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APELAÇÃO 306 CTB negativa de autoria silencio in dubio ausencia de sinais CARLOS HENRIQUE 6231-5

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GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL
Defensoria Pública do Distrito Federal
Núcleo GAMA
Defensoria Pública do Distrito Federal
Núcleo GAMA
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DO TRIBUNAL DO JÚRI E DA VARA DOS DELITOS DE TRÂNSITO DA CIRCUNSCRIÇÃO JUDICIÁRIA DO GAMA-DF.
Autos n.º 2011.04.1.006231-5
		CARLOS HENRIQUE DA SILVA já qualificado nos autos supramencionados vem, assistido pela DEFENSORIA PÚBLICA – NÚCLEO DO GAMA, perante este juízo, interpor RECURSO DE APELAÇÃO, pugnando pelo seu recebimento e posterior remessa ao Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, para julgamento.
	
		Termos em que, pede recebimento.
		Gama/DF, 23 de novembro de 2012.
		
		
		Maurício Morimoto Doi
		Defensor Público
Egrégio Tribunal,
Colenda Turma,
Douto(a) Relator(a),
Ilustre Procurador(a) de Justiça.
RAZÕES DE APELAÇÃO
O apelante CARLOS HENRIQUE DA SILVA foi condenado como incurso no artigo 306 da Lei 9.503/97, sendo aplicadas as penas de 08 (oito) meses de detenção, para efetivo cumprimento em regime inicial aberto e 10 (dez) dias-multa, calculado cada dia-multa à proporção de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato, corrigida monetariamente. Além disso, foi suspensa a sua habilitação para dirigir veículo automotor (fls. 138/142).
Com a devida vênia, em que pese o brilhantismo do juízo a quo, a sentença merece ser reformada, pelos motivos de fato e direito a serem aduzidos no bojo desta peça.
Merece relevo que a magistratura, segundo a concepção garantista de Ferrajoli, exerce papel fundamental, principalmente no que diz respeito ao critério de interpretação da lei conforme a Constituição. O juiz não é mero aplicador da lei, mero executor da vontade do legislador ordinário. Antes de tudo, é o guardião dos nossos direitos fundamentais. Ante a contrariedade da norma com a Constituição, deverá o magistrado, sempre, optar por esta última, fonte verdadeira de validade da primeira.
I) DA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS DE AUTORIA
Consagrando o que já era previsto na Constituição Federal, o Código de Processo Penal passou a prever que:
Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.
Sob o crivo das garantias processuais constitucionais, foram ouvidas duas testemunhas, sendo o Recorrente, a seguir, interrogado.
CARLOS MAGNO PEREIRA DA SILVA narrou como foi a suposta abordagem do Apelante, mas não falou que o mesmo apresentava sinais de embriaguez. Ao final, ressaltou que “foi lhe apresentado o resultado do exame e o acusado não assinou o mesmo, pois “não há necessidade” (fl. 88).
JEANCYE RIBEIRO DA CUNHA reconheceu “que não se lembra do acusado e não pode dar nenhum detalhe sobre a ocorrência” (fl. 112).
Ocorre que este policial militar foi justamente aquele que subscreveu o teste do “bafômetro”, supostamente realizado pelo Recorrente, visto que este não o assinou (fl. 20). 
Ora, se ele não se recordava da ocorrência policial e nem mesmo do Apelante, como atribuir a conduta ora apurada à pessoa do réu?
O RECORRENTE exerceu o seu direito constitucional ao silêncio tanto na fase policial (fls. 08/09) como na fase judicial (fl. 113).
Merece lembrança o que prevê o Código de Processo Penal:
Art. 186. Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas. 
 Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa. 
Em outra perspectiva, não há, nos autos, qualquer prova, na acepção do art. 155 do CPP, ou pelo menos indício (reconhecido pelo Recorrente, mediante a sua assinatura), que comprove que seria o Apelante quem realizou o teste do “bafômetro” de fl. 20.
Relembremos que o teste de alcoolemia juntado à fl. 20 não possui a assinatura do Recorrente. Ademais, a pessoa que teria realizado esse suposto exame, o Sr. Jeancye Ribeiro, não se lembrava do Apelante (fl. 112).
E a isto se resume o conjunto probatório dos autos. O Recorrente jamais foi ouvido e não há uma prova de que fora submetido a exame alcoólico.
Portanto, o Ministério Público não logrou provar a autoria delitiva imputada ao Apelante. Ora, a prova da alegação incumbe a quem a fizer.
O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou neste sentido:
Roubo qualificado por emprego de arma (art. 157, § 2º, I, do Cód. Penal). Apreensão e perícia (ausência). Qualificadora (não ocorrência). Prova testemunhal (insuficiência). Ônus da prova (Ministério Público). 1. O inciso I do § 2º supõe a apreensão da arma, também a sua perícia, porque arma, para ser arma, há de ser eficaz. As coisas são o que são; conforme a poética de Eliot, "alegro-me de serem as coisas o que são". 2. Em sua dialética, o processo penal supõe seja do Ministério Público o ônus de toda a prova de acusação, aí figurando, claro é, o ônus de provar a qualificadora. 3. Carente a espécie da apreensão da arma e, consequentemente, da perícia, não se aumenta, no caso, a pena, visto que não ocorrente a qualificadora. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1111665/SP, Rel. Ministro NILSON NAVES, SEXTA TURMA, julgado em 01/09/2009, DJe 23/11/2009)
PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO COM VIOLÊNCIA PRESUMIDA. PROVA DA IDADE DA OFENDIDA. CÓPIA DE CERTIDÃO OU DOCUMENTO HÁBIL. IMPRESCINDIBILIDADE. I. A prova acerca do disposto na alínea "a" do ora revogado art. 224 do Código Penal, por ser dado fundamental para a adequação típica da imputatio facti, deve obedecer à exigência prevista no art. 155, parágrafo único, do CPP, mormente quando a ofendida não é de tenra idade ou, então, não está distante da idade limítrofe de 14 anos. II. A eventual permissão legal de demonstração subsidiária não se equipara à forma meramente alternativa. Inexistindo motivos para a não juntada oportuna da prova legalmente exigida, é desautorizada a simples substituição - como se opção fosse - por dados outros, carecedores, em situações tais, de força probatória apta a contornar a expressa e legal limitação, o que, igualmente, não desobriga a acusação do onus probandi. Recurso provido. (REsp 1120110/AC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 23/03/2010, DJe 03/05/2010)
Nesse contexto, deve prevalecer o princípio in dubio pro reo, pois o julgador acolhe a tese acusatória só se estiver provada, mas está obrigado a anuir com todas as possibilidades absolutórias não desautorizadas pela acusação. 
Assim leciona, entre outros, Paulo Rangel:
Pensamos que, à luz do sistema acusatório, bem como do princípio da ampla defesa, inseridos no texto constitucional, não é o réu que tem que provar sua inocência, mas sim o Estado-administração (Ministério Público) que tem que provar a sua culpa. A regra inserta na Carta Política (art. 5º, LVII) inverte, totalmente, o ônus da prova para o Ministério Público. Hoje, não é mais o réu que tem que provar o álibi alegado; é o Ministério Público que tem que provar a inexistência deste álibi. (...) Entendemos que nova visão deve ser dada ao ônus da prova à luz do que estatui a Constituição Federal. Assim, sejam as causas de exclusão da ilicitude, de culpabilidade ou extinção da punibilidade, bem como os elementos subjetivos do tipo (dolo ou culpa), o ônus de provar ou não sua existência é do Ministério Público. (Direito Processual Penal. Rio de Janeiro. Lúmen Juris. 2002. p. 25/26).
II) DA INSUFICIENTE PROVA DA MATERIALIDADE DELITIVA
Em outra perspectiva, é de se reconhecer que o “teste do bafômetro” não se mostra suficiente para comprovação da materialidade delitiva. Senão vejamos.
Assim prevê o Código de Trânsito Brasileiro:
Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litrode sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência:
Parágrafo único. O Poder Executivo federal estipulará a equivalência entre distintos testes de alcoolemia, para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo. 
Consoante acima transcrito, o caput do dispositivo é expresso ao indicar o limite de 6 (seis) decigramas por litro de sangue, inserido como elementar do tipo incriminador, cuja prova é exigência legal para configuração do crime, hoje entendida como tarifada.
Assim entende o jurista FERNANDO CAPEZ: 
“No momento em que o nível de alcoolemia (6 decigramas de álcool por litro de sangue) foi inserido como elementar do tipo incriminador, tornou-se imprescindível a comprovação cabal dessa dosagem sob pena de atipicidade da conduta. O nível de álcool, por se tratar de medida técnica, necessita de demonstração pericial. Em outras palavras, não se consegue extrair o exato nível de alcoolemia mandado o agente ‘fazer o quatro’ ou ‘dar uma andadinha’ ou ainda ‘falar 33 no consultório médico’. A Lei fala em 6 decigramas de álcool por litro de sangue, tornando imprescindível, perdoem-me a redundância, o exame de sangue. Não há como substituir essa prova, nem mesmo pelo etilômetro, vulgarmente denominado bafômetro. (Jornal Carta Forense, segunda-feira, 4 de agosto de 2008). Grifo nosso.
Como defende o respeitado penalista, com a nova Lei, a medida de 6 decigramas de álcool por litro de sangue passou a integrar o tipo, esse mesmo nível passou a constituir o próprio corpo de delito, afastando tanto a prova testemunhal quanto a confissão do acusado.
Nesse sentido é o entendimento do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios:
“PENAL. PEDIDO DE CONDENAÇÃO POR EMBRIAGUEZ AO VOLANTE (ART. 306 CTB). INVIABILIDADE. PROVAS INSUFICIENTES. APLICAÇÃO DA LEI N. 11.705/2008. RECURSO DESPROVIDO. Para que haja condenação, necessária prova inconteste de autoria e materialidade. A comprovação de embriaguez ao volante (art. 306 do CTB) se faz com o laudo pericial que comprova a quantidade de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, conforme determina a Lei N. 11.705/2008. Não havendo tal comprovação a absolvição se impõe. Recurso desprovido” (TJDFT - Apelação Criminal 20080110715765APR. Dês. SILVÂNIO BARBOSA DOS SANTOS). Grifo nosso.
Por outro lado, ao estabelecer a possibilidade de equivalência entre distintos testes de alcoolemia por meio de decreto, como é o caso do etilômetro, o parágrafo único do referido tipo revela-se flagrantemente inconstitucional, completamente incompatível com a Constituição Federal, a qual impõe que só por Lei Federal se possa legislar sobre tipos penais (art. 5º, XXXIX, da CF).
Desse modo, sob o influxo da estrita legalidade e atento aos pressupostos constitucionais delineadores do Direito Penal, apenas a coleta de sangue forneceria o subsídio verossímil para medição do teor de substância indesejada no organismo.
Por conseqüência, a absolvição se impõe diante da ausência de provas do tipo objetivo, imprescindível para a configuração do fato típico.
III) DA ATIPICIDADE MATERIAL. DA NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE PERIGO CONCRETO DE DANO
Em outra perspectiva, a conduta do Recorrente se mostraria materialmente atípica, visto que não comprovado o perigo concreto de dano. 
O Apelante trafegava normalmente pela via, quando foi abordado por agentes policiais.
Transcrevemos, por oportuno, entendimento externado por este Juízo, nos autos de nº 2009.04.1.005380-4, em sentença absolutória subscrita pelo Dr. Edilberto Martins de Oliveira:
Vale lembrar, num primeiro momento, o juízo de valor emitido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, por meio do acórdão de fls. 96-100, quanto ao enquadramento típico da conduta.
 Tal orientação, todavia, não reúne aptidão para vincular o entendimento deste juízo, dada a natureza necessariamente provisória do esforço de cognição que a embasou.
 Dito isso, é preciso destacar que os fatos, na configuração delineada nos autos, não resistem a um juízo crítico de tipicidade material.
O crime de embriaguez ao volante está definido no art. 306 da Lei n. 9.503/97, que declara punível o comportamento de quem toma a direção, em via pública, de veículos automotores, apresentando, no organismo, grau etílico igual ou superior a 6 (seis) decigramas de álcool por litro de sangue.
Coube ao decreto presidencial n. 6.488, de 19 de junho de 2008, o encargo de fixar o parâmetro de equivalência entre os resultados dos testes realizados com aparelhos de ar alveolar pulmonar _ o popular "bafômetro" _ e os exames de alcoolemia elaborados com base em amostras sanguíneas. 
A propósito, foi instituído o índice de 0,3 mg/l, como o marco a quo da ilicitude da conduta.
 Portanto, à vista do resultado da perícia a que foi o réu submetido , uma exegese puramente literal do preceito traria, como conseqüência, a conclusão de estar o comportamento amoldado ao tipo penal veiculado pelo art. 306 do CTB.
 A interpretação sistemática do dispositivo conduz, todavia, a entendimento diverso.
 É que, de acordo com a tábua de princípios consagrada na Constituição da República, as condutas humanas só encerram relevância penal, na medida em que agravem ou exponham a risco de dano concreto os bens jurídicos a que visam resguardar.
 A inferência está lastreada em dois postulados constitucionais de destacado relevo, a saber: o princípio da razoabilidade, implicitamente contido na cláusula do devido processo legal, e o princípio da ofensividade, que tem sede expressa, no art. 98, I, do texto magno.
 No primeiro caso, com apoio na dimensão substancial do due process of law, veda-se ao poder público a adoção de providências desarrazoadas, na limitação da liberdade individual. Tal orientação, aplicada à função legislativa, impede que, na instituição das normas penais incriminadoras, sejam levados em conta comportamentos não afrontosos dos valores sob tutela.
 Por tais razões, não se reconhece, em prol do legislador, a prerrogativa de criar tipos penais fundados numa noção de perigo abstrato.
 À luz da teoria do bem jurídico, uma conduta que ao menos não submeta os interesses eleitos a um risco efetivo de dano não pode ser alvo de repressão penal.
 O direito penal, por traduzir a mais drástica forma de intromissão do Estado na esfera da liberdade das pessoas, deve-se pautar por uma atuação residual e fragmentária, não sendo legítima a sua incidência nos casos em que o interesse pode ser provido, em outros campos do agir jurídico, de modo menos gravoso para a cidadania.
 É precisamente o que ocorre, quando - como se dá, na espécie - não se divisa, na conduta, potencialidade daninha objetivamente aferível.
 No caso, os nobres propósitos que presidiram a instituição do Código de Trânsito Brasileiro podem ser alcançados com a aplicação de severas penalidades administrativas, sem que se faça necessário recair, sobre o infrator, o estigma da condenação criminal.
Noutro passo, o princípio da ofensividade, claramente agasalhado pelo texto constitucional, opõe óbice intransponível a que se estabeleçam crimes fundados em uma idéia de perigo presumida pela lei, jure et de jure. 
Diante dessas considerações, só há um modo de compatibilizar-se o preceito contido no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro com a Constituição da República: considerar-se, como implícita na conformação típica da conduta apenada, a exigência da geração perigo concreto de dano.
 Todas as possibilidades exegéticas que tenham, por pressuposto, a desnecessidade de configuração dessa elementar objetiva não encontram respaldo no texto constitucional e devem, por isso, ser rechaçadas, à luz de uma interpretação conforme.
 Firmadas tais premissas, é forçoso reconhecer, com apoio na prova composta judicialmente, que tal situação de fato não chegou a aperfeiçoar-se, na espécie.
Deveras, nenhum dos testemunhos colhidos durante a instrução atestou o fato de ter o réu, de algum modo, comprometido a segurançaviária.
 Ao revés, a convicção tirada do acervo probatório sinaliza no sentido de estar ele, por ocasião da abordagem policial, conduzindo o seu veículo normalmente, com a estrita observância das normas de circulação.
 Impõe-se, assim, o juízo de atipicidade da conduta.
 Do exposto, absolvo o réu da imputação que lhe é endereçada, com apoio no que prevê o art. 386, III, do Código de Processo Penal.”
Logo, a absolvição se impõe.
IV) DA INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO DO ART. 306 DO CTB: DOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA LESIVIDADE. DA NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA INFLUÊNCIA ALCÓOLICA.
Em sentido semelhante, este Juízo se manifesta que é imprescindível a comprovação de que o réu apresentava sinais de embriaguez para configuração do tipo.
Pedimos vênia, mais uma vez, para transcrever decisão de rejeição da denúncia deste Juízo, em cognição sumária, subscrita pelo Dr. Henaldo Silva Moreira (autos de nº 2009.04.1.005396-6):
“Inicialmente, abro um parêntese, a fim de tecer alguns comentários acerca da recente alteração legislativa no tipo de embriaguez ao volante. Muito embora considere louvável a intenção do legislador de tornar mais rigorosas as regras de trânsito, visando, assim, reduzir os excessivos índices de acidentes causados, em todo país, pelo uso indevido de álcool por motoristas inconseqüentes, considero que a inovação legislativa deve ser interpretada à luz dos princípios constitucionais, sob pena de serem criadas situações desiguais e inconciliáveis. 
O primeiro obstáculo, mesmo não sendo questão discutida no presente caso, consiste na dificuldade de produção da prova do índice de concentração de álcool no sangue do condutor. De fato, basta o motorista se recusar a submeter-se ao "bafômetro" ou ao exame de sangue para inviabilizar a persecução penal, já que a prova sobre a elementar de caráter objetivo - quantidade de álcool no sangue - não poderá ser produzida de outra forma.
 A propósito do tema, vale citar um trecho do artigo do Desembargador Mário Machado, intitulado "Crime de Alcoolemia ao volante?", publicado no Jornal Correio Brasiliense, no dia 30.09.2008, no qual é apontada, dentre outras, a impropriedade discutida no parágrafo anterior. 
Após discorrer sobre os principais problemas da nova lei, o nobre Desembargador conclui rogando ao legislador: "volte a redação anterior do artigo 306! Quanto mais cedo melhor". 
Sem dúvida, essa seria a melhor solução! A redução nos índices de acidentes não se deve ao aperfeiçoamento da redação do artigo 306 do CTB, e sim ao maior rigor na fiscalização, agora com possibilidade de prisão em flagrante do motorista embriagado. 
O Código de Trânsito assim tipificava a conduta de dirigir embriagado: 
"Conduzir veículo automotor, na via pública, sob a influência de álcool ou substâncias de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem". 
A nova redação, introduzida pela Lei 11.705/08, passou a ser a seguinte: 
"Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência". 
Fazendo uma interpretação literal do dispositivo acima, conclui-se que para a configuração do delito de embriaguez ao volante basta tão somente a comprovação de certa quantidade de álcool no organismo do condutor. Significa dizer, caracterizada a referida elementar objetiva, seria desnecessário analisar se ele dirigia sob a influência de álcool. 
Todavia, como já dito, uma interpretação apenas literal do dispositivo seria contrária à Constituição Federal, pois restariam violados os princípios da isonomia e da lesividade. 
Com efeito, o legislador fixou um valor quantitativo apenas para o álcool, deixando de fazê-lo em relação às outras substâncias psicoativas que determinam dependência; talvez por vislumbrar a impossibilidade de detecção, pelo etilômetro (bafômetro), da presença de substâncias como maconha, cocaína e outras do gênero. 
Como cediço, a presença dessas substâncias no organismo somente é constatada pelos exames de sangue ou toxicológico, os quais, por serem altamente invasivos, dificilmente seriam feitos, pois a grande maioria dos condutores certamente se recusaria a realizá-los. 
Como se vê, a preocupação maior com o álcool acabou por criar uma situação inconciliável, caso adotada uma interpretação literal do dispositivo penalizador, principalmente porque, com exceção do álcool, foi mantida a elementar subjetiva "dirigir sob o efeito" em relação às outras substâncias psicoativas. 
Consoante já salientado, a citada elementar também integrava a antiga redação do artigo 306 do Código de Trânsito. Naquela época, a prova do "estado de embriaguez" podia ser pericial (exame clínico) ou testemunhal (relatos de condução anormal, como desrespeito ao sinal vermelho, alta velocidade, ziguezague na pista, dentre outros atos de direção perigosa). 
Na situação anterior, além da maior facilidade para a produção da prova, o tipo estava em conformidade com o princípio da lesividade, segundo o qual o Direito Penal não pode se ocupar de condutas que não acarretem, ao menos, perigo de lesão a algum bem juridicamente tutelado, no caso, a segurança no trânsito e a incolumidade das pessoas. 
Nesse contexto, verifica-se que o legislador, ao estabelecer critérios distintos para o álcool e outras substâncias psicoativas, fixando para a primeira uma elementar objetiva (concentração de álcool por litro de sangue) e para a outra uma elementar de natureza subjetiva (sob influência), terminou por violar o principio da isonomia, tratando situações idênticas de forma distinta.
 A título de exemplo, imagine-se a seguinte situação hipotética: dois jovens, conduzindo cada um seu veículo, saem da mesma festa. O primeiro ingeriu álcool e, o segundo, cocaína; no entanto, nenhum deles estava "sob a influência" das respectivas substâncias psicoativas. Alguns quilômetros à frente, ambos são parados por uma blitz e submetidos aos exames do "bafômetro" e clínico.
 No tocante ao primeiro motorista, foi detectada a presença de álcool no sangue, na quantidade exigida pelo artigo 306 do Código de Trânsito; contudo, foi considerado apto no exame clínico.
 Quanto ao segundo, não foi detectada pelo "bafômetro" a presença da substância entorpecente e, igualmente, foi aprovado no exame clínico. 
Se prevalecesse uma interpretação literal do novo dispositivo, a situação narrada teria o seguinte desfecho: o primeiro condutor seria preso em flagrante, em razão da detecção de álcool em sua corrente sanguínea, enquanto o segundo, por ter consumido cocaína, não aferível pelo "bafômetro", seria liberado e voltaria para casa.
 A solução para superar essa evidente violação ao princípio da isonomia está em se exigir, para o caso da ingestão de álcool, não só a concentração, mas também a elementar subjetiva necessária para as demais substâncias psicoativas, ou seja, a demonstração inequívoca de que o motorista conduzia o seu veículo sob o efeito de álcool.
 A título de conclusão, conveniente ressaltar que, desde a entrada em vigor da referida lei, adotamos como procedimento, em todos os processos onde o exame do "bafômetro" não foi realizado, formular ao Instituto de Criminalística a indagação acima referida, obtendo, em praticamente todos os casos, a mesma resposta. A título de exemplo, segue transcrição da conclusão assinada pelos peritos Rodolfo de Paula Gomes e José Damião de Almeida Júnior no aditamento do Laudo de Exame de Corpo de Delito nº 07317/08, relativo a caso análogo, juntado nos autos do inquérito policial nº 110/2008 - 14ª DP, distribuído a esta vara sob o nº 2008.04.1.001614-4:
 "EM ADITAMENTO AO LAUDO ACIMA E EM RESPOSTA AO OFÍCIO Nº 1.659/2008-TJVDT REFERENTE A NOVO QUESITO SOLICITADO PELO MM. DIGNÍSSIMO DR. JUIZ DE DIREITO, DR. HENALDO SILVA MOREIRA, TEMOS Á DIZER; O EXAME DE EMBRIAGUEZ REALIZADO PELOS PERITOS DESTE INSTITUTO É CLINICO PORTANTO NÃO FAZ DOSAGENS DE TEOR ALCOOLICO EM SANGUE NO PERICIANDO VIVO. ASSIM, EMBORAQUANDO O MESMO SEJA POSITIVO PARA EMBRIAGUEZ SE POSSA PRESSUPOR QUE PELAS ALTERAÇÕES CLÍNICAS O PERICIANDO SE ENCONTRA COM O TEOR ALCOOLICO SUPERIOR A 6 DECIGRAMAS POR LITRO DE SANGUE OS PERITOS AINDA ASSIM NÃO POSSUEM ELEMENTOS PARA AFIRMAR OU NEGAR TAL DOSAGEM UMA VEZ QUE A MESMA NÃO É REALIZADA LABORATORIALMENTE." (destaques nossos).
 Como se pode perceber, a conclusão dos peritos é no sentido de não ser possível afirmar, com segurança, se o motorista está ou não com a concentração exigida pela nova lei, mesmo diante de sinais externos de embriaguez atestados pelo exame clínico.
 Ora, fazendo-se uma inversão no raciocínio, a única conclusão possível é: o fato de o condutor estar com concentração de álcool no patamar exigido pela lei não conduz à certeza de que esteja "sob efeito de álcool". 
Sem dúvida, a embriaguez é um estado físico e psíquico, com repercussões no equilíbrio estático e nas reações e reflexos do motorista, aferível por perícia ou prova testemunhal, não sendo possível aferi-la somente pelo grau de concentração de álcool no organismo do condutor, sob pena, como já dito, de ferir-se o princípio da lesividade.
 Na hipótese dos autos, se por um lado há indícios da concentração suficiente de álcool no sangue do investigado, por outro nada há apontando que conduzisse seu veículo sob influência dessa substância.
 As testemunhas presenciais, todos policiais militares (fl. 02), relataram ter abordado a motorista em uma barreira de trânsito, na qual foi submetido ao teste do bafômetro, cujo resultado atestou concentração superior àquela prevista no tipo penal, nada havendo nos autos que indique direção irregular ou conduza ao entendimento de que a autuada dirigisse sob efeito de álcool.
 Desse modo, não havendo indícios da elementar subjetiva no inquérito, falta justa causa para instauração do processo penal, sendo incabível o recebimento da inicial acusatória. 
Ante o exposto, com fundamento no artigo 395, inciso III, do Código de Processo Penal REJEITO A DENÚNCIA OFERECIDA EM DESFAVOR DE MANOEL MESSIAS DE SOUSA.”
Destaque-se que NENHUMA DAS PROVAS TRAZIDAS AOS AUTOS DESCREVE QUALQUER SINAL DE EMBRIAGUEZ (fls. 88 e 112/113). 
Portanto, inafastável é a absolvição.
V) DO PEDIDO
Diante do exposto, requer a Defesa o conhecimento e o provimento do presente recurso para absolver o Recorrente. 
Caso não seja este o entendimento de V. Exas., pugna por expressa manifestação quanto aos dispositivos normativos envolvidos para fins de prequestionamento.
Termos em que, espera deferimento.
Gama/DF, 23 de novembro de 2012.
Maurício Morimoto Doi
Defensor Público
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