencia-se o crime de racismo tipificado pela Lei nº 7.716 de 1989, do crime de injúria preconceituosa tipificado pelo artigo 140, §3º do Código Penal. Investiga-se também os três requisitos formadores da norma constitucional - legitimidade, validade e eficácia – e a eficácia social da legislação anti-racial. 2 No Capítulo 3, cuida-se da urgente necessidade de implementação de uma mudança econômica e sócio-racial no país. Aborda-se a respeito da execução das medidas afirmativas, como eventos, palestras, projetos educacionais, inclusive das cotas raciais e dos projetos que já vêm sendo executado no Estado de Santa Catarina e no Município de Itajaí. O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a luta do negro contra o preconceito e a discriminação racial e o aparato normativo vigente, principalmente o Texto Constitucional. A opção por este tema deu-se pela inefetividade do Estado através dos seus Três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) em evitar que os negros continuem a serem vítimas e estarem em condição de desvantagem mesmo após mais de cem anos da abolição da escravatura. Para a presente monografia foram levantadas as seguintes hipóteses: � Existe preconceito e discriminação racial na sociedade brasileira, embora muitos equivocadamente acreditarem que se vive num país cuja democracia racial predomina. O preconceito denota uma atitude negativa para com um grupo caracterizado por crenças estereotipadas, conquanto que a discriminação racial é a exteriorização dessa atitude. � A legislação brasileira no que toca à essa temática de discriminação é abundante e severa. Todavia, falta aplicabilidade à norma, mais especificamente, a eficácia social dessas leis restam prejudicadas dentro de um sistema inerte, omisso e relapso. � Diversas medidas estão sendo colocadas em prática para a eliminação do cerne do problema que é o preconceito alojado no interior dos indivíduos. Nessa seara, as ações afirmativas aliadas ao desenvolvimento social e econômico podem ser medidas substanciais com resultados positivos. 3 Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva. Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica. O assunto é relevante e atual uma vez que proliferam nos tribunais e na mídia brasileira questões envolvendo as polêmicas cotas raciais e demais políticas públicas de inclusão social, além da natureza da identidade racial. CAPÍTULO 1 UMA PROJEÇÃO HISTÓRICA DA PRESENÇA DO ELEMENTO NEGRO NO BRASIL COM DESTAQUE PARA A ORIGEM DO PRECONCEITO DE COR 1.1 A FORMAÇÃO ÉTNICA BRASILEIRA No tocante a formação étnica brasileira, constituem as três etnias pioneiras: os homens que vieram para o país, os índios e mais tarde os negros. Portanto, embora presente uma forte sensação de invisibilidade do negro, na sociedade concebida atualmente, esta é fruto de uma considerável relação de miscigenação étnica e diversidade cultural. Desde o início as relações não se revestem de caráter amistoso, pelo contrário, prevalece a lei do dominador imediato e mais forte – o europeu que, de modo geral, impôs seus costumes, língua e religião. Os jesuítas que para cá vieram aprendem a língua tupi- guarani com o único objetivo de traduzir a língua nativa para uma importada e muito mais difícil. Tudo conforme manda a lei do dominador e visando à execução do projeto de dominação, os padres Manuel de Nóbrega e José de Anchieta foram grandes arquitetos. Os missionários dos ensinamentos de Cristo, daquela época, como por exemplo Santo Inácio de Loyola e novamente José de Anchieta preocupados com a salvação das almas dos escravos lutavam para que estes levassem uma vida cristã, porém sabiam que economicamente a escravidão era importante. 5 Cláudio Valentim Cristiani16 discorrendo acerca dos elementos étnicos formadores da sociedade brasileira esclarece que: Os elementos formadores da cultura em geral, e do direito especificamente, no Brasil Colonial, tiveram origem em três etnias distintas. É evidente que essa formação não foi uma justa posição em que as condições particulares de cada raça tenham sido respeitadas. Antes, foi uma imposição dos padrões dos portugueses brancos aos índios e aos negros. Os jesuítas também têm a sua parcela de contribuição a favor da escravidão das populações negras, porque agiam em nome da civilização e da religião cristã, procurando ter os índios sob a sua administração para, posteriormente, livrá-los da escravidão como forma de não concorrerem com o tráfico negreiro, pois tinham interesse econômico na escravidão específica dos negros. Ainda assim, segundo Júlio José Chiavenato17, essa atitude dos jesuítas não impediu os índios de serem escravos. No entanto, em virtude da não adaptação dos índios ao trabalho escravo e devido às guerras com os brancos e a imposição da Igreja para não escravizá-los, sob o argumento de serem apropriados para a catequese, passa-se à escravidão dos negros. Por volta de 1531 desembarcam no Brasil os primeiros navios negreiros, época em que a população brasileira era má distribuída e as cidades estavam em lento desenvolvimento. Em 1568, o tráfico de escravos já era oficializado no Brasil, permanecendo de modo intenso, com um papel bastante significativo na economia do país. O homem negro não era visto como um ser humano, mas sim como mercadoria. Era comercializado proporcionando lucros para a coroa portuguesa. Essa comercialização englobava a exploração abusiva e condições de trabalho sub-humanas. 16 CRISTIANI, Cláudio Valentim, O direito no Brasil colonial. In: WOLKMER, A. C. (Org.). Fundamentos de história de direito. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 213-214. 6 Novamente Júlio José Chiavenato18: “Eram examinadoscomo animais: apalpados, dedos enfiando-se pelas bocas, procurando os dentes para adivinhar a idade ou conferir se o vendedor não mentia”. No mesmo caminhar, Jacob Gorender19 sustenta: (...) a tendência dos senhores de escravos foi a de vendê-los como animais de trabalho, como instrumentum vocate, bem semovente. O Eclesiástico comparou o escravo ao asno e Aristóteles escreveu que o boi serve de escravo aos pobres. A Lei Aquiliana, em Roma, ao tratar do crime de morte de escravo alheio, equiparou-a à de um quadrúpede doméstico, para efeitos de ação judicial de indenização pelo proprietário lesado. As Ordenações Portuguesas - Manuelinas e Filipinas – num mesmo título o direito de enjeitar escravos e bestas por doença ou manqueira, quando dolosamente vendidos. Para facilitar a compreensão do panorama sócio-cultural da época, analisando a literatura brasileira, constata-se que o negro não aparece na literatura freqüentemente, a não ser por motivo de piada ou papel ainda menor que secundário.20 O escritor Gregório de Matos relatando minuciosamente a vida do negro escreve que este era propenso a comer bananas e tinha uma espécie de piolho nos seus cabelos encaracolados. Mais tarde é que personagens como Henrique Dias, Calabar e Zumbi dos Palmares tiveram destaque na literatura, pelo papel de liderança e espírito guerreiro nas mais variadas batalhas que enfrentaram. Entretanto, é Frei José de Santa Rita Durão (1722 – 1784), no poema Caramuru, considerado o primeiro a incorporar a figura do negro nobre na literatura brasileira. Alguns pensadores como Montesquieu eram contra a escravidão por razões econômicas, a não ser, no caso de prisioneiros de guerra. 17 Acerca do assunto consultar CHIAVENATO, Julio José. O negro no Brasil: da senzala à guerra do Paraguai. 4 ed. São Paulo: Brasiliense, 1987. p. 106. 18 Ibidem, p. 106. 19 GORENDER, Jacob. Ensaios 29. O escravismo colonial. São Paulo: Ática, 1985. p. 50. 20 Para maiores esclarecimentos consultar SAYERS, Raymond. O negro na literatura brasileira. Rio de Janeiro: Ed. O Cruzeiro, 1958. 7 Ao passo que outros se mostraram totalmente contra a escravidão por motivos humanitários, acompanhado de diversos seguidores. O negro sempre procurou resistir, quer seja com baixa produtividade, com a formação de quilombos ou com lutas, suicídios, abortos. Destaca-se a Rebelião Baiana (1798), Insurreição Malê (1835), Revolta dos Escravos do Maranhão (1838/1841) e outras participações em movimentos sociais buscando a conquista e eficácia de direitos humanos fundamentais. Enquanto estratégia de resistência rumo a liberdade, os quilombos eram altamente organizados e marcaram a sociedade brasileira sendo uma das formas mais significativas de resistência. Formado por grupos comprometidos em viver em liberdade e reconstruir comunidades com uma nova consciência eram aldeias criadas por africanos que fugiam das plantações onde eram escravos. O Quilombo dos Palmares, que durou aproximadamente um século, é considerado o mais importante da época colonial. Foi liderado por Zumbi, até hoje visto e respeitado como um símbolo da resistência negra no Brasil. O fato é que a identidade da formação brasileira está relacionada à pluralidade étnica. Entretanto, o modelo de colonização do Brasil, com a escravidão primeiro do habitante nativo, depois a do negro, implicou na extinção de milhares de vida de maneira brutal. Apesar de todo o sofrimento, diante do significativo índice de descendentes de escravos, aqui estabelecidos, o papel do negro na formação do país é fundamental, seja transformando o solo brasileiro, lutando contra a natureza para a construção de casas, escolas e demais edificações, seja na rica diversidade cultural transmitida. 8 1.2 A ESCRAVIDÃO No Brasil a escravidão influenciou a produção açucareira, cafeeira, mineira e do trabalho em serviços e ofícios urbanos. Frente a essa repercussão na economia e a proposta desta pesquisa, mister discorrer acerca da categoria em questão. Explique-se que de acordo com a Convenção sobre a escravatura, assinada em Genebra, em 25 de setembro de 1962, pela Sociedade das Nações, atual Organização das Nações Unidas - ONU, a escravidão denota: (...) o estado ou condição de um indivíduo sobre o qual se exercem, total ou parcialmente, os atributos do direito de propriedade. O tráfico de escravos compreende todo ato de captura, aquisição ou cessão de um indivíduo com o propósito de escravizá-lo; todo ato de aquisição de um escravo com o propósito de vende-lo ou trocá-lo; todo ato de cessão, por meio de venda ou troca, de um escravo, adquirido para ser vendido ou trocado, assim como, em geral, todo ato de comércio ou de transporte de escravos. Apesar dos escravos negros serem uma preciosidade no mundo antigo, a escravidão enquanto categoria social já predominava. A maioria dos escravos nesse período eram brancos, até porque a travessia do Saara implicava num obstáculo difícil para os mercadores da época. Bárbaros, cidadãos que não podiam pagar as próprias dívidas, ou simples estrangeiros, enfim, é antigo o costume de escravizar determinados grupos, com verdadeiras capturas em massa. Toda a Europa traficava e aqui, não foi diferente. Formaram-se companhias internacionais e portuguesas a fim de desenvolver o comércio do tráfico de escravos. Salienta Jacob Gorender21 acerca do escravismo colonial: 21 GORENDER, Jacob. Ensaios 29. O escravismo colonial. p. 41. 9 Impõe-se, por conseguinte, a conclusão de que o modo de produção escravista colonial é inexplicável como síntese de modos de produção preexistentes, no caso do Brasil. Seu surgimento não encontra explicação nas direções unilaterais do evolucionismo nem do difusionismo. Não que o escravismo colonial fosse invenção arbitrária fora de qualquer condicionamento histórico. Bem ao contrário, o escravismo colonial surgiu e se desenvolveu dentro de determinismo sócio- econômico rigorosamente definido, no tempo e no espaço. Deste determinismo de fatores complexos, precisamente, é que o escravismo colonial emergiu como um modo de produção de características novas, antes desconhecidas na história humana. Diante desse cenário, o processo abolicionista aparece como um avanço extremamente urgente e significativo para o fortalecimento da idéia de liberdade, igualdade e dignidade da pessoa humana, embora saiba-se que na extinção do regime escravocrata tenha faltado assistência para o início do trabalho livre. 1.3 O PROCESSO ABOLICIONISTA Quanto à erradicação da escravatura o Brasil foi o último país do ocidente a abolir a escravidão. Até 1850 o tráfico de escravos não tinha sido suprimida, mas surgiram as primeiras legislações relacionadas a garantias de igualdade racial. Foi um processo gradual, cuja implementação encontrou muita resistência no Brasil, devido à carência de mão-de-obra. Utilizando as palavras de Emilia Viotti da Costa, no que dizem respeito à abolição da escravatura destaca-se: Dessa forma, a abolição foi apenas um primeiro passo em direção à emancipação do povo brasileiro. O arbítrio, a ignorância, a violência, a miséria, os preconceitos que a sociedade escravista criou ainda pesam sobre nós. Se é justo comemorar o Treze de Maio, é preciso, no entanto, que a comemoração não nos ofusque 10 a ponto de transformarmos a liberdade que simboliza num mito a serviço da opressão e da exploração do trabalho.22 A luta pela extinção do processo de escravidão durou mais de oitenta anos e foi acentuada tendo em vista os ideais revolucionários abolicionistas e a imigração. Eliminar essa instituição aceita por mais de três séculos é uma batalha iniciada há muito tempo com repercussão até os dias atuais.Como o processo ocorre não em conseqüência de um desenvolvimento cultural ou de um amadurecimento social, mas sim por imposição de leis. Assim, o estudo da evolução das legislações propriamente dito é medida essencial para que se possa compreender melhor os reflexos do tratamento desigual ainda característico atualmente. Não é novidade que foi a pressão estrangeira, principalmente a da Inglaterra que influenciou na diminuição gradual do tráfico escravagista. Evidente que na época o processo abolicionista tinha um caráter exclusivamente econômico, mas foi de grande importância para o fim do verdadeiro genocídio praticado contra os negros africanos. A Inglaterra assumiu um papel extremamente positivo na extinção do tráfico negreiro, pois observava a lucratividade e o aumento da independência financeira de Portugal com o trabalho escravo. Com um interesse comercial expressivo interessou-se pela total eliminação do tráfico de escravos para o Brasil. Frente ao predomínio de uma falsa idéia de democracia racial o Brasil foi o país que trouxe o maior número de escravos. George Reis Andrews23 confirma: O Brasil foi o país que recebeu durante o período colonial e até o século XIX mais africanos escravos do que qualquer nação do 22 COSTA, Emilia Viotti da. A abolição. 6 ed. São Paulo: Global, 1997. p. 96. 23 ANDREWS, George Reid. Negros e Brancos em São Paulo: 1888-1988. Trad. Magda Lopes. São Paulo: Universidade do Sagrado Coração, 1991. p. 21 11 Novo Mundo e abriga atualmente a segunda maior população negra do mundo em termos numéricos absolutos. A imprensa brasileira, de um modo geral, não se mostrou a favor da causa abolicionista tão facilmente, tendo em vista os interesses econômicos vigentes, entretanto alguns juristas e demais intelectuais europeus davam grandes contribuições. É que em dado momento a escravidão passa a não ser tão lucrativa para a economia do país como anteriormente e cada vez mais ganha evidência a utilização daqueles com poder de compra no mercado, os trabalhadores assalariados. O gradual processo de abolição teve inúmeras legislações que contribuíram para que, de fato, acontecesse, algumas com maior repercussão prática enquanto outras nem tanto. Contudo, a idéia de minimização ou extermínio da escravidão começa a se fazer presente, através da ratificação de tratados, convenções, acordos e promulgação de leis. Já em 1810, rendendo-se às pressões, Portugal celebra tratado com a Inglaterra comprometendo-se a adotar medidas que viabilizassem uma abolição gradual do tráfico de escravos. Assim, em 1815 assina uma declaração reconhecendo juntamente com outros países da Europa a importância de exterminar o tráfico com urgência. 1.3.1 Lei Eusébio de Queirós O tráfico de escravos sendo proibido em 7 de novembro de 1831 (Lei Diogo Feijó), permitindo a entrada de africanos no país para uma vida legalmente livre, facilita a aprovação em 4 de setembro de 1850, da Lei Eusébio de Queirós, a qual teve uma pequena repercussão prática. 12 Emilia Viotti da Costa24 narra que: A lei foi aprovada em 1850. Segundo a nova lei, a importação de escravos foi considerada ato de pirataria e como tal deveria ser punida. As embarcações envolvidas no comércio ilícito seriam vendidas com toda carga encontrada a bordo, sendo seu produto entregue aos apresadores, deduzido um quarto para o denunciante. A partir daí, inicia-se uma verdadeira caçada ao contrabando, que aos poucos diminui, com a vigilância da Inglaterra e das autoridades brasileiras, no combate as reiteradas tentativas de continuar o tráfico de escravos. 1.3.2 Lei do Ventre Livre Em 28 de setembro de 1871, é aprovada a Lei de Ventre Livre, a qual, ainda atrelava os libertos a seus antigos donos até os 21 anos, pois determinava que as crianças trabalhariam nas fazendas tão-somente até essa idade. A liberdade dos filhos das escravas nascidos no Brasil a partir da vigência da lei foi uma utopia. É que as datas de nascimento dessas crianças eram alteradas. O projeto de lei que gerou muita polêmica e discussão entre o Partido Conservador e Liberal foi proposto pelo gabinete conservador em 27 de maio do mesmo ano, presidido pelo Visconde do Rio Branco, o senador José Maria da Silva Paranhos, preocupado com a imagem externa do país. Nesse sentido, Emilia Viotti da Costa25 preleciona: O projeto oferecia grandes vantagens aos proprietários: condenava a escravidão a desaparecer a longo prazo, sem abalo para a Economia, dando aos proprietários bastante tempo para se 24 COSTA, Emilia Viotti da. A abolição. p. 29. 25 Ibidem, p. 47. 13 acomodarem sem dificuldades à nova situação. E o que era ainda mais importante: respeitava o direito de propriedade. Igualmente foi pequena a repercussão prática da lei e as tentativas de burlá-la eram fortes. Entretanto é referência obrigatória para qualquer discussão relacionada à abolição da escravatura. Abriu espaço para novas iniciativas com a tutela de crianças pobres, ingênuas (filhos livres de mulheres escravas) e órfãs. Aliás, com relação às tentativas de burlar a Lei do Ventre Livre destaca-se: Senhores havia que procuravam emancipar escravos doentes ou incapacitados, em lugar de outros mais qualificados de acordo com os requisitos da lei. Esperavam, dessa forma, conseguir indenização por escravos que já se tinham tornado imprestáveis. Para evadir-se da lei, proprietários de escravos também se apressaram em alforriar com cláusula de prestação de serviços escravos que se achavam em condições de serem incluídos preferencialmente nas listas de escravos a serem emancipados pelo Fundo de Emancipação. (...) ingênuos continuaram a viver como escravos, a ser vendidos juntamente com suas mães, a ser castigados como qualquer outro escravo, perfazendo as mesmas tarefas a que teriam sido obrigados se não tivesse sido libertos pela lei de 1871. Para ele, a liberdade continuava uma promessa a ser cumprida num futuro distante.26 Aos poucos, diminuía consideravelmente o índice da população escrava. Os abolicionistas, por sua vez, não pararam por aí, a luta ainda continuaria para assegurar o sonho de liberdade, igualdade e dignidade dos negros. 26 Ibidem, p. 46. 14 1.3.3 Lei dos Sexagenários Em 1885 a Lei dos Sexagenários ou Lei Saraiva - Cotegipi (Lei 3.270) estabeleceu a liberdade para os maiores de 65 anos e mediante indenização, libertação gradual dos demais escravos. O projeto dessa lei provoca um clima de grande tensão, resistência e divergência entre partidários que, inclusive, seguiam uma ideologia parecida. Acerca do projeto comenta Emilio Viotti da Costa27: Analisando o novo projeto, artigo por artigo, diante de um grande número de pessoas que se reuniu no Teatro Politheama, Rui Barbosa demonstrou que, com as alterações introduzidas, ele se afastara completamente da versão original, representando uma concessão aos interesses escravistas. De fato, o novo projeto estipulava que os escravos emancipados aos sessenta anos ficavam obrigados a trabalharem mais três anos gratuitamente (ou até atingirem a idade de 65 anos), a título de compensação aos seus senhores. Oferecia ainda vantagens aos senhores que se decidissem espontaneamente a emancipar seus escravos, concedendo-lhes indenização. O problema era que poucos escravos atingiam essa idade e tal fato justifica-se pelas terríveis condições de vida que levavam, trabalhando duro, com uma jornada diária de trabalho sub-humana, sem o mínimo de cuidado médico ou apoio emocional. 1.3.4 Lei Áurea Brilhante participação ativa de intelectuais e políticos como Joaquim Nabuco28, José Carlos do Patrocínio – ambos fundadores da Sociedade Brasileira contra a Escravidão em 1880 – e Ângelo Agostini que fomentaram o27 Ibidem, p. 68. 28 Ver a obra de NABUCO, Joaquim. O abocionista. Brasília: Vozes, 1977. 15 fortalecimento das campanhas abolicionistas por todo o país. Já em 1884 o Ceará, por exemplo, decretava o fim da escravidão. A agitação e o clamor público era muito expressivo, gerando inúmeros debates, conflitos, entraves políticos e lutas. Mas o árduo caminho para se chegar na conquista de libertação foi descrito principalmente pela classe dominante, até porque na época, apenas trinta por cento da população era alfabetizada. Diversos abolicionistas dedicados a causa estão anônimos na história, posto que não puderam escrever tampouco contar sua própria trajetória, ante a valorização exacerbada da ação parlamentar enquanto dádiva das classes dominantes. Aliás, interessante trazer a baila um pequeno trecho da obra O Abolicionista29: O abolicionismo era, além do mais, uma causa generosa e cristã e falava aos sentimentos filantrópicos que a sociedade cultivava. Ser a favor da emancipação dos escravos era ser a favor do progresso e da civilização, pois a escravidão fora condenada em nome do progresso e da civilização nos países mais desenvolvidos. (...) A abolição passara a ser uma causa nobre; a defesa da escravidão odiosa. Alistar-se nas fileiras do abolicionismo era também combater as oligarquias que se apegavam à escravidão. Para uns a escravidão era uma convicção; para outros, um expediente (ou talvez ambos) e, cada vez mais, as fileiras do abolicionismo recebiam novos recrutas. Intensificou-se a participação dos negros no processo abolicionista e as fugas em massa dos escravos aumentaram. Cada vez mais, os senhores temiam perder o controle da situação, juntamente com o seu patrimônio e estabilidade. A pressão sobre o governo imperial foi grande tanto interna (grande concorrência de mão-de-obra imigrante) quanto externa, principalmente 29 COSTA, Emília Viotti da. A abolição. p. 63. 16 da Inglaterra. O Projeto de Abolição foi apresentado à Câmara em 8 de março de 1888 e em 13 de maio de 1888, a princesa Isabel Cristina Leopoldina de Bragança sanciona a Lei nº 3.353 a Lei Áurea, extinguindo a escravidão no Brasil. Finalmente, veio a abolição da escravatura. Abdias do Nascimento tece duras críticas à lei em comento, comparando-a a uma mistificação histórica, juntamente com a Lei do Ventre Livre, as quais, não implicaram numa redemocracia do país, propriamente dita. Interessante mencionar o seguinte trecho dessas críticas:30 O 13 de maio de 1888, representou para aquela elite europóide o que representou para Pilatos o ato de lavar as mãos. E foi num outro 13 de maio que Rui Barbosa tocou fogo em todos os documentos relativos à escravidão e ao tráfico negreiro, tentando apagar de uma vez por todas essa nódoa no suposto humanismo brasileiro. Lavando suas mãos, nas águas rituais da magia branca, Rui Barbosa pretendeu liberar as classes dirigentes das conseqüências do seu tenebroso passado escravagista. Ao mesmo tempo, quis erradicar para sempre a possibilidade de o negro investigar mais minuciosamente sua própria história. Pois do resgate de sua história, o negro poderia passar à reivindicação do que de direito lhe cabe: a indenização pelos séculos de massacre, exploração e espoliação que sofreu. Mas a perseguição, insegurança e falta de valorização não havia terminado. Após a vigência das leis supracitadas, os negros são chamados a encontrar espaços em projetos políticos, econômicos e sociais, extremamente fechados. Os ex-escravos tiveram dificuldades em se adaptar a nova situação e o clima político que se criou era desfavorável a sua efetiva participação na sociedade. Viviam conforme lhes permitia a situação econômica e de saúde, peculiaridade regional, concorrência de mercado dentre outros desafios. 30 NASCIMENTO, Abdias do. Combate ao racismo: Discursos e projetos. Brasília: Coordenação de Publicações – Câmara dos Deputados, 1983. p. 11. 17 De um lado, aqueles que partiram para as zonas rurais, não raro foram substituídos pelo imigrante branco europeu ou japonês. De outro também foram preteridos nas cidades enquanto mão-de-obra para a nascente indústria brasileira. Até a oficial abolição da escravatura, a população negra era considerada mera mercadoria, e discutia-se constantemente o direito de existirem com seres humanos. Contra esta população foram usadas todas as formas de exploração, dominação e diferenças imagináveis que possam separar os cidadãos. Com essa extinção o negro não tinha os direitos sociais e de cidadania garantidos, mas juridicamente foi muito importante pois, repita-se, em tese, foi o fim da escravatura. A lei ora analisada não criou nenhum mecanismo para integrar o ex-escravo à sociedade, predominando uma questão verificada até os dias atuais – o preconceito de cor. 1.4 DEFINIÇÃO DE PRECONCEITO DE COR A análise do aparato normativo antidiscriminação em vigor exige uma qualificação jurídica de fenômenos como Discriminação Racial e Preconceito, porquanto a possibilidade de interpretações equivocadas. Na definição da categoria preconceito, vale-se dos ensinamentos de Antonio Garcia Miranda Neto31: Preconceito é uma atitude negativa, desfavorável, para com um grupo, ou seus componentes individuais. É caracterizado por crenças estereotipadas. A atitude resulta de processos internos do portador e não do teste de atributos reais do grupo. Nas Ciências Sociais, o termo preconceito é usado quase exclusivamente em relação aos grupos étnicos. Dentro dessa limitação há o consenso vastamente difundido quanto a alguns elementos da definição do 31 MIRANDA NETO, Antonio Garcia et al. Dicionário de Ciências Sociais. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1986. p. 962. 18 termo: preconceito é uma atitude desfavorável para com um grupo étnico (ou membros individuais do grupo). O preconceito é a causa para a prática de atitudes discriminatórias, que culminam no racismo. É o elemento justificador dessas medidas abusivas que resulta da socialização do homem e da cultura do meio social que está inserido. José Leon Crochick32 assim se manifesta com relação ao tema: (...) aquilo que leva o indivíduo a ser ou não ser preconceituoso pode ser encontrado no seu processo de socialização, no qual se transforma e se forma como indivíduo. (...) O processo de socialização, por sua vez, só pode ser entendido como fruto da cultura e de sua história, o que significa que varia historicamente dentro da mesma cultura e em várias culturas diferentes. Cuida-se de um tema polêmico arraigado de interpretações equivocadas e fortalecido por segregações sociais, que apenas levam à conclusão do grau de ignorância da população brasileira que mascara a sua existência sob o argumento de “país da miscigenação racial.” Apesar do aparato normativo já citado, principalmente com a promulgação da Lei Áurea, a luta pela liberdade não foi concluída. Evidente que o preconceito de cor e a discriminação são questões sociais que urgentemente precisam ser resolvidas. 1.4.1 A origem do preconceito de cor Na antiguidade, era a evolução de determinados povos que causava certos tipos de preconceito, mas com o passar do tempo a justificativa 32 CROCHICK, José Leon. Preconceito, Indivíduo e Cultura. São Paulo: Rode Editorial, 1997. p. 11. 19 para um tratamento diferenciado baseou-se, principalmente, nas vantagens de ordem econômicas. Para corroborar tal assertiva, Arnold Rose33 em seu artigo: A origem dos preconceitos aponta que: “Uma das origens mais evidentes dos preconceitos é a vantagem ou o proveito material que deles se extrai”. Afirma Joel Rufino Santos34 sobre o tema: ”O racismo dentro dos países capitalistas desenvolvidos, quenão foram colônias (como a Inglaterra e a França, por exemplo), é fruto da competição e da divisão de trabalho.” O fato é que a origem do racismo não pode ser definida cientificamente, sendo impossível determinar datas precisas que indiquem o surgimento do tratamento discriminatório com relação às raças na humanidade. É Eliane Azevedo35, quem descreve a primeira referência racista aceita pelos pesquisadores: (...) a mais antiga referência a discriminação racial data de aproximadamente 2000 a.C e consta de um marco erigido acima da segunda catarata do Nilo, proibindo qualquer negro de atravessar além daquele limite, salvo se com o propósito de comércio ou de compras. Fica óbvio que a discriminação era fundamentalmente de ordem econômico-política, usando a raça como referencial. Destaca-se a título de exemplo o tipo de colonização portuguesa no Brasil em relação aos negros e indígenas, mantendo sobre eles o domínio e impondo sua cultura, fortalecido por um complexo de superioridade. Os próprios jesuítas, assim como inúmeros filósofos e pensadores que se preocupavam com a salvação das almas dos negros e com as suas condições de vida, tinham real consciência da sua importância para o desenvolvimento da economia daquela época. Enquanto isso, inicialmente as 33 ROSE, Arnold M. A origem dos preconceitos. In: DUN, L.C. et. Al. Raça e ciência, 1972. p. 163. 34 SANTOS, Joel Rufino dos. O que é racismo, 1984. p. 39. 35 AZEVEDO, Eliane. Raça, conceito e preconceito. São Paulo: Brasiliense, 1987. p. 23. 20 índias e posteriormente as negras eram sexualmente usadas e os filhos advindos dessa união não eram reconhecidos tampouco valorizados. Sob o âmbito mundial, a situação também não era das melhores. Os descobrimentos e colonizações contribuíram para a propagação do racismo, na medida em que aumentava a pobreza e a diferença entre as classes sociais. O ápice da difusão desse fenômeno deu-se com a exploração de argumentos biológicos para justificar as diferenças raciais pelo francês Joseph-Arthur Gobineau36, até hoje considerado o pai do racismo, que associava os negros aos macacos, escritor ensaio “A Desigualdade das Raças Humanas” e também os escritos de Charles Kingsley. Joseph-Arthur Gobineau, em síntese, defendia que os arianos representavam a raça suprema no mundo moderno. Para ele, negros, índios e brancos formam espécies diferentes, assim no caso de cruzamento entre si o descendente seria estéril ou teria alguma deficiência. Tais obras somadas as de outros autores baseadas na narrativa de viagens que descrevem vulgarmente as diferenças étnicas, auxiliaram na propagação de uma idéia errônea que até pouco tempo atrás era universalmente aceita. Embora a pesquisa de Darwin materializada em: Origem das Espécies, baseada, em resumo, na evolução das espécies tenha trazido novos argumentos científicos no que toca à raça humana, a influência social e hostilidade a determinados grupos, não diminuiu. 1.5 DEFINIÇÃO DE RAÇA A categoria raça não guarda relação com o fator biológico, mas é muito utilizada na identificação de um grupo cultural ou étnico- lingüístico, 36 Ibidem, p. 25. 21 adquirindo uma variedade de significados. Nesse viés, o sentimento das diferenças raciais é universal. Dunn37 enfatiza que: A opinião da Biologia é, no presente caso, clara e inequívoca. A concepção moderna de raça, fundada sobre as teorias da hereditariedade, priva de toda justificação a antiga concepção segundo a qual existiram diferenças fixas e absolutas entre raças humanas e, por conseguinte, uma hierarquia de raças superiores e inferiores. Para os sábios atuais, as raças são subdivisões biológicas de uma espécie única, a do Homo Sapiens, dentro da qual as características hereditárias comuns a toda espécie ultrapassam de longe as diferenças relativas e mínimas que separam as subdivisões. Esta mudança de perspectiva biológica tende a revalorizar a concepção de unidade humana que se encontra nas antigas religiões e mitologias, e que tinha desaparecido durante o período de separatismo geográfico, cultural e político, do qual saímos atualmente. Para Eliane Azevedo38: O ponto fundamental do conceito de raça é o fato de que as populações, em cujas características se elaboram as classificações raciais, pertencem à mesma espécie. Em outras palavras, o mais fundamental aspecto biológico das raças está naquilo que as une e não naquilo que as separa. Cientificamente, é sabido que as raças não têm origens genéticas diferentes, as diferenças físicas que deram origem à classificação das mesmas resultam de adaptações climáticas, de acordo com as regiões que os homens ocupavam acentuado pelo processo de seleção natural. Assim, sociologicamente, as raças surgiram quando o homem já havia atingindo o estágio de homem moderno. 37 DUNN, L.C. Raça e Ciência. p. 8. 38 AZEVEDO, Eliane. Raça, conceito e preconceito. p. 22. 22 Inicialmente, importa ressaltar a idéia de que é impossível delimitar as raças, pois as variações existentes entre tais grupos são superficiais, o que inibe, ou melhor, impossibilita a separação biológica. A maioria das classificações baseiam-se em características físicas, o que é ineficaz. Os estudos de freqüências gênicas, através de marcadores genéticos no sangue também não são perfeitos. O mais importante é que embora as variadas características do ser humano, todos pertencem à mesma espécie. Essa idéia de unicidade está relacionada à descoberta da hereditariedade biológica. Todos os homens descendem de ancestrais comuns sendo, portanto, apresentados pelo sangue, tendo uma herança biológica comum. Essa evidente variedade de características físicas dos grupos tem uma importância prática no sentido de que estabelece separações entre a população. Por exemplo, a cor da pele oferece imediata impressão da diferença entre os grupos. De maneira geral, é comum dizer que a raça é caracterizada pela freqüência de características hereditárias que não aparecem uniformemente em todos os seus membros. Ocorre que além dos indivíduos se diferenciarem, o meio no qual estão inseridos, também não é o mesmo e algumas combinações de genes, se adaptam melhor do que outras a certas condições. Interessante mencionar o trecho do artigo de Harry Shapiro39: Se compararmos as raças sob o ponto de vista da resistência biológica, também não se constatam, pelo menos até o presente momento, diferenças acentuadas que permitam afirmar que uma seja superior à outra. Certos fatos parecem provar que todas as raças se adaptam progressivamente ao seu meio, o que lhes permite acomodar-se melhor às suas condições de existência do que o fazem os grupos de invasores adaptados a condições diferentes. É assim que as recentes pesquisas sobre a perda do 39 SHAPIRO, L. HARRY. Raça e Ciência. p. 133-134. 23 calor corporal provaram que os negros dispõem, nesse aspecto, de um mecanismo fisiológico mais eficaz que os brancos. Não se segue que o negro tenha uma superioridade biológica sobre o branco, salvo nas circunstâncias especiais onde este fenômeno de adaptação constitui para ele uma vantagem. Analogamente os esquimós têm, no seu próprio meio, uma clara superioridade sobre todas as outras raças; mas esta vantagem torna-se para eles um inconveniente em outras regiões. Pretende-se, por vezes, que as raças que vivem sob climas menos extremos e não sejam constrangidas a adaptar-se a situações também especiais, se acomodam a uma maior variedade de condições mesológicas. Mesmo se assim for, seria difícil classificar estas raças a partir de sua resistência biológica, visto que tais julgamentos só têm, no fim de contas, um valor relativo e provisório. No que diz respeito a idéia deraça pura, registre-se que é incompatível com os conhecimentos de genética desenvolvida até então, portanto anticientífica. A mistura dos povos acompanhou os agricultores ainda no período de difusão do emprego do arado e posteriormente os bárbaros, que inventaram o carro de guerra, domesticaram o cavalo e diversas outras invenções e se espalharam por toda a Europa. Até mesmo entre os judeus, que são conhecidos por um certo isolamento reprodutivo, a partir de estudos de cálculos de freqüências gênicas, constatou-se uma mistura racial na taxa aproximada de 1% de genes por geração. Para corroborar40: Todavia, estudos antropológicos demonstram semelhanças entre judeus e não-judeus vivendo na mesma região, e os geneticistas, através de cálculos de freqüências gênicas, concluíram que existe mistura racial entre os judeus a uma taxa média de 1% de genes por geração. Então, fica claro que tendo como justificativa a especialidade científica, do ponto de vista biológico as raças humanas não existem, tese já pacificada. Seguindo essa linha de raciocínio, a idéia de classificação biológica de 40 AZEVEDO, Eliane. Raça, conceito e preconceito. p. 33. 24 afro-descendência através da morfologia, fica para segundo plano, ou melhor, é amplamente desvalorizada. Resta a identificação a partir das características e critérios de ordem psicológica e cultural, o que deixa inúmeras dúvidas. A própria categoria ‘mulato’, por exemplo, dentre tantas outras, é popular e não de antropologia física. Incabíveis e superadas, portanto, as teses referentes à pureza e uniformidade de raças, destaca-se a imprecisão, má colocação e confusões geradas pelo termo mulato. 1.5.1 O que é racismo? Colhe-se do artigo 1º, da Convenção Internacional Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial a única definição de discriminação racial disponível no ordenamento jurídico: A expressão discriminação racial significará qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseadas em raça, cor, descendência ou origem racial ou étnica que tem por objetivo ou efeito anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício num mesmo plano (em igualdade de condição), de direitos humanos e liberdades fundamentais no domínio político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro domínio de sua vida. Esse reconhecimento dos direitos humanos foi aprovado pela Assembléia Geral da ONU em 1965, ratificada pelo Brasil através do Decreto Legislativo nº 23, passando a ter efeitos a partir de 1969, promulgado pelo Decreto nº 65.810. Na sua obra de Direito Constitucional Walter Ceneviva41 conceitua racismo “como o tratamento desigual manifestado pelo agente, em 41 CENEVIVA, Walter. Direito Constitucional Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 78. 25 função de raça ou cor de pele, ou qualquer outro ato em que se identifique a desigualdade segundo critérios objetivos.” No ordenamento jurídico brasileiro racismo é caracterizado pelo tratamento desigual baseado na etnia ou cor da pele, pelo sentimento de superioridade de determinado povo em detrimento dos demais. Joel Rufino dos Santos42 cita em sua obra: ”O racismo é fenômeno universal. O homem está sempre defendendo seu espaço contra a invasão de outros, os quais, freqüentemente pertencem a outras raças”. Em síntese, o termo racismo caracteriza-se pelo tratamento desigual baseado na cor e etnia. É uma ofensa que leva em consideração algumas características físicas e também culturais do indivíduo. 1.5.2 Definição de cor Indubitavelmente, trata-se de algo extremamente insignificante mas que pode desencadear em graves e violentas práticas discriminatórias. Para Rodrigo César Rebello Pinho43: “A cor corresponde à maior ou menor pigmentação da pele”. Como já abordado anteriormente, ao ser avaliada fenotipamente tem uma relação muito fraca com o grau de ancestralidade africana, fato que gera inúmeras confusões principalmente num país tão tico em miscigenação quanto o Brasil. Visando dar sustentação à esse distanciamento entre a cor e o grau de ancestralidade de um determinado indivíduo, vale-se do seguinte apontamento extraído de uma reportagem da Revista Veja: 42 SANTOS, Joel Rufino dos. O que é Racismo. p. 18. 43 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria geral da Constituição e direitos fundamentais. Rio de Janiero: Takano, 2001, v. 17. p. 95. 26 1.6 AFINAL, QUEM É NEGRO NO BRASIL? Na sociedade atual, a genética ganha uma inserção cada vez maior. Assim, estando em voga os debates quanto à legitimidade das cotas universitárias para negros, enquanto ação afirmativa, os geneticistas são chamados a responder o questionamento: quem é realmente negro no Brasil? Em que pese toda pressão por uma resposta definitiva no plano científico, concluem Pena e Bortolini44: Tendo em vista a nova capacidade de se quantificar objetivamente, por meio de estudos genômicos, o grau de ancestralidade africana de cada indivíduo, pode a genética definir quem deve se beneficiar das cotas universitárias e demais ações afirmativas? Prima facie poderia parecer que sim, mas a nossa resposta é um enfático NÃO... Acreditamos que a genética moderna pode oferecer subsídios para as decisões políticas e que o perfil genético da população brasileira certamente deve ser levado em conta em decisões políticas. Por outro lado, a genética não pode arrogar-se um papel prescritivo explícito. Raça é apenas uma construção social e é inócua a tentativa de se adotar um critério científico de grupos raciais. Mas não é só, como a cor é um fraco fator de predição de ancestralidade genômica africana, conclui-se que nem todo afro-brasileiro é negro e nem todo negro é geneticamente um afrodescendente. O assunto é delicado e mostra-se complexo, na medida em que envolve fatores genéticos, culturais, econômicos, políticos e sociais. Os estudos genéticos realizados no Brasil reiteram o fato de que entre as características genômicas, não existem correspondências e a miscigenação existe entre os mais variados grupos étnicos. É que houve entrecruzamentos sucessivos entre os grupos, o que os torna muito próximos. 44 PENA, S. D. P.; BORTOLINI, M. C. Pode a genética definir quem deve se beneficiar das cotas e demais ações afirmativas? Estudos avançados, v. 18, n. 50, 2004. p. 46. 27 A identificação através da autodefinição abre espaço para inúmeras dúvidas e incertezas. Buscando equilibrar a polêmica aqui lançada, Sandro César Sell 45 destaca que: À identidade negra, então, associa-se a inseparabilidade de uma certa posição sócio-cultural. Um lugar onde o negro é esperado e um lugar do qual só com muito espanto e incômodo social ele pode se ver livre. Definida dessa maneira, a condição de negro aproxima tanto, e simplesmente, da posição de excluído, que é despiciendo dizer quão pouca operacionalidade jurídica teria esse conceito nas práticas de Ação Afirmativa. Já que o Brasil caracteriza-se pela miscigenação, predomina uma falsa impressão de que vivemos fraternalmente numa democracia racial. Mas do cotidiano, percebe-se uma injusta opressão dissimulada, seja no mercado de trabalho, na educação ou até mesmo na violência. Inibir as atitudes discriminatórias que implicam no índice de desemprego, salários mais baixos, menores oportunidades de ascensão social e trabalhos mais degradantes é um desafio para a cidadania. Nesse caminhar, a tão sonhada igualdade, em tese, já está garantida. Nas linhas acima delineadas estão expostas questões relacionadas ao preconceito de cor e discriminação racial, além de uma breve evolução da legislação nacional: Lei Diogo Feijó, que aboliu o tráfico negreiro, Lei Eusébio de Queiroz, Nabuco de Araújo, Lei do VentreLivre e Lei dos Sexagenários. A seguir, um destaque especial para o princípio da dignidade da pessoa humana e igualdade e a legislação brasileira positivada relacionada ao assunto aqui discutido, ante a sua importância, enfatizando a necessidade de um amadurecimento social. 45 SELL, Sandro César. Ação afirmativa e democracia racial: uma introdução ao debate no Brasil. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2002. p. 62. 49 Acerca da distinção entre as categorias direitos humanos e direitos fundamentais consultar KRETZ, Andrietta. Autonomia da Vontade e Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais. Florianópolis: Momento Atual, 2005. 28 CAPÍTULO 2 APARATO NORMATIVO BRASILEIRO EM RELAÇÃO AO PRECONCEITO DE COR E SUA APLICABILIDADE PRÁTICA: A IMPORTÂNCIA DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 2.1 DIREITOS HUMANOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS Após um longo período de desigualdade escancarada, os direitos humanos tornam-se a base da Sociedade. É que na Antigüidade o fenômeno da limitação do poder do Estado era desconhecido e a grosso modo, as leis que organizavam os Estados não atribuíam ao indivíduo direitos frente ao poder estatal. Entretanto, em algumas civilizações ancestrais, no Código de Hamurabi, nos escritos de Platão e diversos outros filósofos já percebe-se uma preocupação em atribuir não apenas deveres, mas também direitos aos seres humanos. Hodiernamente, está disposto no Ato das Disposições Finais e Transitórias da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no artigo 7º que: ”o Brasil propugnará pela formação de um tribunal internacional dos direitos humanos.” A origem dos direitos humanos está no direito natural clássico, com a concepção de que o homem é titular dos direitos dados por Deus. A expressão “direitos humanos” aparece pela primeira vez, aproximadamente em 1770, na França. 29 O direito natural ou jusnaturalismo foi criado pela filosofia estóica na Grécia Antiga e evidentemente reflete no ordenamento jurídico pátrio. Alguns de seus pressupostos referem-se a preceitos universais e imutáveis e outros adaptáveis à época e a determinadas regiões. Dessa forma, são regras natas da natureza humana. Na Antigüidade, não se destaca nenhum avanço relevante acerca dessa temática. A sociedade medieval, por sua vez, era religiosa, economicamente auto-suficiente, rural e coletiva. Com a transição para a sociedade moderna e fortalecimento do comércio as pessoas começam a pensar mais em si. O individualismo cresce juntamente com a urbanidade e é o fim do domínio de uma só religião. Começa a surgir um novo direito natural – racionalista – não codificado. O simples fato de ser homem, já o fazia titular de direitos humanos. As primeiras reivindicações dos autores ius naturalistas foram o direito a tolerância, liberdade de religião e humanização do direito penal, com a limitação do poder do Estado Absoluto. Quando se fala em direitos humanos é bastante comum a confusão conceitual entre com as categorias direitos fundamentais, as quais inúmeras vezes são aplicadas como sinônimas. Aliás, no próprio Texto Constitucional a terminologia utilizada “direitos fundamentais”, não é uniforme. Veja-se, os direitos humanos49 são mais genéricos e amplos de um ponto de vista geral, sob um âmbito internacional. Ao passo que os direitos fundamentais estão num âmbito mais nacional, garantidos pelo ordenamento jurídico de cada Estado. O título II, do Texto Constitucional de 1988 “os direitos e garantias fundamentais”, está subdividido em cinco capítulos: direitos individuais e coletivos, direitos sociais, nacionalidade, direitos políticos e partidos políticos. Especificamente, esses direitos e garantias fundamentais consagrados pela Constituição estão limitados nos outros direitos garantidos, o que caracteriza o princípio da relatividade. 30 Como características, mais uma vez adota-se as exposições da professora Andrietta Kretz, pelo cunho altamente didático. Ensina que o “caráter analítico deve-se ao fato de haver um grande número de dispositivos legais apresentados pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.”50 No que toca ao pluralismo acrescenta: “é característica em razão da redação final do texto constitucional acolher posições algumas vezes controvertidas entre si.”51 E ainda quanto ao caráter pragmático “é conseqüência do grande número de dispositivos constitucionais, que dependem de regulamentação legislativa infraconstitucional, que estabelecem programas e diretrizes a serem implementados e garantidos pelos poderes políticos.”52 Portanto, os direitos humanos no atual contexto constitucional brasileiro envolvem um caráter analítico, pluralista e pragmático que, em tese, são harmônicos entre si. Quanto à sua evolução, o direito de liberdade é considerado de primeira dimensão, cujas origens estão nas doutrinas iluministas e jusnaturalistas dos séculos XVII e XVIII (Hobbes, Locke, Rosseau e Kant). Os sociais, culturais e econômicos, além dos direitos coletivos provenientes dos movimentos e reivindicações de justiça social do século XX, são direitos de segunda dimensão. Os transidividuais, aqueles que ultrapassam as fronteiras das contendas nacionais - os direitos de solidariedade são de terceira dimensão. Já os de manipulação genética, vida e morte são de quarta dimensão e, finalmente, os relacionados à realidade virtual são os de quinta. 50 Ibidem, p. 68. 51 Ibidem, p. 69. 52 Ibidem, p. 69. 31 Comumente, existem diversas teorias negadoras dos direitos humanos, as quais tecem duras críticas que advêm de muitas frentes, desde revolucionários até pensadores pós-modernos.53 Destaca-se a crítica marxista que diz respeito a visualização dos direitos humanos como discurso da justificação da dominação social, mascarando verdadeiras condições estruturais que só poderiam levar à desigualdade social. Outras sequer preocupam-se em fornecer bases sólidas de justificação de suas posições, entretanto, tais críticas, não são objeto de estudo do presente trabalho, razão pela qual, não será realizada maior abordagem. Aqui, o enfoque é para uma perspectiva dos direitos humanos na medida em que se encontram positivados ou assegurados pela Constituição. 2.2 OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS CONSTITUCIONAIS Já que a idéia de soberania vem sendo rechaçada com o passar dos tempos e fala-se em relações transnacionais, não mais internacionais, faz-se necessário discorrer acerca dos princípios de um modo geral, enfatizando sua importância frente à regra específica, propriamente dita. Vale-se dos ensinamentos do filósofo Ronald Dworkin54, desenvolvidos e difundidos pelo jurista e filósofo alemão Robert Alexy, o qual, ao tratar do sistema de normas, defende a existência de uma diferença qualitativa e conceitual entre princípios e regras.55 A norma denota o gênero, da qual o princípio e a regra são as respectivas espécies. Os princípios são as normas de ordenação amplas, ou mandados de otimização que podem ser cumpridos em diferentes graus ou 53 Ver SAMPAIO, José Adércio Leite. Direitos Fundamentais: Retórica e Historicidade. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. 54 DWOEKIN, Ronald. Los Derechos em Serio. 4. ed. Barcela: Ariel, 1999. 55 Sobre o assunto ver ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica: A Teoria do Discurso Racional como Teoria da Justificação Jurídica. Tradução de Zilda Hutchinson Schild Silva. São Paulo: Landy, 2001. 32 níveis, segundo sejam aplicados por inteiro ou em partes, através do princípio da ponderação. Enquanto as regras, por sua vez, são as normas com exigência de cumprimento integral ou descumprimento total, sendo que a sua validade exige o cumprimento integral de seu conteúdo fáticoe jurídico. De acordo com Ruy Samuel Espíndola56 os princípios são: (...) estruturação de um sistema de idéias, pensamentos ou normas por idéia mestra, por um pensamento chave, por uma baliza normativa, donde todas as demais idéias, pensamentos ou normas derivam, se reconduzem ou se subordinam. Portanto, existe uma quantidade enorme de valores éticos intrínsecos aos princípios que atingem a Constituição como um todo, emprestando-lhe uma significação uniforme. A grosso modo, possuem como principais características a generalidade, primariedade e dimensão axiológica. Mais especificamente, acerca do princípio constitucional, assegura Luís Roberto Barroso57: Conjunto de normas que espelham a ideologia da Constituição, seus postulados básicos e seus fins (...) normas eleitas pelo constituinte como fundamentos ou qualificações essenciais da ordem jurídica que institui. Os princípios gerais do direito constitucional surgem da igualdade que se apregoa nas sociedades democráticas e possibilitam a interpretação e aplicação do Texto Constitucional. De outra banda, as regras notoriamente denotam comandos diretos que servem apenas para determinadas situações e que são sempre específicas e positivadas. 56 ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 47. 33 Diante deste contexto, os juristas precisam estar atentos e preparados para trabalharem com os princípios que não se acabarão com a globalização cada vez mais evidente, o que já não pode ser garantido no que tocam as regras. A professora Andrietta Kretz58 ensina que: Outro aspecto inovador é o fato da Constituição de 1988 apresentar o principal rol de direitos fundamentais bem no início do texto, ou seja, logo após o preâmbulo e os princípios fundamentais. Também faz uso da terminologia “direitos e garantias fundamentais”, que nas Constituições Brasileiras anteriores de 1988 apresentava-se como “direitos e garantias individuais”, muito embora a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, não apresente uma uniformidade em todo o texto constitucional no uso terminológico da categoria “direitos e garantias fundamentais”. Mais uma vez Andrietta Kretz59 esclarece: (...) Alexy destaca o caráter prima facie, tendo em vista que os princípios ordenam que algo deva ser realizado na “maior” medida do possível, levando em conta as possibilidades jurídicas e fáticas, por isso não contêm mandatos definitivos e sim prima facie. O princípio não determina como deverá ser resolvida uma relação entre razões opostas. Por esta razão, os princípios não possuem conteúdo determinativo com relação a princípios opostos ou possibilidades fáticas. Já as regras, pelo contrário, apresentam um conteúdo exato, ou seja, contêm uma determinação no âmbito das possibilidades jurídicas e fáticas, e essas mesmas possibilidades poderão fazer com que a regra não seja válida. Assim, percebe-se que, de maneira sintética Andrietta Kretz destaca que os princípios suscitam problemas de validade e peso, já as regras somente questões de validade. 57 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 151. 58 Para maiores elucidações pesquisar em KRETZ, Andrietta. Autonomia da Vontade e Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais. p. 68. 59 Ibidem, p. 65. 34 Embora bastante difundida é importante fazer esta distinção entre as categorias ora trabalhadas posto que facilitam a compreensão da discussão proposta. O artigo 1º da Constituição de 1988 dispõe que “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de direito.” A partir daí, fica a ressalva de que o sistema de governo é republicano, descentralizado política e administrativamente e fundado na soberania popular. 2.2.1 O princípio da dignidade da pessoa humana Como anteriormente exposto, um princípio é o pilar do ordenamento jurídico, a substância do direito. Sendo anteriores à própria lei, devem ser respeitados, estando inseridos de fato, no ordenamento jurídico atribuindo eficácia à norma. Nessa discussão, não poderia deixar de citar como fundamentos o princípio da legalidade, igualdade e dignidade da pessoa humana, essenciais em sede de Estado Democrático de Direito. Indubitavelmente, a luta pela garantia das liberdades individuais foi marco precursor inafastável, de forma que os conceitos de liberdade e dignidade se confundem como que se considerasse a dignidade como evolução natural daqueles. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 nos seus artigos 1º, inciso III, e 60, § 4º, inciso III, estabeleceu como fundamento do Estado Democrático de Direito o princípio da dignidade da pessoa humana. Quando presente a prática de condutas como preconceito e discriminação essa dignidade é arrombada. 35 Rizzato Nunes61 lecionando acerca da dignidade oferece o seguinte conceito: (...) é um conceito que foi sendo elaborado no decorrer da história e chega ao início do século XXI repleto de si mesma como um valor supremo, construído pela razão jurídica. Com efeito, é reconhecido o papel do Direito como estimulador do desenvolvimento social e freio da bestialidade possível da ação humana. (...) se torna necessário identificar a dignidade da pessoa humana como uma conquista da razão ético-jurídica, fruto da reação à história de atrocidades que, infelizmente, marca a experiência humana. Na sociedade atual já se reconhece que a dignidade da pessoa humana, antes de se constituir apenas em princípio constitucional, representa uma ampla qualidade intrínseca do ser humano, não dependendo de nenhuma previsão legal para ser reconhecida. Aqui, reporta-se àquela distinção entre as categorias regras e princípios. É aceito que a partir do reconhecimento pelos cristãos da igualdade entre cidadãos e escravos, os quais passaram a ser reconhecidos como filhos de Deus o conceito de dignidade ganha valoração. Em seguida, com os ideais iluministas do fim do século XVIII, a visão de liberdade e igualdade, representa a base das liberdades e dos direitos da personalidade do homem. Assim se manifesta Kant62 sobre a dignidade: No reino dos fins, tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a coisa que se acha acima de todo preço, e por isso não admite qualquer equivalência, compreende uma dignidade. (...) o que se faz condição para alguma coisa que seja fim em si mesma, isso não tem simplesmente valor relativo ou preço, mas um valor interno, e isso quer dizer, dignidade. Ora, 61 NUNES, Rizzato. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 46. 62 KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes e outros escritos. Tradução de Leopoldo Holzbach, São Paulo: Martin Claret, 2004. p. 65. 36 a moralidade é a única condição que pode fazer de um ser racional um fim em si mesmo, pois só por ela lhe é possível ser membro legislador do reino dos fins. Por isso, a moralidade e a humanidade enquanto capaz de moralidade são as únicas coisas providas de dignidade. Aos poucos a necessidade de garantias mais amplas fica cada vez mais presente, ganhando força a proteção ao interior do indivíduo, a tutela à sua personalidade. 2.2.2 O princípio da igualdade Os princípios democráticos fundam-se na igualdade, liberdade e justiça. O Texto Republicano de 1988, por sua vez, prescreve dispositivos
Compartilhar