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UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE Módulo de: Ética e Deontologia Profissional UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE Índice Unidade nº1 i Introdução à Ética Geral .................................................................................................i Introdução .............................................................................................................i I. A origem etimológica dos conceitos ética e moral. .............................................. ii I.1. Diferença entre Ética e Moral ................................................................................. ii I.2. O carácter normativo da Ética................................................................................ iii I. 3. O contexto do surgimento da Teoria ética ........................................................ iv I.3. 1. A Ética como Ciência ......................................................................................... iv I.3.2. Descrição de outros ramos da Ética ..................................................................... vi I.4. Problemas da Ética ................................................................................................. vi I.4.1. O problema da Diversidade dos Sistemas Morais ................................................vii I.4.2. O problema da Liberdade Humana .....................................................................vii I.4.3. O problema dos Valores .....................................................................................vii I.4.4. O problema dos Fins e dos Meios .......................................................................vii I.4.5. O problema da Obrigação Moral ....................................................................... viii I.4.6. O problema da Diferença entre a Ética e a Moral .............................................. viii I.5. Teorias Éticas ...................................................................................................... viii I.5. 1. Teoria não Cognitivista.................................................................................... viii I.5.2. Teorias Absolutistas ............................................................................................ ix I.5.3. Teorias do Comando Divino ................................................................................ ix I.5.4. Teoria Racionalista .............................................................................................. ix I.5.5. Teoria Intuicionista ou Intuicionismo .................................................................. ix I.6. Breve historial da Ética ........................................................................................... x I.6.1. Ética Grega........................................................................................................... x I.6.2. Ética Cristã (Período Medieval) ..........................................................................xii I.6.3. Ética Moderna .................................................................................................. xiii I.6.4. Ética Contemporânea .......................................................................................... xv I.6.5. Ética da Pós-Modernidade ...............................................................................xviii Bibliografia Complementar ......................................................................................... xx UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE Unidade nº1 Introdução à Ética Geral Introdução O módulo de ética e deontologia apresenta 4 unidades subdividas em várias secções que possam facilitar a sua aprendizagem. Esta divisão é de carácter didáctica. Quer a unidade I quer a unidade II visão introduzir, os estudantes de licenciatura em Organização e Gestão da Educação, assuntos ligados a ética geral. Esses temas serão tratados de forma sumária e objectiva sem contudo esgotá-los. Na primeira unidade, apresentamos temáticas relacionadas com a Ética Geral. A unidade está dividida em várias secções que passamos a apresentar: a primeira secção fala da origem etimológica dos conceitos Ética e Moral, e o carácter normativo da ética. A segunda secção trata do surgimento das teoria ética;a ética como ciência e outros ramos da ética. A quarta secção vai abordar os problemas que interessam a ética. A quinta secção reflecte sobre algumas teorias éticas. Por fim, a sexta secção trata de um breve historial da ética. Nesta unidade pretende-se que o estudante tenha conhecimentos mínimos sobre a origem da ética; os problemas que interessam a ética; as teorias relacionadas com a ética bem como a divisão didáctica da Ética. No entanto, não vamos deixar de estabelecer uma breve diferenciação entre a ética e a moral. Por fim apresentaremos um breve historial da ética e os respectivos pensadores mais proeminentes da época. Recordamos que toda divisão quer das disciplinas da ética quer da história da ética constitui uma tentativa didáctiva para a sua compreensão. Pois a ética é uma só. Objectivos Ao completar esta unidade, você será capaz de: § Definir os conceitos de Ética e Moral; § Diferenciar entre a Ética e a Mora; § Reflectir sobre o carácter normativo da Ética; § Identificar os principais problemas éticos; § Analisar os principais problemas que interessam a ética; § Caracterizar, historicamente, a ética ao longo do tempo. UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE A origem etimológica dos conceitos ética e moral. Nesta secção vamos descrever a etimologia dos conceitos de ética e moral, bem como a origem dos mesmos. A palavra ética provem do grego e tem dois significados: (1) Éthos – que significa hábitos e costumes e (2) Êthos – que significa modo de ser ou carácter. O conceito de ética não se fazia presente no latim. Este vocábulo só mais tarde é traduzido para o latim para a expressão mos, moris dando origem a palavra moral que equivale a hábitos e costumes. A moral e a ética são conceitos diferentes, mas que inserem em si algo de comum: o sentido eminentemente prático. A moral tem sido definida como um conjunto de regras, valores, proibições, tabus, procedente desde fora do homem, isto é, eles são impostos quer pela política, costumes sociais, a religião, quer pelas ideologias de uma sociedade. A moral nasce com a existência do homem, pois historicamente não se conhece nenhum povo, por selvagem que seja ou primitivo que não tivesse normas, regras ou rituais de conduta. A moral é inseparável dos costumes humanos, os quais dependem de cada época, da região geográfica ou das circunstâncias. Neste sentido, a moral é mutável e relativa a determinadas práticas culturais. A moral não é diferente dentro de toda forma de associação, mesmo na família, na classe social ou num estado. Entretanto, a ética implica sempre uma reflexão teórica sobre qualquer moral e uma revisão racional e crítica sobre a validade da conduta humana. Por isso, a ética é uma justificação racional da moral. A ética remete-nos a idéias ou valores que procedem a partir da própria deliberação do homem. A ética é uma análise das regras morais. Também a ética pode ser entendida como uma filosofia moral, se entendermos a filosofia como um conjunto de conhecimentos racionalmente estabelecidos. I.1. Diferença entre Ética e Moral De seguida vamos apresentar algumas diferenças entre a ética e a moral. Embora esses dois conceitos sejam tomados como sinónimos, eles apresentam algumas diferenças substânciais.: Ora vejamos, a ética: Ø É uma reflexão crítica sobre a moralidade; Ø Procura o fundamento do valor que norteia o comportamento; Ø É a filosofia da moral; Ø Tem como problema definir o comportamento moral; Ø Implica uma relação de si para consigo; Ø Estabelece uma base racional para a conduta. Enquanto que: A Moral: Ø Deve apontar para uma possibilidadede realização de um projecto de felicidade; Ø Está ligada ao mundo da cultura onde as normas, os valores, os hábitos nos são passados através da linguagem, dos ritos e tradições, Ø É o conjunto de regras de conduta admitidas em determinada época/sociedade (observe-se que nas sociedades islámicas a mulher que comete adultério e condenada a morte por apedrejamento); Ø Tem a finalidade de organizar as relações entre os sujeitos sociais; Ø Representa todo comportamento moral que varia de acordo com o tempo e o lugar. Portanto, para Heinemann (1993), a ética procura responder as seguintes questões: UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE • Que devo escolher? • Há uma hierarquia de valores? • Que espécie de homem devo ser? • Que devo querer? • Que devo Fazer? Estas entre outras questões constituem o horizonte problemático da ética. I.2. O carácter normativo da Ética Falemos de seguida do carácter normativo da ética. A ética trata da normalização dos actos humanos segundo princípios últimos (que vão além do nosso entendimento) e racionais. A ética é um conhecimento que se preocupa com o fim a que se deve dirigir a conduta humana e os meios para alcançar este fim. Ela pretende explicar a validade das suas afirmações, procurando comprovar porque é que algo é bom ou mau, justo ou injusto, moral ou imoral desde uma perspectiva universal e necessária. A ética é normativa porque é uma racionalização do comportamento humano, isto é, trata de um conjunto de princípios ou enunciados dados à luz da razão e que iluminam o caminho correcto/acertado da conduta. O carácter normativo da ética tem como fundamento um aspecto essencial da natureza humana, a saber: • O facto do homem ser imperfeito porém perfectível. A razão para tal afirmação é a seguinte: se fossemos perfeitos e mantivéssemos na nossa perfeição, não teríamos problema moral, pois não estaríamos obrigados a desenvolver todas as nossas potencialidades. Por isso, os princípios éticos têm uma dimensão imperativa, por serem mandatos ou ordens que nos damos para movermo-nos na realização de actos que melhorem a nossa condição humana. Por outro lado, somos seres incompletos/imperfeitos que buscamos, tendemos a perfeição dirigindo as nossas acções ao que deve ser. Todavia, a perfeição não deve centrar-se apenas num aspecto da nossa personalidade porque a natureza humana é complexa. Ela deve englobar o espiritual, o físico, intelectual, volitivo (a vontade), afectivo, o estético, o social, etc. A perfeição espiritual desenvolve os aspectos que têm a ver com o enriquecimento da vida espiritual que possam engrandecer a alma, a esperança, fé, acaridade, etc. A perfeição física deve ser vista como um complemento da alma. A alma e o corpo são duas manifestações distintas de uma mesma realidade. Daí o ditado popular Mente sã num corpo são. Quando a alma afecta o corpo surgem alterações nervosas. E quando o corpo afecta a alma podem surgir estados depressivos. Note que é indispensável o exercício físico, uma boa alimentação para o equilíbrio entre a alma e o corpo. A perfeição intelectual representa o desenvolvimento da mente, da inteligência, do conhecimento. O homem aperfeiçoa-se através da cultura, do estudo, da educação e só assim é que é capaz de julgar a validade das coisas. O homem deve buscar um conhecimento alargado das coisas (capacidade de se abstrarir).. A perfeição da vontade representa o que se deve separar dos desejos. A vontade deve ser vista como uma aliada da razão e não uma súbdita do desejo. É possível ser mais responsável, UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE mais moderado, ter mais respeito sem nunca deixar de lado a razão. Daí a necessidade de aliar a desejo à razão, de modo que as nossas acções e decisões sejam bem pensadas. A perfeição afectiva está ligado às emoções, tem a ver com a bondade, abenevolência, a compreensão, o carinho e a gratidão. É importante temperar a razão com o lado afectivo. O homem não deve ser dominado somente pelas paixões nas suas acções e decisões. No entanto, um homem que actua com base na paixão sem a razão corre risco de tornar-se cego, frio e calculista. As emoções devem ser conjugadas com uma dose de racionalidade. Normalmente quando a razão caminha sozinha torna-se cega, fria e calculista. A perfeição estético: o ser humano aperfeiçoa-se ao se relacionar como belo com o sublime. A perfeição estético torna o ser humano mais criativo, sensível e com maior capacidade de comunicar e de reflectir. A arte não deve ser nada que fique subjugada à pressão dos media, ou apenas entendida em aspectos comerciais. A perfeição social: o relacionamento com os outros é fundamental para o desenvolvimento do ser humano. Por isso, é no relacionamento que o homem promove e desenvolve capacidade como a amizade, a cooperação, a paz, a liberdade, a fraternidade, a dignidade, a igualdade e o pluralismo. Só através do relacionamento com os outros somos capazes de combater determinados anti-valores como: o individualismo, a intolerância, o egoísmo, etc. Portanto, o desenvolvimento da personalidade humana deve ter em conta todas essas dimensões da sua personalidade. Nunca o individualismo deve ser tomado como um meio do homem impor as suas regras. 3. O contexto do surgimento da Teoria ética Depois de fazermos uma breve abordagem acerca da etimologia dos conceitos de ética e moral, da diferença entre ética e moral, e do carácter normativo da ética, vamos de seguida contextualizar o ambiente do surgimento de uma teoria ética. A ética como um saber teórico que justifica ou legitima a conduta moral é relativamente recente. Aparece com o advento da filosofia no séc. VI a C, na Grécia. A prática de uma teoria ética no seu sentido mais restrito, surge no séc. V a C, com Sócrates. Sócrates fez uma viragem na abordagem da moral da sua sociedade ao propor como primordiais os valores espirituais antes dos materiais. Assim sendo, para Sócrates, a moral não lida com um problema sem importância, mas ela tem haver com o como deveríamos viver e porquê? I.3. 1. A Ética como Ciência Nesta secção vamos demonstrar como a ética surgiu como uma ciência. Note que a ética como uma disciplina está dividida. No entanto, não devemos nos esquecer que a Ética é uma só. Esta classificação que descrevemos abaixo tem fins meramente didáticos. A ética como uma reflexão normativa sobre os actos humanos segundo princípios racionais faz parte da Ética Geral que tenta explicar questões como a liberdade, a natureza do bem e do mal, a virtude e a felicidade, entre outros aspectos. Por outro lado, existe a Ética Especial ou UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE a Ética Aplicada que pretende levar à prática os fundamentos gerais da ética. Por isso, a ética pode ser: Ética Geral e Ética Especial ou Aplicada. A Ética Geral é aquela, como diziamos anteriormente, que procura explicar questões relacionadas com a liberdade, a natureza do bem e do mal, a felicidade, etc. Ela estuda todos esses aspectos no seu plano mais geral . A Ética Especial ou Aplicada pode ser enquadrada em três planos: individual, familiar e social. A nível social a ética pode se subdividir em diversos ramos: ética internacional, económica, profissional, etc. No caso da ética profissional pode se falar da ética para ciências de saúde, ética para a comunicação; ética para a educação, ética para os psicólogos, ética para o jurista, ética na administração, etc. Na ética especial aplicamos os conteúdos da ética geral a uma realidade específica, isto é, concreta. A ética especial pode ser: ética médica, ética do psicólogo, ética dos enfermeiros, ética dos professores, ética dos economistas, ética ambiental, ética dos auditores, etc. Portanto, a ética especial é a aplicação dos princípios gerais da ética a uma realidade ou tema específico. Observe de seguida a figura abaixo que procura ilustrar a divisão da ética como uma disciplina. Fig.1: Classificação eSubdivisões da Ética UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE I.3.2. Descrição de outros ramos da Ética Em seguida descrevemos outros ramos da ética. Metaética A Metaética é o estudo filosófico da natureza do julgamento moral. Ela busca o sentido pelo qual se denomina algo como certo ou errado (bom ou mau), incluindo o significado dos termos morais e a discussão de quando um julgamento moral é objectivo ou subjectivo. Também a Metaética é uma reflexão sobre a natureza dos próprios juízos éticos como: o que quer dizer bem moral? A Metaética estuda, ainda, outros temas como: • Objectividade da Moralidade; • A natureza da moralidade; • A natureza da responsabilidade e sua conexão com o livre arbítrio (a liberdade). O estudo da natureza do julgamento moral pode ser enquadrado nas seguintes disciplinas: a psicologia moral e epistemologia moral. A Psicologia Moral interessa-se pelo estudo da motivação, da teoria das decisões e da ética descritiva. Por sua vez, a Epistemologia Moral estuda a natureza do conhecimento moral e a natureza dos argumentos morais. O estudo da natureza do argumento moral também é enquadrado na disciplina chamada Lógica Deôntica. A lógica deôntica estuda os princípios do raciocínio referente às obrigações, permissões, proibições, compromisso moral, etc. I.4. Problemas da Ética Na presente secção vamos estudar os problemas que interessam a ética – os chamados problemas éticos. Os problemas éticos são: o problema da diversidade dos sistemas morais; o problema da liberdade humana; o problema dos valores; o problema dos fins e dos meios; o problema da obrigação moral; e o problema da diferença entre a ética e a moral. A existência das normas morais sempre afectaram a pessoa humana já que desde pequeno captamos por diversos meios a existência das normas, e sempre somos afectados por elas em forma de conselhos, ordens ou em outros casos como uma obrigação ou proibição, porém UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE sempre com o fim de orientar e determinar a conduta humana. Já que as normas morais existem na consciência de cada indivíduo, isso faz com que existam diferentes pontos de vistas e apresentem problemas no momento de considerar as diferentes respostas. E isso faz com que perante uma questão existam diferentes respostas. É dessas circunstâncias que surgem os diversos problemas éticos. Assim teremos os seguintes problemas éticos: I.4.1. O problema da Diversidade dos Sistemas Morais Este problema ético tem a ver com a pluralidade de tendências que buscam explicar o mesmo acto moral. Esta tendência faz com que existam diferentes respostas para o mesmo problema, isto é, para alguns um acto é correcto para outro é incorrecto/amoral. Por exemplo perante o divórcio, o aborto, a eutanásia existem diversas respostas divergentes quanto a aceitação ou não aceitação desses actos. Mas a questão que se coloca é a seguinte: qual é o critério para escolher uma norma ou o contrário? Qual é o critério que leva as pessoas a consideram, perante o mesmo acto, respostas diferentes (umas que aprovam um determinado acto outras que reprovam o mesmo acto)? I.4.2. O problema da Liberdade Humana Este problema tem em conta a questão da liberdade humana. Como todos sabemos, pela experiência do dia-a-dia, a liberdade humana não é total e todo o indivíduo vive condicionado pelas circunstâncias em que vive. Este condicionamento feito pela sociedade faz com que a pessoa actue sob pressão social, cultural ou laboral. Portanto, este problema está relacionado com a incompatibilidade da liberdade humana com as normas morais, ou seja, no ser e o dever ser. I.4.3. O problema dos Valores Deste problema surgem numerosos questionamentos, mas o problema fundamental se encontra na objectividade e subjectividade dos valores: os valores são objectivos? Os valores existem fora da mente de modo que cada homem possa captar os valores já definidos? Se os valores são subjectivos porque dependem da consciência de cada sujeito? Quanto ao conhecimento: como podemos conhecer os valores? Em si, qual é a sua essência? I.4.4. O problema dos Fins e dos Meios Há sustentações de qualquer meio é bom se executa acções para obter um fim desejado (bom). Este ponto de vista está relacionado com a tese de Maquiavel que diz “os fins justificam os meios”. Esta tese sobrevaloriza as boas intenções de um acto que é a parte interior do ser e também se descuida do aspecto externo do acto (intenção e finalidade). Por isso que os fins UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE jamais vão justificar os meios. Mas as questões que se colocam são as seguintes: Será que os meios justificam os fins? Ou os fins justificam os meios que os homens utilizam? I.4.5. O problema da Obrigação Moral O problema da obrigação moral está intimamente ligada a questão dos valores. Esta ligação faz-nos realçar o seguinte facto: o que se faz por obrigação perde todo o seu mérito, pelo contrário quando se faz por própria convicção adquiri valor moral. A obrigação moral deixa o homem a única possibilidade de ser ele mesmo, de acordo com a sua própria moralidade e o seu próprio critério. Mas temos que ficar claro de que uma coisa é obrigação entendida como coerção externa e outra como obrigação baseada na pressão interna que exercem os valores na consciência de uma pessoa. 4.6. Problema da Diferença entre a Ética e a Moral Será que a ética e moral não é mesma coisa? Pois não, por definição etimológica significa o mesmo – costumes. Mas actualmente conhecemos a ética como o conjunto de normas que nos vem do interior; e a moral como as normas que vem do exterior, ou seja, da sociedade. I.5. Teorias Éticas Depois de termos apresentado na secção anterior a questão dos problemas éticos, nesta secção vamos falar das teorias éticas. Das várias teorias éticas vamos destacar as seguintes: a teoria não cognitivista; a teoria absolutista; a teoria do comando divino e a teoria racionalista. Os assuntos éticos são essencialmente dependentes de padrões que definem um particular código moral: as práticas e as normas aceites por um grupo social num tempo e lugar específico. Uma vez que, existem uma pluralidade de grupos sociais com diferentes mores (costumes), os relativistas afirmam que existe não um ponto de vista a partir do qual esses códigos possam em si ser considerados, isto é, não há um critério absoluto para que eles possam ser observados. I.5. 1. Teoria não Cognitivista Esta teoria realça um conjunto de teorias éticas que afirmam o julgamento moral não possuem valor de verdade em si e, portanto, não pode ser conhecido. Ela engloba as seguintes correntes: • Emotivismo afirma que os julgamentos morais são efectivas expressões das emoções. A razão somente examina a situação a ser considerada e discerne as alternativas para a acção. Porém, a razão é inerente e somente a emoção é capaz de promover a rectidão para iniciar a acção moral. • Prescritivismo de R. M. Hare - esta teoria pretende apontar o contraste entre o sentido descritivo da linguagem quando empregada para estabelecer factos, e o sentido prescritivista que seria o característico da linguagem moral. Os termos morais seriam empregados para guiar a acção e para dizer as pessoas o que deveriam fazer. É uma teoria sobre o significado de termos morais como: bom, certo ou dever. UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE I.5.2. Teorias Absolutistas Estas teorias têm os seus enfoques sobre as acções que podem ser consideradas como erradas ou às vezes obrigatórias, qualquer que seja a consequência. Os exemplos concretos são as visões tradicionais de moralidade do tipo religioso: os Dez Mandamentos. Nestas teorias quando afastado o apelo da autoridade religiosa, apresentam-se vulneráveis ao criticismo racional. I.5.3. Teorias do Comando Divino Esta teoria afirma que todo axioma moral deriva do comando divino que determina os actos moralmente aceites, os proibidos e os actosmoralmente obrigatórios. I.5.4. Teoria Racionalista A teoria racionalista dá mais importância a razão. Ela enfatiza o papel ou a importância da razão frente a experiência sensorial e do apelo a autoridade, como fundamento da moralidade. Observem-se os argumentos de Platão, de Kant e J. Rawls (na secção sobre um breve historial da ética: nos tópicos ética grega, ética moderna e pós-moderna). I.5.5. Teoria Intuicionista ou Intuicionismo Afirma que os homens já possuem intuições a priori de verdades morais. O intuicionismo pode ser de factos particulares ou de princípios. NB: Ao apresentarmos estas teorias não pretendemos esgotar o seu estudo, porém é para demonstrar o carácter abrangente do facto moral e que mereceu estudos aprofundados de acordo com diversas perspectivas. UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE I.6. Breve historial da Ética A existência de uma história da moral é sustentada considerando que cada sociedade tem sido caracterizada por um conjunto de regras, normas e valores. A história da Ética é complexa e exige alguns cuidados no seu estudo, uma vez que ela como disciplina filosófica é mais limitada no tempo e no material tratado do que a história das ideias morais da humanidade. A história das ideias morais da humanidade compreende o estudo de todas as normas que regularam a conduta humana desde os tempos pré-históricos até aos nossos dias. Esse estudo é filosófico ou histórico-filosófico e social. A história das ideias morais é um tema de que se ocupam a sociologia e a antropologia. A existência de ideias morais não implica a existência de uma disciplina particular, uma vez que podem estudar-se as atitudes e ideias morais de diversos povos, orientais, judeus, etc. sem que o material resultante seja enquadrado na história da Ética. Assim, só existe história da Ética no âmbito da história da filosofia. A história da Ética adquire uma considerável amplitude. Por isso, é difícil com frequência estabelecer uma separação rigorosa entre os sistemas morais e–objecto próprio da. Isto porque a ética é um conjunto de normas e atitudes de carácter moral dominantes numa sociedade ou fase histórica. Assim, os historiadores da Ética limitaram seu estudo para aquelas ideias de carácter moral que possuem uma base filosófica, isto é, em vez de se darem simplesmente como supostas, são examinadas em seus fundamentos e são filosoficamente justificadas. A justificação não importa se é do âmbito metafísico ou teológico, mas que seja uma explicação racional das ideias ou das normas adoptadas. Dai, a razão dos historiadores da Ética seguirem os procedimentos tomados pelos historiadores da filosofia. Se olharmos para a história, notaremos uma grande diversidade de ideias morais no tempo. Friedrich Nietzsche faz uma exposição da sucessão das doutrinas éticas quando afirma “aquilo que numa época parece mau, é quase sempre um restolho daquilo que na precedente época era considerado bom” (Nietzsche, 1977:99). As doutrinas éticas nascem e se desenvolvem em diferentes épocas e sociedades como resposta aos problemas básicos apresentados pelas relações entre os homens e em particular pelo seu comportamento moral efectivo. Por isso, existe uma estreita vinculação entre os conceitos morais e a realidade humana social, sujeita historicamente a devir (a mudanças). As doutrinas éticas não podem ser consideradas isoladamente, mas dentro de um processo de mudança e de sucessão que constitui propriamente a sua história. A Ética e História se relacionam porque: • Com a sua própria história, uma vez que cada doutrina esta em conexão com as anteriores (tomando posições contra elas ou integrando alguns problemas e soluções precedentes), ou com as doutrinas posteriores - prolongando-se ou enriquecendo-se nelas. Em toda moral se elaboram certos princípios, valores ou normas, mudando radicalmente a vida social e a vida moral. Os princípios, os valores ou as normas nela encarados entram em crise e exigem a sua justificação ou a sua substituição por outros. Surgindo assim, a necessidade de novas reflexões ou nova teoria moral porque os conceitos, valores e normas vigentes se tornaram problemáticos. I.6.1. Ética Grega Sob o ponto de vista formal, a história da Ética teve a sua origem na antiguidade grega através de Aristóteles (384-322 a. C) e suas ideias sobre a Ética e as virtudes éticas. Mesmo antes de Aristóteles, já foi possível encontrar na Grécia fragmentos de uma abordagem com base filosófica para os UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE problemas morais e até entre os filósofos – pré-socráticos encontram-se reflexões de carácter ético, por exemplo, quando pretendiam saber as razões do comportamento moral. Já Sócrates (470-399 a. C) considerou a questão da ética individual como problema filosófico central e a Ética como disciplina em torno da qual deveriam girar as reflexões filosóficas. Para Sócrates ninguém pratica voluntariamente o mal. Somente o ignorante não é virtuoso. Só age mal quem desconhece o bem porque todo o homem quando fica sabendo o que é o bem, reconhece-o racionalmente como tal e necessariamente passa a praticá-lo. Ao praticar o bem, o homem sente-se dono de si e consequentemente é feliz. Daí a velha máxima (frase socrática): Conhece-te a ti mesmo. Portanto, para Sócrates a virtude seria o conhecimento das causas e dos fins das acções fundadas em valores morais, identificados pela inteligência e que impelem o homem a agir virtuosamente em direcção ao bem. Platão (427-347 a C) ao examinar a ideia do Bem à luz da sua teoria das ideias subordinou a sua Ética a metafísica. A sua Ética está relacionada com sua filosofia política, porque para Platão a polis (cidade-estado) é o terreno propício para a vida moral. A sua Ética exerceu grande influência no pensamento religioso e moral do ocidente. Aristóteles (384-322 a C) organizou a Ética como disciplina filosófica e formulou a maior parte dos problemas que os filósofos morais se ocuparam: relação entre as normas e os bens entre a Ética individual e social; relação entre a vida prática e teórica, classificação das virtudes, etc. A concepção Ética de Aristóteles privilegia as virtudes (justiça, caridade e generosidade), tidas como propensas aos sentimentos de realização pessoal, aquele que age quanto simultaneamente beneficiar a sociedade em que vive. A Ética Aristotélica busca valorizar a harmonia entre a moralidade e a natureza humana, concebendo a humanidade como parte da ordem natural do mundo – o naturalismo. Para Aristóteles, toda a actividade humana tende a um fim que é o bem supremo ou Sumo Bem que seria resultado do exercício perfeito da razão, função própria do homem. Assim, o homem virtuoso é aquele que é capaz de deliberar e escolher o que é mais adequado para si e para os outros movidos por uma sabedoria prática em busca do equilíbrio entre o excesso e a deficiência: por exemplo, tendemos mais naturalmente para os prazeres e por isso somos levados mais facilmente para a concupiscência do que para a moderação. A Ética Aristotélica também esta relacionada com a sua filosofia política, uma vez que a comunidade social, política é o meio necessário para o exercício da moral. Somente nela pode realizar-se a ideia da vida teórica na qual se baseia a felicidade. Porque o homem moral só pode viver na cidade e é, portanto animal político ou social – zôon politikon. Apenas os deuses e os animais selvagens não tem necessidade da comunidade política para viver. O homem deve necessariamente viver em sociedade e não pode levar uma vida moral como indivíduo isolado, mas no seio de uma comunidade. Com a decadência do velho mundo greco-romano, surge o estoicismo e o epicurismo. Para Epicuro (341-270 a C), o prazer é um bem e, como tal, o objectivo de uma vida feliz. Dai o surgimento da ideia do hedonismo que assume o prazer como princípio e fundamento da vida moral. Uma vez que existem muitos prazeres, nem todos sãoiguais e bons. É preciso escolher entre eles os mais duradouros e estáveis, para isso é necessário à posse de uma virtude sem a qual é impossível escolher. Essa virtude é a prudência que permite seleccionar aqueles prazeres que não nos trazem a dor ou perturbações. Os melhores prazeres não são corporais – fugazes e imediatos - mas os espirituais porque contribuem para a paz da alma. Para os estóicos (Zenão, Sêneca e Marco Aurélio), o homem é feliz quando aceita o seu destino com imperturbabilidade e resignação. O universo é um todo ordenado e harmoniosos onde os sucessos resultam do cumprimento da lei natural, racional e perfeita. O bem supremo é viver de acordo com a natureza, aceitar a ordem universal compreendida pela razão, sem se deixar levar pelas paixões, UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE afectos interiores ou pelas coisas exteriores. O homem virtuoso é aquele que enfrenta seus desejos com moderação aceitando seu destino. O estóico deixa de ser um cidadão da polis e passa a ser do cosmo. I.6.2. Ética Cristã (Período Medieval) Com o fim do mundo antigo (Grécia e Roma Antiga), o regime servil substituiu a escravidão. Assim o regime servil deu bases para a construção da sociedade feudal. A sociedade feudal era extremamente estratifica e hierarquizada. No entanto era uma sociedade fragmentada economicamente e politicamente na medida em que as estruturas deixadas pelo mundo antigo foram desfeitas e a igreja continuou sendo a única instituição organizada. É por este motivo que a religião se tornou o garante da unidade social do povo na época. Assim a igreja passou, além do poder espiritual e temporal, a monopolizar a vida intelectual. Evidentemente a Ética, neste período medieval, foi sujeita a conteúdos religiosos. Os filósofos cristãos, da época, tiveram uma dupla atitude diante da Ética: • Uma atitude Teônoma que fundamenta em Deus os princípios morais. Deus criador, omnisciente e todo-poderoso. O homem como criatura de Deus tem seu fim último Nele que é o seu bem mais alto e o valor supremo. Deus exige a sua obediência e a sujeição a seus mandamentos – com carácter de imperativo supremo. Esta atitude aproveitou as ideias da ética grega platónica e estóicas inserindo-as na ética cristã. A Ética cristã é uma ética subordinada a religião num contexto em que a filosofia era considerada serva da teologia, isto é, a filosofia deveria ajudar na compreensão da teologia. A ética cristã é uma ética limitada por parâmetros religiosos e dogmáticos e tende a regular o comportamento dos homens com vista a uma outra vida (reino de Deus) colocando o seu fim ou objectivo fora do homem, mas na divindade. Ao pretender elevar o homem da ordem natural para a ordem transcendental ou sobrenatural, onde possa viver uma vida feliz e plena, livre de desigualdades e injustiças do mundo terreno o cristianismo introduz uma ideia inovadora: a igualdade dos homens diante de Deus. Assim o homem é chamado a alcançar a perfeição e a justiça num mundo sobrenatural, o reino dos céus. Esta teoria absorve bastante o que Platão e Aristóteles postularam. Os filósofos cristãos mais marcantes na ética cristão são Santo Agostinho (354-430) e São Tomas de Aquino (1226-1274). Estes reflectem respectivamente as ideias de Platão e Aristóteles. Por exemplo, a purificação de Platão e a sua ascensão libertadora até elevar-se ao mundo das ideias tem correspondência na elevação ascética até Deus exposta por Santo Agostinho. A ética de S. Tomás de Aquino assemelha-se a Aristóteles na questão da contemplação e do conhecimento que permite alcançar o fim último. Para São Tomás o fim último é Deus. A história da ética é complexa a partir do renascimento europeu onde prevaleceram diversas doutrinas. Contudo, todas elas surgem como reacção a Ética Cristã que era descêntrica e teológica. A ética do renascimento é antropocêntrica. Ela procura reflectir o homem. Portanto, o renascimento faz uma viragem significativa na história da ética. Esta viragem deveu-se as mudanças que o mundo sofreu nas esferas económicas, políticas e científicas. Na esfera económica, por exemplo, viu-se crescer de forma muito intensa o relacionamento de forças produtivas com o desenvolvimento científico. A relação entre a produção e a ciência propiciou o desenvolvimento da ciência. Este tema não será desenvolvido nesta unidade porque não faz parte desta disciplina. No entanto, esta relação fortaleceu a nova classe social – a burguesia – que lutava para se impor politicamente e economicamente. Este foi um período de grandes revoluções política (na Holanda, França e Inglaterra). O renascimento trouxe as seguintes consequências: UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE • A razão se separa da fé (filosofia separa-se da religião); • As ciências naturais separam-se dos pressupostos teológicos; • O estado separa-se da igreja; • Começam a surgir indícios da separação do homem de Deus.. Esta rotura foi evidente entre a idade Media e a Moderna. Ora vejamos: Nicolau Maquiavel (1469- 1527) (autor moderno) provoca uma revolução Ética ao romper com a moral cristã que impõe valores espirituais como superiores aos valores políticos. Para Maquiavel a adopção de uma moral própria em relação ao estado era fundamental. Por isso, para este, o que importa são os resultados e não a acção política em si mesma. Adicionalmente, Maquiavel sugeriu sendo legítimo o uso da violência contra o que se opõe aos interesses estatais. Maquiavel pretende a aplicação de novos valores, onde o homem é centro de busca dos seus próprios valores e princípio. As ideias de Maquiavel tiveram bastante influência em Thomas Hobbes, Baruch de Espinosa no que se refere à Ética realista. I.6.3. Ética Moderna A teoria da ética moderna teve uma contribuição de vários autores. Em seguida descrevemos o desenvolvimento da ética moderna na visão de vários autores. Rene Descartes (1596-1650) procurou basear as suas reflexões na filosofia e no homem que passaram a ser o centro de tudo, da política, da arte e da moral. Surgindo, desse modo, a Ética antropocêntrica. Thomas Hobbes (1588-1679) sistematiza a Ética do desejo que esta em cada ser, de própria conservação como sendo o fundamento da moral e do direito. Para Hobbes, a vida do homem no estado de natureza - sem leis nem governo – era solitária, pobre, sórdida, embrutecida e curta, uma vez que os homens são por índole agressivos, autocentrados, insociáveis e obcecados por um desejo de ganho imediato. Para Hobbes, os indivíduos que decidem viver em sociedade não são melhores ou egoístas do que os selvagens: são apenas clarividentes se cooperarem, podem ser mais ricos e mais felizes. Segundo Hobbes o bom comportamento do homem deriva do seu egoísmo. Por exemplo, para Hobbes a explicação é simples: dois homens juntos têm mais facilidade de matar uma fera sem se ferirem. Esta é uma razão que explica a necessidade do homem de se auto conservar. Baruch de Espinosa (1632-1677) diz que: os homens tendem naturalmente a pensar apenas em si mesmos, nos seus desejos e opiniões. As pessoas sempre são conduzidas por suas paixões, as quais nunca tem em conta o futuro ou outras pessoas. Esta é uma acção necessitante da substância divina baseada na tendência de conservação e consecução de tudo o que é útil. Espinosa é essencialmente panteísta: entre Deus e o mundo se não há uma diferença de pontos de vista, Deus é a única substância necessária, una, infinita, independente, simples e indivisível. Tem uma identidade, de atributos dos quais conhecemos apenas dois: a extensão e o pensamento. O mundo é o conjunto dos modos desses dois atributos. O homem é uma colecção de modos da extensão e do pensamento. A substância divina desenvolve-se segundo as leis necessárias da sua natureza. Deus é determinado por si mesmo, mas é determinado num sentido único e irrevogável. O livre arbítrio do homem reduz-se à ignorância das causas que determinam as suas acções. A verdadeira liberdade cria-se na medida em que o homem se liberta das suas paixões e, pela contemplação intelectual, identifica- se com Deus. Portanto, o princípio da moral identifica-se com Deus. Para Espinosa, a virtude não é algo diferente da natureza e, ainda menos, oposto a ela. A virtude é a própria tendência natural para o auto conservação. O homem actua melhor e mais eficazmente quando UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE se vale da razão, que é a busca útil e, por isso, a virtude humana está essencialmente ligada ao uso da razão. Segundo Espinosa, o bem e o mal são aquilo que permitem ou impedem o entender. “A razão nada exige contra a natureza, mas ela mesma exige que cada um se ame a si próprio e procure o bem próprio, e deseje tudo o que verdadeiramente conduz o homem a uma maior perfeição e, de modo absoluto que cada um se esforce no que lhe diz respeito por conservar o seu próprio ser” (Ética, IV,18). Em relação aos juízos morais, Espinosa refere que os padrões humanos de julgamento moral, na sua prática, são arbitrários e caprichosos. Quando se critica ou se avalia no homem, em qualquer aspecto procede-se a um julgamento tomando por comparação a uma figura pessoalmente pré-concebida ou um ideal de homem, individualmente construída. Contudo, quando se julga um homem e se diz que ele poderia fazer isto ou aquilo, isto implica uma ilusória noção de liberdade, visto que é determinado, não poderá ser ou fazer nada diferente do predestinado e daquilo que é. O estado ordinário da mente quando se procede a julgamentos morais é sempre de confusões e de ilusões. Então, como proceder? Espinosa refere que o modo de proceder ultrapassa os usos e a linguagem que condicionam o julgamento, que deverá ser através da experiência. John Locke (1632-1704) toma a posição da conservação e satisfação a uma concepção de felicidade pública, uma vez que estabeleceu um liame indissolúvel entre a virtude e a felicidade pública, e tornou a prática da virtude necessária a conservação da sociedade humana e visivelmente vantajosa por todos os que precisam tratar com as pessoas de bem. David Hume (1711-1776) nessa mesma linha, Hume afirma que o fundamento da moral é a utilidade, isto é, a boa acção, aquela que proporciona felicidade e satisfação à sociedade. A utilidade responde a uma necessidade que leva o homem a promover a felicidade dos seus semelhantes. Ao invés de limitar os desejos humanos determinados pelo interesse pessoal (comida, dinheiro, glória, etc.) Hume acha que as paixões do homem estão baseadas na simpatia – a capacidade de sentir em si mesmo os sofrimentos e até as alegrias do outro. O que impossibilita traçar uma linha divisória nítida entre o interesse pessoal e o interesse alheio, uma vez que agora é possível encarar o interesse como se fosse um interesse pessoal. Immanuel Kant (1724-1804) está preocupado em estabelecer a regra da conduta na substância racional do homem. Nele, o conceito de dever é o ponto central da moralidade – hoje conhecido por deontologia. Para Kant, uma coisa que seja boa em si mesma é a boa vontade ou boa intenção, aquilo que se põe livremente de acordo com o dever. O conhecimento do dever é a consequência da percepção pelo homem de que é um ser racional e como tal está obrigado a obedecer – o imperativo categórico: a necessidade de respeitar todos os seres racionais na qualidade de fins em si mesmo. E o reconhecimento da existência de outros homens (seres racionais) e a exigência de comportar-se diante deles a partir desse reconhecimento. A humanidade deve ser tratada na própria pessoa como na do próximo sempre como um fim e nunca como um meio. A Ética kantiana busca sempre na razão, formas de procedimentos práticos que possam ser universalizáveis, de tal maneira que os princípios que eu sigo possam valer para todos. “Age apenas segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal”. Analisando a questão da corrupção, por exemplo, podemos questionar se tal procedimento deveria ser universalizado ou não. Se não podemos querer a universalização da corrupção, também não posso aceitá-la no aqui e agora. Em Kant, o bem se identifica com a necessidade moral, não interessando para nada um conhecimento racional da moral. A moralidade está tão afastada da pura sensibilidade como da racionalidade UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE absoluta. Se o homem fosse apenas sensibilidade, as suas acções seriam determinadas pelos impulsos sensíveis. Se fosse só racionalidade seriam determinadas pela razão. Mas sendo o homem ao mesmo tempo sensibilidade e razão, tanto pode seguir o impulso como a razão. É nesta possibilidade de escolha que consiste a liberdade que o faz um ser moral. Para viver moralmente, o homem deve transcender a moralidade, submetendo-se aos impulsos sensíveis e evitando assumir qualquer desejo. Como ser racional, o homem deseja a felicidade, mas enquanto desejo, a felicidade não pode ser o fundamento de um imperativo moral. A resolução deste dilema está na acção da vontade: age de modo que a máxima da tua vontade possa sempre ser valor, como princípio da legislação universal. Esta fórmula constitui a lei moral, valendo para todos os seres racionais. A relação de uma vontade com esta lei é uma relação de dependência que se exprime numa obrigação – em obrigar a uma acção conforme com a lei. Esta acção chama-se dever. A lei moral é origem e fundamento do dever no homem. Kant distingue legalidade e moralidade: A legalidade é a conformidade com a lei, efectuada com um motivo natural sensível. Por exemplo: obter qualquer vantagem ou evitar qualquer dano. A moralidade é a conformidade imediata da vontade com a lei sem o recurso dos impulsos sensíveis. O amor de si é o conjunto de impulsos cuja satisfação constitui a felicidade e acção que realiza a moralidade é a eliminação do egoísmo, isto é, contrapõe o eu e os seus impulsos a lei moral. “Nós somos de certos membros legisladores de um reino moral tornado possível pela liberdade e representado pela razão prática como objecto de respeito: mas somos súbditos, não o soberano desse reino, e assim o desconhecer a nossa condição inferior de criaturas, o recusar presunçosamente a autoridade da lei, é já uma infidelidade ao espírito da lei, mesmo quando se lhe observe a letra”. A acção moral do homem tem como objectivo final o bem supremo. Este bem supremo consiste, para o homem, que é um ser finito, na virtude e na união da virtude com a felicidade. A virtude é o bem supremo, a condição de tudo o que é desejável. A afirmação de que o “homem é mau” significa apenas que o homem tem consciência da lei moral e que por vezes se pode afastar dela. A afirmação de que o “homem é mau por natureza” significa que o que se disse vale para toda a espécie humana, o que não quer dizer que se trate de uma qualidade, mas de uma tendência para o mal em todos os homens, isto é, dos homens. Tal tendência para o mal é moralmente negativa - mal radical e inato na natureza humana. O mal radical não pode ser destruído pelas forças humanas, mas pode ser vencido, a fim de que o homem seja verdadeiramente livre nas suas acções. I.6.4. Ética Contemporânea Semelhantes a ética moderna, alguns autores contribuíram para o desenvolvimento da teoria da ética contemporânea. Em seguida descrevemos as contribuições desses autores. Friedrich Hegel (1770-1831) é o filósofo mais importante do idealismo pós-kantiano. A doutrina de Hegel tem uma tendência panteísta e é conhecida como idealismo absoluto porque o absoluto é a ideia, o pensamento puro, a abstracção lógica. Hegel compreende que a moral não é uma questão perene, mas complexa e dinâmica. Hegel trata de uma moral que muda algo que se mantém independentemente e acima dos conceitos que mudam, evoluem e se transformam enquanto ela se matem una, universal e intemporal. O que é comum a todas as perspectivas e conceitos da moral é que o indivíduo providencia a sua própria moralidade e ao mesmotempo clama por uma genuína universalidade. O que permite a sanção das nossas escolhas morais é em parte o facto de que o critério que governa as nossas escolhas, não é escolhido. É no contexto da ordem moral estabelecida numa comunidade bem ordenada que se podem encontrar os critérios éticos gerais e concordâncias com os seus. A autoridade Ética da sociedade não advém, porém do seu poder real, mas dos seus conceitos que são encarados como normativos. UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE Para Hegel, a vida pode ser vivida dentro de um certo tipo de comunidade que em cada comunidade certos valores se provarão indispensáveis, adaptando uma posição diferente da linha sobre a objectividade da moral do séc. XVIII e dos seus herdeiros posteriores. Do ponto de vista do indivíduo isolado, a escolha entre os valores está aberta, mas para o indivíduo integrado numa sociedade não está. Cada sociedade impõe certos valores a si próprio e ao indivíduo, só havendo verdadeira possibilidade de escolha arbitrária ao indivíduo que não esteja integrado numa sociedade. Platão e Aristóteles encaram a objectividade e a autoridade ética, porque a descrevem dentro de uma sociedade de polis. Os individualistas do séc. XVIII vem o bem como a expressão dos seus sentimentos ou o mandato da sua razão individual porque se situam como se estivessem fora da sociedade em que vivem. A sociedade é por eles considerada apenas como um mero agregado de indivíduos. Mas Hegel levanta uma questão: o que é que, para o homem moderno, toma lugar da polis grega? Para Hegel a vida Ética ou moral dos indivíduos enquanto ser cultural e histórico é determinada pelas relações sociais que mediatizam as relações pessoais intersubjectivas. Assim, Hegel transforma a Ética numa filosofia de direito e divide-a em Ética subjectiva (pessoal) e Ética objectiva (social). A Ética subjectiva é uma consciência de dever enquanto a ética objectiva é formada pelos costumes, pelas leis e normas de uma sociedade. Entretanto, Hegel dividiu a sua obra de 1821, Filosofia do Direito, em três áreas: direito abstracto, a moral e a eticidade. • Direito abstracto – é da pessoa individualmente considerada e exprime-se na propriedade, que é a esfera exterior da sua liberdade; • A moralidade – é a esfera da vontade subjectiva que se manifesta na acção; • A eticidade – é a esfera da necessidade e das regras sociais que regem a vida dos indivíduos e constituem os seus deveres. O domínio da moralidade é caracterizado pela sua separação abstracta entre a subjectividade que deve realizar o bem, e o bem que deve ser realizado. Esta separação é resolvida pela ética, onde o bem se realiza de forma concreta e se torna existente. Os deveres éticos são obrigatórios e surgem como uma limitação a subjectividade ou a liberdade abstracta do indivíduo, sendo, no entanto, a redenção do próprio indivíduo, dos seus impulsos e da sua subjectividade individual. No mundo Ético (família, sociedade civil, Estado) a liberdade torna-se realidade: “o sistema de direito é o reino da liberdade realizada, o mundo do espírito expresso por si mesmo, como uma segunda natureza.” Para que o direito - ética se realize e subsista é necessário que à vontade do indivíduo se reverta numa vontade mais vasta, universal, a qual se submeta por livre vontade. O homem é um indivíduo ético, integrado num sistema social ético que é constituído pelo sistema de necessidades da sociedade civil. Para o Kant, o indivíduo está submetido a imperativos categóricos enquanto o indivíduo hegeliano procura os seus critérios morais nas normas da sociedade. Para Hegel, o estado reúne esses dois aspectos numa totalidade Ética. A vontade individual subjectiva é determinada por uma vontade objectiva, impessoal, colectiva, social e pública que cria as diversas instituições sociais. Essa vontade regula e normaliza as condutas individuais através de um conjunto de valores e costumes vigentes numa determinada sociedade e numa determinada época. O ideal ético está numa vida livre dentro de um estado livre, um estado de direito que preserve os direitos dos homens e lhes cobre seus deveres onde a consciência moral e as leis do direito não estão separadas e nem em contradição. Assim, a vida Ética é a interiorização dos valores, normas e leis de uma sociedade, condensadas na vontade objectiva, cultural por um sujeito moral que as aceite livre e UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE espontaneamente através de uma vontade subjectiva individual. A vontade pessoal resulta da aceitação harmoniosa da vontade colectiva de uma cultura. Karl Marx (1818-1883) a moral é uma superestrutura ideológica, com função social que permite sacramentar as relações e condições de existência de acordo com os interesses da classe dominante. Numa sociedade dividida em classes antagónicas, a moral sempre terá um carácter de classe. Enquanto não se verificarem as condições reais para uma moral universal, válida para toda a sociedade não pode existir um sistema moral válido para todos os tempos e todas as sociedades. Para Marx, ao se tentar construir tal sistema no passado estava-se a imprimir um carácter universal a interesses particulares. Se a moral proletária é a moral de uma classe que esta destinada historicamente a abolir a si mesmo como classe para ceder lugar a uma sociedade verdadeiramente humana, serve como passagem a uma moral universalmente humana. Os homens necessitam da moral assim como necessitam da produção, e cada moral cumpre sua função social de acordo com a estrutura social vigente. Entretanto, torna-se necessário uma nova moral que não seja o reflexo de relações sociais alienadas para regular as relações entre os indivíduos tanto em vista das transformações da velha sociedade como para garantir a harmonia da emergente classe socialista. A transformação da antiga classe e a construção da nova moral exige a participação consciente dos homens. Porque, a nova moral com suas novas virtudes transforma-se numa nova necessidade. Assim, o homem deve interferir sempre na transformação da sociedade. Friedrich Nietzsche (1844-1900) é um crítico mordaz de toda a moral, seja a socrática, judaico- cristão ou moral burguesa. Para Nietzsche, a vida é à vontade de poder, princípio último de todos os valores. O bom é o que favorece a força vital do homem, e tudo o que intensifica e exalta no homem o sentimento de poder, à vontade de poder e o próprio poder. O mal é tudo o que vem da fraqueza. Nietzsche vê no super-homem, alguém capaz de quebrar a tábua dos valores, transmutando-os a todos. O pragmatismo afasta-se de questões teóricas de fundo, dos problemas abstractos da velha metafísica e dedicam-se as questões práticas sob o ponto de vista utilitarista. A verdade é o útil que ajuda a viver e a conviver. O bem é algo que conduz a obtenção eficaz de uma finalidade, que nos conduz a um êxito. Os valores, princípios e normas perdem seu conteúdo objectivo e o bem passa a ser aquilo que ajuda o homem nas suas actividades práticas, variando de acordo com as circunstâncias. O perigo apresentado pelo pragmatismo é que ele tenta reduzir o comportamento moral a actos que conduzem apenas aos êxitos pessoais transformando-os numa variante utilitarista marcada apenas pelo egoísmo, rejeitando a existência de valores ou normas objectivas, criando uma distorção baseada na busca da vantagem particular onde o bom é o que ajuda o meu progresso e o meu sucesso particular. Henri Bergson (1859-1941) distingue a moral em: moral fechada e moral aberta. A moral fechada é o conjunto do que é permitido e do que é proibido para os indivíduos de uma sociedade tendo em vista o auto conservação da mesma. É imposta aos indivíduos e tem como finalidade tornar a vida em comum possível e útil a todos. Ela corresponde no mundo humano ao que é instinto em certas sociedades animais, isto é, tende ao fim de conservar as próprias sociedades. A moral aberta nasce do impulso criador supra-racional.É a moral do amor, de liberdade e da humanidade universal que resulta de uma emoção criadora. Ela torna possível a criação de novos valores e de novas condutas em substituição daquelas vigentes segundo a moral fechada. É a moral dos profetas, sábios, místicos inovadores e dos santos que inspiram a instauração de uma nova ética face a moral vigente. UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE Na filosofia contemporânea, os princípios do liberalismo influenciaram o conceito de ética, adquirindo fortes traços de moral utilitarista. Os indivíduos devem buscar a felicidade e fazerem melhores escolhas entre as alternativas existentes. Bertrand Russel (1872-1970) afirma que a ética é subjectiva. Não contem afirmações verdadeiras ou falsas. É a expressão dos desejos de um grupo. Mas o homem deve reprimir certos desejos e reforçar outros se pretende atingir a felicidade ou equilíbrio. I.6.5. Ética da Pós-Modernidade Jurgem Habermas (1924) faz uma revisão e actualização do marxismo capaz de dar conta das características do capitalismo avançadas na sociedade industrial contemporânea. Faz uma critica a racionalidade dessa sociedade caracterizando-a de uma razão instrumental que visa apenas estabelecer os meios para se alcançar um fim determinado. O desenvolvimento técnico e a ciência voltada apenas à aplicação técnica acarretam a perda do próprio bem que estaria submetido às regras de dominação técnica do mundo actual. E necessário então a recuperação da dimensão humana de uma racionalidade instrumental baseada no agir comunicativo entre sujeitos livres, de caracter emancipador em relação à dominação técnica que distorce a possibilidade da acção comunicativa e produz relações assimétricas e impede uma interacção plena entre as pessoas. Habermas pretende fundar uma nova racionalidade, e recomenda a filosofia analítica da linguagem para sistematizar as condições do uso da linguagem livre em torno da teoria da acção comunicativa. Habermas busca uma teoria geral da verdade segundo a qual o critério da verdade é o consenso dos que argumentam e defende a idéia de que argumentar é uma tarefa eminentemente comunicativa porque o discurso intersubjectivo é o lugar próprio para a argumentação. O critério de verdade aceite por consenso e somente aquele que se estabelece sob condições ideiais – situação ideal de fala. O consenso é racional quando estabelecido numa condição de fala. Para tal Habermas estabeleceu regras cuja observação e condição para que se possa falar de um discurso verdadeiro, que são: • Todos os participantes tenham as mesmas chances de participar do dialogo; • Todos os participantes tenham as mesmas chances para a critica. Estas são formas de eliminação dos factores de poder que poderiam perturbar a argumentação; • Todos os falantes deveriam ter chances iguais para expressar suas atitudes, sentimentos e intenções; • Serão admitidos ao discurso falantes que tenham as mesmas chances enquanto agentes para dar ordens e se opor, permitir e proibir, etc. Um diálogo sobre questões morais entre senhores e escravos, patrões e empregados, pais e filhos, violaria as condições da situação ideal da fala. Isto porque o discurso autêntico é aquele que ocorre com pessoas em situação igual, sob condições igualitárias do ponto de vista de participação no discurso. John Rawls (1971) em teoria da justiça afirma que a justiça não é um resultado de interesses por publico que seja. Mas ele pretende afirmar uma justiça distribuitiva partindo de um estado inicial por meio do qual se pode assegurar que os acordos básicos a que se chega nem contrato social sejam justos e eqüitativos. A justiça é entendida como equidade por ser eqüitativa em relação a uma posição original. E, ela basea-se em dois princípios: • Assegurar para cada pessoa numa sociedade direitos iguais numa liberdade compatível com a liberdade dos outros; UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE • Haver uma distribuição de bens econômicos e sociais de modo que toda desigualdade resulte vantajosa para cada um, podendo alem disso, ter cada um acesso, sem obstáculo, a qualquer posição ou cargo. Portanto, todos os bens sociais primários – liberdade e oportunidade, rendimentos e riquezas e as bases de respeito a si mesmo devem ser igualmente distribuídas a menos que uma distribuição desigual desses bens seja vantajosa para os menos favorecidos. UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE Bibliografia Complementar ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Editora Martin Claret. 2007. ARRUDA, De M. C. C. at al Fundamentos de Ética Empresarial e Económica. 3 Edição. São Paulo: Editora Atlas. 2007. KANT, I. Licciones de ética. Barcelona: Biblioteca de Bolsillo.2001. LOURENÇO, J. V. e Vicente, J. N. Do Vivido ao Pensado. Porto: Porto Editora. 1995. RODRIGUES. L. Filosofia. 10 ano. Lisboa: Plátano Editora. 2003. VÁZQUEZ, A. S. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 2006. UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE Índice Unidade nº2 i Ética Geral – Pessoa, Consciência e Responsabilidade Moral .........................................i Introdução .............................................................................................................i UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE II. A Pessoa como categoria ética ............................................................................. ii II. 1. O indivíduo como um ser Biológico e Social ................................................... ii II. 2. A constituição da Pessoa.................................................................................. ii II. 3. Características da Pessoa ................................................................................ iii II. 3.1. Unicidade .................................................................................................... iii II.3.2. Comunhão ......................................................................................................... iii II.3.3. Interioridade ...................................................................................................... iii II.3.4. Carácter sagrado e absoluto da pessoa ............................................................... iii II. 3.5. Singularidade ................................................................................................ iv II.3.6. Autonomia ......................................................................................................... iv II.3.7. Abertura ............................................................................................................. iv II.4. A Pessoa na sua relação com os Outros ................................................................. iv II.4.1. A relação com o outro como concorrente............................................................ iv II.4.2. A relação com o outro como contrato ................................................................. v II.4.3. A relação com o outro como um tu-como-eu ....................................................... v II.5. O significado ético da relação da pessoa com os outros .......................................... v II.6. A Experiência do dever ......................................................................................... vi II.6.1. O dever .............................................................................................................. vi II.6.2. A coacção e a obrigatoriedade moral .................................................................. vi II.6.3. Os deveres.........................................................................................................vii II.6.3.1. Deveres para connosco mesmo .......................................................................vii II.6.3.2. Deveres para com os outros ............................................................................vii II.7. A liberdade como fundamento do agir moral ........................................................viiII.8. A consciência moral - etimologia ....................................................................... viii II.8.1. A consciência sob ponto de vista da Filosofia ..................................................... ix II.8.2. A consciência sob ponto de vista da Psicologia ................................................... x II.8.3. A consciência sob ponto de vista da Sociologia ................................................... x II.8.4. A consciência sob ponto de vista da Ética........................................................... xi II.9. A consciência moral e a experiência do dever ....................................................... xi II.10. Os constituintes do campo ético .........................................................................xii II.11. A Formação da consciência moral ..................................................................... xiv II.12. Responsabilidade moral .................................................................................... xvi II.13. Acção moral ....................................................................................................xviii II.13.1. Classificação dos valores ..............................................................................xviii II.13.1.1. Os valores espirituais .................................................................................xviii II.13.1.2. Os valores sensíveis (materiais) ................................................................... xix II.13.2. Juízos de Valor e Juízos de Facto ................................................................... xix II.13.3. A relaçãõ entre Normas e Valores Morais........................................................ xx Tarefas ....................................................................................................................... xxi Auto- avaliação .......................................................................................................... xxi Chave de correcção ....................................................... Error! Bookmark not defined. Bibliografia Complementar ....................................................................................... xxii UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE Unidade nº2 Pessoa, Consciência e Responsabilidade Moral Introdução Especificamente, esta unidade é constituída por 5 tópicos, nomeadamente A pessoa como categoria ética, a consciência moral, a formação da consciência moral, a responsabilidade e os valores e a acção moral. O primeiro tópico (pessoa como categoria ética) pretende reflectir e caracterizar a pessoa sob ponto de vista ético. O segundo tópico (consciência moral) pretende descrever os vários pontos de vista acerca da origem da consciência moral). No terceiro tópico (formação da consciência moral) vamos fazer uma abordagem psicológica da formação da consciência. Tomaremos como autores fundamentais os psicólogos Jean Piaget e L. Kohlberg. No quarto tópico vamos reflectir acerca da responsabilidade moral. E por fim, na quinto tópico definiremos os valores e a acção moral. Objectivos Ao completar esta unidade, você será capaz de: • Definir os coneitos de pessoa, consciência moral e responsabilidade moral; • Diferenciar a responsabilidade moral da culpabilidade; • Caracterizar a pessoa como categoria ética; • Classificar a ética enquanto uma disciplina • Explicar o processo da formação da consciência moral em Kohlberg e Jean Piaget. UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE A Pessoa como categoria ética Nesta secção vamos falar acerca da etimologia dos conceitos de pessoa, bem como as carcaterísticas da pessoa. “Todos sabemos que somos animais da classe dos mamíferos, da ordem dos primatas, da familia dos hominideos, do género homo, da espécie sapiens, que o nossso corpo é uma máquina com trinta bilhoes de células, controlada e procriada por um sistema genético que se constistuiu no decurso de uma longa evolução natural de 2 a 3 bilhões de anos, que o cérebro com que pensamos, a boca com que falamos, a mão com que escrevemos, são órgãos biológicos, mas este conhecimento é tão inoperante como o que nos informa que o nosso organismos é constituído por combinações de carbono, de hidrogénio, de oxigénio e de azoto” (Morin, 1975: 15) Este relato de Edgar Morin, a cima citado, mostra-nos que somos diferentes relativamente a outros animais. O homem é um ser capaz de dizer sim ou não a algo, um eterno protestante a tudo. O homem é o sujeito que manifesta a sua autonomia em relação a natureza e ao mundo que o rodeia. Este mesmo homem possui qualidades que o constitui como um sujeito impar no universos dos outros animais, tais como: a conscieência de si mesmo, reter opassado, prever o futuro, dá nomes aos objectos, ultrapassando os limites graças a sua imaginação. Perante estes factos podemos concluir que a realidade humana não se limita no ser biológico, uma vez que exige e comporta outras vertentes como psicológica, social, cultural e moral. Por isso, o ser humano é o resultado de vários processos: biológicos, psicológicos, sociais, culturais e morais. Estes factores encontram se conjugados numa complexa relação interindividual. É nesse contexto que o homem se descobre a si mesmo como um indivíduo pensante, e descobre a existencia dos outros como a condição da sua existência. Mas falemos de seguida deste indivíduo biológico e social. II. 1. O indivíduo como um ser Biológico e Social Nesta secção vamos abordar de tês realidades intimamente relacionadas – o indivíduo biológico, a pessoa e o indivíduo social. Para compreendermos o processo da sociabilidade do homem temos que partir da noção da pessoa. Pois o ser vivo enquanto indivíduo é uma totalidade diferênciada, como ilustra o texto de Edgar Morin (1975). No entanto os diversos órgãos que compõe o ser vivo não são indipendentes um do outro, porém constituiem uma estrutura. Afirmar que o indivíduo é um ser estruturado significa queo todo é formado por partes interdependentes que só são aquilo que são devido a esta sua relação de mútua dependência. Mas a totalidade do ser biológico está centrado num foco – a consciência ou memória sensível. Quando a consciência é reflexão, o homem não só sabe mas sabe que sabe, então estamos entrando no mundo da pessoa. Portanto, é esta centralidade que dá uma certa autonomia ao indivíduo em relação ao meio ambiente e a razão última das diversas características do ser vivo. II. 2. A constituição da Pessoa Depois de explicarmos do indivíduo biológico, nesta secção vamos apresentar e compreender a constituição da pessoa. Num primeiro momento vamos demonstrar a perspectiva clássica e em segundo descrever a pessoa na perspectiva de algumas correntes filosóficas. A perspectiva clássica é representada por Boécio (480-525) e São Tomás de Aquino. Boécio define a pessoa como sendo uma “substância individual de natureza racional”; o aquiniate, por seu turno, define a pessoa como um “subsistente de natureza racional”. UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE Estas duas definições apresentam dois elementos fundamentais a saber: o primeiro tem a ver com o facto da pessoa ser um indivíduo subsistente. Esta perspectiva demonstra realidade (totalidade), fechada, acabada, que subsiste em si mesma, centrada e autónoma. o segunda elemento é o facto de que a pessoa é de natureza racional. Esta racionalidade pressupõe uma dimensão espritual. Pois a razão é o fundamento último da liberdade e a liberdade é o fundamento último de outras carcaterísticas e realizações da pessoa. A perspectiva das correntes filosóficas, vamos destacar a visão da Antropologia Moderna. Vamos de seguida descrever as caracteristicas da pessoa. II. 3. Características da Pessoa Das várias características da pessoa podemos destacar as seguintes: Uniciddade, comunhão, interioridade, carácter sagrado e absoluto da pessoa, singularidade, autonomia e abertura. Passemos, de seguida,a carecterização. II. 3.1. Unicidade A unidade da pessoa deve ser entendida no contexto do seu agir e no sentido psicológico. Uma pessoa não pode ser habitado por nenhum outro, e que na relação consigo mesmo, ele se encontra só ele mesmo, isto é, ela não pode ser representado por nenhum outro, porque ela é única. A pessoa é incomunicável, não é delegável. Eu António delegar a minha personalidade, essência, carácter, etc., ao Francisco para que se pareça comigo. Isso jamais acontecerá, porque a pessoa é única e irrepetível. II.3.2. Comunhão A comunhão é outra característica da pessoa. Esta característica está profundamente ligada a característica anterior – a unicidade. Embora a pessoa seja única,irrepetível incomunicável, no seu sentido ontológico, ela está estruturada para viver com, para comunicar, para se relacionar. É neste sentido que afirmamos que a pessoa se encontra em plena comunhão interpessoal. II.3.3. Interioridade A interioridade, como uma característica da pessoa, deve ser entendida como espiritual. Pois a relação interpessoal existe um núcleo intransponível: O encontro interpessoal nunca é absolutamente transparente. Há sempre uma margem de alteridade que escapa à união. A este núcleo pessoal, a esta interioridade revistidade de espiritualidade denomina-se eu primorial, eu-origem ou eu-frontal. II.3.4 . Carácter sagrado e absoluto da pessoa A pessoa tem um valor absoluto que não pode ser instrumentalizada em função seja de que for. A pessoa não pode ser reduzida a simples meio, mas sempre deve ser considerada como um fim em si mesmo. É a este carácter irrecusável que afirmamos que a pessoa tem um valor sagrado e absoluto. UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE II. 3.5. Singularidade A singularidade faz com que a pessoa possua uma essência individual que a torna única, irrepetível, insubstituível. Jamais existirá um outro Sócrates, Platão, o Galilleu igual ou indéntico àquele que conhecemos pela história. II.3.6. Autonomia A autonomia é uma propriedade que faz da pessoa o principio das suas acções. Por isso, um autónomo é aquele que se rege pela sua prória lei. Esta característica confere a pessoa uma dignidade especial. Pois é por se sentir autónomo que a pessoa se sente sujeito, isto é, uma realidade distinta e superior ao mundo das coisas que a circundam. Mas a manifestação mais elevada da autonomia está na capacidade de se governar a si mesmo, na capacidade de ser lei para si mesmo, na capacidade do exercício da liberdade e autodeterminação. II.3.7. Abertura A abertura significa que a pesar de ser um princípio do seu agir, a pessoa é um projecto aberto e comunicante: um projecto aberto ao mundo que o circunda, um projecto aberto aos outros que descobre como coexistente e coactuantes, um projecto aberto ao transcendente enquanto possibilidade de encontrar nessa abertura o sentido da vida. II.4. A Pessoa na sua relação com os Outros Nesta secção vamos falar em primeiro lugar da relação da pessoa com os outros. De seguida trataremos do significado ético desta relação. A pessoa é um Ser-com-os-outros. Este é um primeiro dado da existência humana. Pois o ser humano vem no mundo graças a vontade e mediação de outrem, cresce, vive e colabora com outrem. Esta relação com o outro é uma relação constituitiva da própria existência individual. Se o ser humano existe então ele está no mundo com os outros. Sob ponto de vista da moralidade e da ética, a relação com os outros, este ser-com-os-outros funda algum tipo de exiência moral e ética, a destacar: a relação com o outro como concorrente, a relação com o outro como contrato e a relação com o outro com um tu-como-eu. Vamos de seguida descrever a relação com o outro como concorrente. II.4.1. A relação com o outro como concorrente A relação com o outro como concorrente, ela depende bastante da forma como observamos o outro e do tipo de relação com o outro. Se entendo o outro como outro (alguem alheio a mim), aquele com quem não tenho nada a ver, aquele que aparece no meu dia-a-dia como um concorrente com quem e contra quem devo competir, como aquele que dispuda o meu lugar, como meu adversário e meu inimigo, então a minha relação com ele será de oposição, disputa, conflito e até mesmo de aniquilação. Nos nossos dias de hoje é frequente observar que a relação com o outro é de oposição e guerra, precisamente porque encara-se o outro como o outro; alguém estranho, como aquele que não tenho nada a ver. Observe-se o nosso dia-a-dia: conflitos, a concorrência desleal entre empresas, etc. UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE II.4.2. A relação com o outro como contracto A relação com o outro como contrato, esta relação com o outro perspectiva o eu e o outro como apenas indivíduos que estabelecem contratos entre si porque não podem sobre viver um se o outro, e porque precisam de encontrar uma forma de assegurar a defesa dos seus interesses distintos e antagónicos. Este é uma dimensão individualista em que a relação com o outro têm um carácter de uma relação acidental e estratégica. Poranto, segundo essa visão eu preciso o outro para poder sobreviver e satisfação das suas necessidades. Este modo de relação com o outro ainda não satisfaz a dimensão moral ou ética de sermos-uns-com-os-outros. II.4.3. A relação com o outro como um tu-como-eu Esta perspectiva procura abordar o outro como um outro-eu, com um eu-como-eu, ou seja, um tu- como-eu a quem gratuitamente e com prazer concede a dignidade de pessoa. Esta relação está cheia de experiência. E, é na experiência de acolhimento, de reconhecimento, do amor, da amizade, do enamoramento que encontramos a dimensão mais profunda da relação com o outro como uma relação positiva e feliz, como uma relação com enorme peso moral e ético. É nessas experiência que acabamos de referir e outras em que os outros tem efectivamente o sentido ético da responsabilidade por nós. É só nessa dimensão que encontramos o verdadeiro sentido ético de sermos-uns-com-os-outros. Pois é por detrás do reconhecimento onde reside o outro que é um valor, que o outro tem dignidade própria, de que o outro é um imperativo ético e de que o outro pode assumir obrigações morais e arcar com a responsabilidade ética pelo seu bem e felicidade. II.5. O significado ético da relação da pessoa com os outros Nesta secção vamos acentuar o valor ético da pessoa e a sua importância na relação com os outros. A relação da pessoa com os outros só pode ter significado ético se a própria pessoa se apresentar como um valor ético. A pessoa é um fim autónomo do universo – porque ele é racional e livre. Por isso, o valor da pessoa emerge nas relações interpessoais. É na sua relação com os outros que a pessoa encontrar os vínculos éticos mais profundos. Esses vínculos expressam-se de diversos níveis: • Em primeiro lugar, como respeito pela pessoa do outro, tal como se apresenta no encontro interpessoal. A pessoa é única, original, insubstituível. Ela é fim em si mesma e nunca pode ser instrumentalizada e reduzida a um simples meio seja do que for. • Em segundo lugar, a promoção como uma forma de libertação. Na relação interpessoal, o outro se apresenta, muitas vezes, em estado de alienação: é o pobre, o oprimido, o explorado, o esfomeado, o desempregado, etc. Face a estas situações é necessário agir sob o risco do significado ético da relação pessoal possa ficar reduzida a um mero moralismo forma. Por isso, a relação interpessoal é activa, criadora, libertadora. Portanto, o valor ético da pessoa é o fundamento duma ética social e é o critério para decidirmos sobre os deveres que a consciência moral nos impõe. Depois de termos abordado do significado ético da relação da pessoa com o outro, vamos de seguida explicar o problema da experiência do dever. UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE II.6. A Experiência do dever Nesta secção vamos tratar da experiência do dever. No entanto, é importante distinguir entre dever e deveres. II.6.1. O
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